INTRODUÇÃO
A memória política do movimento social de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneras/os (LGBT)1 tem contribuído com a construção de um cenário de lutas em nossa história contemporânea, ressignificando aspectos da construção de nossos corpos e identidades político-sociais. A construção das análises neste artigo está relacionada também a esses campos de embate que formulam sobre a história de nossas subjetividades, elementos a partir dos quais podemos nos referir quanto às experiências e vidas das diversidades de lutas por direitos humanos no país.
Neste sentido, também vemos que há uma escassez de informações sobre o movimento LGBT em Pernambuco em seu processo formativo inicial. Ainda que sej a mencionado de forma constante em publicações destinadas ao tema, como nas produções de Michele Conde (2004), Victor Mariusso (2011) e Rodrigo Cruz (2015), encontramos escasso material sobre o Grupo de Atuação Homossexual (Gatho) de Recife e Olinda. O Gatho foi um grupo que teve importância definitiva para a construção dos processos de institucionalização do movimento LBGT em Pernambuco, além de que retomar essas memórias contribui para o nosso campo de estudos em gênero, masculinidades e memória na Psicologia e áreas afins. Por isso, temos por objetivo no presente artigo analisar como a mídia jornalística dos anos 1980 apresenta as demandas políticas dos primeiros investimentos do Gatho para a institucionalização do movimento LGBT em Pernambuco.
Para isto, traçaremos inicialmente aproximações à literatura sobre o movimento LGBT no processo de redemocratização do país, destacando aspectos que retomam as principais dinâmicas e jogos de força que atuaram naquele período para a institucionalização deste movimento social. Em seguida apresentaremos os nossos materiais de pesquisa e o percurso metodológico que efetivamos, para, somente depois, apresentarmos os resultados e as discussões que formulamos sobre os repertórios narrativos encontrados em matérias de jornais2 da década de 1980 mencionando o Gatho.
Deste modo, poderemos vislumbrar a forma como as lutas por direitos humanos de pessoas LGBT foram sendo efetivadas e institucionalizadas em Pernambuco, considerando o contexto de abertura democrática do Brasil. Além de considerarmos como a articulação entre outras pautas políticas e sociais de diversos outros movimentos sociais com as do Gatho possibilitaram a organização política de pessoas homoafetivas ainda na década de 1980 em Pernambuco.
O PROCESSO DE REDEMOCRATIZAÇÃO DO PAÍS E O GATHO
De acordo com Guilherme Vergili (2016), os movimentos sociais passaram a ser não só o local de origem das principais contestações culturais, como também, um espaço para representá-las na sociedade moderna, a exemplo do movimento LGBT. No Brasil, auxiliaram a criar e a fomentar uma nova mentalidade na população, ao tempo em que traziam para o centro do debate a discussão de uma outra cultura política de base, passando a serem não apenas um espaço para criação de contestações culturais, mas também de como representar esses movimentos socialmente, a partir da centralidade do conceito de igualdade no debate político nacional.
Segundo Rodrigo Cruz (2017), no Brasil, o movimento homossexual surge no final dos anos 1970, seguindo as lutas pela democratização do país, quando foi possível ver o aumento significativo da mobilização dos movimentos sociais contra o regime militar. Esses grupos pioneiros, apesar de suas singularidades, convergiam em um ponto central, seu teor libertário. Apresentavam-se como grupos independentes com relação ao Estado e a partidos políticos, como também se opunham a modelos de organização verticalizados. Por esse motivo, construíram maneiras de se gerir de forma participativa e coletiva. Suas principais pautas de luta abarcavam o livre exercício da sexualidade e a crítica às relações monogâmicas, ao mesmo tempo em que indicavam a necessidade de superar padrões hierárquicos sociais, principalmente aqueles relacionados a questões sexuais e de gênero.
Como marcador, tem-se que, efetivamente, o início da organização política do movimento LGBT no Brasil foi a partir da criação do ‘Grupo Somos’, em 1978. Apesar de haver registro anterior sobre a efervescência de iniciativas voltadas a esse público, com a criação do periódico Snob, de 1968, se percebe que ele ainda não trazia em seu bojo um caráter de luta política. Já os últimos anos da ditadura foram marcados pelo surgimento de diversos movimentos sociais que combatiam a repressão tanto política quanto cultural. Surge nesse ínterim o jornal Lampião da Esquina, como um dos movimentos de contracultura das décadas de 1960 e 1970, considerado o primeiro veículo de distribuição em massa voltado para o debate sobre direito das minorias e, em especial, da homossexualidade, como nos diz Rodrigo Moretti-Pires, Zeno Tesser-Júnior e Douglas Kovaleski (2018), cuja proposta vinha trazendo a contestação e a crítica ao autoritarismo, tanto no âmbito das instituições políticas quanto na própria sociedade de forma ampla, conforme pontua Gustavo Santos (2016).
Dessa maneira, existe uma associação muito forte entre as reivindicações da esquerda brasileira e as pautas de grupos ditos minoritários, dentre os quais se destaca o movimento LGBT. Porém, nos anos em que o movimento homossexual começou a se institucionalizar, transpor as pautas defendidas por esses primeiros grupos organizados para um âmbito de política institucional encontrava muitas barreiras.
Se o próprio movimento avaliava que suas pautas ficariam invisibilizadas em meio às outras lutas dos partidos de esquerda, por outro viés, estes partidos não consideravam as reivindicações dos homossexuais como sendo de relevância para sua luta política. Cabe reforçar que, segundo alguns autores, a esquerda internacional condenava a homossexualidade, chegando a acusar e denunciar um suposto desvio da luta trabalhadora contra sua pauta considerada mais importante: a luta contra o capitalismo (Santos, 2016).
Cruz (2017) ainda nos indica que nesse primeiro momento - fim da década de 1970 e sequente década de 1980 - fora registrada uma divisão das pautas de ações coletivas relacionadas ao movimento homossexual em dois lados principais: um que bebia do movimento anárquico, contracultural, que desacreditava no Estado e partidos políticos, mantendo preocupação com a “desconstrução de hierarquias sociais e focada exclusivamente nas questões referentes aos homossexuais” (p. 249); e o segundo, que apresentava menor rejeição no que diz respeito aos partidos políticos, tinha “maior inclinação à ação externa, prezava pela criação de estruturas organizativas mais ou menos hierarquizadas e mostrava-se mais aberta à construção de alianças com outros movimentos sociais” (p. 249).
O que é possível observar, inicialmente, é que existiu uma potencialização dos movimentos nos estados do Sudeste. O Rio de Janeiro passou a ser considerado como um grande polo no qual seria possível acolher e fomentar espaços de discussão e articular ações de forma mais organizada e contundente. Como nos apontam James Green e Renan Quinalha (2015), existia um tipo de apropriação territorial pelos homossexuais desse período, como estratégia de vida e sobrevivência, fazendo com que essa região se tornasse bastante visibilizada.
