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Revista da SBPH
versão impressa ISSN 1516-0858
Rev. SBPH vol.24 no.1 São Paulo jan./jun. 2021
Desfechos do Planejamento Antecipado de Cuidado e Diretivas Antecipadas em Unidade de Terapia Intensiva: Revisão Integrativa
Outcomes of Advance Care Planning and Advance Directives in an Intensive Care Unit: Integrative Review
Cibele Dayana de Souza Werneck LeiteI; Cibelle Antunes FernandesII
IUniversidade de Brasília (UNB) - Brasília/DF - cibeledayana@gmail.com
IIHospital de Base do Distrito Federal - Brasília/DF - cibelle.antunes@gmail.com
RESUMO
A temática de finitude é notadamente desafiadora para o ser humano, e especialmente, para as equipes de saúde. Assim, o Planejamento Antecipado de Cuidado (ACP) e Diretivas Antecipadas (DA) se apresentam como recursos para otimizar o cuidado humanizado centrado no paciente. Este estudo objetiva identificar os desfechos de ACP e DA no cuidado do paciente crítico em UTI. Trata-se de revisão integrativa com abordagem descritiva. Utilizou-se as fontes de dados Medline (Via Pubmed), Cochrane Central e Lilacs. Após o processo sistemático de exclusão, resultaram 23 estudos. Os resultados apontaram os desfechos de ACP mais significativos: a) Taxas mais altas de conclusão de DA (60,9%); b) recebimento de tratamentos menos intensivos no final da vida (56,5%); c) tomada de decisão compartilhada (30,4%); d) melhora na comunicação entre o paciente, a família e os médicos (21,7%); e) maior probabilidade de que médicos e familiares compreendam e cumpram os desejos do paciente (13%); f) maior utilização de serviços de cuidados paliativos (13%); Este estudo apresentou e descreveu as principais evidências científicas que abordam os desfechos de ACP e DA em UTI.
Palavras-chave: planejamento antecipado de cuidado; diretivas antecipadas; unidade de terapia intensiva; paciente crítico; equipe multiprofissional.
ABSTRACT
The study of finitude is notoriously challenging for human beings and especially to health teams. Thus, the Advance Care Planning (ACP) and Anticipated Directives (AD) present itself as resources to optimize the humanized treat focused on the patient. The objective of this article is to identify the ACP and AD conclusions in the treatment of the critical patient in the Intensive Care Unit (ICU). The method of this study is a systematic review of the integrative type. The systematic review occurred by search on eligible articles from 3 databases known: Medline (by Pubmed), Cochrane Central, and Lilacs- Literature in the Health Sciences in Latin America and the Caribbean. The main results demonstrated that the most significative ACP upshot was: a) Higher AD completion rates (60,9%); b) less intensive receiving treatment in the final life (56,5%); c) shared decision-making (30,4%); d) better communication between the patient, the family and the doctors (21,4%); e) higher probability to the doctors and relatives understand and get the patient desires (13,00%); f) higher utilization of palliative care services; These answers presented and described the main scientific evidence that addresses the outcomes of ACP and AD in ICU.
Keywords: advance care planning (ACP); anticipated directives (AD); intensive care unit (ICU); critical patient; multiprofessional team.
O aprimoramento do suporte artificial e tecnológico no contexto de terapia intensiva protagoniza o cuidado ao paciente crítico em situação de vulnerabilidade, contribui para salvar vidas, revoluciona a qualidade de vida e a longevidade humana (Nunes & Anjos, 2014). Por outro lado, esse aparato no tratamento pode ser considerado uma ameaça à morte natural, pois pode conduzir a obstinação terapêutica. Nesse contexto, Planejamento Antecipado de Cuidado (ACP) e Diretivas Antecipadas (DA) se apresentam como uma possibilidade de harmonizar os valores e preferências pessoais com o tratamento de saúde a ser recebido em processo de final de vida (Detering & Silveira, 2018). A manifestação de vontade expressa pelo paciente e planejada antecipadamente com a sua família e equipe de saúde tem como objetivo garantir respeito a autonomia e proporcionar discussões de final de vida. Desse modo, configuram-se como uma proposta de humanização do cuidado centrado no paciente e na comunicação em saúde.
