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Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento

versão impressa ISSN 1519-0307versão On-line ISSN 1809-4139

Cad. Pós-Grad. Distúrb. Desenvolv. vol.18 no.2 São Paulo jul./dez. 2018

https://doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p125-151 

Análise da utilização do desenho universal para aprendizagem

 

Analysis on the use of universal design for learning

 

Análisis de la utilización de un diseño universal para el aprendizaje

 

 

Glaucia Roxo de Pádua Souza RibeiroI; Cibelle Albuquerque de la Higuera AmatoII

IUniversidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: caribeiro1@hotmail.com
IIUniversidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: cibelle.amato@mackenzie.br

 

 


RESUMO

O Desenho Universal para Aprendizagem (DUA) é uma abordagem que procura minimizar as barreiras metodológicas de aprendizagem, tornando o currículo acessível para todos os alunos, pois possibilita a utilização de diversos meios de representação do conteúdo, de execução e de engajamento na tarefa. O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão da literatura verificando quais os componentes do currículo escolar (objetivos, método, material e avaliação) que, ao serem flexibilizados, impactam positivamente a aprendizagem dos alunos. As perguntas que nortearam este estudo foram: Quais são as práticas educacionais recentes baseadas no DUA? Qual o impacto desses conhecimentos na prática educacional brasileira? Considerados os critérios de seleção propostos, 35 artigos foram selecionados em três bancos de dados. Os resultados foram organizados em tabelas e foram realizadas análises de conteúdo e eleição de categorias. A categoria mais frequente foi o uso da tecnologia associada às diretrizes do DUA. A maioria dos estudos foi realizada nos Estados Unidos (20) e, quando se flexibiliza o método, associando-o ao uso da tecnologia, todos os alunos, incluindo aqueles com deficiência intelectual, são capazes de aprender. Conclui-se que os estudos mostraram que o DUA, quando utilizado no curso superior associado à educação on-line, garante a aprendizagem dos alunos, pois favorece o desenvolvimento de comportamentos autônomos e independentes, fazendo com que eles se autorregulem.

Palavras-chave: Inclusão educacional. Currículo. Pessoas com deficiência. Desenho Universal para Aprendizagem. Educação Especial.

 


ABSTRACT

Universal Design for learning (UDL) is an approach that aims to minimize the methodological learning walls, making the curriculum accessible to all students with or without disability, as it enables the use of various means of content representation, execution and task involvement. The purpose of this study was to revise he literature and verify which curriculum components (goals, method, material and evaluation) that when made flexible have a positive impact on the students learning process. The questions that guided this study were: What are recent educational practices based on UDL? What is the impact of this knowledge on Brazilian educational practice? Considering the proposed selection criteria, 35 articles were select from three data bases. The results were organized into tables and content analysis and category selection were performed. The category that emerged was the use of technology associated which the UDL guidelines. Most of the studies were performed in the USA (20) and when the method was flexible, associating it with technology, all the students, including those with mental disability, were able to learn. The conclusion is that these studies have shown that UDL when used in higher education (undergraduate program) associated to online education ensures students learning, as it favors the development of autonomous and independent behavior, making the students self-regulate.

Keywords: Mainstreaming. Curriculum. Disabled Persons. Universal design for learning. Special Education.

 


RESUMEN

El Diseño Universal para el Aprendizaje (DUA) es un enfoque que pretender minimizar las barreras para el aprendizaje metodológico, haciendo el currículo accesíble para todos los estudiantes con y sin discapacidades, ya que permite el uso de diversos medios de representación del contenido, la aplicación y el compromiso en la tarea. El objetivo de este estudio fue realizar una revisión de la literatura señalando cual(es) componentes del currículo (objetivos, método, materiales y evaluación) que al ser más flexible impacta positivamente el aprendizaje de los estudiantes. Las preguntas que guiaron este estudio fueron: ¿Cuáles son las prácticas educativas recientes basadas en el DUA ¿Cuál es el impacto de esos conocimientos en la práctica educativa brasileña? Considerados los criterios de selección propuestos, unos 35 artículos fueron seleccionados en tres bases de datos. Los resultados fueron organizados en tablas y se realizaron análisis de contenido y elección de categorías. La categoría que surgió fue el uso de la tecnología asociada a las directrices del DUA. La mayoría de los estudios se realizaron en los EE.UU. (20) y cuando se facilita el método, que involucra el uso de la tecnología, todos los estudiantes incluyendo los estudiantes con discapacidad intelectual son capaces de aprender. Resulta que los estudios han demostrado que el DUA cuando utilizado en el curso superior asociado a la educación en línea garantiza el aprendizaje de los estudiantes ya que fomenta el desarrollo de comportamientos autónomos e independientes, haciendo que los estudiantes se autorregulen.