O Rio de Janeiro continuava sendo uma cidade importante política e culturalmente, mesmo depois da inauguração de Brasília em 1960, mantendo-se como um polo de atração para quem buscava as oportunidades oferecidas por uma metrópole dinâmica e diversa. Para uma pessoa jovem que sentia desejos por outra pessoa do mesmo sexo ou que não se adaptava aos padrões de gênero associados ao seu corpo, a “Cidade Maravilhosa” servia com um grande refúgio. Era uma destinação para pessoas expulsas das suas casas em Aracaju, Porto Alegre, Curitiba ou Campos quando os pais descobriram a sua orientação sexual ou não concordaram com a sua apresentação de gênero. A metrópole do anonimato oferecia um abrigo para pessoas que sofreram as fofocas dos vizinhos, as piadas dos seus colegas ou o afastamento dos seus parentes por serem “diferentes”. Em 1960, o Rio de Janeiro representava um espaço longe do controle familiar, onde era possível viver relativamente livre da desaprovação social entre desconhecidos numa cidade com 4 milhões de habitantes. (Green & Quinalha, 2015, pp. 3-4).
No início da década de 1980, há o início da desarticulação do movimento homossexual em São Paulo, ocorrendo um deslocamento para o roteiro Rio - Nordeste. Nesse momento, vimos a crescente do protagonismo de dois grupos que se tornariam referências nacionais por décadas à frente: Grupo Gay da Bahia (GGB) e o Triângulo Rosa, do Rio de Janeiro, com a participação de João Antônio Mascarenhas, presidente deste último grupo, na Assembleia Constituinte (1987/88). Também nessa época, o movimento homossexual, chamado de segunda onda, começa a se articular mais fortemente com os partidos de esquerda, inclusive com o lançamento das primeiras candidaturas assumidas no RJ e em SP, com Herbert Daniel e Batista Breda. Porém, essa aproximação entre esquerda e movimento LGBT ainda não estava tão consolidada durante a década de 1980, se fortalecendo nas décadas posteriores (Santos, 2016).
Em contraste, quando tentamos dialogar sobre o processo de institucionalização política em nossa região, pouco, ou quase nada, é localizado na literatura estudada. O Gatho surge de forma muito tímida, até mesmo apagada, nesse cenário e nas matérias jornalísticas objetos desse estudo, nos dando pistas para uma possível invisibilização dos movimentos no contexto Nordeste – Pernambuco.
Ao considerarmos as articulações efetivadas pelo Gatho no contexto local de Recife e Olinda na década de 1980, questionamos sobre a centralidade e a visibilidade das Regiões Sul e Sudeste no período de institucionalização do movimento LGBT no país, ao mesmo tempo em que problematizamos a forma como tal visibilidade produziu um certo apagamento das memórias das lutas coletivas do movimento na Região Nordeste, especialmente de Pernambuco.
Assim, dialogaremos sobre esses diferentes vieses que surgem quando falamos em organização, articulação e institucionalização dos movimentos homossexuais, com base nas narrativas e discursos apresentados na mídia jornalística dos anos de 1980, especialmente no que tange à atuação do Gatho como grupo pioneiro no Recife. Nessa leitura, estamos articuladas em uma análise que participa da construção de conhecimento em psicologia social crítica, à luz das contribuições dos estudos feministas, especialmente quando articulada à visibilidade de saberes e práticas contra-hegemônicas.
A expressão “psicologia social crítica” aqui adotada dialoga diretamente com as reflexões pós-construcionistas de Lupicínio Íñiguez-Rueda (2005), para quem uma “psicologia social crítica” seria a consequência da necessária problematização histórica sobre as práticas de produção de conhecimento científico, em aliança às contribuições da epistemologia feminista (especialmente sobre conhecimento situado), dos estudos sociais da ciência e da tecnologia da performatividade. Esse movimento, que o autor define como “paisagem pós-construcionista”, se inscreve no “projeto/tentativa de permeabilização das disciplinas sociocientíficas, tornando-se um magma informe que impregna lugares e recantos no campo genérico das ciências humanas e sociais” (p. 6).
Tal abordagem, do nosso ponto de vista, corrobora com as reflexões sobre gênero a partir de uma matriz feminista propostas por Benedito Medrado e Jorge Lyra (2008) para quem a leitura sobre o sistema sexo/gênero não pode reificar a dicotomia natureza-cultura. Ao contrário, deve buscar compreender “os usos e efeitos que práticas sociais, inclusive as científicas, produzem a partir do exercício constante de oposição ou de busca de similitude entre os dois sexos” (p. 818).
Corrobora também com as leituras de Sofia Neves e Conceição Nogueira (2005), a partir de uma postura feminista crítica, segundo a qual “uma análise reflexiva da investigação científica e social parte do princípio de que o conhecimento é sempre e forçosamente moldado por quadros de referência sócio-políticos” (p. 411). Neste sentido, as teorias e metodologias feministas rompem com projeto moderno de neutralidade e as configuram como reflexivas, pois implicam que haja o reconhecimento de aspectos sociais, históricos e políticos na construção do conhecimento, além do envolvimento do/a pesquisador/a no seu fazer ciência, bem como em seus discursos, práticas e lugares.
CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA E OS REPERTÓRIOS NARRATIVOS EM JORNAIS DA DÉCADA DE 1980
A partir de Mary Jane Spink, Benedito Medrado e Ricardo Méllo (2014), podemos compreender que a pesquisa é um labor artesanal, e que se não prescinde da criatividade, se realiza fundamentalmente por uma linguagem fundada em conceitos, proposições, métodos e técnicas, linguagem esta que se constrói com um ritmo próprio e particular. Para estas/es autoras/es, metodologia é o caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade, uma vez que inclui as suas concepções teóricas, o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da realidade e o potencial criativo do investigador.
A partir das considerações teórico-metodológicas de Maria Cecília Minayo, Simone Assis e Edinilsa Souza (2005), Jorge Lyra e Benedito Medrado (2010), bem como de Medrado e Lyra (2015), teceremos o desenvolvimento dos procedimentos metodológicos adotados para elaboração desta pesquisa. Nesse sentido, apontaremos nossas escolhas e justificativas, bem como etapas ou estratégias empregadas para que fosse possível desenhar essa trama articulada. Importante sempre destacar que essa construção se deu de forma coletiva, em constante diálogo com os pares do nosso grupo de pesquisa, nos moldes de uma triangulação metodológica de pesquisadores/as.
Inicialmente, é preciso dar destaque ao fato de que nossas leituras são pautadas por uma perspectiva feminista sobre o fazer científico. Como já nos indica Donna Haraway (1995, p. 31), todos os conhecimentos são histórica e socialmente situados e, por isso, são parciais, logo, o “feminismo tem a ver com uma visão crítica, consequente comum posicionamento crítico num espaço social não homogêneo e marcado pelo gênero”. Entendemos, então, que tudo aquilo que produzimos também falam sobre nós, dos nossos lugares, olhares e vontades; fala sobre (mas não se limita a) aquilo em que acreditamos. A subjetividade é intrínseca à produção científica e se efetiva no encontro com a alteridade: os pares e a comunidade científica. Reativamos assim a metáfora proposta anteriormente por Spink, Medrado e Méllo (2014), para quem a pesquisa científica pode ser compreendida como um labor artesanal.
