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Psicologo informacao

versão impressa ISSN 1415-8809

Psicol inf. vol.17 no.17 São Paulo dez. 2013

 

Artigo

 

 

Sonolência diurna excessiva entre acadêmicos de psicologia

 

Excessive daytime sleepiness among students of psychology

 

 

José Carlos de Souza*; Bruno Vinicius Silva da Cunha**; Lucas Rasi Cunha Leite***; Mirna Torres Figueiró****; Karina Oliveira de Andrade*****

*Psiquiatra, Doutor em Saúde Mental pela UNICAMP, PhD da Faculdade Medicina de Lisboa e Professor da Unigran- Capital, Campo Grande, MS
**
Graduando em Psicologia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Campo Grande, MS.,

***
Economista pela Universidade Estadual de Maringá e Mestre em Agronegócios da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Campo Grande, MS.
****
Psicóloga, mestre em Psicologia pela Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Campo Grande, MS
*****
Graduanda em Psicologia da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Campo Grande, MS.

 

 


RESUMO

A sonolência compreende um processo biológico de homeostase do organismo, que quando em excesso se configura em uma patologia. O objetivo deste trabalho consistiu avaliar a prevalência de sonolência diurna excessiva em acadêmicos do curso de psicologia de uma universidade. Foram entrevistados 286 estudantes e utilizou-se a Escala de Sonolência de Epworth (ESE) e um questionário sociodemográfico. A Escala de Sonolência de Epworth constitui valores do cotidiano que inclinem para algum tipo de sonolência, tal como estar sentado e lendo; vendo televisão; sentado em lugares públicos; andando uma hora sem parar; deitando-se para descansar à tarde, quando as circunstâncias permitem; sentado e conversando; sentado calmamente depois do almoço sem álcool; enquanto estiver dirigindo, quando parar por alguns minutos. Observou-se que 54,44% dos acadêmicos apresentaram sonolência diurna excessiva, sendo que apenas o fator idade teve significância (P = 0,004); quanto menor a idade, tanto maior tendência à sonolência. Outras variáveis como, turno frequentado, sexo, estado civil, ano de curso, nível de dependência e o fator trabalho não tiveram associação significativa.

Palavras-chave: Sonolência diurna excessiva; universitários; Escala de Sonolência Epworth.


ABSTRACT

The sleepiness comprises a biologic process of homeostasis, that when in excess is configured in a pathology. The objective of this work consists to evaluate the prevalence of excessive daytime sleepiness in academics of psychology of a university. In this way 286 students. Utilizing the Epworth Sleepiness Scale (ESS) and a sociodemographic questionnaire. The Epworth Sleepiness Scale constitutes daily values of academics that inclinates to some kind of sleepiness, such as being sitting and reading; watching TV; sitting in a public place; lying down to rest in the afternoon when the circumstances permit; sitting and talking to someone; sitting quietly after a lunch without alcohol; in a car, while stopped for a few minutes in a traffic. It was observed that 54,44% of the students presented excessive daytime sleepiness, and only the age factor was significant (P = 0,004), how much lower the age, greater the tendency to sleepiness. Other variables such as shift frequented, gender, marital status, year of study, level of dependence and labor factor are not significantly associated with the ESS.

Keywords: Excessive daytime sleepiness; academics; Epworth Sleepiness Scale.


 

 

Introdução

A sonolência é uma condição biológica natural do ser humano, onde é estabelecido um processo de homeostase do organismo, quando em excesso, pode ser considerada uma patologia (CHELLAPPA, 2009). Segundo Carskadon e Dement (2011), o sono é um complexo processo psicológico e biológico dividido por estágios que se denominam: sono REM (Rapid Eye Moviment ou Movimento Rápido dos Olhos) e o NREM (Non-REM). O primeiro estágio do sono NREM corresponde a 5% do tempo dormido, em um adulto saudável. O segundo estágio do sono NREM corresponde a 50% do tempo de sono. O terceiro e quarto estágios correspondem a 10-20% do tempo de sono. E o sono REM, ou sono paradoxal (GANHITO, 2001), corresponde cerca de 20-25% do tempo total de sono (Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais – DSM IV TR). Carskadon e Dement (2011) ressaltam ainda que, a fase inicial do sono é onde podem ser detectados alguns dos distúrbios do sono, assim como a narcolepsia. Há diversas causas para a ocorrência da sonolência excessiva (SE), entretanto, Bittencourt et al. (2005, p. 17) apontam que:

As principais causas de SE são a privação crônica de sono (sono insuficiente), a Síndrome da Apnéia e Hipopnéia Obstrutiva do Sono (SAHOS), a narcolepsia, a Síndrome das Pernas Inquietas/Movimentos Periódicos de Membros (SPI/MPM), Distúrbios do Ritmo Circadiano, uso de drogas e medicações e a hipersonia idiopática.

A capacidade de mensurar o sono proporciona a possibilidade de um diagnóstico prévio da doença e que acarretará em uma redução de danos. A avaliação dos hábitos e distúrbios do sono pode ser feita de distintas maneiras: avaliação clínica, diário de sono e também de forma objetiva, por meio da polissonografia; ou subjetiva, por intermédio de questionários estruturados e padronizados, como a Escala de Sonolência Epworth (ESE), utilizada neste artigo (BITTENCOURT et al., 2005; SOUZA et al., 2008).

A Escala de Sonolência de Epworth (ESE) foi desenvolvida por Murray W. Johns, em 1991, no Centro de Distúrbios do Sono do Epworth Hospital, Melbourne, Austrália (JOHNS, 1991). Esta foi planejada como um questionário simples, de fácil aplicação, com o intuito de fornecer uma medida geral do grau de sonolência diurna. Desde a sua descrição, a ESE tem mostrado diferenças significantes entre controles normais e diversos grupos de pacientes, incluindo os portadores da Síndrome de Apneia do Sono, Narcolepsia e Hipersonia Idiopática (JOHNS, 1991).

As diversas tarefas acadêmicas, em paralelo às atividades sociais que o universitário se depara, resultam em um grande gasto de energia, que muitas vezes não é restituído devido às múltiplas demandas. É por isso que a sonolência diurna excessiva não se dispõe recorrente apenas aos fatores biológicos, mas também aos fatores comportamentais, ambientais e sociais (PEREIRA, et al. 2010 a.).

Cada vez mais a necessidade de adaptação ao meio é ressaltada, pois para que possam responder a isso, muitas vezes os acadêmicos se ocupam de horários de dormir mais tardios, de modo que dificultem a sua homeostase. Em consequência deste sono mal adaptativo, a aprendizagem, interação social e qualidade de vida entram em declínio (PEREIRA, et al., 2010 a.).

A exatidão de uma boa qualidade de sono e uma boa eficiência na universidade se torna um processo cíclico, no sentido de que quando se tem um bom sono, decorre em uma melhor aprendizagem. Entretanto, há fatores que forjam esse ciclo, como o trabalho, que muitas vezes não é questão de escolha para se pensar em uma higiene do sono, mas sim algo determinado por sua realidade (PEREIRA, et al., 2010b.).

Segundo Rocha et al. (2010, p. 285), "o ritmo acelerado, as jornadas excessivas e o turno de trabalho são fatores que podem desenvolver o estresse ocupacional". Dessa forma, tarefas excedentes correlacionadas ao trabalho, também excessivo, fazem que a qualidade do sono fique em situação crítica.

 

Método

O método empregado foi quantitativo, descritivo e de corte transversal.

Participantes – foram estudados 286 estudantes, acadêmicos do curso de graduação em psicologia de uma universidade. A amostragem da pesquisa foi feita por conveniência em todas as turmas de psicologia da universidade, no período matutino e noturno, e antes de responderem os instrumentos, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido homologado pelo Comitê de Ética em Pesquisa.

Local – A pesquisa foi realizada no campus da Universidade Católica Dom Bosco (UDCB), localizada em Campo Grande – MS, em períodos matutino e noturno.

