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Revista Mal Estar e Subjetividade
versão impressa ISSN 1518-6148
Rev. Mal-Estar Subj. vol.9 no.3 Fortaleza set. 2009
AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS
A formulação do objeto a a partir da teorização lacaniana acerca da angústia
Daniela Teixeira Dutra ViolaI; Ângela Maria Resende VorcaroII
IPsicanalista, psicóloga graduada pela UFMG, especialista em Teoria Psicanalítica e mestranda em Psicologia na área de concentração Estudos Psicanalíticos pela UFMG. End.: R. Peru, nº 111, apto. 04, bairro Sion, Belo Horizonte, MG. Cep. 30320-040. E-mail: daniela.dutraviola@gmail.com
IIProfessora adjunta do departamento de psicologia UFMG. Graduada em psicologia pela PUC (MG), é mestre e doutora em Psicologia pela PUC (SP). É também membro do corpo editorial da revista Estilo da clínica (USP). End.: R. Paul Bouthilier, nº 353, bairro Mangabeiras, Belo Horizonte, MG. Cep: 30315-010. E-mail: angelavorcaro@uol.com.br
RESUMO
O presente artigo examina um recorte do percurso teórico de Lacan sobre o afeto da angústia. Nas obras analisadas, Lacan examina as principais hipóteses freudianas a respeito do surgimento da angústia e sua relação com um objeto, buscando esclarecer as lacunas e os impasses deixados por essas hipóteses. Essa releitura é de grande importância, visto que é a partir dela que Lacan constrói sua própria teoria acerca da angústia, teoria que se mostra essencial para a abordagem de questões de grande importância na psicanálise, como o problema do desejo e da constituição do sujeito. No entanto, é na formulação do conceito de objeto a que essa teorização demonstra ser o ponto nodal. Em vista disso, propõe-se a evidenciar elementos dessa teorização que permitam compreender como ela abre caminho para a concepção de objeto a e para toda a revisão que se dá sobre o estatuto do objeto. Para tanto, recorre-se a dois momentos da obra de Lacan - o seminário oito, A transferência (1960-1961), e o seminário 10, A angústia (1962-1963). Do seminário oito, é apresentado um capítulo que trata da relação da angústia com o desejo. No seminário 10, por sua vez, investiga-se os caminhos que o autor percorre para extrair o conceito singular de objeto a e para formular o estatuto desse objeto, estatuto que o estabelece como um conceito de fundamental importância para a práxis psicanalítica de orientação lacaniana.
Palavras-chave: psicanálise, angústia, objeto a, sujeito, desejo.
ABSTRACT
The present article examines a cutting of the theoretical course of Lacan on the affection of the anguish. In the analyzed works, Lacan examines the main Freudian hypotheses regarding the appearance of the anguish and its relationship with an object, searching to explain the gaps and the deadlocks left by those hypotheses. That rereading is of great importance, because it is starting from it that Lacan builds his own theory concerning the anguish, theory that is shown essential for the approach of subjects of great importance in the psychoanalysis, like the problem of the desire and the constitution of the subject. However, it is in the formulation of the concept of object a that this theorization demonstrates to be the nodal point. In view of that, we intend to evidence elements of that theorization that allow to understand how it clears the path for the conception of the object a and for the whole revision about the statute of the object. For that, we fall back on two moments of Lacan's work - the seminar eight, The transference (1960 - 1961), and the seminar 10, The anguish (1962 -1963). From the seminar eight, it is presented a chapter that bears on the relationship of the anguish and the desire. In the seminar 10, in its turn, we investigate the ways that the author goes through to extract the singular concept of object a and to formulate the statute of that object, statute that establishes it as a concept of fundamental importance for the psychoanalytic praxis of Lacanian orientation.
Keywords: psychoanalysis, anguish, object a, subject, desire.
Lacan e a radicalização da perspectiva freudiana de objeto1
O presente artigo visa demonstrar como a teoria lacaniana em torno da angústia, fundamentada na elaboração de Freud sobre esse afeto2, possibilita a introdução da noção singular de objeto a. Para tanto, recorremos a recortes estratégicos do ensino de Lacan retirados do seminário 10 - A angústia ( 1962-1963) - que é o principal trabalho desse autor sobre o assunto e que formaliza a noção de objeto a.
O movimento conceitual exposto no seminário 10 não se dá por uma via simples e linear, mas por diversos caminhos enviesados. É importante lembrar que tal seminário é ainda caracterizado pelo retorno de Lacan a Freud, cuja marca é a releitura exegética da obra freudiana. Disso decorre a exploração dos diversos caminhos para se enveredar por essa obra. Em virtude dessas peculiaridades e da dimensão da obra lacaniana, a presente investigação não se baseia em uma leitura necessariamente cronológica desse trabalho, mas em uma seleção de pontos cruciais em que a teorização sobre a angústia e o objeto se desdobra. A partir da focalização e da análise desses pontos, é possível localizar as amarrações conceituais que garantem um lugar nodal para a angústia na fundamentação do estatuto do objeto.
A teorização que é construída nesse contexto configura uma linha de pesquisa norteada pela trajetória freudiana sobre a angústia, na medida em que Lacan parte de impasses ou lacunas deixados por Freud. Contudo, o resultado da retomada lacaniana da obra de Freud vai muito além de um esclarecimento de pontos obscuros. No decorrer desse eixo teórico, nota-se que a pesquisa de Lacan o conduz a uma questão de extrema importância para a práxis psicanalítica: o que a pesquisa sobre a angústia desvela é a condição de vazio do objeto que causa o desejo do sujeito e que é o objeto da angústia.
Desde suas primeiras formulações a respeito da formação do aparelho psíquico em trabalhos como Projeto para uma psicologia científica (1895/1996b), A interpretação dos sonhos (1900/1996c) e Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1905/1996d), podemos ler na obra de Freud um objeto impossível para o desejo. De acordo com ele, o neonato experimenta a satisfação de suas necessidades mediante o auxílio alheio. Essa primeira vivência de prazer jamais será reencontrada em sua integralidade, já que a busca dos objetos de satisfação faz o bebê alucinar esses objetos sem que sobrevenha a satisfação. O objeto não está mais no seio, nem na mãe, nem no leite. Também não está nos lábios do bebê. A partir da releitura lacaniana da obra de Freud, é possível compreender que esta saída de cena do objeto é responsável pela fundação do desejo, que passa a conduzir o sujeito incessantemente à tentativa de alcançar o objeto para sempre perdido e a tão almejada satisfação. Na ausência desse objeto, a satisfação do desejo é impossível, e é essa impossibilidade que garante a persistência do movimento do desejo, fundamento da existência humana.
Essa concepção freudiana de objeto do desejo não é unívoca. Percebe-se, desde os primeiros embasamentos teóricos da psicanálise, duas possibilidades de leitura dessa noção de objeto. Em uma delas, notamos que Freud confere certa materialidade a esse primeiro objeto, como se ele realmente tivesse existido naquela primeira experiência de satisfação. Nesse sentido, podemos pensar em termos de um objeto perdido para o desejo do sujeito.
Já em uma leitura mais sutil na obra de Freud, tal como nos apresenta Lacan, podemos conceber essa primeira experiência de satisfação como mítica. Isto é, como uma situação que nunca existiu, mas que é postulada por esse autor como uma construção teórica necessária para alicerçar sua hipótese acerca do desejo. Nessa concepção, o objeto deve ser considerado como inexistente. Ele jamais existiu, mas foi estabelecido na experiência de satisfação retroativamente. Trata-se de um nada, de um vazio ou ponto de fuga ao qual o desejo se dirige. Daí a infinidade de objetos empíricos que se prestam a substituir esse lugar vazio, em uma busca vã e inesgotável, na saga pessoal de cada sujeito desejante. Os objetos mundanos, portanto, são tomados e reivindicados para suplantar o nada que é o objeto do desejo. Certamente, isso nunca acontece, o que se traduz na perene insatisfação do neurótico, sempre guiado por uma lista de objetos que perdem seu valor de objeto-eleito assim que são conquistados. Quando isso acontece, tão logo o sujeito se recupera da decepção momentânea, ele reedita sua lista e segue em frente, infatigável.
Essa perspectiva não é totalmente elaborada por Freud, mas é passível de ser lida em sua obra a partir da perspectiva lacaniana. A lógica da pesquisa freudiana dá bases consistentes para que se possa compreender a relação do desejo com a metonímia do objeto nesses termos. E é Lacan quem leva essa teorização a suas últimas consequências, com a demarcação do campo do desejo e com a noção de objeto a. Essa trajetória teórica lacaniana se desdobra ao longo de todo o seu ensino. Ainda assim, é possível estabelecer um recorte com os momentos cruciais nesse caminho, o que será feito neste trabalho a partir da abordagem da angústia. Dessa maneira, a retomada lacaniana da teoria da angústia possibilita o aprimoramento e a radicalização dessa perspectiva que dessubstancializa o objeto, que o depura a ponto de perder seu estatuto ontológico, permitindo ao autor extrair dessa problemática a noção fundamental que é o objeto a.
Angústia: tradução subjetiva do objeto a3
O seminário 10 de Lacan, intitulado A angústia, corresponde ao curso ofertado por ele de novembro de 1962 a julho de 1963. Trata-se de um conjunto denso e eloquente de aulas que apresentam diversas questões essenciais no ensino lacaniano. Em vista da dimensão e da complexidade de seu conteúdo, traçaremos um caminho que visa seguir os passos fundamentais do autor para a formulação da noção de objeto a da intrincada trama que sustenta a teoria da angústia.