Pedro Bicalho, Kely Magalhães, Luan Cassal e Janaína Geraldini (2012) afirmam que não devemos considerar a existência de neutralidade do pesquisador, pois as escolhas que definem o objeto de estudo, método, campo e referencial teórico falam diretamente sobre nós, dessa forma, devemos nos considerar “como sujeitos mergulhados no mundo, atravessados por sua história e seu presente, e envolvidos (ou não) com os efeitos de sua produção de conhecimento no mundo” (p. 269). E, ainda, que “nossa aposta é o ato de pesquisar como prática política ... no sentido de não aceitarmos hegemonias simplesmente por estarem naturalizadas” (pp. 266-268).
Neste sentido, o pressuposto metodológico que aqui usamos busca, em diálogo com Mary Jane Spink (2010, p. 11), levar para a pesquisa uma postura “desreificante, desnaturalizante, desessencializadora que radicaliza ao máximo a natureza social do nosso mundo vivido e a historicidade de nossas práticas”.
Nossa aproximação inicial com os materiais utilizados neste artigo se deu pelo contato direto com um dos integrantes do Gatho, em entrevista realizada em meio à pandemia de Covid-19. Considerando as normas sanitárias tão imprescindíveis à nossa segurança, ela se deu de forma remota, por videoconferência, tendo participação ativa da maioria das integrantes do grupo de pesquisa.
Na ocasião, o interlocutor apontou sobre o histórico desse coletivo, nos dando uma dimensão política, estética e social de como o grupo se comportava. Além de falar sobre a atuação, também nos deu pistas e caminhos para que pudéssemos localizar outros interlocutores, bem como materiais publicados por eles durante seu ativismo nos anos 80 e 90 do século 20.
Somado a esse diálogo potente e enriquecedor, nossos esforços se direcionaram então para a busca desses materiais, compreendendo serem os documentos fundamentais para o desenvolvimento desta pesquisa. Entendemos que documentos de domínio público são quaisquer materiais que sejam disponibilizados publicamente, produtos sociais tornados públicos, como panfletos, jornais, revistas, livros, relatórios impressos ou publicados em sites, portais, ou qualquer outro meio eletrônico onde o material pode ser acessado de forma livre e registrado de alguma forma, conforme nos propõem Peter Spink (2013) e Peter Spink, Maria Auxiliadora Ribeiro, Simone Conejo e Eliete de Souza (2014). Seguindo ainda pelas contribuições propostas por estas últimas autoras e autor, podemos afirmar que nossa pesquisa foi realizada “com toda e qualquer matéria escrita produzida para a leitura e o uso pelo público em geral ou para um público específico” (p. 207).
E nesse caminho seguimos, entendendo que os achados também vão nos direcionando para a construção de novas formas de trabalhar e fazer pesquisa, nem sempre linear e com um formato fechado, e entendendo que “trabalhar com aquilo que é público, incluindo torná-lo público, implica também uma postura ativa em relação ao tornar também mais público” (Spink et al., 2014, p. 214). Ou seja, há um chamado, diríamos até uma exigência, para que nosso fazer em pesquisa consiga tornar as informações mais acessíveis, no sentido de dar visibilidade ao tema e convidar as pessoas, no mínimo, à inquietação.
A partir das indicações apontadas por nosso interlocutor, componente do Gatho, foi realizada pesquisa na Hemeroteca Digital Brasileira, e no acervo da Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), além de buscas no Google, onde localizamos 31 (trinta e uma) matérias jornalísticas que apontavam o Gatho de alguma forma em seu texto. Nas buscas, foram utilizados como descritores e palavras-chave as expressões Grupo de atuação homossexual, bem como a sigla GATHO. É importante ressaltar que todas as matérias selecionadas são disponibilizadas em acervos digitais, e não tivemos acesso a outras fontes por conta do isolamento social decretado em função da pandemia de Covid-19. Dessa maneira, não conseguimos acessar reportagens de outros jornais, que se encontram apenas no acervo físico da Biblioteca Pública do estado de Pernambuco.
Além disso, o acervo disponibilizado na Hemeroteca Digital Brasileira limita-se a parte das edições do jornal, cujas matérias utilizamos majoritariamente dele. Tal limite do acervo também restringe o número de reportagens possíveis de serem acessadas. Não obstante, por serem registros fotográficos das páginas do jornal, existe a possibilidade de que o sistema de busca não tenha conseguido identificar as palavras-chave pesquisadas. O acervo da Cepe também contempla poucas edições dos jornais pernambucanos, dos quais somente um circulava na década de 1980, e apenas até o ano de 1985, no qual apenas uma matéria com citação ao Gatho foi localizada.
Durante o processo de busca de menções ao Gatho, nos deparamos com erros de grafia do nome do grupo, ou a ausência da sigla e uso do nome completo, Grupo de Atuação Homossexual. Por conta disso, foi necessário repetir a pesquisa duas vezes, variando a palavra-chave entre sigla e nome completo, o que resultou em cinco novas ocorrências não localizadas na primeira busca realizada na Hemeroteca Digital. Apesar de utilizar os mesmos procedimentos no acervo da Cepe, não encontramos novos resultados.
Inicialmente, utilizaríamos apenas matérias veiculadas em jornais do estado de Pernambuco, entretanto, considerando o pouco número de menções localizadas, além da relevância das matérias que encontramos em jornais de outros estados, optamos por abranger mídias jornalísticas de todo o país. Cabe salientar que, mesmo abrindo nosso leque, a maior parte das reportagens se concentrou em um veículo de comunicação pernambucano, considerando o acesso por meio da internet.
Após localizadas as reportagens, fizemos um exercício de aproximação e construção de nossas impressões iniciais frente ao material. Todas as matérias foram lidas pelo grupo e organizadas em uma tabela, na qual consideramos algumas linhas iniciais de interpretação acerca do conteúdo, de maneira menos sistemática, mas como uma visão mais ampla acerca dos conteúdos como um todo. Assim, nos detivemos ao que era possível observar em primeira leitura, como elementos gráficos, aspectos estéticos, teor da matéria e principais atores e atrizes mencionados(as). Foi possível visualizarmos, também, elementos iniciais como sistematicidade e fluxo de publicação.
De maneira concomitante, alguns integrantes do grupo organizaram todas as reportagens em uma tabela classificada por data de publicação de maneira crescente, identificando o nome do jornal, a coluna ou seção de publicação, o autor, se havia imagens e outros elementos não textuais, e a quantidade de palavras, tanto da reportagem quanto da coluna.
A partir de então, foram feitas escolhas metodológicas, relacionadas à divisão de eixos e de explanação das matérias que organizamos, para que tornasse o trabalho coletivo mais acessível para todas, facilitando o manuseio desses materiais. Com esse procedimento, foi possível, então, elaborar o primeiro quadro de análise das reportagens, no qual identificamos os repertórios sobre sexualidade apresentados em cada um dos materiais, além dos interlocutores apontados, temas e aspectos estéticos identificados. Este quadro de análise foi uma ferramenta importante para a nossa escolha de critérios de inclusão e exclusão das matérias que trabalhamos neste artigo.