Palabras clave: Propensión. Aprendizaje. Personas con discapacidad. Diseño Universal para el Aprendizaje. Educación Especial.


 

 

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de 1996, diz que a Educação Especial deve ocorrer preferencialmente nas escolas regulares (BRASIL, 1996). O poder público, por meio de suas instituições nos diversos setores da administração pública, tem lançado, desde então, cartilhas, orientações e outros documentos oficiais como pareceres, notas técnicas, entre outras legislações específicas, orientando como esse atendimento deveria se dar nas escolas regulares brasileiras. Constatou-se, então, que havia um grande desafio pela frente, no qual novos conhecimentos e práticas deveriam ser produzidos. Observou-se que o professorado em exercício não estava preparado para atender a esse público. Parte das lacunas estava na própria formação inicial, nos cursos de licenciatura, que não preparam adequadamente o professor para uma prática inclusiva, e os cursos de formação em exercício - que visavam minimizar essas lacunas de formação inicial - muitas vezes desprezam as experiências dos docentes acumuladas durante anos na prática do dia a dia (RODRIGUES, 2006).

Diante dessa realidade, o que vimos (e vemos) acontecer nas escolas brasileiras é um discurso inclusivo, por parte da maioria dos professores, e uma prática excludente, visto que para atendimento desta população é necessária maior flexibilidade de recursos, metodologias e conhecimento (MENDES; MATOS, 2014; RODRIGUES, 2006).

A prática é excludente porque os alunos não têm acesso ao currículo escolar, em virtude das várias barreiras metodológicas no contexto da aprendizagem (BOCK; GESSER; NUEMBERG, 2018). Para que todos os alunos possam aprender, é necessário que o acesso ao currículo seja oferecido mediante práticas pedagógicas distintas (MIRANDA; GALVÃO FILHO, 2012). Tal procedimento demanda não só conhecimentos teórico-práticos, mas também metodologias de ensino, planejamento e mudança no processo avaliativo (MIRANDA; GALVÃO FILHO, 2012).

Nem todos os alunos têm acesso ao currículo, porque a escola planeja suas ações para um único tipo de aluno e desconsidera que os alunos diferem entre si nos aspectos físico, intelectual, social, cultural, econômico, nas habilidades, nos interesses e nas aptidões. O Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA) procura atender a essa diversidade por meio da utilização de vários recursos (pedagógicos e tecnológicos), materiais, técnicas e estratégias, facilitando a aprendizagem e, consequentemente, o acesso ao currículo. Assim sendo, utiliza diversos meios de apresentação do conteúdo, diversas opções para a realização das atividades (meios de execução) e diversos meios de manter a motivação e o interesse do aluno.

De acordo com a proposta do DUA, é a escola que deve se adaptar às diferenças dos alunos e não o contrário (ALVES; RIBEIRO; SIMÕES, 2013). O lema do DUA é: o que é essencial para alguns é bom para todos (CAST, 2014). A proposta surgiu nos Estados Unidos. O objetivo da educação passou da aquisição do conhecimento para a experiência do aprendiz, ou seja, o aprendiz deve se tornar um especialista em aprender (CAST, 2014).

A base conceitual desta proposta (DUA) está na neurociência. O cérebro é formado por um conjunto de redes que estão interconectadas. Na aprendizagem três redes são importantes: afetiva - capacidade de se envolver com a aprendizagem (o porquê da aprendizagem); reconhecimento - transformar informações em conhecimento (o o quê da aprendizagem) e estratégica - organizar e planejar ações no ambiente (o como da aprendizagem) (CAST, 2014).

Para o DUA, quatro são os componentes do currículo que devem ser flexibilizados:

1. Objetivos: rol dos conhecimentos e habilidades que os alunos devem dominar e desenvolver.

2. Avaliação: verifica o processo de aprendizagem do aluno e faz ajustes no ensino; aponta para o currículo, não para o aluno. Verifica a evolução do aluno ao longo do percurso. Não deve oferecer um único meio de resposta e o resultado é um indicador do conhecimento.

3. Métodos: devem estar de acordo com cada rede; a) afetiva (níveis de desafios diferentes, recompensas, opções de ferramentas, contexto da aprendizagem); b) estratégica (modelos flexíveis de desempenho, feedback contínuo, prática como suporte, oportunidade de mostrar as habilidades); c) reconhecimento (fornecer vários exemplos do conteúdo, várias mídias e recursos). Os métodos devem estar de acordo com a necessidade de cada aluno e incluir todos os alunos num ambiente colaborativo.