Lacan deixa claro, desde o princípio, que garante um lugar de grande importância ao problema da angústia para a psicanálise como um todo. Paralelamente a essa tomada de posição, ele indica que a abordagem da angústia naquele momento de seu ensino não é uma simples opção. Ela tem uma função, palavra tão repetida no decorrer das aulas a propósito da angústia. Qual seria a função da angústia? Está claro que ele parte do ponto em que culminou a reflexão de Freud sobre esse tema - a angústia como sinal no eu de um perigo interno. Mas também está claro que Lacan não se acomoda com essa ideia, que será amplamente debatida e aprimorada por ele. De que se trata esse sinal? Em que consiste um perigo interno? E esse perigo ameaça mesmo o eu ou será o sujeito? Estas e muitas outras questões vão irrompendo ao longo do seminário. E a função dessa consistente e ampla abordagem da angústia fica evidente: é somente pela via da angústia que Lacan pode, nesse momento, conceber a noção de objeto a.
Essa relação de dependência é explicada da seguinte forma: a angústia é a única tradução subjetiva do a. O que isso quer dizer? Para compreender essa conexão necessária entre essas duas noções tão caras à psicanálise, é preciso localizar, nessa obra, pontos que expõem a construção dessa relação de interdependência. Essa localização será buscada neste tópico através de dois eixos principais de leitura: um deles segue os desdobramentos da elaboração em torno da angústia e do desejo; o outro examina a introdução e a definição do objeto a a partir da constituição subjetiva. Esses dois eixos estão entrelaçados no decorrer de todo o seminário e confluem precisamente no estabelecimento da relação entre a angústia e o objeto a.
Lacan já se enveredou pelo caminho da relação entre a angústia e o desejo no seminário oito (A transferência, 1960-1961/ 1992) e, com isso, estabeleceu pontos importantes a serem avançados. Naquele contexto, ele propôs que a angústia sinaliza o modo mais radical de sustentação do desejo (Lacan, idem). Já no seminário 10, ele nos lembra que o desejo "é o fundo essencial, o objetivo, a meta e também a prática de tudo que se anuncia (...) neste ensino, acerca da mensagem freudiana" (Lacan, 1963/ 2005, p.236). Se a angústia denuncia um ponto radical em que o desejo se sustenta, é preciso ir adiante nessa linha investigativa para se chegar às relações estruturais que garantem tal sustentação.
Assim, o autor introduz a questão da angústia no seminário 10 por meio de sua reflexão sobre o desejo. O centro dessa reflexão está na formulação que ele considera ser a chave do que a doutrina freudiana introduz sobre a subjetividade: o que quer o Outro de mim? Essa pergunta concerne diretamente ao eu, pois é do lugar do eu que o Outro é questionado. (Idem, p.14). Esse psicanalista adianta que a função da angústia se introduz no jogo dialético que ata estreitamente duas etapas separadas pelo ponto em que essa pergunta se instala no circuito do desejo. Trata-se, de um lado, do problema da relação com o desejo e, de outro, da questão da identificação imaginária. (Idem, p.15). A angústia possibilita a orientação nesse jogo, porque ela está ligada ao desejo do Outro. O surgimento do afeto da angústia está atrelado ao momento em que o sujeito se vê diante do desejo do Outro, alienado nesse desejo. E esta é a primeira proposição acerca da angústia que constatamos nesse seminário: esse afeto é o índice ou signo do desejo do Outro.
De maneira ainda mais explícita, Lacan afirma que a angústia é uma manifestação específica do desejo do Outro. (Lacan, 1963/2005, p.169). E essa definição traz implicações importantes para se compreender a angústia no enfoque lacaniano. Lembremos que, para Freud, o surgimento da angústia sinaliza para o eu um perigo proveniente de outro lugar - perigo que Freud qualifica como interno e que podemos conceber como relativo ao campo pulsional. Na perspectiva lacaniana, a noção de interior e exterior não se aplica ao aparelho psíquico. Lacan sustenta que há uma superfície contínua, tal como a banda de Moebius. Explicando essa superfície em termos usados por Freud em sua primeira Tópica, Lacan propõe que nessa superfície única o Outro corresponde a uma outra dimensão, interpondo-se entre a percepção e a consciência. Dessa forma, compreende-se que o sinal de angústia que irrompe no eu não denuncia um perigo interno, mas sim algo que se passa na dimensão do Outro. Trata-se de um sinal que se produz no eu, mas que se destina a advertir o sujeito sobre um desejo. Quanto a isso, o autor explica:
O que representa o desejo do Outro como sobrevindo por essa vertente? É aí que o sinal adquire seu valor. Se ele se produz num lugar que podemos chamar topologicamente de eu, realmente diz respeito a algum outro. Se o eu é o lugar do sinal, não é para o eu que o sinal é dado. Isso é bastante evidente. Se isso acende no nível do eu, é para que o sujeito seja avisado de alguma coisa, a saber, de um desejo, isto é, de uma demanda que não concerne a necessidade alguma, que não concerne a outra coisa senão meu próprio ser, isto é, que me questiona. Digamos que ele me anula. Em princípio, não se dirige a mim como presente, dirige-se a mim, se vocês quiserem, como esperado, e, muito mais ainda, como perdido. Ele solicita minha perda, para que o Outro se encontre aí. Isso é que é a angústia. (Lacan, 1963/2005, p.169).
Lacan concebe o Outro como inconsciência constituída (Lacan, 1962/2005, p. 33), como correspondente ao desejo na medida do que falta ao sujeito e do que ele não sabe. E é nesse nível que o sujeito é implicado: na total inconsciência a respeito de seu desejo e na inexistência de uma sustentação possível desse desejo que tenha referência a um objeto qualquer. (Idem, p. 15-16). Esse Outro é o lugar do significante, e é nele que o sujeito encontra um traço único, marca distintiva a partir da qual o sujeito vai se constituir em sua subjetividade. A análise da constituição do sujeito diante do Outro conduz à introdução da concepção de objeto a. A dedução desse objeto não é apresentada de maneira simples no seminário. Ela é retomada em diversos pontos do curso, em um movimento teórico que estabelece o estatuto do a e sua relação com a angústia.
O objeto a é apresentado na elaboração em que Lacan coteja sua concepção de desejo com aquela de Hegel. Na perspectiva hegeliana, o desejo do homem é desejo de desejo na medida em que é desejo de reconhecimento por parte do Outro. Esse Outro é, para Hegel (apud Lacan, 1962/2005), aquele que vê o sujeito. Diferentemente da ideia lacaniana de Outro como inconsciência, o Outro da teoria hegeliana do desejo é tomado como consciência. E o sujeito é reconhecido por esse Outro apenas como objeto4. Lacan, por sua vez, propõe que o sujeito, ao se inscrever no campo do Outro, é marcado pelo significante, ficando dividido, clivado por uma inconsciência necessária. Nesse ato de clivagem, o contínuo movimento de seu desejo tem início. E dessa operação de divisão, correlata à entrada na linguagem, resta um resíduo. Algo que não entra no domínio do simbólico, que não é abarcado pelo condicionamento da linguagem. Essa parte do indivíduo anterior ao sujeito que fica de fora do simbólico é o objeto a5.
Lacan salienta o fato de que esse objeto aparece tanto em sua formulação a propósito do desejo como na de Hegel. No entanto, para este último, o sujeito, ao ser reconhecido pelo Outro, é objeto como consciência. No pensamento lacaniano, todavia, esse objeto a é concebido como essencialmente inapreensível pelo significante. Ele é o que resta de irredutível no advento do sujeito no lugar do Outro. A primeira inscrição do sujeito nesse lugar se deve a uma primeira interrogação. A resposta do Outro a essa interrogação nunca será plena, visto que o simbólico, o domínio da linguagem, não abarca todo o campo do real. Surge uma diferença entre a resposta do Outro e o dado real. Tal diferença é a irredutibilidade do sujeito e corresponde ao objeto a. Sobre esse objeto, o autor acrescenta que "na medida em que ele é a sobra, por assim dizer, da operação subjetiva, reconhecemos estruturalmente nesse resto, por analogia de cálculo, o objeto perdido. É com isso que lidamos, por um lado, no desejo, por outro, na angústia". (Lacan, 1963/2005, p.179).
A definição do objeto a como o que escapa ao sujeito que se constitui no simbólico demonstra a importância dos três registros - real, simbólico e imaginário - para a abordagem desse assunto. No seminário em questão, Lacan não discute diretamente as amarrações entre os registros, mas dá um primeiro passo nessa direção ao tecer minuciosamente o entrelaçamento entre o imaginário e o simbólico para alicerçar sua hipótese sobre o objeto a. Vejamos, então, como isso é feito e como a angústia vai ser compreendida como sinal do real.
Lacan ressalta que não se deve compreender a trajetória de seu ensino como um percurso que, por um período, privilegiou o campo do imaginário, abarcando todas as questões relativas à imagem especular e às identificações, e que, em seguida, sua investigação se direcionou inteiramente para o campo do significante. Ele afirma que está, na verdade, trançando o entrejogo entre os dois registros. (Idem, p.39). É nesse sentido que constatamos a interdependência entre o estádio do espelho e a introdução do Outro. O autor remete ao estádio do espelho o "fundamento de uma certa relação do homem com a imagem de seu corpo e com os diferentes objetos constitutivos desse corpo, com pedaços do corpo original, captados ou não no momento em que i(a) tem a oportunidade de se constituir". (Lacan, 1963/2005, p.132). A i(a) é a função da imagem especular. Antes do estádio do espelho, prevalece a desordem do corpo fragmentado, o caos "dos pequenos a que ainda não se cogita ter ou não ter" (idem), assevera Lacan. Esse caos é organizado no estádio do espelho com o advento da i(a), quando o bebê adquire uma primeira noção de eu através da imagem unificada de seu corpo. E é a organização obtida por essa função que possibilita a posterior constituição do sujeito.