Em seguida, a partir dos objetivos definidos para essa pesquisa, foram pensados critérios de inclusão e exclusão das matérias, para alinharmos e trabalharmos com aqueles que, de fato, versassem sobre nosso objeto, uma vez que os conteúdos eram diversos e nem sempre atendiam ao que buscamos investigar aqui. Foram então definidos os seguintes critérios para inclusão das matérias: (a) matérias que apresentem demandas políticas dos primeiros investimentos institucionalizados do movimento LGBT em Pernambuco; (b) matérias que apresentem as principais pautas e especificidades políticas e sociais que o movimento homossexual de Recife articulou nos anos 1980; e (c) matérias que apresentem a articulação dos movimentos sociais com a atuação do Grupo de Atuação Homossexual de Recife e Olinda. E decidimos como critérios de exclusão de matérias os seguintes pontos: (a) - Matérias que não dialogavam com qualquer dos pontos relacionados acima e (b) Matérias em que não fosse possível identificar pontos dos objetivos específicos, por carência de informações. Após esse processo, resultaram 19 (dezenove) documentos selecionados, cuja apresentação, discussão e análise serão feitas em sequência.
O processo de análise se construiu a partir do destaque de discursos que apareciam nos materiais jornalísticos, a fim de identificar repertórios discursivos produzidos e inscritos nas matérias selecionadas sobre o Gatho. A partir dessas operações analíticas, reunindo discursos e colocando-os em relação com os demais repertórios discursivos das matérias jornalísticas, foi possível destacar as repetições, confluências e divergências temáticas apresentadas pelos documentos analisados. Essas estratégias analíticas nos auxiliaram a formular algumas linhas de análise, que permitiram a organização de ideias de maneira sistematizada, que dispomos em: (a) Narrativas contra-hegemônicas do Gatho na mídia jornalística pernambucana, que contextualiza os esforços do Gatho na construção de narrativas contrárias a intensa discriminação sofrida por homossexuais no período de repressão; (b) Os primeiros encontros organizados do movimento homossexual na mídia jornalística, que traz reflexões sobre os modos com os quais a mídia jornalística pernambucana divulgava os primeiros esforços do Gatho na institucionalização do movimento LGBT em Pernambuco; (c) Críticas do Gatho à mídia sensacionalista, que denuncia a forma sensacionalista que a mídia divulgava as discussões sobre homossexualidade da época; (d) Articulação do Gatho com eventos e informativos científicos e integrantes da comunidade acadêmica, que discute as aproximações do Gatho com a comunidade acadêmica, divulgadas a partir da mídia pernambucana.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Ao pesquisarmos eventos históricos relacionados à memória político-social de nossas subjetividades, estamos percorrendo um terreno que nos possibilita conexão com o que fomos, a partir do presente de nossas histórias. Esse percurso de aproximação com materiais produzidos em outro momento histórico nos permite um estranhamento de nossas corporeidades, ao mesmo tempo que requer cuidados e uma visão temporal e espacial daquele período histórico. Estamos mergulhados em uma cosmovisão da década de 1980 no Brasil, período conhecido pela redemocratização do país, após um abismal período de perseguição política na ditadura militar brasileira.
Esse elemento de uma memória que ocorre através do cotidiano e das publicações jornalísticas, permite-nos a retomada de narrativas e discursos que estão relacionados à possibilidade de lembrar e esquecer, mas também ao esquecimento de uma memória de luta que nos trouxe ao que vivemos atualmente. João Trevisan (2018) demarca que a imprensa brasileira da década de 1970 ocupava-se na construção de manchetes homofóbicas, construídas pela produção de calúnias contra homossexuais, relatando-os como repugnantes, perigosos e marginais. A essa construção narrativa das mídias naquele período, o autor chama de tempos de ódio, que logo daria lugar ao que chamou de uma década marcada pela peste do preconceito com a chegada da Aids ao país.
Deste modo, as construções narrativas em jornais da década de 1980 em Recife ainda estavam atravessadas por tais formulações, que costumeiramente atrelavam à homossexualidade estigmas sociais que estavam associados à violência e à marginalidade. No entanto, houve um processo de abertura, ainda que tímida, para a desconstrução dessas narrativas, principalmente a partir das articulações do Gatho, como veremos a seguir.
NARRATIVAS CONTRA-HEGEMÔNICAS DO GATHO NA MÍDIA JORNALÍSTICA PERNAMBUCANA
Nesse período de redemocratização, diversos coletivos de homossexuais passam a construir outras narrativas de confronto contra essas hegemonias narrativas, entre eles o Gatho, que tinha ao seu lado alguns movimentos sociais como o movimento de mulheres e a esquerda, especialmente dimensionada em Recife pelo Partido dos Trabalhadores, e que contribuiu para a institucionalização do movimento LGBT em Pernambuco.
Uma das matérias jornalísticas, com o título “Bonecas: direito ao prazer é fundamental” (Diário de Pernambuco, 16 agosto, 1980), trata de colocar a luta por direitos humanos de homossexuais como elemento fundamental relacionado naquele período aos temas do prazer e do direito ao próprio corpo, configurando em alguma medida aspectos que visam a uma articulação política com outros movimentos sociais, especialmente aqueles que dizem respeito às mulheres, índias/os e negras/os do país.
Em outra matéria, há a acusação de que o movimento de homossexuais de Recife deveria construir um sindicato, trazendo a seguinte manchete: “Era só o que faltava! Sindicato das bichas” (Diário da Noite, 14 agosto, 1980). É provável que tal menção aos sindicatos tenha ocorrido devido à proximidade do Gatho ao Partido dos Trabalhadores, conhecido pela mobilização e luta sindical. Esta menção parece construir um tom que ridiculariza as lutas desse coletivo. Ao que o Gatho responde: “a homossexualidade não é uma profissão” e “homossexuais jamais poderiam constituir sindicato, exceto dentro de suas próprias profissões” (Diário da Noite, 16 agosto, 1980).
Deste modo, continua demarcando suas experiências e a possibilidade de agenciamentos na luta por direitos a partir da construção sistemática da vulnerabilidade desses grupos homoafetivos nas práticas sociais que os definiriam como criminosos e/ou doentes. O Gatho também responde: “além disso, achamos que o sr. Valente está confundindo ação e reação: não é a organização dos homossexuais que irá gerar perseguição policial, e sim a perseguição policial, entre outras, a geradora da necessidade de organização” (Diário da Noite, 14 agosto, 1980).
Nesta medida, a vulnerabilidade aparece como elemento constituinte de uma frente ampla nas pautas de esquerda em Pernambuco, relacionadas à construção de agenciamentos políticos e lutas por direitos de pessoas homoafetivas naquele período, bem como de outros grupos sociais.
No trecho a seguir, que faz parte de uma matéria publicada no Diário de Pernambuco em 1980, podemos visualizar como este coletivo de homossexuais permite a construção de pautas em narrativas que vão se articulando a outros movimentos sociais, tendo como elemento transversal a construção de vulnerabilidade, mas também a ideia de dignidade humana e cidadania, pautas que fazem conexão com esses outros movimentos sociais e que desempenham uma importância vital para as políticas mais à esquerda em Pernambuco e no país.