4. Materiais: devem estar alinhados com as metas de aprendizagem; envolver os alunos para que se tornem proativos (CAST, 2014).

Todos os alunos precisam de modelos alternativos de como atingir um objetivo e quais passos são necessários para se chegar lá. É necessário acabar com todas as barreiras que impedem a aprendizagem de todos, principalmente os fatores de natureza pedagógica (NUNES; MADUREIRA, 2015), ou seja, aqueles intrinsecamente relacionados ao processo de ensino-aprendizagem (metodologia, concepção pedagógica, recursos didáticos, entre outros).

A abordagem de ensino tradicional de "tamanho único para todos" mostrou-se insuficiente para atender à diversidade do aluno em aprendizado contemporâneo. É possível citar duas linhas teóricas que foram desenvolvidas para superar a falha dessa abordagem. A primeira, chamada de teoria dos estilos de aprendizagem, propõe acomodar o conteúdo educacional de acordo com as preferências individuais do aluno, e a segunda, conhecida como DUA, propõe projetar configurações educacionais flexíveis e acessíveis, sem adaptação.

O DUA mostrou ser uma abordagem eficiente para a criação de ambientes de aprendizagem flexíveis e acessíveis para todos os alunos, incluindo aqueles com deficiência. O artigo ressalta que a aplicação dos princípios do DUA oferta mais opções de acesso ao aprendizado e melhora as percepções dos alunos sobre o próprio aprendizado - isso pode melhorar positivamente a disposição deles para a aquisição de conhecimento, usando múltiplos meios de representação e expressão. Para Al-Azawei, Serenelli e Lindqvist (2016), o engajamento pode motivar os alunos a alcançarem seus objetivos de aprendizagem de forma divertida e eficaz.

Para que todos os alunos possam aprender e ter acesso aos conteúdos escolares, é necessário que os componentes do currículo (objetivos, método, material, avaliação) sejam flexibilizados. No entanto, ainda não é possível dizer se há impacto de um componente curricular isoladamente na aprendizagem e como seria esse impacto. Basham et al. (2016) apontaram para a necessidade de realização de pesquisas a fim de verificar quais princípios do DUA são mais eficazes para qual contexto, aluno, cultura e projeto de intervenção.

O Brasil ocupa a 63ª posição no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), num total de 70 países que fizeram parte da pesquisa (PISA, 2015). Esse resultado aponta para a necessidade da utilização de práticas que cientificamente melhorem a aprendizagem dos alunos, como o DUA.

Para este artigo será utilizado o conceito de prática pedagógica, como toda ação (reflexiva, intencional, ética, consciente e participativa) do professor na sala de aula (FRANCO, 2015). A prática pedagógica envolve um conjunto de conhecimentos, querer saber para fazer bem, que o professor deve dominar. O aluno necessita fazer parte dessa prática para a ocorrência de uma aprendizagem significativa (MACHADO, 2005).

O objetivo deste estudo foi analisar as produções científicas recentes, tanto nacionais quanto internacionais, e verificar quais foram as práticas pedagógicas baseadas no DUA que tiveram resultados promissores na aprendizagem dos alunos. E, como objetivo secundário, verificar se essas práticas estão presentes no cenário nacional.

 

MÉTODO

A primeira etapa para a realização deste estudo de revisão da literatura foi realizar uma busca nos bancos de dados e selecionar os artigos. A pesquisa foi realizada nos seguintes bancos de dados: PubMed, Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e Education Resources Information Center (Eric). A escolha desses bancos de dados se deu porque o SciELO concentra publicações científicas nacionais de diversas áreas do conhecimento. O Eric é um importante banco de dados sobre pesquisa em educação do Departamento de Educação dos Estados Unidos e o PubMed é um banco de dados de publicações na área da Saúde. Optou-se por incluir o PubMed porque o tema deficiência (independentemente da abordagem adotada) é objeto de estudo tanto da medicina como de outras áreas. A compreensão da deficiência, e principalmente a rede de apoio profissional a esses indivíduos, precisam ser multiprofissionais prioritariamente nas áreas de saúde e educação.

As perguntas que nortearam este estudo foram: Quais são as práticas educacionais recentes baseadas no DUA? Qual o impacto desses conhecimentos na prática educacional brasileira?

Os critérios de inclusão na seleção dos artigos foram: conter o descritor "Desenho Universal Aprendizagem" ou seu equivalente em inglês "Universal Design Learning" no título ou no resumo do artigo; os estudos terem sido publicados a partir de 2014, em periódico revisado por pares, com acesso livre ao estudo completo e que o conteúdo fosse relacionado ao universo escolar.