Nesse momento, o bebê percebe também sua dependência de um outro que o segura diante do espelho. Esse outro - geralmente a mãe - representa nessa situação o grande Outro, toda a dimensão simbólica, visto que dá a garantia para a criança da sua imagem totalizada. Daí fazer toda a diferença esse pequeno gesto do bebê ao se virar para o adulto que o ampara, indagando ali a imagem que vê e recebendo uma espécie de ratificação dessa imagem. E é nesse ato compartilhado pelo bebê e pelo outro que o carrega que se abre toda a dimensão do Outro, todo o potencial simbólico daquela relação. A entrada efetiva no campo simbólico acontece quando essa criança se dirige ao Outro de forma interrogativa. Ela está marcada pelo traço unário, a marca distintiva a partir da qual uma trama de significantes vai se desdobrar.
Se Lacan visa localizar a origem da angústia e do objeto a em momentos constitutivos do psiquismo, essa investigação conduz inevitavelmente à evocação da hipótese freudiana acerca da angústia do nascimento. Em sua pesquisa sobre a angústia, Freud se inspira nas ideias de Rank e sugere ser o ato do nascimento uma espécie de experiência prototípica da angústia que será reevocada no transcurso da vida de um sujeito (Freud, 1926/1996a). Essa hipótese constitui um ponto de tensão na pesquisa desse autor, que não a aceita inteiramente e empreende uma tentativa de aprimorá-la no final de sua produção teórica, quando propõe que o trauma vivenciado no nascimento corresponde, na verdade, a uma perturbação econômica que é experimentada como um excesso libidinal (Freud, 1933/1996e). Fica assim estabelecida a relação entre a angústia e a libido na obra de Freud.
Lacan concorda com Freud ao afirmar que a angústia é um fenômeno de borda, um sinal que se produz no limite do eu, diante da ameaça de algo que não deve aparecer. Isso justifica a procura da origem da angústia em um estádio pré-especular e pré-autoerótico, como é o nascimento. Contudo, a investigação lacaniana se direciona para um ponto na constituição do eu como momento inaugural da angústia. Essa hipótese explica a concomitância da angústia nos fenômenos de despersonalização, quando o sujeito vacila ao não reconhecer sua própria imagem especular6. Para esse autor, a intuição freudiana sobre a conexão entre o nascimento e a angústia está correta, mas em uma vertente que reconhece nesse ato o valor do corte, da separação no sentido anatômico. Essa questão é essencial para a definição do status do objeto a em sua relação com um objeto separável do corpo, o que será abordado mais detidamente logo adiante.
Por ora, voltemos ao problema da origem da angústia. Como foi constatado, Freud conclui que a primeira experiência de angústia corresponde a um excesso libidinal impossível de ser simbolizado. Lacan demonstra que no estádio do espelho é engendrado um primeiro reconhecimento de nossa própria forma. A respeito desse reconhecimento, o autor acrescenta:
Esse reconhecimento, em si mesmo, é limitado, pois deixa escapar algo do investimento primitivo em nosso ser que é dado pelo fato de existirmos como corpo. Não será uma resposta, não apenas razoável, mas controlável, dizer que é esse resto, esse resíduo não imaginado do corpo, que, por um desvio que sabemos designar, vem manifestar-se no lugar previsto para a falta, e de um modo que, por não ser especular, torna-se impossível de situar? Com efeito, uma das dimensões da angústia é a falta de certos referenciais. (Lacan, 1962/2005, p.71).
É evidente a similaridade desse investimento primitivo à libido concebida por Freud. Em um outro momento do seminário, Lacan se refere a um "continente narcísico da libido" (Idem, p.98). Conforme o autor, a imagem do corpo próprio relaciona-se com esse continente libidinal por intermédio do espelho do Outro. O termo continente denota a característica fundamental da libido, que é ser extralinguística, pertencente a um outro registro. Se essa libido é reversível tal como assegura Freud7, há algo que intervém nessa oscilação. Trata-se do objeto a, e sua intervenção é sinalizada pela incidência da angústia, que é a manifestação mais flagrante desse objeto. Lacan esclarece que o objeto a só funciona em correlação com a angústia porque a angústia é um sinal relacionado ao que se passa na relação do sujeito com esse objeto. O sujeito só se relaciona com o a como um sujeito barrado, que vacila em sua relação com o objeto. A angústia é o sinal que denuncia a deflagração desses momentos de vacilação do sujeito.
É nesse sentido que a angústia é a tradução subjetiva do objeto a. Trata-se do afeto que acomete o sujeito nos momentos em que este está às voltas com esse objeto inapreensível, objeto que é intraduzível de outra maneira que não seja pela angústia. Se a angústia é sinal de um resto de real que sobra irredutível na constituição do sujeito, esse afeto pode ser compreendido também como sinal do real. Para compreender melhor esses momentos de vacilação do sujeito em sua relação com o a - momentos que configuram a irrupção do sinal de angústia e, portanto, da aproximação do real -, é preciso seguir a articulação que Lacan faz desse objeto com o campo da imagem.
Antes de designar o objeto cujo status Lacan formaliza nesse seu décimo seminário, o pequeno a já fazia parte do discurso lacaniano em relação à dimensão imaginária. Ele já era anunciado na fórmula da fantasia - $ ◊ a - como suporte do desejo. Focalizando, então, o a na cena da fantasia, nota-se que é o mesmo objeto que entra em jogo, como nos lembra o autor, no advento da função da imagem especular - i(a). Ambas as situações concernem, portanto, à dimensão da imagem, e é nesse caminho que essa investigação vai progredir.
Para avançar na problemática da imagem, é evocada uma antiga passagem da Interpretação dos sonhos (Freud, 1900/1996c) em que Freud introduz o inconsciente como "uma outra cena". Aludindo a Hamlet, Lacan relaciona essa "outra cena" com "a cena dentro da cena" que se passa no contexto da peça8. Ele conclui que o protagonista, ao representar no palco ele mesmo cometendo o assassinato do pai, tenta dar corpo a alguma coisa que passa por sua imagem especular, que é, afinal, sua imagem naquele palco. E isso diz respeito ao que se passa no plano identificatório. Lacan localiza uma identificação de Hamlet com Ofélia, aquela que se suicida "patentemente oferecida em sacrifício à alma do pai" (Lacan, 1962/2005, p.45) após seu assassinato. Esse processo identificatório é análogo à estrutura do luto, tal como é descrita por Freud em "Luto e melancolia" (Freud, 1917/1996g) e que se mostra como a identificação com um legado negativo do morto. Esse exame cuidadoso da identificação em Hamlet permite Lacan articular a função da imagem especular com a questão do objeto nos termos que se seguem:
Aqui podemos medir a distância que há entre dois tipos de identificações imaginárias. Existe a identificação com i(a), a imagem especular, tal como nos é dada por ocasião da cena dentro da cena, e existe a identificação mais misteriosa, cujo enigma começa a ser desenvolvido aí, com o objeto do desejo como tal, a, assim designado na articulação shakespeariana sem nenhuma ambiguidade, já que é justamente como objeto do desejo que Hamlet é negligenciado, até um certo momento, e reintegrado na cena por meio da identificação. (Lacan, 1962/2005, p.46).
O campo da imagem especular e o campo do Outro se atam na passagem da estruturação que ocorre a partir do estádio do espelho para a estruturação definitiva, aquela que institui o sujeito como clivado pelo significante. Lacan acentua que nem todo investimento libidinal passa pela imagem especular, pois há um resto, opaco ao espelho. Esse resto corresponde ao falo como falta. A imagem do falo aparece como uma lacuna para o sujeito, na medida em que o falo não é representado no nível do imaginário. Ele é cortado da imagem especular. (Idem, p.49). Como relacionar esse falo que falta na imagem, essa lacuna que o autor designa por menos phi, ao objeto a? O a é um resíduo do real, e, como tal, não deriva da imagem especular. Paradoxalmente, Lacan confessa que só pode imaginar esse objeto no registro especular. (Lacan, 1962/2005, p.50).
É a partir da identificação primária com um significante que as outras identificações se tornam possíveis, dentre elas aquela que garante ao sujeito o reconhecimento de sua imagem corporal. O desejo é fundado nesse tempo inaugural. Ele depende da entrada do sujeito na ordem da linguagem, sobretudo por causa da clivagem instituída por essa entrada que deixa o objeto a de fora. Como então alcançar esse objeto que escapou do registro simbólico? É aí que a função do imaginário demonstra todo o seu valor. Lacan nos lembra que a fantasia é precisamente o desvio imaginário que dá acesso, ainda que de forma artificial, à relação do sujeito com seu desejo. Ele reitera que tal acesso nunca é possível de maneira efetiva, porque o objeto a, suporte do desejo na fantasia, é invisível na imagem do desejo para o sujeito. Do lado do espelho, o lugar que corresponde ao a é uma lacuna, pois é o lugar vazio devido à ausência do falo. É nessa impossibilidade de representação especular que o falo e o a se correspondem. Eis aí a característica essencial do campo do imaginário que é a dimensão de engano. O autor acrescenta que "quanto mais o homem se aproxima, cerca e afaga o que acredita ser o objeto de seu desejo, mais é, na verdade, afastado, desviado dele. Tudo que ele faz nesse caminho para se aproximar disso dá sempre mais corpo ao que, no objeto desse desejo, representa a imagem especular". (Idem, p.51).