Culturalmente, há grandes dificuldades em conceber a morte como fase pertencente ao ciclo natural da vida (Cassol et al., 2015). A temática de finitude é notadamente desafiadora para o ser humano e especialmente para as equipes de saúde, sobretudo porque a busca da perspectiva curativa de tratamento pode gerar distanciamento do limite da vida (Cogo et al., 2017). Contudo, a morte pode ser considerada um evento previsível, presente na rotina de todo e qualquer hospital.
Na literatura, é possível encontrar diversas definições divergentes de ACP. Neste estudo, foi considerada a definição de ACP apresentada por Sudore et al. (2017), no qual teve o objetivo de desenvolver uma definição consensual para ACP por meio de um painel multidisciplinar de Delphi de especialistas internacionais multidisciplinares, formado por 52 clínicos, pesquisadores e líderes de políticas de quatro países e um comitê consultivo de pacientes / substitutos:
ACP é um processo que apoia adultos em qualquer idade ou estágio de saúde na compreensão e compartilhamento de seus valores pessoais, objetivos de vida e preferências em relação ao atendimento médico futuro. O objetivo é ajudar a garantir que as pessoas recebam assistência médica consistente com seus valores, objetivos e preferências durante doenças graves e crônicas (Sudore et al, 2017 p.9).
Dessa maneira, ACP pode ser considerado um processo de humanização do tratamento que preconiza a comunicação com o paciente, com sua família e com a equipe de saúde como um de seus aspectos fundamentais. Objetiva oportunizar ao paciente espaço adequado para compreensão e acompanhamento do seu próprio processo de doença, prognóstico, planos de tratamento, perspectivas interdisciplinares e metas de cuidado (Coelho & Yankaskas, 2017). Sudore et al. (2018) apontam que ACP tem despertado interesse crescente nos sistemas de saúde internacionais, mas alertam que há carência de estudos que abordem desfechos clínicos e uma estrutura organizadora que mensure qualidade de ACP. Os autores defendem que, para implantação e sucesso de ACP na assistência centrada no paciente, é importante considerar as características do indivíduo, da comunidade e dos sistemas de saúde.
As Diretivas Antecipadas consistem na declaração de vontade antecipatória sobre conduta terapêutica em caso de doença ameaçadora de vida, bem como diante de prognóstico de irreversibilidade e sem perspectiva de tratamento curativo (Conselho Federal de Medicina, 2012). DA são compostas pelo Testamento Vital e pelo Mandado Duradouro. O Testamento Vital é o documento com a descrição de desejo específico sobre medidas de tratamento manifestado antecipadamente pelo próprio paciente. Já o Mandado Duradouro é a intitulação prévia de outra pessoa para responder pelo paciente quando este estiver incapacitado de fazê-lo. Sob o ponto de vista do sistema jurídico brasileiro, não há legislação que regulamente DA, e esse aspecto consiste em um dos maiores debates entre os pesquisadores do tema (Ribeiro, 2006). Apesar da falta de Legislação específica sobre DA, pelo ordenamento jurídico brasileiro, é possível buscar respaldo legal na própria Constituição Federal (1988), que prevê o princípio da dignidade da pessoa humana e garante em seu artigo 5° que "ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Outro fator a se considerar é que o Código Civil, através da Lei 10.406 de 2002, estipula que "Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou a intervenção cirúrgica" (Lei 10.406/2002). Por fim, o direito à autonomia do paciente é garantido através da Lei 8.080/90, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção, recuperação da saúde e organização dos serviços (Lei 8.080/1990).
Nesta mesma perspectiva, em 31 de agosto de 2012, o Conselho Federal de Medicina, através da Resolução 1.995, dispôs sobre as diretivas antecipadas (Conselho Federal de Medicina, 2012). A resolução começa definindo DA e em seguida recomenda ao médico levar em consideração a DA do paciente. O Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, através da Resolução No 0564/2017, orienta-os a respeitar o direito do exercício da autonomia da pessoa ou de seu representante legal na tomada de decisão e nas diretivas antecipadas da pessoa. Dadalto, Tupinanbás e Greco (2013), defendem que apesar das resoluções dos órgãos de classes não terem regulamentação legislativa, possuem força normativa entre os profissionais desses órgãos.