Crimes envolvendo heterossexuais acontecem todos os dias. Entretanto, a imagem vendida pelos jornais mostra um dado estatisticamente falso, isto é, que homossexualismo gera violência ... O simples fato de relegar o indivíduo a uma condição de inferioridade dentro da hierarquia social deve ser combatido. Os homossexuais, os negros, as mulheres, os índios e os trabalhadores são forçados a uma condição indigna para o ser humano, - afirmam os membros do Gatho. (Diário de Pernambuco, 16 agosto, 1980)
Outra matéria destaca a vinda da escritora e dramaturga brasileira Leila Míccolis ao Recife, bem como sua importância na luta contra o patriarcado. Ainda destaca em algum momento o desejo dela em acompanhar e conhecer o Gatho, descrito como uma associação de homossexuais composta somente por homens.
Ao longo da matéria do Diário de Pernambuco, que diz: “Leila Míccolis: A lucidez feminina ameaça a sociedade patriarcal” (Diário de Pernambuco, 18 de fevereiro, 1981), há menção a aspectos importantes da luta feminista, dentre os quais a luta contra o patriarcado, o esvaziamento das relações familiares, a luta do movimento feminista associado às artes e à escrita de suas experiências. Em um trecho curto é feita referência ao Gatho e ao desejo daquela ativista em conhecer essa associação de homossexuais composta somente por homens. A matéria acaba por construir uma narrativa que procura pensar essas questões da luta feminista e ainda que não avance em uma crítica ao Gatho, menciona-o como um coletivo com composição exclusiva de homens gays. É provável que esse já seja o anúncio de uma certa crítica a essa construção masculina do Gatho, ao mesmo tempo em que parece sugerir a importância dele para a luta e as pautas feministas em andamento.
O que podemos destacar também é que essa construção de narrativas jornalísticas sobre o Gatho articula-se, principalmente, em duas vertentes: a construção das articulações com as manifestações artísticas em Recife e Olinda; e a presença dele em eventos científicos de faculdades e cursos de graduação e pós-graduação em Recife.
A questão artística era retratada tendo em vista a construção de divulgações de eventos nos jornais da cidade, destacando a participação do Gatho em acontecimentos artísticos em Recife e Olinda, normalmente associados às festas carnavalescas, ao teatro e ao cinema, como por exemplo, o ‘Vivencial Diversiones’, retratado no filme “Tatuagem”, de Hilton Lacerda, lançado em 2013. Essa construção de eventos e de uma divulgação de uma agenda política associada às artes nos jornais dos anos de 1980 podem ser pensadas também pela construção sistemática de lutas políticas daquele período de redemocratização do país, bem como através da construção da homossexualidade como um elemento político associado às pautas feministas e dos movimentos à esquerda da agenda política nacional.
Como nos demonstrou Trevisan (2018), a cena artística brasileira durante muito tempo foi construída como espaço para homens, as peças teatrais eram encenadas por homens e não era permitida a presença de mulheres nos palcos, entre outros elementos, devido à baixa reputação dos teatros, retratados pelos estrangeiros que visitavam o país como espaço destinado à prostituição - o que parece ser um exagero, descreve o autor.
A questão é que a cena teatral e artística brasileira foi comumente ocupada pelo que Trevisan (2018) chama de modalidades de travestismo teatralizado, a saber, no Carnaval; como também o travestismo profissionalizado que fora chamado de transformismo, ganhando espaço também nos cinemas brasileiros no início do século XX. De certo modo, essa construção narrativa, relacionada à forma como o Gatho foi associado aos movimentos artísticos em Recife, acaba por retomar a cena política daquele período, a partir dos seus elementos constitutivos relacionados à censura e à perseguição política efetivada pelos militares. E quando consideramos a construção de uma cena política, social e artística em que a presença de mulheres se tornou cada vez mais contundente e marcante em nossas artes nesse período de redemocratização.
Nesta direção também houve uma sistemática parceria entre faculdades e programas de pós-graduação com o Gatho, chamando-o ao debate científico e construindo outros campos de narratividades que retomavam a luta por direitos de homossexuais pela via de uma construção de narrativas científicas sobre suas experiências de vida e homo afetividade. Naquele momento, o discurso científico sobre a homo afetividade estava em vias de desfazer a relação com a criminalidade e a doença. Neste sentido, o palco para tais discussões ocorreram em Recife pela construção de eventos científicos anunciados nos jornais da cidade.
Podemos observar isso em uma matéria que menciona o Gatho, e que tem como título “Cientistas sociais vão debater quadro político”. A matéria diz ainda:
O encontro será encerrado no dia 24, às 20 horas, com uma mesa-redonda sobre ‘As Minorias e os Partidos’, mostrando as relações entre os movimentos negro, feminista, homossexual etc., e os partidos políticos, presidida pela profa. Lia Parente Costa, presidente da Associação dos Sociólogos de Pernambuco. Participaram Inaldete Andrade (Movimento Negro Unificado), Sávio Uchoa Regueira (Grupo de Atuação Homossexual), Lizete Prata (Ação Mulher) e o escritor carioca Herbert Daniel. (Diário de Pernambuco, 30 julho, 1982)
A importância desses relatos ocorre pelo registro da participação do Gatho em eventos científicos na cidade, com a presença de pesquisadoras/es e profissionais de diversas áreas das ciências humanas. Ainda que em alguns momentos a presença dele fosse mencionada como depoimento em meio às falas de especialistas, havia uma composição desses espaços nos jornais da época de maneira que criavam ressonância junto às outras pautas como as do movimento feminista, de pessoas negras e indígenas, bem como com trabalhadores diversos. Desse modo, vemos a construção de uma narrativa que articula movimentos sociais, práticas artísticas e uma discursividade científica que pensa como os corpos homoafetivos podem ser pensados através de pautas relacionadas ao direito ao prazer e ao respeito pelas outras corporeidades.
Ao que nos parece, a articulação do Gatho às pautas identitárias na década de 1980 e à constituição de uma luta política por direitos humanos somada aos partidos à esquerda, especialmente com o Partido dos Trabalhadores, contribuiu de forma irresoluta para a construção de uma luta social atravessada por uma institucionalização do movimento de forma concisa. Esse movimento, iniciado na década de 1980, tem consolidado ao longo dos anos conquistas sistemáticas de direitos para a atual população LGBT de Recife e de Pernambuco, ainda que atualmente este seja um estado em que há um aumento expressivo da violência motivada por questões de gênero e de orientação sexual.
OS PRIMEIROS ENCONTROS ORGANIZADOS DO MOVIMENTO HOMOSSEXUAL NA MÍDIA JORNALÍSTICA
Nas matérias jornalísticas encontradas, percebemos que os jornais eram importante ferramenta de divulgação dos encontros organizados pelo movimento homossexual com participação do Gatho, sejam os eventos que já haviam acontecido, ou os que estavam para acontecer. É o caso, por exemplo, das matérias encontradas que divulgaram o que havia ocorrido durante o “1º Encontro de Grupos Homossexuais Organizados do Nordeste – Eghon” (Jornal da Sexualidade, 1981), realizado em Recife e Olinda/PE, de 17 a 19 de abril de 1981.