Todo esse desenvolvimento teórico permite compreender o que se passa nesse tempo inaugural do desejo, tanto no nível do imaginário quanto na relação com o grande Outro. Esse exame apresenta novos elementos que possibilitam elucidar o surgimento da angústia. Lacan postula que a angústia surge quando alguma coisa aparece no lugar do campo especular que corresponderia ao objeto a, caso esse objeto pudesse ser refletido. Esse lugar deveria estar vazio, posto que não existe imagem da falta. "Quando aparece algo ali, portanto, é porque, se assim posso me expressar, a falta vem a faltar" (Idem, p.52), indica o autor. Essa formulação traz consequências de grande importância para a teoria da angústia e do objeto, que serão analisadas no tópico que se segue.
A angústia na cena do Unheimlich
Nota-se que a elaboração lacaniana em torno da angústia vai sendo construída a partir de uma constante interlocução com a pesquisa de Freud. Os recortes dessa elaboração que foram focalizados no tópico anterior demonstram que essa interlocução tem como eixo a questão do objeto da angústia. É preciso ressaltar que toda a pesquisa freudiana sobre esse assunto persegue um objeto para esse afeto. Na verdade, Freud (1926/1996a) concebe o perigo da perda de certos objetos extremamente valiosos para o sujeito como a causa do surgimento da angústia. Se, para ele, a angústia surge nos momentos em que o sujeito se encontra na iminência da perda do objeto, Lacan enfatiza que não se trata da perda desse objeto, mas sim da possibilidade de que tal objeto não falte. Essa iminência da aparição de um certo objeto - cujo estatuto está sendo delineado nessa mesma teorização - é exemplificada por esse autor através da análise de um estudo singular na obra freudiana: aquele que descreve e examina o fenômeno do estranho. Portanto, neste tópico, propomos investigar aspectos do seminário 10 que privilegiam a experiência do estranho descrita por Freud em seu artigo sobre essa temática, O estranho (Freud, 1919/1996h), como aquela que evidencia a relação do surgimento da angústia com a presença do objeto a.
É possível afirmar que, de todos os trabalhos de Freud sobre o tema da angústia, o artigo "O estranho" é o que melhor delineia o problema central a respeito desse afeto. Nesse trabalho, as referências freudianas sobre a angústia são tensionadas ao limite, o que nos permite considerá-lo como uma dobradiça entre o conjunto de hipóteses chamado de "primeira teoria da angústia" e as hipóteses ulteriores, organizadas alguns anos depois em Inibição, sintomas e ansiedade (Freud, 1926/1996a). Para compreender melhor a especificidade da temática do estranho, é necessária uma breve digressão que assinala os principais aspectos desse artigo.
Talvez em nenhum outro trabalho Freud se detenha com tamanho afinco na descrição e análise de um estado afetivo como no artigo O estranho. Trata-se de uma obra sui generis no conjunto bibliográfico freudiano por conciliar, em uma mesma argumentação, uma rigorosa investigação etimológica, o exame de fragmentos literários e teatrais, episódios extraídos do tratamento de pacientes e, até mesmo, experiências pessoais. Tudo isso examinado à luz do suporte teórico psicanalítico, mas seguindo um viés que privilegia a questão estética.
O artigo O estranho é, sem dúvida, a grande obra sobre estética deixada por Freud. E se por estética esse autor entende como "a teoria das qualidades do sentir" (Freud, 1919/1996h, p.237), uma elaboração psicanalítica que trata de um fenômeno estético deve ter como eixo central a questão afetiva. É o que acontece nesse trabalho de 1919. Mas essa investigação não aborda um afeto qualquer. O autor elege o tema do estranho - mais precisamente, o termo alemão Unheimlich, de difícil tradução para o português. De acordo com ele, ocasionalmente um psicanalista se interessa por algum aspecto da estética, e o estranho revela-se um campo bastante remoto e negligenciado na literatura especializada, que prefere o que é belo, atraente e sublime. (Idem).
É possível ler essa explicação do interesse de Freud pelo assunto de outra maneira. Ao destacar o estranho como uma categoria marginal da estética e, de certa forma, opositora aos tradicionais termos estéticos ligados ao sublime, o autor parece justamente estabelecer o ponto de tangência da psicanálise com esse campo filosófico, porque a psicanálise busca se imiscuir precisamente nesse "outro lado", nesse "por trás". O que ele vai decifrar ao longo desse trabalho é esse lugar do estranho, o "outro lado" do sublime. E toda essa análise traz consequências essenciais para a teoria da angústia, ponto que interesse ao presente estudo.
Freud chega a confessar que foi impelido a pesquisar o estranho (Idem, p.237). Cabe a pergunta: impelido por quê? É preciso ressaltar o fato de tal discussão vir à tona precisamente nesse momento, quando esse psicanalista está prestes a direcionar a guinada epistemológica mais contundente de toda a sua produção teórica. Sabe-se que a obra Além do princípio de prazer (1920/1996i) já está concluída nesse período, dado que é informado ao leitor (p.255). Em vista disso, é válido concluir que o que impele a pesquisa sobre o estranho está relacionado à tese central defendida em Além do princípio de prazer: a nova hipótese sobre a pulsão, que propõe o dualismo pulsional constituído pela oposição entre as pulsões de vida e a pulsão de morte. E a noção de pulsão de morte é aquela que introduz na psicanálise todo um vasto campo do arcaico, do primitivo, do além e do aquém do princípio de prazer, até então apenas superficialmente abordado. Considerando essa nova noção como um fator determinante fundamental para o estudo sobre o estranho, pode-se presumir, de início, que se trata de um afeto ligado ao que há de mais primitivo no psiquismo.
Contando com essa ligação ao arcaico, Freud não se convence da definição corrente do estranho como aquilo que se relaciona ao que assusta, ao que provoca medo e horror, e propõe uma outra que procurará demonstrar no decorrer do artigo: "o estranho é aquela categoria do assustador que remete ao que é conhecido, de velho, e há muito familiar".(Idem, p.238). Para justificá-la, ele segue rumo às raízes da palavra unheimlich. Os significados, a etimologia e as traduções dessa palavra ocupam uma parte importante do trabalho, pois há uma ambiguidade nesse termo que é fundamental para se compreender o sentido do afeto que ele designa. Percorrendo cuidadosamente os dicionários, o autor descobre que a palavra heimlich - que quer dizer íntimo, familiar, confortável, amigável, domesticado - abarca também um sentido inesperado, porque, de tão íntimo, de tão "de casa", heimlich torna-se secreto, desconhecido, escondido, e vai ao encontro do seu antônimo, Unheimlich. Dessa maneira, é de grande valor a definição que Freud encontra deixada por Schelling: "Unheimlich é o nome de tudo que deveria ter permanecido... secreto e oculto, mas veio à luz9". (Apud. Freud, 1919/1996h, p.242).
Unheimlich, portanto, carrega um sentido ambivalente na medida em que é, ao mesmo tempo, o oposto de heimlich e um de seus significados. Freud é perspicaz ao perceber essa nuance semântica, e essa descoberta é o primeiro passo no caminho que ele traça para decifrar o estranho. O passo seguinte é a análise de uma obra literária capaz de despertar inequívoco sentimento de estranheza. Trata-se do conto O homem da areia, de E. T. A. Hoffman, cuja síntese é narrada no artigo. Não entraremos aqui nos detalhes dessa análise e vamos diretamente aos elementos que permeiam o campo do estranho, extraídos por Freud do conto, e que interessam particularmente à discussão sobre a angústia. O principal desses elementos é a figura do homem da areia que arranca os olhos das crianças. Esse homem é temido por Nataniel, personagem principal da trama e que tem sua história marcada por acontecimentos estranhos, nos quais o homem da areia ou um seu substituto aparece e causa angústia. E essa angústia está ligada ao medo de perder os olhos, medo que Freud relaciona ao complexo de castração.
Segundo Freud, o complexo de castração está nas raízes dos ícones do estranho apresentados em O homem da areia. Hoffmann é habilidoso ao desfilar esses ícones. A trajetória de Nataniel é pautada por uma sucessão de incidentes que refletem a situação da iminência de uma perda: do menino que teme pelos olhos, passando pela morte do pai, pela destruição da boneca desejada, pela separação da mulher amada e chegando ao momento do clímax do conto, em que ele se joga para a morte, a história repete continuamente a situação extremamente angustiante que é a possibilidade da perda de um objeto valioso. Na perspectiva freudiana, essa angústia tem origem, necessariamente, no medo da castração. Sobre a angústia da perda dos olhos, o autor afirma:
No decorrer do presente estudo, retornaremos ao problema dessa sucessão de perdas na história de um sujeito, questão que é fundamental para a discussão sobre o objeto da angústia. Essa sequência de repetidas situações de perda é estranha não apenas em decorrência da angústia que uma possibilidade de perda incita, mas também por causa da própria repetição. Freud nota que a repetição de um evento por improváveis vezes é geralmente sentida como estranha. Ele dá uma ênfase especial a esse aspecto, sobretudo por se tratar de um tema de grande importância na pesquisa que já foi apontada como aquela que perpassa os bastidores do artigo em questão. A ideia de compulsão à repetição é desenvolvida e analisada no livro Além do princípio de prazer, o que explica a sensibilidade do autor para ressaltar e compreender esse elemento na estrutura de um conto literário. O homem da areia aparece repetidas vezes, ainda que revestido por outros personagens e esse retorno não apenas é angustiante para Nataniel, como também garante o sentimento de estranheza por parte do leitor.