Na pesquisa realizada no banco de dados da Eric, no idioma inglês, foram listados 29 artigos. Observou-se que oito deles não tinham todas as palavras do descritor mencionado anteriormente, nem no título nem no resumo, e foram excluídos. Vinte e um artigos foram lidos na íntegra. Após a leitura, um foi excluído, pois apesar de obedecer aos critérios de inclusão, o objeto de estudo do artigo eram os sistemas de distribuição de áudio na sala de aula no ensino superior, não sendo relevante para o nosso trabalho. Portanto, 20 artigos desse banco de dados foram utilizados neste estudo.

No site da SciELO, em português e inglês, 27 artigos foram listados. Vinte e quatro artigos foram excluídos pelos seguintes motivos: um artigo estava em duplicidade, um texto consistia em anais de congresso, um artigo não possuía o texto na íntegra, outros 20 artigos não possuíam todas as palavras do descritor no título ou no resumo e um artigo foi realizado em Portugal, portanto, três artigos desse banco de dados fizeram parte desta revisão. A escolha de restringir a pesquisa à produção brasileira foi para analisar as pesquisas atuais, ou seja, as produções científicas realizadas no Brasil sobre o tema a partir de 2014.

Na pesquisa realizada no banco de dados da PubMed, consideramos o idioma inglês e qualquer ano de publicação, porque, quando estipulada publicação a partir de 2014, um número inexpressivo de artigos foi listado. No total, 232 artigos foram apresentados. Após uma análise cuidadosa, somente 12 artigos responderam aos critérios de inclusão, os demais não tinham o descritor no título ou no resumo ou não se relacionavam ao tema (UDL). Na PubMed optou-se por não ler os artigos na íntegra, visto que a maioria deles não tinha texto de livre acesso. Como um dos objetivos foi ampliar o conhecimento sobre a produção científica internacional, optou-se por ter um panorama maior de publicações. Como comentado anteriormente, a escolha dessa base de dados deu-se por ser um banco de dados importante na área da saúde, reforçando a compreensão interdisciplinar da Educação Especial.

Considerados todos os critérios de inclusão e bases de dados consultadas, obteve-se um total de 35 artigos.

Na segunda etapa da pesquisa foi feita a análise do conteúdo, que compreende técnicas de pesquisa que permitam, de forma sistemática, a descrição das mensagens e das atitudes atreladas ao contexto da enunciação, bem como as inferências sobre os dados coletados (CAVALCANTE; CALIXTO; PINHEIRO, 2014). Elaborou-se uma planilha contendo título, autores, ano da publicação, local da pesquisa, objetivos, conclusões e observações. Essa planilha ajudou a organizar o texto em unidades menores, para que fosse possível compreender melhor as mensagens dos textos, auxiliando tanto no entendimento dos conceitos e/ou ideias quanto na comparação entre os artigos, levantando pontos em comum e divergências.

A terceira etapa da pesquisa foi a eleição das categorias, que são enunciados e abarcam um número variável de temas que possam, por meio de sua análise, exprimir significados e elaborações importantes que atendam aos objetivos de estudo (CAMPOS, 2004). A categoria que emergiu foi o uso da tecnologia associada com o DUA.

 

RESULTADOS

No total, 35 artigos fizeram parte desta revisão; desses, 20 foram realizados nos Estados Unidos, conforme mostra o Quadro 1. Esse mesmo resultado foi encontrado nos estudos de revisão de Bock, Gesser e Nuemberg (2018). Os autores analisaram as produções científicas sobre o DUA entre 2011 e 2016 e não encontraram nenhum estudo realizado no Brasil nesse período. Dos artigos que compuseram a amostra, houve predominância da análise do DUA no ensino superior. Os autores levantaram três pontos de discussão:

 

 

1. Aspectos legais e históricos sobre o DUA. O DUA surgiu a partir do conceito de Desenho Universal do arquiteto Ronald Mace, no qual os ambientes e produtos deveriam ser projetados para atender a maioria das pessoas sem a necessidade de adaptações. Esse conceito ganhou importância na educação, sobretudo na educação inclusiva.

2. Contribuições conceituais e críticas acerca da deficiência. O DUA foi associado à Educação Especial, mas sua premissa principal é planejar instruções para atender às necessidades de todos os alunos. No Brasil confunde-se Educação Especial com educação inclusiva e o DUA é adequado para a educação em geral.

3. Contribuições de aplicabilidade prática. Os autores apontaram para a necessidade de planejar a acessibilidade. No Brasil, questionaram se algumas práticas do DUA encontrariam barreiras devido ao sistema de ensino. Entre elas, citaram: tempo extra utilizado pelo professor para aperfeiçoamento e preparação de material; formação inicial do professor na temática do DUA; número reduzido de computadores nas escolas e acesso limitado à internet e políticas públicas pouco inclusivas.