Matérias sobre o 1º Eghon foram encontradas tanto no jornal Diário de Pernambuco, destinado à população em geral, como no Auê – Jornal da Sexualidade, destinado à comunidade homossexual. Embora tratem da divulgação do mesmo evento, as matérias apresentam estéticas diferentes. Enquanto a matéria do Diário de Pernambuco apresenta apenas um parágrafo simplório e meramente descritivo sobre o evento, a matéria do Auê é apresentada em quase metade da página e acompanhada de muitos posicionamentos. No Diário de Pernambuco, a narrativa sobre o encontro aponta somente os grupos organizados que compuseram o encontro, o local, a data e o objetivo. Já no Auê, além de ser escrita em primeira pessoa, a matéria traz uma grande riqueza de detalhes, como o motivo do surgimento do 1º Eghon, apresentado na matéria da seguinte forma: “achamos que nós, do NE, deveríamos primeiramente nos conhecer e nos organizar, para poder partir com um certo embasamento para transar o ativismo com nossos irmãos do sul maravilha” (Jornal da Sexualidade, 1981). A matéria traz também as principais deliberações do encontro: (a) criar uma revista chamada bichana, para ser o periódico do movimento homossexual; (b) participar da 33ª edição da reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, com o objetivo de propagar o movimento pelo país; e (c) fortalecer os laços com outros movimentos sociais, como o movimento feminista, o negro, o índio e o ecológico.
A partir disso, percebemos que, apesar da contribuição da matéria jornalística do Diário de Pernambuco em relação à divulgação do encontro, é no Auê, jornal destinado à comunidade homossexual, que o 1º Eghon tem o destaque apropriado diante de sua importância para a institucionalização do movimento LGBT em Pernambuco e no Nordeste. Sobre a importância dos periódicos destinados à comunidade homossexual e LGBT como um todo, Jorge Rodrigues (2018) aponta que estes periódicos constituem grande parte das redes de informações da população LGBT, que experimenta contextos de clandestinidade e invisibilidade. O autor discute ainda a importância destes periódicos para a identidade da comunidade LGBT como um todo, pois proporcionam que as/os leitoras/es se vejam como protagonistas, e não a partir do recorte da culpa e do preconceito, como comumente acontece.
No entanto, nos anos 1980, ainda no início da institucionalização do movimento homossexual, os periódicos destinados à comunidade homossexual não tinham o mesmo alcance que os jornais destinados à população em geral. Desta forma, apesar de divulgar o evento, e não o associar a conteúdos pejorativos, preconceituosos e discriminatórios como faziam outros veículos jornalísticos e/ou midiáticos da época, esta neutralidade do Diário de Pernambuco talvez tenha interferido na veiculação, propagação e viabilização do movimento. Sobre essa neutralidade, percebemos que as divulgações destes eventos pareciam ser um mero cumprimento de obrigação, e nos perguntamos como ocorriam as negociações para estas publicações no jornal. Seriam por reivindicação do próprio Gatho? Ou diante do surgimento dos primeiros esforços do movimento homossexual, em Recife e outras cidades do Nordeste, o jornal se sentia de alguma forma responsável pela divulgação de um evento de vanguarda e polêmico para a época?
Ao divulgar de maneira meramente descritiva e expositiva um acontecimento de forte viés social e político, podemos supor que o Diário de Pernambuco, frente a um assunto que, à época, causaria ainda mais desconfortos e intolerâncias às(aos) suas(seus) leitoras(es) que os tempos atuais, buscava “neutralidade”. Além disso, nas matérias que encontramos, observamos que não só aquelas relacionadas aos encontros organizados do movimento homossexual apresentavam esta suposta neutralidade, mas também aquelas relacionadas ao Gatho e a conteúdos sobre sexualidade de modo geral.
No entanto, como argumenta Benedito Medrado (2013, pp. 205-206), “a edição de uma matéria tem, sempre, em maior ou menor grau, uma intencionalidade, argumentos, uma construção retórica. Em última análise, é impossível informar de modo neutro”, ou seja, esta suposta busca pela neutralidade é, em si mesma, um posicionamento, e que produz efeitos. James Green (2011) discute que a partir dos anos 1970, reportagens em jornais e revistas com grande circulação no Brasil e no exterior foram importantes ferramentas que geraram novas compreensões sobre a homossexualidade.
Neste sentido, pensamos que a falta de profundidade e de posicionamento da mídia tem efeitos na institucionalização do movimento homossexual de Pernambuco, como por exemplo, o evidente apagamento das contribuições do Gatho na história da institucionalização do movimento LGBT no Brasil, observada na literatura científica utilizada neste artigo.
Em uma época de ditadura, censura e repressão, o ideal de bem-estar costumava andar de mãos dadas com ideologias de higienização social. Em torno disto, havia uma concepção de vadiagem associada em geral à permanência nas ruas de pessoas negras sem alguma ocupação, bem como travestis e transgêneros que estivessem nesses espaços públicos. Tal noção era largamente aplicada a pessoas que fugissem às normatizações impostas pelo poder sobre as vidas, era comum o uso de força e truculência sobre os corpos de homens e mulheres cis e trans pobres e negras.
Nesse sentido, Green e Quinalha (2015) afirmam que, em nome da preservação da moral e dos bons costumes, tanto os periódicos que tivessem foco em assuntos ligados à homossexualidade, quanto reuniões de sociabilidade, principalmente nos anos 1970 eram diretamente vigiados e em determinada época proibidos pela ditadura. As tentativas de manter esses eventos eram violentamente combatidas pelas forças militares do regime ditatorial brasileiro.
CRÍTICAS DO GATHO À MÍDIA SENSACIONALISTA
Nas matérias encontradas, observamos muitas críticas do Gatho à mídia sensacionalista. Uma delas é encontrada em uma das matérias anteriormente citadas, publicada pelo jornal Auê, a respeito do 1º Eghon. Na matéria, é apontado que uma das pautas do Eghon foi a discriminação sofrida pelos homos-sexuais nos meios de comunicação. É tecida uma crítica à forma pejorativa e preconceituosa com que a homossexualidade vinha sendo discutida nos meios de comunicação de massa. Outra matéria também se refere ao 1º EGHON, traz como título “Gays nordestinos se reúnem em Olinda” (Jornal Movimento, 17 maio, 1981), o jornal apresenta uma nota assinada por quatro grupos participantes, (Gatho, Grupo Gay da Bahia, Nós Também, de João Pessoa/PB e Dialogay, de Aracajú/SE), que apresenta alguns assuntos, entre os quais, as discriminações sofridas por homossexuais nos meios de comunicação.
Outra matéria encontrada, publicada em 16 de agosto de 1980, traz a seguinte introdução:
Protestando contra o tom sensacionalista de algumas reportagens policiais publicadas recentemente por um jornal da cidade, o Grupo de Atuação Homossexual (Gatho) enviou nota à imprensa, defendendo a tese de que o direito ao prazer não é parte complementar, mas parte fundamental de um direito mais amplo. (Diário de Pernambuco, 16 agosto, 1980)
A matéria, então, segue criticando a forma com que o jornal se utiliza de homofobia para lucrar e vender mais exemplares. Nesta reportagem, o jornal abre espaço para que o Gatho possa protestar contra as reportagens que têm atrelado a homossexualidade à criminalidade. Na matéria, o Gatho traz uma discussão histórica sobre como a questão da sexualidade foi perpassando vários contextos, da criminalidade à doença mental, por exemplo.