Como explicar o efeito de estranho resultante da repetição? Freud demonstra que os diversos exemplos de situações capazes de culminar no sentimento de estranho têm em comum um processo de retorno de algo que há muito tempo foi superado. Algo primitivo, relativo aos primeiros estádios da vida mental. Daí a definição do estranho como aquilo que é essencialmente íntimo, ainda que remoto e desconhecido. O fenômeno da repetição, presente tanto na ficção analisada quanto em situações reais, diz respeito a esse retorno de um indício do que o psiquismo já foi. O exemplo máximo desse retorno é o tema do duplo, que o autor examina cuidadosamente.
Freud lembra que para os povos primitivos o duplo era uma segurança contra a destruição do eu, uma espécie de denegação da morte. Com a evolução da cultura, essa forma de pensamento, bem como boa parte das superstições e crenças na magia, foram superadas. Tudo isso faz parte de uma pré-história da cultura, que o autor compara à pré-história individual do sujeito, constituída pelas primeiras experiências do bebê, há muito esquecidas. Tal analogia fica explícita no trecho que se segue:
Essa invenção do duplicar como defesa contra a extinção tem sua contraparte na linguagem dos sonhos, que gosta de representar a castração pela duplicação ou multiplicação de um símbolo genital. O mesmo desejo levou os antigos egípcios a desenvolverem a arte de fazer imagens do morto em materiais duradouros. Tais ideias, no entanto, brotaram do solo do amor-próprio ilimitado, do narcisismo primário que domina a mente da criança e do homem primitivo. Entretanto, quando essa etapa está superada, o 'duplo' inverte seu aspecto. Depois de haver sido uma garantia da imortalidade, transforma-se em estranho anunciador da morte. (Freud, 1919/1996h, p.252).
Essa passagem é muito importante para percebermos como Freud articula todos esses índices do estranho e constrói o raciocínio que o permitirá, ao mesmo tempo, esclarecer esse afeto e dar um grande passo na teoria psicanalítica da angústia. Nota-se que o duplo configura uma cena emblemática do retorno de algo primitivo. Essa cena angustia por remeter o sujeito a esse período primitivo, estádio em que ainda não há um sujeito propriamente distinto do mundo exterior, predomínio do narcisismo primário em que o risco de desamparo domina a vida mental. Dessa maneira, pode-se compreender o estranho como aquilo que alude ao desamparo. Essa conclusão é de extrema importância na compreensão da angústia. Ainda que não possamos tomar como totalmente correlatos esses dois afetos - o estranho e a angústia - estão muito próximos na acepção freudiana, tanto em suas características quanto em seus mecanismos de surgimento. Embora muitos fatores desse trabalho evidenciem essa proximidade, Freud não deixa claro em que medida se dá essa similaridade. E essa imprecisão decorre, a meu ver, dos impasses ainda presentes na teorização sobre a angústia. Na verdade, esse artigo tensiona ao máximo as brechas dessa teorização, o que se torna evidente na tentativa que Freud faz de aplicar a teoria vigente sobre a angústia à explicação do estranho, parte considerada por ele como a essência desse seu estudo e que transcrevemos a seguir:
Se a teoria psicanalítica está certa ao sustentar que todo afeto pertencente a um impulso emocional, qualquer que seja a sua espécie, transforma-se, se reprimido, em ansiedade, então, entre os exemplos de coisas assustadoras, deve haver uma categoria em que o elemento que amedronta pode mostrar-se ser algo reprimido que retorna. Essa categoria de coisas assustadoras construiria então o estranho; e deve ser indiferente à questão de saber se o que é estranho era, em si, originalmente assustador ou se trazia algum outro afeto. (...) Se é essa, na verdade, a natureza secreta do estranho, pode-se compreender por que o uso linguístico estendeu das Heimlich (...) para o seu oposto, das Unheimlich (...); pois esse estranho não é nada novo ou alheio, porém algo que é familiar e há muito estabelecido na mente, e que somente se alienou desta através do processo da repressão. (Freud, 1919/1996h, p.258).
É possível compreender, a partir dessa argumentação, que o estranho, para Freud, seria uma forma mais específica de angústia. Mas para delinear essa diferenciação, esse autor chega bem perto de questões que vão se mostrar decisivas no grande trabalho sobre a angústia que ainda está por vir em sua obra, Inibição, sintomas e ansiedade, de 1926. Tal trabalho vai demonstrar a ineficiência dessa teoria que explica a angústia como um produto do recalque. No artigo sobre o estranho, no entanto, ele ainda tenta usar essa teoria para entender esse fenômeno, mas essa tentativa só contribui para escancarar a presença de uma imprecisão teórica. O estranho, afinal, não surge a partir do afeto liberado no recalque, tal como sugere a teoria vigente até então. Conforme Freud, no processo de recalque, a representação fica submetida a esse mecanismo, sendo, então, impossibilitada de se tornar consciente. O afeto, por sua vez, não pode ser recalcado. Ele deixa de investir a representação e fica liberado, podendo sofrer diferentes vicissitudes. De acordo com a primeira teoria freudiana da angústia, o surgimento desse afeto é um dos destinos possíveis para o afeto liberado no recalque. No entanto, essa ideia se mostra frágil no decorrer da pesquisa de Freud, e a problemática do estranho é um ponto fundamental para o aprimoramento dessa teoria. O afeto do estranho provém de algo que é, obviamente, anterior ao recalque. Ele surge quando algo arcaico e primitivo é evocado em uma cena atual. A estranheza está, justamente, na familiaridade dessa evocação, que diz respeito a um descompasso entre o sujeito atual, que se vê às voltas com uma cena capaz de capturá-lo de volta a um tempo imemorial em que ele, como sujeito, nem existia.
Um outro aspecto, que só será mais desenvolvido posteriormente, é a ideia da angústia como sinal de perigo. Embora Freud não trate disso com todas as letras no momento focalizado, fica evidente a função do estranho como um afeto que sinaliza a presença de alguma coisa que o autor decifra como um elemento primitivo do psiquismo, exteriorizado em decorrência do recalque. A escolha do conto O homem da areia e da ameaça de perda dos olhos como exemplo do perigo que é apontado pelo afeto, já indica essa nova concepção da angústia e demonstra também a proximidade entre esses dois estados afetivos. Portanto, a partir desse momento, Freud não deixa apenas uma via aberta para a compreensão desses afetos. Como elementos desse estranho-familiar, ele indica o desamparo, a perda, a vida intrauterina, a morte, a castração, enfim, todo o campo da angústia. E se alguma coisa inerente a esse campo aparece, entra em cena, causando todo o processo afetivo, esse mecanismo também permite pensar o problema de um objeto que ressurge.
Lacan, por sua vez, entende que O estranho "é o eixo indispensável para abordar a questão da angústia". (Lacan, 1962/2005, p.51). De acordo com ele, a Unheimlichkeit, isto é, a inquietante estranheza, é desencadeada quando algo aparece no lugar em que deveria estar uma lacuna, um vazio proveniente da falta de imagem do falo. (Idem). E essa hipótese é de suma importância, na medida em que se contrapõe à questão tão cara a Freud da angústia frente à perda de objeto. O objeto da angústia, tão perseguido e questionado pela pesquisa freudiana, está ali bem diante dos olhos, no fenômeno do Unheimlich. E é mesmo disso que se trata: de algo diante dos olhos, esses órgãos que são também superfícies especulares. Quanto a isso, é necessário nos determos em uma passagem que articula de forma nodal a questão do desejo com o objeto a no campo da imagem, articulação que deve ser preliminar para uma melhor compreensão da problemática do estranho. Lacan esclarece:
Se o que mais existe de mim mesmo está do lado de fora, não tanto porque eu o tenha projetado, mas por ter sido cortado de mim, os caminhos que eu seguir para sua recuperação oferecerão uma variedade inteiramente diferente. Para dar à função do espelho, nessa dialética do reconhecimento, um sentido que não seja da ordem do passe de mágica, da escamoteação, da magia, convém fazer algumas observações, a primeira das quais, que não deve ser tomada no sentido idealista, é que o olho já é um espelho. O olho, eu chegaria a dizer, organiza o mundo como espaço. Reflete aquilo que é reflexo no espelho, mas, para o olho mais penetrante, é visível o reflexo que ele mesmo carrega do mundo, nesse olho que ele vê no espelho. (...). A partir do momento em que existem o olho e um espelho, produz-se um desdobramento infinito de imagens entrerefletidas. (Lacan, 1963/2005, p.246).
Onde está o objeto a nessa infinidade de imagens refletidas? Sabe-se que em parte alguma. Aí está a articulação mais essencial do desejo com o campo da imagem. A busca infindável que constitui o desejo depende da condição primordial da falta do objeto. O circuito do desejo se insere na dimensão da imagem partindo do princípio de que o objeto não está lá. Sequer a imagem desse objeto está nessa dimensão. É preciso salientar que essa discussão acerca do entrejogo de reflexos entre o olho e o espelho conduz Lacan à conclusão do "caráter radicalmente ilusório de todo desejo" (idem, p.249). No entanto, às vezes algo acontece nesse caminho do reencontro impossível com o objeto. O circuito do desejo fica perturbado por algo que irrompe. É nesse sentido que nos remetemos ao fenômeno do estranho. É preciso entender o que se passa nesse campo delimitado pelo jogo de espelhos, pois sabemos que é diante dos olhos que algo se passa, algo que momentaneamente produz um desvio súbito no circuito do desejo e que é evidenciado pelo acometimento do sujeito pela angústia.