No Brasil, a perspectiva de adesão às DA é crescente. Em 2016, foram lavrados 672 atos em São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais (Terra, 2017). Até abril de 2017, foram registradas 185. O primeiro registro em cartório de DA no Brasil foi em 2006 e, desde então, já foram registradas 3.127 (Cremesp, 2017) Diante desse cenário, há autores que defendem que as DA serão cada vez mais utilizadas (Nunes & Anjos, 2014). Mas ainda são raros os estudos sobre DA no âmbito de UTI. Por isso, faz-se extremamente necessário o aprofundamento de pesquisas sobre o tema e maiores discussões. Esse trabalho focou-se a estudar ACP e DA especificamente no âmbito de UTI por ser um campo de alto risco para gravidade, mortalidade e uso de tecnologias.
As UTIs se caracterizam pela oferta de cuidado multiprofissional pelas equipes de saúde. Segundo a Portaria nº 895, de 31 de março de 2017, a UTI caracteriza-se como um serviço hospitalar destinado a pessoas em condição clínica grave ou de risco, clínico ou cirúrgico, necessitando de cuidados intensivos (Portaria no 895/2017). Na UTI, a assistência médica e de enfermagem deve ser ininterrupta, bem como a monitoração contínua durante as 24 (vinte e quatro) horas do dia, além de equipamentos e equipe multidisciplinar especializada. Ainda segundo essa portaria, as UTIs deverão dispor de assistência nutricional, farmacêutica fisioterapêutica e psicológica aos pacientes. Outra característica dessas unidades de atendimento, é o alto investimento de suporte tecnológico (Dias et al., 2006). Tal configuração hospitalar exige desenvolvimento de habilidades de comunicação e trabalho em equipe multidisciplinar, como forma de oferecer qualidade na assistência.
No Brasil, dados atualizados até setembro de 2018 registraram 13.579 leitos, distribuídos entre 832 UTIs. O tempo de permanência do paciente internado foi em média de 5,65 dias. Em 2017, a taxa de mortalidade nas UTIS foi de 16,92. As comorbidades mais frequentes encontradas nas UTIs de todos hospitais brasileiros foram: "Hipertensão arterial (65,68%); diabetes (31,03%); tumor sólido (16,40%); insuficiência renal crônica (12,03%); insuficiência cardíaca (10,08%); AVC Prévio (9,03%); infarto prévio (8,67%); Doença pulmonar obstrutiva crônica (7,04%); neoplasia hematológica (1,82%) e Cirrose (1,78%)" (Epimed Solutions, 2018). O aprimoramento da assistência em saúde é necessário como espécie de resposta às necessidades de saúde dos cidadãos. Para tanto é indispensável constante preparo interdisciplinar, a começar pelo aprofundamento técnico científico brasileiro sobre ACP e as DA.
Este estudo, portanto, tem como objetivo identificar os desfechos no cumprimento do Planejamento Antecipado de cuidado e de Diretivas Antecipadas no cuidado do paciente crítico internado em UTI. Um objetivo secundário a este estudo consiste em auxiliar os profissionais de saúde brasileiros envolvidos com o tema a avistar um ponto de partida, iniciando pelo entendimento de aspectos básicos de ACP e DA e, com reflexões acerca da natureza dos serviços prestados.
Método
Trata-se de estudo de revisão integrativa da literatura com abordagem descritiva, fundamentada na prática baseada em evidências e realizada por meio de seis passos: 1) Estratégia de busca, descritores e bases de dados; 2) Critérios de inclusão e exclusão; 3) Identificação dos estudos pré-selecionados e selecionados; 4) Categorização dos estudos selecionados; 5) Análise e interpretação dos resultados; 6) Apresentação da revisão/síntese do conhecimento (Botelho et al., 2011). Realizou-se uma busca na literatura para investigar se outros estudos já haviam abordado o objetivo dessa pesquisa previamente, utilizando as seguintes bases de dados: site oficial da Cochrane Library; biblioteca Cochrane, disponível na BVS (Biblioteca Virtual em Saúde - Bireme); CRD (Centre for Reviews and Dissemination e Clinical Queries no PubMed), com as seguintes estratégias de busca: "Critical care"; "Advance Care Planning" e "Advance Directives"; "Diretivas Antecipadas"; "Planejamento Antecipado de Cuidado" e "Diretivas Antecipadas". Dessa forma, não tendo sido identificados estudos prévios, adotou-se as etapas sequenciais da revisão integrativa.
