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Revista Psicologia Política

versão On-line ISSN 2175-1390

Rev. psicol. polít. vol.21 no.52 São Paulo set./dez. 2021

 

EDITORIAL

 

Sobre a importância dos editais de apoio a periódicos científicos no Brasil

 

On the importance of public notices to support scientific journals in Brazil

 

Sobre la importancia de los avisos de apoyo a las revistas científicas en Brasil

 

 

Kátia MaheirieI; João Manuel C. de OliveiraII

IEditora da Revista Psicologia Política
IIEditor da Revista Psicologia Política

 

 

Em meio a tantos cortes no campo da educação, ciência e tecnologia, o surgimento de algum edital de apoio a periódicos científicos aparece como um verdadeiro "salva-vidas", um navio pronto a resgatar sobreviventes no mar das publicações científicas no Brasil, prestando-lhes o apoio para continuar navegando por esse mar em condições tão adversas.

Falo aqui, em especial, do Edital 01/2021 da ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia), com o objetivo de apoiar periódicos científicos brasileiros, cujos editores pertençam a Programas de Pós-graduação filiados a ANPEPP. Esta iniciativa, já em sua terceira edição, tem conseguido prestar um auxílio financeiro fundamental em tempos tão difíceis, em um país que vem, desde 2016, rompendo com seu perfil democrático e, com ele, tudo que envolve o pensamento crítico.

Os periódicos científicos de um país representam a vitrine acadêmico-científica do que é produzido a partir das pesquisas que fazem avançar as diferentes áreas de conhecimento e, por consequência, a vida prática e cotidiana de cada cidadão do mundo. O apoio a ciência e sua divulgação é o que garante o desenvolvimento de tecnologias, de novos produtos, de novas práticas profissionais, de novos conceitos e novos procedimentos em diferentes campos. A partir de tais veículos de divulgação científica, pode-se salvar vidas, melhorá-las, aprimorar tratamentos, criar estratégias de intervenção em diferentes campos, rever procedimentos, criar mecanismos de superação, fazer surgir, alimentar, rever políticas públicas e sociais, dentre tantas outras possibilidades no encremento da vida prática.

No referido edital da ANPEPP, vários periódicos da área da Psicologia, ligados a diferentes Programas de Pós-graduação no país puderam se inscrever, em faixas específicas, conforme sua avaliação no Qualis/Capes de 2013-2016. Em uma dessas faixas, a Revista Psicologia Política foi contemplada, o que indica que nossa especificidade na área da Psicologia e nossa proposta para o futuro como veículo de divulgação de trabalhos científicos no campo da Psicologia Política foi reconhecido e bem qualificado.

Ficamos extremamente felizes por tal reconhecimento e, também, pela possibilidade de publicar nossos artigos com qualidade, buscando dar vazão a represa de manuscritos que já aceitos, aguardam publicação.

Nosso total agradecimento a ANPEPP que, por meio do reconhecimento da importância de editais de fomento as publicações científicas, apostou mais uma vez, em fazer viver os periódicos científicos brasileiros e, com isso, produzir seu fortalecimento, legitimando sua importância no âmbito da divulgação científica e auxiliando sua projeção nacional e internacional.

Abrimos este número com o artigo intitulado Crise, anomia e confiança em instituições no Brasil, de Marcus Eugênio de Oliveira Lima e Dalila Xavier de França, que analisam a relação entre a percepção de crise, anomia e confiança nas instituições. Apontam que a desconfiança nas instituições políticas "foi o melhor preditor da anomia" nos estudos realizados com crianças, adolescentes e adultos, dentre outros significativos achados, considerando o papel da desconfiança nas instituições políticas.

O artigo de Luciane Cherobini, Francisco Luiz Marques, Aline Reis Calvo Hernandez e Patrícia Binkowski, intitulado Mídia, fake news e neoliberalismo: o uso de ferramentas de dominação no pós-verdade, mostra, por meio de uma revisão bibliográfica, que há um foco prioritário na crença que interessa crer em detrimento dos fatos tais como ocorreram, trazendo um olhar crítico sobre a sociedade neoliberal brasileira, as mídias e as fake news. Marcelo Santana Ferreira no artigo Escrita literária, memórias coloniais e subjetividade, a partir do diálogo que estabelece entre Psicologia e Literatura contemporânea, defende uma concepção política de memória, na medida em que se amplia da autoria particular em direção a composição de comunidades de ouvintes e leitores atentos ao apagamento do passado, possibilitando uma elaboração política deste.

Estudos das masculinidades na psicologia brasileira: da invisibilidade da crítica à crítica da invisibilidade, de autoria de Daniel de Castro Barral e Valeska Zanello, faz uma análise dos discursos de um corpus documental, tomando como base uma revisão da literatura sobre masculinidades no campo da Psicologia brasileira, encontrando uma assertiva em grande parte dos estudos, a saber, a invisibilidade masculina, a qual foi tomada como enunciado organizador de parte da produção discursiva da ciência psicológica brasileira.