Instrumentos – Inicialmente foi utilizado: a) um questionário sociodemográfico – composto de oito itens com as seguintes variáveis: idade, sexo, estado civil, ano do curso, nível de dependência financeira da família, trabalho e carga horária semanal e tipo de condução para a universidade. Após, foi aplicado: b) Escala de Sonolência de Epworth (ESE) – que constitui oito itens que denotam diversas situações passivas e ativas, como estar sentado e lendo; vendo televisão; sentado em lugares públicos (ex.: sala de aula, igreja); como passageiro de trem, carro ou ônibus andando uma hora sem parar; deitando-se para descansar à tarde, quando as circunstâncias permitem; sentado e conversando com alguém; sentado calmamente depois do almoço sem álcool; enquanto estiver dirigindo, quando parar por alguns minutos, em trânsito intenso; onde o paciente escolhe o número correspondente à chance de cochilar em alguma dessas situações, estima-se notas de acordo com: – Nenhuma chance de cochilar = 0; – Pequena chance de cochilar = 1; – Moderada chance de cochilar = 2; – Alta chance de cochilar = 3.

Assim, caso a soma dos valores seja 11 ou superior, considera-se sonolência diurna excessiva. As pontuações têm as seguintes referências: Sonolência Excessiva normal de 0 a 6; Sonolência Excessiva limite: de 7 a 9; Sonolência Excessiva leve: de 10 a 14; Sonolência Excessiva moderada: de 15 a 20; Sonolência Excessiva grave: acima de 20 (BITTENCOURT et al., 2005). A Escala de Sonolência de Epworth tem um elevado grau de consistência interna, medido pelo índice alfa de Cronbach (0,88) (JOHNS, 1991).

Procedimento – Após a aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética em Pesquisa e autorização para a coleta de dados, o pesquisador adentrou a sala de aula, com a licença prévia do professor presente, apresentou-se, explicou a pesquisa, explicou e leu o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, enfatizando o sigilo da pesquisa e que os termos seriam lacrados na presença dos respondentes. Por se tratar de uma pesquisa voluntária, aqueles que não consentiram participar retiraram-se e os que aceitaram participar permaneceram em sala. Não houve um tempo limite estabelecido, entretanto, ocorreu uma variabilidade devido à quantidade de alunos que foram submetidos à aplicação. Foi permitida qualquer manifestação, caso houvesse dúvidas, sem qualquer interferência do pesquisador em sua subjetividade. Foi necessária uma semana para a aplicação em todas as salas.

 

Resultados e discussão

Foram realizados testes estatísticos correlacionando o questionário sociodemográfico e a Escala de Sonolência Epworth. A análise estatística foi feita a partir dos seguintes testes, sendo: Teste de Diferença de Médias (t-student), Análise de Variância (ANOVA) e Teste de Correlação Linear de Pearson. Todos os testes foram realizados com 95% de confiabilidade. Baseada nos estudos de Johns (1991), a análise utilizada para a avaliação dos dados foi feita a partir da Escala de Sonolência de Epworth (ESE), como referido.

Foi observado, a partir do questionário sociodemográfico, que o corpo discente amostrado teve uma predominância feminina, constituindo-se 83,51% e o masculino de 16,49% da amostra. Em relação ao estado civil, a maioria compõe a classe de solteiros (72,03%). Quanto à dependência/independência financeira dos universitários, observou-se que aqueles que se declararam dependentes incidem em 17,54% daqueles que se consideraram independentes; 49,65% desses estudantes amostrados trabalham.

Com relação à sonolência, sua análise pode ser observada na Tabela 1.

 

 

A análise de sonolência feita a partir da Escala de Sonolência de Epworth indica (Tabela 1) que há sonolência diurna no grupo representado por 54,55% dos participantes. Ou seja, há algum tipo de dissonia, conforme descrito por Souza et al. (2003) e segundo o DSM-IV TR (2002), que considera as dissonias como transtorno dado pela qualidade, quantidade ou regulação do ritmo do sono.