Digamos que, por alguma razão, a imagem do objeto a apareça nesse entrejogo de espelhos que constitui o campo visual. Trata-se de uma cena, e o conteúdo dessa cena pode ser detalhadamente examinado por Freud em seu referido artigo: entra em cena alguma coisa que não deveria, alguma coisa que deveria ser inapreensível pelo olhar. O objeto a, como Lacan o está desvelando, não é da ordem do material. Não possui um estatuto ontológico. Na cena do Unheimlich - a mais genuína experiência de angústia - esse objeto ganha, paradoxalmente, certo estatuto ontológico. Ao se apresentar em uma cena diante dos olhos, ele ultrapassa uma barreira até então intransponível, posto que algo do real se insere na dimensão do imaginário. Dessa maneira, quando o sujeito se depara com o Unheimlich e é tomado pela angústia, ele é momentaneamente paralisado em seu movimento desejante. Não é mais do desejo que se trata, e sim do gozo. O estranho encena para o sujeito a face de gozo do seu desejo. E a angústia, deflagrada pela imagem impossível de um objeto avesso a qualquer imagem, é o afeto que denuncia essa borda derradeira entre o desejo e o gozo.
Passemos, então, a pontos do curso lacaniano que dão suporte a essa argumentação. No rastro do texto de Freud, Lacan destaca a preciosa análise linguística que estabelece Unheimlich como sinônimo de heimlich. Como indicam os diversos verbetes transcritos no artigo, heim diz respeito a um lugar íntimo, ao lar do sujeito, à casa do homem, nos termos de Lacan. "O homem encontra sua casa num ponto situado no Outro para além da imagem de que somos feitos" (Lacan, 1962/2005, p.58), declara o autor. Essa casa, heim, corresponde ao que é mais íntimo para o sujeito. Freud já havia demonstrado em seu estudo que esse heimlich, de tão íntimo, tornou-se secreto, obscuro, daí Unheimlich.
Lacan localiza o lugar heim na lacuna da falta de imagem especular do falo, designada por menos phi. Se esse heim, obscuro e invisível, de repente se revela como uma presença em outro lugar, ele se apodera da imagem que o sustenta e se transforma na imagem duplicada, o duplo. Os exemplos extraídos por Freud da literatura foram suficiente para estabelecer o duplo como fonte de radical estranheza. É o que ocorre no enredo do conto O homem de areia, em que o protagonista salta de uma imagem a outra, nos duplos que constituem essas imagens.
Embora a ficção literária seja o campo privilegiado para a inquietante estranheza se manifestar, ocorrem também, na chamada "vida real", situações plenamente capazes de provocar esse estado afetivo. Para Lacan, a vantagem da ficção se deve ao fato de que nela a situação do estranho é mais articulada e permanece no plano da fantasia. Na realidade, entretanto, uma experiência de Unheimlich costuma ser fugidia demais. (Lacan, 1962/2005). Ainda assim, o autor nos apresenta um exemplo do estranho em uma situação da vida real. Ele descreve como o estranho se apodera do sujeito que, ao se ver diante de um espelho, depara-se com a imagem do seu duplo. Ele afirma:
Mesmo na experiência do espelho, pode surgir um momento em que a imagem que acreditamos estar contida nele se modifique. Quando essa imagem especular que temos diante de nós, que é nossa altura, nosso rosto, nosso par de olhos, deixa surgir a dimensão de nosso próprio olhar, o valor da imagem começa a se modificar - sobretudo quando há um momento em que o olhar que aparece no espelho começa a não mais olhar para nós mesmos. Initium, aura, aurora de um sentimento de estranheza que é a porta aberta para a angústia. Essa passagem da imagem especular para o duplo que me escapa, eis o ponto em que acontece algo do qual a articulação que damos à função do a nos permite mostrar a generalidade, a presença em todo o campo fenomênico. (Lacan, 1963/2005, p.100).
Esse exemplo nos remete a outro, descrito por Freud em uma nota de rodapé de seu artigo sobre o estranho. Nós nos referimos à lembrança de uma experiência estranha vivida por ele mesmo ao enxergar sua imagem na porta de vidro em um trem e não se reconhecer nessa imagem por um breve instante. (Freud, 1919/1996h). Propomos que a estranheza experimentada por ele naquele momento pode ser compreendida a partir das balizas usadas por Lacan no exemplo acima.
Essa análise dos mecanismos do Unheimlich aprimora a primeira definição de angústia lançada nesse seminário. Não é somente do desejo do Outro que a angústia é sinal. A angústia emerge quando o sujeito é tomado como objeto do desejo do Outro. Quando ele perde sua subjetividade e vacila como sujeito, tal como se passa no fenômeno do duplo. Está aí o momento do Unheimlich, visto que o sujeito se identifica à imagem do objeto que é seu real irredutível, perdendo-se, então, como sujeito. Perdendo-se no labirinto de imagens duplicadas desse objeto que anulam a única imagem que ele reconhece.
No Unheimlich, a angústia denuncia o ponto-limite tangido pelo desejo, tão próximo do gozo. Nessa experiência, o sujeito fica à deriva, se perde no labirinto da imagem do objeto, que está escancarado, desvelado. É por isso que a fantasia é o que melhor serve ao neurótico para se defender contra a angústia. Nela, há uma tela em que o desejo é encenado na relação do sujeito com o a por meio de uma espécie de artifício. Na cena que figura o estranho, a tela subitamente desaparece. O que, na imagem, era uma falta, apresenta-se. Tudo isso dá suporte a uma resposta de Lacan à concepção freudiana de angústia, como constatamos a seguir:
Em Inibição, sintoma e angústia, Freud nos diz, ou parece dizer, que a angústia é a reação-sinal ante a perda de um objeto. (...) A angústia não é sinal de uma falta, mas de algo que devemos conceber num nível duplicado, por ser a falta de apoio dada pela falta. (...) Vocês não sabem que não é a nostalgia do seio materno que gera a angústia, mas a iminência dele? O que provoca a angústia é tudo aquilo que nos anuncia, que nos permite entrever que voltaremos ao colo. Não é, ao contrário do que se diz, o ritmo nem a alternância da presença-ausência da mãe. (...) A possibilidade da ausência, eis a segurança da presença. O que há de mais angustiante para a criança é, justamente, quando a relação com base na qual essa possibilidade se institui, pela falta que a transforma em desejo, é perturbada, e ela fica perturbada ao máximo quando não há possibilidade de falta. (Lacan, 1962/2005, p.64).
Como compreender essa falta da falta? Em uma situação em que a falta vem a faltar, o que se torna presente? Sabemos que é algo relativo ao objeto a, mas, se tal objeto é um vazio, se é desprovido de materialidade, como ele se apresenta? Um avanço na elucidação dessas questões é possível pela via do exame da cena da angústia. Desde o início dessa investigação, Lacan chama a atenção para a similaridade entre a estrutura da angústia e a estrutura da fantasia. Através da abordagem do estranho, tal similaridade se torna mais clara. Ambas são enquadradas, ou seja, ambas são delimitadas em uma cena que mostra um outro plano. A diferença é que a fantasia encena a natureza enganosa do desejo. Ela é o desvio, o artifício imaginário que permite o acesso a um quadro do desejo. Nesse quadro, o objeto a está representado por um objeto postiço, artificial, já que ele mesmo não é visível em uma imagem.
A cena da angústia, por sua vez, ao invés de encobrir o real, como na fantasia, ela escancara, desvela. Há um rasgo na tela que se abre para o real. Desse rasgo, salta algo para dentro da cena, algo que Lacan designa como o heim, o que já estava muito perto, o que é de casa, mas que é, ao mesmo tempo, desconhecido, velado. É nessa ambiguidade que consiste a estranheza do afeto que se instala, quando o sujeito reconhece algo como proveniente de sua mais radical intimidade, mas que, ao mesmo tempo, figura o horror do mais absolutamente outro. O autor conclui que "é o surgimento do heimlich no quadro que representa o fenômeno da angústia, e é por isso que constitui um erro dizer que a angústia é sem objeto". (Idem, p.87).
Essa definição da angústia como o corte no real de onde sai o inesperado produz, de imediato, implicações essenciais. Dentre elas, o autor enfatiza o caráter de verdade que ela evidencia, como aquilo que não engana. (Idem). Além disso, pode-se pensar na condição de tela tênue que separa o desejo do gozo e que é rompida na ocasião sinalizada pela angústia. Quanto a esse aspecto, é preciso ressaltar que Lacan equipara a lei e o desejo nesse seminário. O desejo constitui em seu circuito uma estrutura defensiva análoga à lei, na medida em que detém o sujeito no caminho do gozo. Dessa forma, o desejo é também uma defesa contra a angústia. A incidência desta denúncia que algo nessa defesa foi rompido. A angústia, então, sinaliza o limite do desejo, a borda que toca a dimensão do gozo, dimensão que extravasa a lei. Nesse sentido, o corte no real que desencadeia o sinal de angústia é também a fenda que revela, por um instante, o campo do gozo.
Essa função da angústia como função de corte mostra-se fundamental na concepção do objeto a. No tópico seguinte, constata-se como essa função participa da formulação do estatuto desse objeto.