O Quadro 2 apresenta um panorama dos artigos que fizeram parte desta revisão.

 

 

A partir da revisão realizada é possível destacar que os meios habituais de ensino não são totalmente capazes de garantir a aprendizagem de todos os alunos. Alguns estudos, como os citados, mostraram que outros meios inovadores promoveram resultados acadêmicos mais promissores.

Um dos meios habituais de ensino é deixar nas mãos do professor a organização do tempo e espaço da aprendizagem, bem como o planejamento do currículo. Isso faz com que os alunos não participem do processo nem permite que eles se autorregulem. Basham et al. (2016) conduziram um estudo que teve como objetivo identificar os princípios undamentais da educação personalizada. A educação personalizada permite que o aluno se autorregule, tor-nando-se o condutor do processo de aprendizagem. Atender ao ritmo do aluno, deixá-lo escolher qual é a sua preferência de apresentação do conteúdo (oral, texto etc.) e expressão favorece o entendimento do conteúdo.

Kahn, Pigman e Ottley (2017) propuseram-se a examinar os planos de aula de Ciências para verificar se de fato eram inclusivos e constataram que os professores têm a tendência de se acomodar em relação ao aluno com deficiência, limitando sua atuação à adaptação de atividades e seleção de materiais específicos, o que se distancia de uma Educação Especial que promove o desenvolvimento cognitivo dos alunos. Dessa forma, conseguiram mostrar que a educação inclusiva não ultrapassa as atividades adaptadas na sala de aula. Pensar somente em adaptar as atividades, sem considerar o aluno e o que é importante para o seu desenvolvimento, é outro modo habitual de ensino que precisa ser repensado.

Os estudos de Alnahdi (2014), Pearson (2015), Crevecoeur et al. (2014) mostraram a importância do uso de recursos tecnológicos combinados com o DUA para promover a aprendizagem de todos os alunos. O uso de recursos habituais como lousa, livro didático, aula expositiva, currículo unificado e prova escrita como única forma de avaliação é prática frequente nas escolas atuais. Tal prática não atende mais a diversidade de alunos no contexto escolar, precisando ser revista. Atualmente, a escola inclusiva tem vários desafios, como o de atender os alunos com etnias diferentes, níveis sociais, culturais e econômicos diferentes e alunos com deficiências motora, intelectual e sensorial, entre outras.

Para lidar com a rigidez sistêmica que caracteriza o setor educacional, utilizar-se de propostas como o Desenho Universal para a Aprendizagem é uma forma de beneficiar todos os alunos (CRADDOCK; MCNUTT, 2017), pois oferece diversos meios de apresentação do conteúdo, de execução e de engajamento com a tarefa.

O DUA é benéfico para todos os alunos, seja com deficiência, seja sem deficiência, pois fornece flexibilidade, apoio e maximiza a aprendizagem, diminuindo a necessidade de procurar serviços de suporte (KUMAR; WIDEMAN, 2014; DELL; DELL; BLACKWELL, 2015), justamente por não estar pautado em possíveis déficits dos alunos, mas nas características dos alunos em geral (CRUZ; NASCIMENTO, 2018). Dessa forma, reduz as barreiras de aprendizagem, tornando o currículo mais acessível (CREVECOEUR et al., 2014).

Um estudo realizado por Andersen e Nash (2016) nos Estados Unidos, na disciplina de Ciências no K-12, trouxe reflexões interessantes com relação à aprendizagem dos alunos com deficiência intelectual (DI). Os autores tiveram como objetivo principal da pesquisa elaborar um currículo com conteúdos relevantes para os alunos com DI e avaliações alternativas, usando o DUA. Eles concluíram que para os alunos com deficiência intelectual, a prática de ensino atual não favorece o entendimento conceitual e, consequentemente, o desenvolvimento cognitivo.

Nesse sentido, os objetivos conceituais traçados para esses alunos são simplificados e empobrecidos, resultando num currículo de "segunda linha", baseado no déficit da criança. Além disso, constataram a falta de conhecimento por parte dos professores sobre como os alunos com deficiência aprendem. Os autores concluíram que os alunos com deficiência intelectual são capazes de adquirir conceitos científicos quando há um aumento no tempo, análise da tarefa e uso das diretrizes do DUA (ANDERSEN; NASH, 2016).