E sobre esse aspecto do sono em universitários, é interessante lembrar que Rodrigues (2002) encontrou resultados elucidando a sonolência em acadêmicos desde o início do semestre.

 

 

Pela Tabela 2 é possível observar uma diferença significativa (p = 0,004) entre a Escala de Sonolência de Epworth e a idade dos estudantes. Foi evidenciado que os acadêmicos com menos idade (em média 23,122 anos) tendem a ter maior sonolência. Esses dados não corroboram com pesquisa realizada por Souza et al. (2002), a qual não encontrou associação entre a idade e a residência de sonolência.

Em relação às demais variáveis associadas, levantadas pelo questionário sociodemográfico, pode-se verificar que não houve um valor significativo da Escala de Sonolência de Epworth em relação ao turno frequentado, sexo, estado civil, ano de curso, nível de dependência e o fator trabalho. Os fatores sexo e trabalho também não se apresentam significativos na pesquisa realizada por Souza (2002, p. 559), pois suas descobertas não mostraram correlações significativas entre SDE e as variáveis: sexo, idade, escolaridade, status socioeconômico e trabalho.

Assim, embora Pereira et al. (2010 a.) tenham demonstrado que a sonolência diurna excessiva não se associa apenas aos fatores biológicos, mas também aos comportamentais, ambientais e sociais, a associação dessas variáveis no presente estudo não teve significância.

Entretanto, foi observado no presente que, os estudantes trabalhadores eram mais sonolentos do que aqueles que não trabalhavam, ou seja, além da carga significativa de estudos, as tarefas do trabalho pareceram contribuir para menor disposição de vigília; mas vale salientar que os acadêmicos do período noturno se encontravam mais adaptados a estudar sob carga de trabalho do que os estudantes da manhã. Nesse sentido, é importante que se estude mais a capacidade adaptativa desses estudantes.

São interessantes, neste aspecto, as considerações de Sukys- -Claudino et al. (2010), ao analisarem que a eficiência de atenção no momento de estudar é menor pela manhã, devido à maior quantidade de sonolência.

 

Conclusão

A atual pesquisa aponta para pouco contraste, em termos de significância, na relação da prevalência e não prevalência de algum tipo de sonolência entre os universitários, ainda que tenha apontado três relações importantes:

Houve maior índice de prevalência de sono nos estudantes amostrados; observou-se que acadêmicos com menos idade tenderam a ter maior sonolência e os estudantes trabalhadores eram mais sonolentos do que aqueles que não trabalhavam, havendo, pois, uma tendência na indicação de que, além das tarefas escolares, a carga de trabalho contribuía para menor disposição de vigília.

Assim, é de imensa importância que se leve em consideração a diferenciação nos resultados devido à subjetividade presente, pois há de se considerar que cada um tem construído seu ritmo circadiano diferente e sonos distintos.

Há, portanto, uma necessidade de se pensar na qualidade do sono dos universitários, já que são evidentes as mostras de que existe sonolência diurna excessiva na maioria deles e a eficiência acadêmica depende, também, de uma boa higiene desse sono.

 

Referências

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Contato dos Autores:

José Carlos Souza – Rua Theotônio Rosa Pires, 88, Vila Rosa Pires,
CEP 79004-340, Campo Grande, MS
E-mail: josecarlossouza@uol.com.br
Bruno Vinicius Silva da Cunha –. E-mail: vinnibrunoo@hotmail.com
Lucas Rasi Cunha Leite –E-mail: lucas_rasi@hotmail.com
Mirna Torres Figueiró –E-mail: mirnatorresfigueiro@hotmail.com
Karina Oliveira de Andrade –E-mail: karina.andrade92@hotmail.com

 

Recebido em: 10/07/2012
Aceito em: 25/01/2013

 

Agradecimentos

Aos universitários pesquisados, à coordenação do curso de psicologia, e também ao apoio financeiro do CNPq e pela bolsa cedida para o presente pesquisador.

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