Um novo estatuto para o objeto na psicanálise
A abordagem por Lacan da angústia no Seminário 10 viabiliza a definição do status do objeto em sua teoria. Nesse percurso, esse autor demonstra que a angústia é um fenômeno de borda que sinaliza o último limite anterior ao real e ao campo do gozo. Mais precisamente, a angústia acomete o sujeito quando algum acontecimento o remete ao mais íntimo de si mesmo, ocasionando um corte que se abre, momentaneamente, nesse momento de vacilação do sujeito, a um registro desprovido de simbolização. O objeto a é estabelecido como aquilo que escapa por esse corte, como algo do real que se apresenta em decorrência de alguma situação que podemos considerar traumática. Sabemos que o trauma tem relação com a fratura, com o corte. E é desse corte que se desprende o objeto a.
Neste tópico, que conclui o presente artigo, propomo-nos a salientar e discutir pontos da reflexão lacaniana que configuram o embasamento de um novo estatuto do objeto em sua teoria. As bases para essa nova concepção de objeto obviamente se estendem por todo o ensino desse psicanalista que precede o contexto focalizado nesta pesquisa. Entretanto, é no seminário 10 que o objeto vai receber efetivamente um status singular na psicanálise, diferente de qualquer outra concepção de objeto. O objeto designado pela letra a passa ao centro da práxis psicanalítica de orientação lacaniana e alcança o lugar epistemológico até então ocupado apenas pelas noções freudianas mais essenciais, como a pulsão e o inconsciente, por exemplo. É preciso compreender, portanto, como é depreendido da elaboração sobre a angústia o estatuto singular desse objeto.
Voltemos, então, ao problema do corte. No seminário em questão, Lacan discute a hipótese freudiana acerca da angústia no nascimento, como foi visto no tópico anterior, e sustenta ser inconcebível supor que o conjunto de movimentos e sensações corpóreos vividos nessa ocasião seria transportado para a angústia em sua função de sinal. Certamente, Freud foi de grande perspicácia ao intuir a estreiteza da articulação entre a angústia e a situação do nascimento. No entanto, o que está em jogo nessa experiência não é a vivência motora cuja percepção excessivamente intensa seria repetida nas ocasiões posteriores capazes de suscitar angústia. O que realmente importa no contexto do nascimento é a função do corte que funda uma relação do sujeito com uma parte separada de seu corpo, um apêndice, como nomeia Lacan.
Conforme Lacan, "a separação característica do começo, aquela que nos permite abordar e conceber a relação, não é a separação da mãe. O corte de que se trata não é o que se dá entre a criança e a mãe". (Lacan, 1963/2005, p.135). O autor demonstra que, na verdade, a separação que é realizada no nascimento e que traz consigo todas as implicações para o campo do objeto e da angústia é aquela que ocorre entre o bebê e os envoltórios embrionários que faziam parte de seu corpo. A embriologia corrobora esse entendimento, já que em sua descrição da maneira como esses envoltórios se diferenciam a partir do óvulo, fica claro que eles são elementos do corpo do feto. É esse "o corte que nos interessa, o que deixa sua marca num certo número de fenômenos clinicamente reconhecíveis" (idem, p.136), informa o autor.
A especificidade dessa separação se repete em outros modos de corte. A noção freudiana de pulsão parcial já delineia bem o espaço em que Lacan se apóia para se aprofundar nesse assunto. Comentando sobre os objetos parciais de que Freud fala, ele chama a atenção para a forma seccionada de tais objetos. O seio, por exemplo, é, para o bebê, parte de seu corpo. Isso se deve à provável percepção que o bebê tem de ser chapado ao corpo da mãe pelo seio e de ter essa parte ocasionalmente retirada dele, assunto a que retornarei logo adiante. Esse caráter separável chega ao limite na equiparação que pode ser feita - e realmente o é pelo bebê em relação a sua pulsão oral, - entre o mamilo e a mamadeira, analogia que evidencia um certo artificialismo desses objetos. O aspecto artificial, no entanto, está impregnado em um objeto fundamentalmente corpóreo. A propósito disso, o autor comenta que "essa parte corporal de nós é, essencialmente e por função, parcial. Convém lembrar que ela é corpo e que somos objetais, o que significa que não somos objetos do desejo senão como corpo". (Lacan,1963/2005 , p.237). Além do seio, há outros objetos com essas mesmas características.
Lacan relembra que o estádio do espelho tem uma função fundamental, que é instituir o campo do objeto. Nesse estádio, ocorre a primeira identificação com a imagem especular, mas ocorre também a identificação com o outro imaginário, o semelhante. Para o autor, a dificuldade que um indivíduo tem em discernir sua identidade da de outro se deriva dessa dupla via identificatória. Ele assegura que daí provém "a introdução da mediação de um objeto comum, objeto de concorrência cujo status decorre da ideia de posse - ele é seu ou é meu. No campo da posse, existem dois tipos de objetos - os que podem ser partilhados e os que não podem". (Lacan, 1963/2005, p.103). E os objetos que constituem o conjunto peculiar que está sendo especificado nessa análise não são objetos de troca, embora também circulem pelo espaço da partilha.
Quais são, afinal, esses objetos estruturalmente análogos aos envoltórios embrionários cortados do bebê? Além do seio, já mencionado, Lacan enumera outros quatro: o falo, as fezes, o olho e a voz - sendo os dois últimos acréscimos que ele faz à lista de objetos da teoria freudiana. São estes os cinco objetos cedíveis. Tais objetos são as formas que o objeto a assume. A principal característica desses é o fato de manterem com o corpo uma relação de separação mediada por uma pulsão parcial. Eles são objetos separáveis não por acaso ou por acidente, mas por terem um caráter artificial, como se estivessem agarrados ou superpostos ao corpo, como apêndices. (Idem, p.184). E é como pedaço de corpo que eles funcionam como objetos das pulsões parciais, cada um correspondendo a determinada pulsão: o seio é o objeto da pulsão oral, as fezes da pulsão anal, o falo da pulsão genital, o olho corresponde à pulsão escópica e a voz à pulsão introduzida pelo autor como invocante.
Quanto ao seio, Lacan enfatiza o fato de que não é a criança quem bombeia o leite da mãe, e sim o seio. Esse objeto encerra certo artificialismo porque há uma ambiguidade no corte que é estabelecido nesse nível. Tal corte não se efetua no mesmo lugar do lado da mãe e do lado do bebê, daí a dificuldade que este tem em reconhecer o seio como parte da mãe, e não como algo seu que foi cortado. A mama é o ponto intermediário entre mãe e filho. Esse objeto é eleito por uma pulsão parcial por causa de sua relação, por meio da sucção, com a zona erógena da boca, essa parte do corpo que está necessariamente ligada à função de borda e de corte. Essa correlação é de grande importância, visto que o autor destaca que a função de borda é o que há de mais essencial na estrutura da erogenidade. Nesse nível oral, o bebê, que não tem como saber até que ponto está chapado no peito da mãe pelo mamilo, acredita que o a é o Outro, pois não tem ideia do limite desse objeto em relação ao Outro. Nisso se inicia a problemática do desejo na fase oral.
No caso das fezes, essa função da borda que introduz um corte fica ainda mais óbvia. Na medida em que a mãe demanda as fezes da criança, esta pode retê-la ou ofertá-la. De qualquer forma, trata-se de um objeto pertencente à criança que é cortado de seu corpo pela zona erógena anal. E é a demanda da mãe - demanda do Outro - que faz com que o objeto fezes seja subjetivado e inserido na dialética do desejo.
Dentre esses objetos, o falo é o mais detidamente abordado pela teoria psicanalítica desde Freud. Devido a suas características mais evidentes, esse órgão funda a problemática da castração. Mas não é apenas da ameaça de castração que se trata. O falo é um objeto separável na medida em que ele se torna inoperante no momento que se segue ao coito. A detumescência é o principal aspecto do pênis que faz dele um objeto cedível. "O fato de o falo ser mais significativo na vivência humana por sua possibilidade de ser um objeto decaído do que por sua presença, é isso que aponta a possibilidade do lugar da castração na história do desejo" (Lacan, 1963/2005, p.187), argumenta Lacan, que ressalta ainda a intuição de Freud ao situar uma fonte de angústia no distúrbio do coito interrompido. A função do falo como objeto a é a função da falta. O falo é aquilo que se pode ter ou não. Daí provém toda a importância desse objeto para a psicanálise, porque a falta é constitutiva do movimento do desejo. A sexualidade é compreendida como ponto central da experiência humana muito em função desse núcleo da falta que é o falo como objeto a e que dá significado à castração.
O olhar como objeto, por sua vez, é uma inovação do seminário 10. Lacan deixa clara a importância dos olhos como objetos separáveis ao comentar a cena do Édipo arrancando os próprios olhos. Nessa cena, a angústia provém da visão impossível dos olhos arrancados. (Idem, p.180). O olho está necessariamente ligado à dimensão da imagem no desejo. Esse órgão funciona como um espelho que delimita todo o espaço exterior, que está atrelado ao corpo por intermédio do olho. No entanto, ele, o olho, fica de fora do campo de visão. Fica cortado, tal como sua função de visão. Nesse nível de relação com o desejo, o a se aloja em um ponto do olhar que o autor descreve como o ponto zero, "cuja extensão sobre todo o campo da visão é fonte, para nós, de uma espécie de apaziguamento, traduzido desde sempre pelo termo contemplação". (Lacan, 1963/2005, p.264). Nesse ponto, o olhar se volta para a imagem do sujeito e o objeto a se instala nesse olhar isolado que vê o sujeito e reflete sua imagem duplicada. A angústia aparece quando esse olhar cortado reflete, em seu espelho, a imagem do objeto que não é apreensível pela imagem. A experiência do estranho está estreitamente relacionada com esse olhar10. Além disso, Lacan ressalta que essa função do olhar como objeto a explica por que a fantasia, que é o suporte mais satisfatório do desejo, é sempre marcada por um parentesco com os modelos visuais, modelos que de certa forma dão o tom da vida desejante. (Idem).