Coyne, Evans e Karger (2017) verificaram que os alunos com DI demoram mais tempo para se alfabetizar que os alunos típicos, resultando numa discrepância entre idade cronológica e conteúdos esperados. Propuseram, então, oferecer um modelo de alfabetização alternativo para esses alunos, on-line. Constataram que pouco se sabia como eles podiam ser capazes de se beneficiar com um ambiente de alfabetização on-line. Os resultados desse estudo indicaram que quando o conteúdo é relevante para a idade do aluno e oferece oportunidade de socialização em discussões on-line, os alunos mostraram-se interessados e aprenderam.

Os alunos com deficiência têm progredido nos diversos níveis de escolarização e ingressado em cursos superiores. O censo realizado em 2015 mostrou que as matrículas nos cursos superiores realizadas por alunos com deficiência representaram 0,5% (37.927 alunos) do total de vagas oferecidas. Houve um aumento significativo de matrículas comparado com os índices de 2004, nos quais somente 5.395 alunos com alguma deficiência estavam matriculados no ensino superior (INEP, 2015).

Novas modalidades de ensino têm surgido nesse setor, como os cursos a distância e aulas on-line, havendo necessidade de avaliar se o público-alvo da Educação Especial pode se beneficiar com elas, considerando que esta é uma tendência mundial.

No Brasil, o censo de 2015 apontou que, dos 8 milhões de vagas oferecidas em cursos superiores em instituições públicas e privadas, 32,6% correspondem à modalidade a distância (INEP, 2015).

Para que os alunos com deficiência possam ter acesso ao currículo do curso escolhido, há necessidade de se terem à disposição os três princípios do DUA (diversos meios de apresentação do conteúdo, diversos meios de ação e diversos meios de engajamento na tarefa), pois fornecem mais apoio aos estudantes e maximizam o ensino on-line (DELL; DELL; BLACKWELL, 2015). No Brasil, não encontramos nenhuma pesquisa no ensino superior, considerando as modalidades presencial e a distância, para alunos típicos e/ou atípicos, baseada no uso dos pressupostos do DUA.

O DUA diminui as barreiras de aprendizagem e facilita o acesso ao currículo, bem como é capaz de oferecer um ensino mais personalizado, no qual o aluno é capaz de se autorregular (BASHAM et al., 2016). A abordagem proposta pelo DUA pode ser utilizada em diferentes culturas. Neste estudo, observou-se que algumas pesquisas foram conduzidas em países de culturas diferentes da ocidental, como é o caso de alguns países como Malásia, Arábia Saudita e Iraque, obtendo resultados positivos (ALNAHDI, 2014; AL HAZMI; AHMAD, 2018; AL-AZAWEI; LUNDQVIST; PARSLOW, 2017).

Além da flexibilização do currículo, o uso da tecnologia (diversas mídias, programas, aplicativos, entre outros) é outro elemento fundamental para garantir o acesso ao currículo. A tecnologia melhora a independência e a autonomia do aluno nas tarefas acadêmicas, levando-o à aprendizagem dos conteúdos propostos (ALNAHDI, 2014). A tecnologia torna possível a aplicação dos princípios do DUA somados ao uso de diferentes técnicas de aprendizagem, auxiliando os professores no processo de ensino-aprendizagem. O uso de formatos alternativos baseados no DUA é válido e importante para facilitar o acesso de todos ao conteúdo; no entanto, alguns alunos se beneficiam com a leitura de texto e um tempo adicional para a realização da atividade (FIDALGO; THORMANN, 2017), mostrando a importância da variabilidade de opções, incluindo meios mais convencionais de aprendizagem.

A maioria das pesquisas que fizeram parte desta amostra foi realizada em cursos de nível superior. Não foi encontrado nenhum estudo realizado no Brasil avaliando a utilização dos princípios do DUA no ensino superior. Auto-res como Fidalgo e Thormann (2017) verificaram qual o formato alternativo de conteúdo (apresentação do conteúdo) on-line, baseado no DUA, no curso superior que mais ajudou na aprendizagem, na visão dos alunos. Levantaram quatro questões de pesquisa: 1. Qual é o formato de apresentação do conteúdo que os alunos mais preferem? 2. Há relação entre o tipo de apresentação com o conteúdo? 3. Qual é o formato mais procurado? 4. Para apresentar os trabalhos, qual é o tipo de apresentação que os alunos mais utilizaram? Os autores constataram que todos os formatos são válidos. O formato mais apreciado pelos alunos foi o vídeo, no entanto, eles se sentiram mais confortáveis utilizando-se da leitura de texto e de um tempo adicional para a conclusão da tarefa (meio de execução). Para apresentação dos trabalhos, os alunos optaram pelo software Power Point. Os autores concluíram que todos os meios são válidos e que os comumente utilizados (por exemplo, leitura de texto) devem ser oferecidos como opção. A opção de escolha sempre é a melhor estratégia de ensino.