Neste momento, deparamo-nos com uma pequena contradição. Ao passo que as produções jornalísticas em que nos debruçamos denunciam o sensacionalismo e a brutalidade com que a mídia tradicional tratava a homossexualidade, os textos jornalísticos encontrados em nossas buscas raramente coincidem com esse comportamento agressivo, sendo observado com mais frequência, descrições sem aprofundamento e notas curtas. No entanto, esta questão é reflexo de dificuldades metodológicas, sobretudo em decorrência da pandemia de Covid-19, pois nosso exercício de busca só pôde ser realizado online, e encontramos apenas 31 reportagens. Não conseguimos ter acesso a um jornal apontado por um dos integrantes do Gatho como o principal autor dessas matérias, o Diário da Noite. Apesar das dificuldades metodológicas e tecnológicas, conseguimos acesso a fotos feitas em 2018, pelo integrante do Gatho que entrevistamos e que ele nos cedeu para ilustrar este artigo, bem como para que pudéssemos ter acesso às matérias, pois infelizmente este periódico, além de não mais existir, não está digitalizado nem disponível em hemerotecas digitais, mas é importante tecer os seguintes questionamentos: por que esse material não está disponível como estão os outros? E quais repercussões essa ocultação pode promover em um exercício de análise crítica da história?
Ainda sobre os materiais encontrados, podemos notar que as críticas feitas pelo movimento homossexual não diziam respeito a certo sensacionalismo ou exagero por parte desses jornais, mas sim da construção de narrativas que não condiziam com a realidade. A matéria cita:
Como explicam os homossexuais, o referido jornal tentou relacionar a grande ocorrência de crimes com práticas homossexuais, quando é sabido que tais crimes não se encontram isolados do contexto social e que os protagonistas das violências, na maioria das vezes, são heterossexuais. (Diário de Pernambuco, 16 agosto, 1980)
Para refletir sobre isso, utilizaremos a noção de pauta quente e fria, explicada por Medrado (2013). Segundo o/a autor/a, as matérias jornalísticas se encaixam nestas duas noções, a primeira se refere aos furos jornalísticos e a segunda às matérias que têm como objetivo o desenvolvimento ou evolução de determinado tema. Dito isto, percebemos que as recorrentes notícias que situavam os homossexuais como criminosos se encaixam na noção de pauta fria, pois objetivavam, a partir de suas narrativas, desenvolver a identidade homossexual como criminosa, violenta, e, por isto, abjeta, contribuindo assim para a construção de justificativas para as violências, preconceitos e discriminações homofóbicas, a partir desta associação entre homossexualidade e criminalidade.
ARTICULAÇÃO DO GATHO COM EVENTOS E INFORMATIVOS CIENTÍFICOS E INTEGRANTES DA COMUNIDADE ACADÊMICA
Encontramos duas matérias que discorrem sobre a participação do Gatho no seminário “A Questão Homossexual”, promovido pelo curso de Psicologia da Universidade Católica de Pernambuco. Uma delas, em formato de classificados, objetiva divulgar o evento; para isso, contextualiza a abordagem do tema, divulgando que as discussões serão feitas à luz da psicanálise e da sociologia. Cita psiquiatras e sociólogos palestrantes, informa endereço e datas. Ao apontar que o Gatho estará presente, menciona que será ouvido o “depoimento” do grupo. A segunda matéria encontrada parece seguir o mesmo gênero jornalístico, à exceção da presença de detalhes.
Percebemos, assim, que o processo de institucionalização do movimento homossexual no Recife passa pela presença de seus representantes em espaços acadêmicos, aproximando o debate teórico ao movimento social, fator que é de grande importância para o processo de legitimação deste. Ao mesmo tempo, curiosamente, ambas as matérias utilizam a expressão depoimento para referirem-se à participação do Gatho no evento. Tivemos a impressão de que a expressão aponta para uma ideia de ilustração das narrativas competentes, de complementaridade em relação à discussão científica, cujos temas centrais ainda se concentravam na psicanálise, psiquiatria, antropologia e sociologia. Dessa forma, percebemos a presença de uma noção mais consistente de separação entre academia e movimento social.
Podemos construir uma reflexão acerca dessa aproximação, embora ainda com tons de diferenciação entre movimento social e ciência, considerando que a homossexualidade era considerada uma patologia na Classificação Internacional de Doenças (CID) até o ano de 1990, mais precisamente em 17 de maio de 1990, quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da CID.
De acordo com Rita Rodrigues (2018), essas alianças estabelecidas principalmente com profissionais das áreas de saúde mental poderiam se caracterizar como ferramentas importantes na luta pela despatologização da homossexualidade, pauta que era defendida por muitos grupos homossexuais do final dos anos 1970 e começo dos anos 1980, como o Grupo Gay da Bahia (GGB).
Não obstante, outras duas matérias veiculam informações acerca de eventos dos quais o Gatho participou. No entanto, uma das reportagens, que trata do Encontro Científico de Estudantes de Medicina (Ecem), possui como foco principal a participação do grupo homossexual, as palestras e debates viabilizados por este. Por outro lado, a outra notícia, que trata sobre cientistas sociais e seus debates sobre o quadro político da época, apenas cita o Gatho como participante de uma mesa intitulada “as minorias e os partidos”, cujo tema se debruçava sobre a relação entre os movimentos negro, feminista e homossexual com a política partidária. Destacamos como essa segunda reportagem explicita um movimento comum a vários grupos homossexuais de início e meados dos anos de 1980, de aproximação a debates partidários, notadamente a instâncias de esquerda, na busca de legitimação de suas pautas principalmente no âmbito legislativo (Santos, 2016).
Outras duas notícias do Diário de Pernambuco apresentam discursos do Gatho que explicam brevemente questões acerca da homossexualidade e de aspectos socialmente relacionados a ela, como Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST)3. Em uma dessas reportagens, lê-se uma reprodução de um informativo produzido e distribuído pelo grupo: “NADA A VER. No boletim nº 2 do Grupo de Atuação Homossexual do Recife: A sexualidade, ou seja, o sexo psicológico, não tem nada a ver com o sexo biológico” (Diário de Pernambuco, 5 dezembro, 1980).
Também em um pequeno texto, com o título PROCURA-SE, no mesmo jornal, é veiculada notícia de que o Gatho planeja confeccionar um folder explicativo sobre doenças sexualmente transmissíveis, buscando para tanto alguém que pudesse patrocinar esta produção. Apesar de compreender que os assuntos abordados nestas duas matérias estão vinculados a conhecimentos científicos, e são também apresentados em formato de classificados, há a diferença de que o discurso que está sendo veiculado é do próprio Gatho. E, como discutimos anteriormente, mais uma vez observamos a neutralidade do jornal, que não se posiciona com relação a nenhuma das reportagens referidas.