Critérios de elegibilidade
Foram elaborados os seguintes critérios de elegibilidade dos estudos para compor essa revisão:
•Critérios de inclusão: pacientes adulto críticos de UTI; ensaio clínico randomizado; estudos observacionais; estudo caso controle; estudo de coorte; relato de casos; idiomas: português, inglês; não houve delimitação do recorte temporal; estudos publicados nos periódicos com classificação Qualis: A1, A2, B1.
•Critérios de exclusão: teses, dissertações, monografias, trabalhos de conclusão de curso e livros, capítulos de livros, anuários, relatórios; revisão de literatura não sistemática do tipo narrativa; pacientes crianças ou adolescentes; estudos em duplicidade; periódicos com classificação Qualis: B2, B3, B4, B5 e C.
Fontes de informações e estratégias de busca
A condução da revisão integrativa ocorreu por meio de busca de potenciais estudos elegíveis nas seguintes fontes de dados: Medline (Biblioteca Nacional de Medicina do EUA), Cochrane Central (coleção internacional de banco de dados sobre saúde) e Lilacs (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde). A coleta foi realizada entre os meses de setembro a dezembro de 2019. Foi elaborada estratégia de busca dos artigos com foco no acrônimo PICO que por ser revisão sistemática inclui-se população (paciente adulto crítico de UTI) e intervenção (ACP e DA), mas não inclui o desfecho para evitar atribuir a especificidade do resultado (Ministério da Saúde, 2012). Assim, o objetivo é identificar a eficácia dos desfechos do Planejamento Antecipado de cuidado e de Diretivas Antecipadas no cuidado do paciente crítico de UTI. Os termos selecionados para a busca foram definidos através de vocabulário controlado em Decs (Descritores em Ciências da Saúde) pela Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Mesh (Medical Subject Headings) pelo PubMed. A estratégia utilizada na busca dos artigos nas plataformas de dados, foi o cruzamento de descritores com base nos operadores booleanos: AND ou OR. Desse modo, os principais termos foram: "Critical care"; "Advance Care Planning" e "Advance Directives"; "Diretivas Antecipadas"; "Planejamento Antecipado de Cuidados" "Unidade de Terapia Intensiva", com suas possíveis variações.
O processo de elegibilidade dos estudos foi realizado por dois revisores de forma independente com o objetivo de minimizar risco de viés. Foi realizado teste Cohen Kappa para avaliação de concordância entre os autores, feito a partir do pacote IRR do software R. O coeficiente kappa resultou em concordância substancial - 0,78 p=0. A primeira etapa do processo ocorreu por meio de triagem dos artigos pela leitura do título, resumo e palavras chaves. Para essa etapa utilizou-se o software Mendeley, um gerenciador de referências e rede de pesquisadores. Os artigos triados na fase 1 foram pré-selecionados para terem sua elegibilidade confirmada pela leitura detalhada do texto completo do estudo. Para guiar esta etapa, utilizou-se uma ficha clínica padronizada elaborada Ministério de Saúde (2012) que contém os critérios de inclusão estabelecidos. A ficha clínica padronizada foi elaborada por meio de ferramenta online do sistema Google Forms. Os estudos selecionados no processo de elegibilidade (Etapa 1 e 2) foram incluídos. Para o processo de extração dos dados foi elaborada uma ficha clínica padrão adaptada de Ursi (2005) e Ministério da Saúde (2011). Também foi utilizada ferramenta online do sistema Google Forms nessa etapa (Apêndice 2) e o tratamento de dados ocorreu em planilha do Excel.
Resultados
A revisão foi realizada seguindo critérios Prisma (2009), o fluxograma com a descrição de tais critérios está ilustrado na Figura 1. A estratégia de busca obteve 234 estudos. Conforme a avaliação dos títulos, resumos e palavras-chave (etapa 1), 132 referências foram identificadas como potencialmente relevantes para o assunto. Tais artigos foram pré-selecionados para a segunda fase de Triagem, que após leitura dos resumos, palavras - chave e títulos, eliminou-se os estudos pelos critérios de exclusão. Dessa maneira, 39 estudos foram considerados potencialmente elegíveis. Assim, após leitura completa e preenchimento da ficha de elegibilidade, 16 estudos não atenderam aos critérios de inclusão. Por fim, 23 estudos foram incluídos na fase de extração de dados para compor essa revisão.