Numa pesquisa realizada no Iraque, os autores integraram o DUA (múltiplos meios de representação, ação e expressão, e engajamento) com uma teoria de sistema de informação, Technology Acceptance Model (TAM), e procuraram determinar a eficácia dessa interação num curso de web design e-learning e a medida da satisfação dos alunos. Os autores concluíram que o modelo de currículo tem efeito direto na percepção dos alunos e que o DUA é eficaz na promoção de comportamento intencional para o e-learning (AL-AZAWEI; SERENELLI; LUNDQVIST, 2016).

No Brasil, Prais e Rosa (2014) propuseram-se a elaborar um livro digital que contemplasse a organização da atividade de ensino a partir do DUA. No entanto, a pesquisa estava em andamento na época da publicação do artigo, não tendo seus resultados divulgados.

Outra publicação nacional foi o trabalho feito com dois alunos com autismo na cidade do Rio de Janeiro, no qual as autoras utilizaram recursos de informática e diretrizes do DUA para promover a acessibilidade ao currículo. Realizaram adaptações nas atividades, utilizando-se dos recursos do software Power Point. Concluíram que os alunos em questão aprenderam que o acesso ao currículo não deve ser baseado nas dificuldades, mas nas características diversas dos alunos em geral, sendo o DUA uma estratégia eficaz (CRUZ; NASCIMENTO, 2018).

 

DISCUSSÃO

A maior parte das publicações científicas consideradas neste estudo sobre o DUA, nos últimos cinco anos, são norte-americanas e tiveram como foco o ensino superior. Esses dados também foram encontrados no trabalho de Bock, Gesser e Nuemberg (2018). Há uma tendência nos artigos analisados de estudar como esses alunos podem ter acesso aos programas de graduação e pós-graduação (HALLIGAN; HEELAN; QUIRKE, 2015).

As práticas pedagógicas baseadas no DUA que encontramos nesses artigos foram:

• Aplicação das diretrizes do DUA, principalmente as que se referem ao oferecimento de diversos meios de apresentação do conteúdo.

• Seleção de conteúdos que, de fato, promovam o desenvolvimento cognitivo dos alunos com deficiência intelectual.

• Elaboração de avaliações adequadas aos alunos com deficiência intelectual, que sejam capazes de verificar a aquisição de conteúdos conceituais.

• Uso de tecnologia.

• Uso de tecnologia combinada com outros recursos (RAO; SMITH; LOWREY, 2017).

• Treinamento para professores conhecerem o DUA e as deficiências de maneira geral.

• Flexibilidade no currículo, tornando-o mais acessível a todos.

• Aprendizagem personalizada, com uso de tecnologia para ajudar os alunos a se autorregularem.

• Utilização do DUA em cursos a distância e on-line.

• Utilização do DUA em diversos cursos no ensino superior.

• Exemplos da utilização do DUA em curso superior, especificamente nos estágios supervisionados.

Quando se comparam os achados com a teoria do DUA, constata-se que a maioria das pesquisas se preocupou em flexibilizar e analisar o componente "método" do currículo. O método para o DUA diz respeito às três redes: 1. rede de reconhecimento; o quê da aprendizagem, ou seja, é o conteúdo apresentado: conjunto de informações ministradas por meio do som, de textos, símbolos, ações, entre outros. 2. redes estratégicas; o como da aprendizagem, isto é, a maneira como expressamos o conhecimento. 3. rede afetiva; o porquê da aprendizagem, ou seja, a motivação e o interesse necessários para a aprendizagem.

Vários estudos realizados no nível superior em cursos on-line, nos quais os autores se propuseram a utilizar o DUA, são exemplos de flexibilização do currículo no componente "método", enfatizando a rede de reconhecimento e associando-a com a tecnologia (DELL; DELL; BLACKWELL, 2015; SCOTT; TEMPLE; MARSHALL, 2015; SCOTT et al., 2017; COYNE; EVANS; KARGER, 2017).

Quando se fez uso da tecnologia associada ao DUA e se flexibilizaram o método e o material, os resultados em relação à aprendizagem dos alunos foram positivos. A tecnologia permite que o aluno se autorregule, ou seja, permite que haja, por parte do estudante, a administração do tempo, a flexibilização do espaço físico, o feedback instantâneo e constante sobre os avanços, além da possibilidade de acessar os formatos a que o aluno mais se adapta (texto, áudio, vídeo, entre outros). Permite que ele se mantenha motivado, desafiado e interessado. Estimula a autonomia e a independência. Assim, a rede afetiva é contemplada, dando sentido ao conteúdo. A aprendizagem se torna mais significativa porque o aluno está no "comando" do processo (BASHAM et al., 2016; FIDALGO; THORMAN, 2017).