Adriano Valério dos Santos Azevêdo e Gisele Groehler Giesel, no artigo Docência em Psicologia na formação em Psicologia Social Comunitária, trazem os resultados de uma pesquisa sobre práticas didáticas de 12 docentes de 4 cursos de graduação em Psicologia do sul do Brasil, no que se refere a formação em Psicologia Social Comunitária. A partir de uma perspectiva psicossocial da violência, o artigo Do projeto político pedagógico às práticas cotidianas: perspectiva psicossocial sobre violência na escola, de autoria de Jacqueline Meireles, Ana Paula Gomes Moreira e Raquel Souza Lobo Guzzo, problematiza o hiato entre as propostas de ação do projeto político pedagógico e sua concreta execução no contexto das escolas públicas, no que se refere as situações de violência.

Resistência dos/as jovens da periferia urbana de Garanhuns/PE às desigualdades sociais, artigo de autoria de Roseane Amorim da Silva e Jaileila de Araújo Menezes, mostra como jovens da periferia se fazem resistência a situações de desigualdades de gênero, classe e raça, a partir de uma pesquisa realizada em uma escola da periferia do município, pautada em uma análise interseccional dos referidos marcadores. José Francisco Greco Martins, no artigo A busca do lugar no mundo, em um mundo sem lugar para os mais pobres: o despejo da favela Jardim Maria Virgínia, problematiza práticas sociais no espaço da favela em dois momentos históricos, desvelando contrastes e continuidades entre os dois momentos, marcado pelo cotidiano instável e identificado por violência, medo e silêncio.

Duas Resenhas constam neste número. A primeira é sobre o livro "O que os animais nos ensinam sobre política" (Brian Massumi), resenha de autoria de Pedro Augusto Papini e Rodrigo Shames Isoppo. A segunda, de autoria de Henrique Araujo Aragusuku, é acerca da obra Políticamente: Contribuciones desde la Psicología Política en Argentina, organizada por Silvina Brussino, que reune pesquisas realizadas pela "Equipo de Psicología Política" da Universidad Nacional de Córdoba (UNC).

Este número também integra uma seção especial de artigos aprovados na chamada COVID 19 e Biopolíticas que apresentamos no número anterior da Revista. Assim relembramos que os trabalhos agora publicados procedem a uma análise da dimensão biopolítica da pandemia do COVID 19 e introduzem um olhar psicossocial sobre o tema. Remetemos para o editorial do número anterior (http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-549X2021000200001&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt), onde são analisadas de forma panorâmica as principais linhas de força desta perspetiva. Assim, na continuidade deste número especial, publicamos mais 4 artigos recebidos no âmbito desta chamada.

O trabalho Inumeráveis e pandemia: a memória como resistência à quantificação da vida, de Gerusa Morgana Bloss e Lucas de Oliveira Alves, analisa projetos memorialísticos como os de Ai Wei Wei e o projeto Inumeráveis no Brasil como contraposição à lógica da quantificação das vidas, no quadro da gestão biopolítica da pandemia no Brasil. O texto seguinte Entre vírus e humanos: a responsabilidade como resposta diante do SARS-CoV-2, de autoria de Caio Henrique de Mendonça Chaves Incrocci, Adriano Beiras e Maria Juracy Filgueiras Toneli, aborda as ficções humanas produzidas em relação aos vírus, analisando a relação humano-virus, recorrendo ao trabalho de Donna Haraway e de Ailton Krenak, incorporando os debates sobre antropoceno e suas narrativas auto-indulgentes e desresponsabilizantes.

O artigo de Regina Marques de Souza Oliveira intitulado Protagonismo negro e indígena na ciência e na COVID-19: observações da psicologia, procede a uma análise crítica das epistemologias clássicas na produção de conhecimento científico que não integram a dimensão de engajamento social. Também nestas áreas, o protagonismo negro e indígena faz-se sentir, apesar da conivência de muitos saberes científicos com a exclusão e invisibilidade da produção de pessoas negras e indígenas. A autora fornece uma reflexão sobre a forma como a psicologia pode oferecer contribuições importantes para reavaliar o engajamento político das ciências no quadro do genocídio e violências exercidas sobre populações vulneráveis no Brasil. Rafael Silva dos Santos, Cássio Calyton Martins Andrade, Deyse Cristina Valença Guedes, Mateus Felipe Otaviano Pedro e Jáder Ferreira Leite, com o texto Mobilização política em tempos de pandemia: a atuação do MST em foco, distinguem entre ações de promoção e prevenção em saúde; ações de solidariedade; ações artísticas e culturais; e ações de enfrentamento e articulação política, mostrando a diversidade de formas de ação política que o movimento desenvolve neste tempo de pandemia.

Estes trabalhos nos ajudam a entender as dimensões biopolíticas da gestão da pandemia, analisando formas de saber-poder que justificam determinadas dimensões de violência e extermínio ou discursos sobre a doença, o vírus e sua gestão, mas sem descurar as ações de resistência a estes poderes. Agradecemos mais uma vez às autoras/es e às/aos pareceiristas que tornam possível a publicação desta reflexão sobre as biopolíticas do COVID-19.

Desejamos a todes uma excelente leitura!

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