Perfil Demográfico dos Estudos
Apesar da inclusão dos idiomas inglês e português, apenas foram encontrados estudos publicados em inglês. Em relação ao país das publicações, os estudos encontrados foram realizados na Alemanha (N=2), Coreia do Sul (N=1) e Estados Unidos (EUA) (N=20). EUA apresenta-se com maior desenvolvimento no tema. Foram encontrados estudos publicados entre 2003 e 2018. Constatou-se um intervalo de seis anos de publicação entre o primeiro artigo (2003) e os artigos subsequentes (2009 em diante). Outro fato é que 2012 foi ano com maior concentração de publicações (n=7).
Os principais aspectos metodológicos presentes nos estudos, foram distribuídos por participantes e delineamento. O número total de participantes de todos os artigos incluídos nessa pesquisa foram 315.933 pacientes adultos críticos e o valor médio foi 13.736,22. Os estudos com maior número de participantes foram o de Hart et al., (2015) com 277.693, seguido por Meissner et al., (2010) com 14.720 e Chavez et al., (2018) com 10.157. Os estudos com menor número de participantes foram os estudos de relatos de casos de Schenker et al., (2012) e Nunez et al., (2015) com 23 e 30 participantes respectivamente. Em termos de delineamento presente nos estudos, percebe-se a predominância do estudo de coorte com 13 artigos (56,52%), seguido pelo estudo prospectivo com cinco artigos (21,73%). Os tipos de estudos menos frequentes foram os estudos retrospectivos com dois artigos (8,69%), os relatos de casos com dois artigos (8,69%) e o estudo transversal com um artigo (4,34%).
A qualidade e abrangência dos estudos foram tratadas nessa pesquisa com base em três critérios principais: 1) Estrato Qualis Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior da revista; 2) Fator de impacto da revista e 3) Nível de Evidência do artigo. O Estrato Qualis Capes é um meio de avaliação e estratificação da qualidade da produção intelectual. Foi triado no Portal de Periódicos Capes, (Capes, 2018). A qualidade das evidências científicas foi avaliada conforme os critérios estabelecidos pela Oxford Centre for Evidence-based Medicine com base no Nível de Evidência Científica por Tipo de Estudo (Oxford Centre for Evidence-Based Medicine, 2018). O fator de impacto foi resgatado por meio de acesso ao Jornal Citation Reports/WEB of Science pelo Portal de Portal de Periódicos Capes (Capes, 2018).
Em relação ao estrato Qualis Capes, foram encontrados 15 artigos do tipo A1 (62,5%). A maior parte da amostra está composta pelo mais elevado indicador de qualidade. Seguido do tipo A2, que obteve três artigos (12,5%) e B1 com seis artigos (25%). A respeito do potencial de abrangência da revista, o fator de impacto variou de 1.533 a 79.258, com a média de 11.868. Na avaliação das evidências científicas, 23 artigos (91,3%) obtiveram nível de evidência científica 2B, devido aos estudos terem delineamento de coorte, transversal e prospectivo. Ademais, dois artigos (8,69) têm nível de evidência C por serem do tipo relato de caso. A maioria dos artigos apresenta-se com uma evidência moderada de recomendação (B) e a minoria representa uma baixa recomendação (C).
Análise dos desfechos e categorização dos estudos
A referência utilizada para a categorização dos desfechos da eficácia de ACP e DA para o cuidado do paciente crítico de UTI encontrados nas evidências científicas desse estudo foi o estudo de Detering e Silveira (2018). A figura 2 apresenta os possíveis desfechos específicos de DA e ACP.
A maioria dos desfechos relatados por Detering e Silveira (2018) foram encontrados nos resultados dos estudos incluídos nessa pesquisa. A Tabela 1 apresenta o tipo de desfecho, a quantidade dos estudos com o respectivo desfecho e a frequência do desfecho dos estudos incluídos nessa revisão.
Discussão
Esse estudo encontrou e integrou os desfechos estudados na literatura científica atual de ACP e DA em pacientes críticos de UTI. Além disso, mostrou que os desfechos menos pesquisados na literatura do paciente crítico de UTI estão relacionados com a escolha e preferência do local da morte, satisfação com a qualidade do cuidado, preparação da família para a morte, ansiedade e custo dos cuidados em final da vida.