Outra notícia, em matéria do Diário de Pernambuco de título “gay internacional vem para debate hoje no Varadouro”, informa sobre a vinda de Tjerk Van den Berg, do movimento de libertação homossexual da Dinamarca, à cidade de Olinda para:
conhecer de perto a atual situação dos homossexuais brasileiros”. Argumenta que ele vem estando em contato com grupos homossexuais de várias partes do Brasil, e que o objetivo de sua vinda é “não apenas colher dados para a sua pesquisa, mas também expor suas experiências como grupo apoiado pelo governo dinamarquês. (Diário de Pernambuco, 12 setembro, 1981)
A literatura aponta que um dos fatores de importância para a institucionalização do movimento homossexual no Brasil concentrou-se no fortalecimento da articulação política internacional (Cruz, 2017). Segundo a matéria do Diário, podemos notar que, em alguma medida, o Gatho esteve inserido nesse contexto; é o que a comunicação entre o movimento e o pesquisador e militante dinamarquês nos sugere. Todavia, ao longo do exercício de revisão de literatura, o Gatho raramente ou nunca é mencionado, em contraste aos grupos organizados do Sudeste, que parecem praticamente contar a história oficial do movimento homossexual do Brasil. À exceção do GGB, que esteve envolvido em importantes transformações, pouco se fala sobre o movimento no Nordeste e em Pernambuco, fato que nos despertou para a reflexão: há a possibilidade de estarmos nos deparando com o já familiar processo de apagamento de nossa história?
O surgimento das primeiras iniciativas de associação de homossexuais, a circulação de materiais informativos impressos, expressões artísticas ligadas intimamente ao Carnaval, com bailes, e afins são características marcantes do início do processo de institucionalização do movimento homossexual, notadamente no Rio de Janeiro, conforme afirmam Green e Quinalha (2015). Não obstante, o surgimento dos primeiros esforços de organização de um movimento homossexual pernambucano possui nuances similares, mas não é documentado da mesma maneira, não sendo citado em nenhum dos textos com os quais dialogamos em nossa revisão de literatura.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O movimento LGBT brasileiro, inicialmente marcado pelo movimento homossexual surgido no final dos anos 70, teve seus primeiros passos no contexto de redemocratização, articulado a outros movimentos sociais que lutavam contra o regime militar. A história data uma forte articulação inicial no Sudeste, deslocando-se posteriormente para conexões com a região Nordeste, com a participação de grupos como o Grupo Gay da Bahia, Nós Também, de João Pessoa/PB, Dialogay, de Aracaju/SE e o Grupo de Atuação Homossexual – Gatho, de Recife-Olinda/PE. No entanto, percebemos na literatura científica que consultamos um forte apagamento das evidentes contribuições do Gatho na história do movimento LGBT brasileiro, o que parece estar relacionado à neutralidade com a qual a mídia jornalística Pernambucana apresentava os esforços do grupo.
Durante o percurso, precisamos reconhecer que algumas dificuldades nos acompanharam, tanto de cunho metodológico como analítico, principalmente por conta de adversidades produzidas com a pandemia de Covid 19. Em virtude do isolamento social, a busca das matérias jornalísticas precisou ser realizada de forma online, na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional e na plataforma da Companhia Editora de Pernambuco, não sendo possível a busca por matérias jornalísticas no acervo físico da Biblioteca Pública do estado de Pernambuco. Isso resultou no quantitativo de matérias jornalísticas às quais pudemos nos deter nestas análises, que são em sua grande maioria de um mesmo jornal, o Diário de Pernambuco. Porém, sem qualquer intensão de sermos exaustivos ou de produzirmos uma análise que se pretenda conclusiva, as reportagens encontradas possibilitaram um potente trabalho analítico, dada a complexidade das questões que traziam, no diálogo com a literatura que dispomos.
Além disso, lançamos mão de estratégias metodológicas complementares. Não conseguimos ter acesso a algumas produções importantes, como as matérias preconceituosas e discriminatórias contra os homossexuais aludidas em relatos de ativistas que viveram aquela época, mas tivemos acesso a reportagens em que o próprio Gatho denunciava o preconceito, o sensacionalismo e a violência da mídia nesta época. Segundo um dos integrantes do Gatho, com quem tivemos a oportunidade de conversar e que também assina coautoria deste artigo, o Diário da Noite era um dos principais jornais que publicavam matérias preconceituosas e discriminatórias sobre homossexuais, principalmente para aumentar a venda de seus exemplares, contudo, não conseguimos localizar estas reportagens. Este interlocutor nos informou que o Arquivo Público Estadual Jordão Emerenciano – cujo acesso foi temporariamente suspenso em virtude da pandemia de Covid-19 – dispõe de vários volumes encadernados do Diário da Noite, onde ele localizou matérias de 1980 que faziam referência direta ao Gatho.
Em boa parte das matérias jornalísticas que analisamos, encontramos publicações que se pretendiam neutras – ainda que não acreditemos na possibilidade de neutralidade em veículos midiáticos, pois a neutralidade é, em si mesma, um posicionamento –, talvez pelo receio de abordar um tema que, à época, era ainda mais polêmico e evitado.
Essas matérias eram, em sua maioria, divulgações de eventos do próprio movimento homossexual ou de eventos científicos que contaram com a presença do mesmo, e, apesar de importantes por um lado, pois contribuíram para a apresentação do Gatho e do movimento homossexual para o grande público, por outro, também podem ter contribuído, a partir da omissão, para o evidente apagamento das contribuições do Gatho no movimento homossexual brasileiro.
Nas divulgações sobre esses eventos científicos que contavam com a participação do Gatho, percebemos que embora fossem direcionados à questão da homossexualidade, nas matérias jornalísticas era notória a evidência à comunidade acadêmica em detrimento do Gatho, que teve várias vezes sua participação mencionada como um mero “depoimento”, o que nos leva a questionarmos se de fato a participação do Gatho nesses eventos era pontual ou se as matérias jornalísticas construíam narrativas que inferiorizavam a participação do Gatho nestes espaços.
Algumas matérias jornalísticas também apresentaram alguns esforços do Gatho para desconstruir as noções que estavam surgindo sobre os homossexuais, associando-os a contextos de criminalidade e situando-os como pervertidos por conta de suas sexualidades. Observamos também um esforço do Gatho em relação à conteúdos informativos que explicavam questões como a diferença do que eles chamam ser “sexo biológico” e “sexo psicológico”; o que se tratava por orientação sexual e a importância da luta homossexual.
Por fim, consideramos que apesar das dificuldades vivenciadas pela equipe de pesquisadoras/es no percurso metodológico, sobretudo por estarmos situados em um cenário nunca vivenciado, conseguimos elaborar estratégias criativas para a construção de nossas análises. Avaliamos este trabalho como uma grande conquista, dada as dificuldades e limitações vivenciadas pela ciência brasileira no contexto de Covid-19, não apenas na perspectiva biológica da doença, mas sobretudo política e econômica vivenciada pelo país neste período, novamente em processo de luta por redemocratização. Além disso, percebemos neste artigo uma grande importância histórica, política e social, principalmente para a história do estado de Pernambuco e a produção científica nacional sobre direitos LGBTQIA+, pois, apesar de sua incontestável contribuição nos anos 1980 no movimento homossexual, a partir dos esforços do Gatho, nos livros e demais produções acadêmicas nacionais tem sua história apagada e invisibilizada.