Hitchcock et al. (2016) conduziram um estudo para alunos com DI, no qual utilizaram a tecnologia somada a estratégias de autorregulagem para diminuir a defasagem desses alunos em relação ao esperado para idade e série. Os autores analisaram os conteúdos regulares curriculares do curso de Ciências na educação básica e estabeleceram objetivos pedagógicos específicos para os alunos com DI. Para avaliar se os objetivos foram alcançados, se os alunos de fato adquiriram os conceitos propostos, foi elaborado um sistema de avaliação (testes). Nesse estudo, tanto o método quanto a avaliação foram flexibilizados e adaptados. Os autores tiveram resultados positivos e concluíram que alunos com DI são capazes de aprender, desde que haja adaptações curriculares (método e objetivos) orientados pelo DUA.

Dos artigos pesquisados nesse estudo, poucos tiveram o foco da intervenção nos objetivos e na avaliação de acordo com o DUA. A maioria focou os métodos e materiais.

O uso da tecnologia diminui a necessidade de o aluno procurar serviços de apoio nas instituições de ensino (ALNAHDI, 2014).

A prática pedagógica mais utilizada no Brasil para garantir o acesso dos diversos alunos ao currículo foi a adaptação das atividades didáticas, não uma adaptação curricular (CRUZ; NASCIMENTO, 2018). Em um estudo realizado por Kahn, Pigman e Ottley (2017), os autores constataram uma situação semelhante.

Em relação às práticas pedagógicas inclusivas que utilizam o DUA com todos os alunos e que respeita as especificidades de cada um, há a necessidade de se oferecer um ensino personalizado. O professor deve ter conhecimentos teóricos sólidos em educação e no DUA. No entanto, o que se percebe (inclusive na realidade brasileira) é que os professores ainda desconhecem as leis de inclusão, bem como as estratégias pedagógicas que beneficiam todos os alunos (WEST; NOVAK; MUELLER, 2016). Hering et al. (2017) apontaram a necessidade de os professores manterem um diálogo diário entre si e promoverem discussões sobre as práticas pedagógicas constantemente para garantir a aprendizagem dos alunos. Pearson (2015) escreveu que o uso do DUA, da tecnologia, do conhecimento de diversas técnicas de aprendizagem e a elaboração de avaliações adequadas são elementos fundamentais para um bom desempenho profissional, que acaba por resultar em altos índices de aprendizagem.

No Brasil, confunde-se adaptação curricular com adaptação das atividades didáticas. A adaptação curricular deve ocorrer porque os alunos são diferentes entre si e necessitam de estratégias, metodologias, avaliações e objetivos de aprendizagem específicos para eles, ou seja, de um conjunto de práticas pedagógicas que garantam acesso ao conteúdo acadêmico. Adaptar as atividades é apenas um item desse processo maior. Quando se adaptam as atividades sem essa reflexão, improvisa-se e não se garante o desenvolvimento acadêmico e cognitivo desses alunos. Essa dificuldade resulta na oferta, principalmente para os alunos com deficiência, de um conteúdo no qual os conceitos científicos, matemáticos, linguísticos, entre outros, não são ensinados.

 

CONCLUSÃO

É possível concluir que, das práticas pedagógicas utilizadas, as que potencializam a aprendizagem garantindo o acesso ao currículo para os alunos com e sem deficiência do DUA são a adaptação do método em primeiro lugar, seguido do material e dos objetivos combinado com o uso da tecnologia. O treinamento dos professores sobre as diretrizes do DUA, seja na graduação, seja em cursos de formação em serviço, seja no entendimento das deficiências, resulta numa atuação profissional mais afinada com as necessidades de cada aluno. No Brasil, há necessidade de divulgação sobre as bases teóricas do DUA. Enquanto nos outros países as pesquisas se concentraram no ensino superior, nenhum estudo neste nível foi realizado no Brasil.

Repensar a forma de ensinar, a partir da compreensão do que significa aprender, requer um esforço conjunto de diversos profissionais e de saberes específicos, principalmente quando consideradas as especificidades de cada aluno e a diversidade de cada sala de aula. Talvez este seja o grande desafio a ser enfrentado por todos os profissionais preocupados com a educação: transformar as escolas em espaços para todos, em ambientes inclusivos e facilitadores da aprendizagem.

 

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Recebido em: 23.07.2018
Aprovado em: 04.09.2018

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