Alguns desfechos identificados nesse estudo corroboram com Detering e Silveira (2018): taxas mais altas de conclusão de DA; recebimento de tratamentos menos intensivos no final da vida; tomada de decisão compartilhada; melhora na comunicação entre o paciente, a família e os médicos; maior probabilidade de que médicos e familiares compreendam e cumpram os desejos do paciente; menor risco de depressão em parentes sobreviventes de pessoas falecidas; redução da hospitalização no fim da vida e aumento do uso de cuidados paliativos.
Percebe-se através dos dados supracitados alguns fatores agravantes para a expansão de ACP e DA no Brasil: 1) Falta de legislação que regulamente sobre DA; 2) Déficit de educação em saúde para a população; 3) Cultura paternalista de cuidado; 4) Influência do modelo tradicional biomédico, onde era dado ao médico o poder de decisão; 5) Não existência de implementação de ACP como rotina no cuidado centrado no paciente na maioria dos hospitais; e 6) Pouca ou quase nenhuma divulgação de DA e ACP.
Um fator agravante é que o principal argumento utilizado pelos poucos profissionais de saúde brasileiros que conhecem o tema, está direcionado para a falta de legislação específicos regulamentadora da prática de DA. Contudo, esse estudo mostrou que ACP é o foco do cuidado centrado no paciente, sendo, portanto, DA uma opção final da ACP. Já para implementação de ACP não se pode usar tal argumento, uma vez que ACP é prática assistencial sem necessidade de legislação. A implementação de ACP e DA para a assistência do paciente crítico em UTI no âmbito assistencial no Brasil implicaria em enxergar a pessoa que possui uma doença ameaçadora de vida como um ser total, protagonista do seu cuidado, dotado de suas próprias crenças, desejos, valores, sentimentos, pensamentos, sensações, dores e fantasias.
Considerações Finais
Este trabalho buscou fazer uma revisão integrativa acerca de ACP e DA. Os resultados principais apresentados neste trabalho demonstram que os desfechos mais frequentemente evidenciados melhoram o tratamento do paciente crítico de UTI ao proporcionar qualidade de vida, medidas de conforto em pacientes sem perspectiva curativa e limitação do uso de medidas invasivas provocadoras de intenso sofrimento. Tal aspecto considerado inovador apresenta as principais evidências científicas que abordam os desfechos de ACP e DA em UTI. Com base nisso, apresentou-se os desfechos mais atuais encontrados na literatura e em paralelo a isso, os desfechos menos estudados.
Essa pesquisa consiste em um trabalho com foco interdisciplinar. Isso abrange diferentes perspectivas e não somente valores específicos de uma categoria profissional, pois o paciente é o foco central e requer múltiplos profissionais envolvidos no seu cuidado. Considerando que não se conhecem, até o momento, estudos brasileiros sobre ACP e DA em UTI, essa pesquisa por meio da revisão sistemática integrativa foi a estratégia mais recomendada neste momento da produção nacional acerca da temática.
Uma limitação da pesquisa, foi a não inclusão do idioma espanhol na coleta de dados. Além disso, os estudos compostos na revisão integrativa foram em sua maioria do tipo observacional. As evidências científicas não forneceram dados para identificar a influência de ACP e DA no controle da dor, importante aspecto da qualidade de vida em pacientes críticos. Também não conseguiu avaliar a eficácia dos desfechos, apenas apresentá-los e descrevê-los.
Como sugestão para estudos futuros, aponta-se a necessidade de uma avaliação profunda do impacto de ACP e DA nos aspectos de limitação e suspensão do suporte de manutenção de vida, tais como ressuscitação, uso de drogas vasoativas, ventilação mecânica e intubação, bem como os valores da população brasileira quanto à ACP e DA, explicitamente valores relacionados aos conteúdos de ordem de não reanimar, escolha do substituto e procedimentos de intubação e cuidados paliativos.
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Cibele Dayana de Souza Werneck Leite - Psicóloga e administradora do Centro de Referência em Psicologia: Inside Out. Mestranda em Psicologia (Programa Clínica e Cultura da UNB). Possui residência pelo programa multiprofissional em Rede: Terapia Intensiva - Escola Superior em Ciências da Saúde (ESCS)/ Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF).
Cibelle Antunes Fernandes - Psicóloga Assistente da UTI Adulto do Hospital de Base do Distrito Federal/IGESDF. Coordenadora do Programa de Residência Multiprofissional em Rede: Terapia Intensiva - Escola Superior em Ciências da Saúde (ESCS)/ Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES/DF). Docente do Curso de Psicologia do UNICEUB.