Nesse mesmo sentido, a voz - a segunda inovação lacaniana na lista dos objetos -, é uma das formas do objeto a como voz isolada, separada, algo como um imperativo, a alteridade do que é dito. Pode-se pensar na dimensão material da voz, que é articulada pelas cordas vocais e se desprende do corpo, como onda sonora. Essa voz volta para o ouvido do sujeito como um objeto autônomo, algo que se origina no lugar do Outro. É a voz do grande Outro, quando o desejo do grande Outro assume a forma de uma ordem. Nesse modo de aparição do a, a angústia surge diante do desejo do Outro na vertente tirânica desse desejo. Essa voz como a é aquela que se ouve de maneira estranha, devido ao não reconhecimento, pelo sujeito, de sua própria voz naquele som. É o Unheimlich no plano sonoro, pois se trata de uma cena sonora em que a voz, separada do que foi dito, retorna irreconhecível. Como exemplo dessa forma vocal de aparição do objeto a, Lacan menciona as vozes perdidas da psicose e os imperativos do supereu. (Idem, p.275).
Os cinco objetos listados acima correspondem às cinco formas do objeto a. O que isso quer dizer? De acordo com Lacan, "o sujeito como tal só se realiza em objetos que sejam da mesma série do a, do mesmo lugar nesta matriz". (Lacan, 1963/2005, p.344). Esse autor explica a relação desses objetos com o a de uma maneira clara:
A falta é radical, radical na própria constituição da subjetividade, tal como esta nos aparece por via da experiência analítica. Eu gostaria de enunciá-la com essa formulação: a partir do momento em que isso é sabido, em que algo chega ao saber, há alguma coisa perdida, e a maneira mais segura de abordar esse algo perdido é concebê-lo como um pedaço do corpo. (Lacan, 1963/2005, p.149).
É possível afirmar que, se o objeto a é um vazio, os objetos cedíveis são as formas que esse vazio assume ao ser delimitado por bordas específicas do corpo. São pontos de fixação da libido, evidentemente relacionados ao movimento das pulsões parciais e à fixação da libido nessas partes do corpo. Mais uma vez, constata-se a proximidade a que Freud chegou desse núcleo do problema, na conexão que ele sempre fez questão de estabelecer entre a angústia e a libido.
A aproximação de Freud se deu por diversos caminhos. Lacan enfatiza a coincidência de sua formulação sobre os cinco objetos separáveis e as cinco formas de perda levantadas pela pesquisa freudiana em Inibição, sintomas e ansiedade (Idem, p.104). Convém lembrar como Freud concebe esses perigos em cada uma das fases. De acordo com ele, na situação do nascimento, o perigo é o ato de sair do meio intrauterino. Na fase oral, teme-se pela perda do seio como objeto. Já na fase anal, a criança se angustia frente ao perigo de perder o objeto de amor. Mais tarde, na fase fálica, o perigo é a ameaça de castração. Finalmente, com a consolidação do supereu, teme-se ser punido pelo rigor dessa instância psíquica.
Já no enfoque lacaniano, essa metonímia da perda de sucessivos objetos é entendida como a metonímia da presença do objeto a na forma dos objetos cedíveis. Se, para Freud, a angústia sinaliza a iminência dessas perdas, para Lacan, a angústia demarca o momento da aparição do a, "momento do desvelamento traumático em que a angústia se revela tal como é, como aquilo que não engana, momento em que o campo do Outro, por assim dizer, fende-se e se abre para seu fundo". (Lacan, 1963/2005, p.339). E o que há nesse fundo? No fundo aberto pelo trauma do corte encontra-se o vazio irredutível, a Coisa. O objeto a faz parte desse vazio e é o elo de mediação entre a falta radical, que é a Coisa, e os outros objetos, capazes de se apresentar como objetos na cena do mundo. O objeto a é o vazio que dá início ao desejo. É um fundo de vácuo que origina e direciona o desejo - desejo que a partir dessa origem se lança indefinidamente em sua busca desenfreada de preenchimento. Nesse sentido, ele não é o objeto eleito pelo desejo, alvo da busca do desejo. Na verdade, o a é a causa do desejo, o que está por trás de todo o movimento desejante como um referencial latente e absolutamente necessário. Como referencial, o objeto a conduz à metonímia do desejo com seus diversos e efêmeros objetos empíricos. Tais objetos tentam recobrir o vazio do a com os véus que são seus atributos, mas são sempre tentativas vãs, daí a perene insatisfação do desejo.
O estatuto do objeto fica definido como a causa do desejo. É como causa que o objeto a sustenta o desejo, e é por isso que no seminário oito Lacan conclui que a angústia é o mais radical dos modos de sustentação do desejo. A angústia é o afeto que demarca cada uma das incidências do objeto a. Para esclarecer essa conexão, esse autor localiza todas as cinco formas do objeto a em sucessivos patamares do circuito da constituição do sujeito no lugar do Outro. Em cada momento constitutivo, o objeto a assume uma função. E em cada um dos níveis desse circuito, o desejo é causado por uma das formas do a: o primeiro nível é o objeto oral, em seguida vem o objeto anal, depois está o nível do falo, em seguida se apresenta o objeto da pulsão escópica, o olhar, e, finalmente, no último nível está a voz. (Lacan, 1963/2005, p.320). A angústia pontua cada um desses momentos constitutivos do psiquismo. Ela é a tradução subjetiva do objeto a na medida em que é ela que sinaliza os momentos de aparição desse objeto. Nesses momentos, o sujeito é acometido pela angústia porque o desejo, causado pelo a, está prestes a invadir o campo do gozo. Portanto, "não só ela não é sem objeto, como também, muito provavelmente, designa o objeto, digamos, mais profundo, o objeto derradeiro, a Coisa" (Idem, p.338-339), declara Lacan. Tendo tudo isso em vista, fica evidente que o percurso escolhido por esse autor - pautado pela teoria da angústia - era mesmo fundamental para o estabelecimento de um novo estatuto para o objeto na psicanálise.
Notas
1. Este artigo provém da pesquisa de mestrado de Daniela Teixeira Dutra Viola, orientada pela professora Ângela Vorcaro, realizada no Programa de Pós-graduação em Psicologia da UFMG, e intitulada A travessia da angústia: Estudo psicanalítico sobre a função da angústia na formulação do objeto a. A dissertação foi defendida em março de 2009.
2. Na obra Inibições, sintomas e ansiedade (1926/1996a), Freud elabora a angústia como um "estado afetivo", ocasião em que se aprofunda na teoria dos afetos.
3. Lacan defende a ideia da angústia como "tradução subjetiva" do objeto a no decorrer do Seminário livro 10: A angústia. (1962-1963/2005). Essa proposta fica explícita em alguns trechos do seminário, como na página 113 (idem). Para ele, a angústia é o afeto deflagrado para o sujeito quando este se depara com a presença do objeto. O termo tradução é empregado aí para designar a sinalização para o sujeito de algo inapreensível de outra maneira.
4. As referências de Lacan a Hegel são muito abrangentes e complexas ao longo de toda a produção teórica lacaniana. Contudo, utilizamos essa passagem para evidenciar como Lacan se vale de sua interlocução com Hegel nesse momento de sua produção, justamente para viabilizar sua proposta de um objeto como resto da operação de constituição subjetiva. Este é o primeiro passo na construção da concepção de objeto a, que ainda no Seminário 10 será tomado como a causa do desejo.
5. No seminário 11, trabalho dedicado aos quatro conceitos fundamentais da psicanálise, Lacan investigará detidamente a questão do objeto a e desenvolverá a célebre fábula da homelete, abordando a origem desse objeto por meio da relação à teoria freudiana da libido. Por ora, a relação com a libido vai ser pouco a pouco destrinchada através do estabelecimento da conexão com a angústia. Não entrarei no contexto do seminário 11 no presente estudo. A passagem a que faço menção está exposta no capítulo XV - Do amor à libido, na aula de 20 de maio de 1964.
6. Essa correlação pode explicar inclusive a presença maciça e invasiva da angústia em certos casos de psicose essencialmente relacionados à ausência de uma definição mínima da imagem especular.
7. Em seu estudo sobre o narcisismo, Sobre o narcisismo: uma introdução (1914/1996f), Freud confere à libido a capacidade de ser revertida do eu ao objeto. Nesse trabalho, o eu, para ele, é o verdadeiro reservatório de libido, ideia que será revista mais tarde precisamente em decorrência da pesquisa sobre a angústia (Em Inibição, sintomas e ansiedade, de 1926/1996a).
8. Em Hamlet, príncipe da Dinamarca (Shakespeare, 1601). Trata-se do trecho em que o protagonista decide encenar uma peça para a corte, cujo clímax apresenta a cena do assassinato de seu pai.
9. Em itálico e entre aspas no original.
10. É importante relembrar o papel marcante do objeto olho no conto escolhido por Freud para abordar o fenômeno do estranho, O homem de areia, de Hoffman.
Referências
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Recebido em 10 de fevereiro de 2009
Aceito em 18 de abril de 2009
Revisado em 08 de junho de 2009