Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. v.3 n.1 Porto Alegre jun. 2004
ARTIGOS
Critério de integração do Teste de Bender: explorando evidências de validade
Integration criterion of Bender Test: exploring its validity evidences
Fermino Fernandes Sisto; Acácia Aparecida Angeli dos Santos; Ana Paula Porto Noronha
Universidade de São Francisco
RESUMO
Este trabalho analisou os critérios de Koppitz para avaliar a integração das figuras do Bender e seu caráter evolutivo. Os participantes foram 314 escolares de ambos os sexos, de 7 a 10 anos. Os dados foram coletados por estudantes treinados, de graduação e pós-graduação, que davam instruções e auxiliavam os alunos para realizar o teste. Os resultados indicaram baixa correlação entre idade e número de erros. Entretanto, apenas dois grupos etários foram diferenciados significativamente pelo teste de Tukey mesmo quando as correlações e análises de variância foram significativas. A análise das correlações item-total mostrou problemas de ajustamento, já que apenas duas medidas apresentaram relação significativa com a pontuação total.
Palavras-chave: Teste de Bender, Parâmetros psicométricos, Sistema de avaliação de Koppitz.
ABSTRACT
The present paper analyzed the Koppitz criteria to assess integration of Bender's figures and its evolutional characteristics. The participants were 314 school children of both genders, 7 to 10 old. Data were collected by trained graduate and undergraduate students who instructed and helped the children to perform the test. The results showed low correlations between age and number of errors. Even though the correlations and the analysis of variance were statistically significant, the Tukey test found significant differences only between two age groups. The item-total correlations showed problems of fit, because just two measures correlated significantly with the total score.
Keywords: Test of Bender, Psychometric properties, Koppitz's evaluation system.
Critério de integração do Teste de Bender: Explorando evidências de validade
O Teste Gestáltico Viso-Motor de Bender foi criado por Lauretta Bender em 1938, tendo como referência os desenhos elaborados por Wertheimer em 1923. Foram selecionadas nove figuras consideradas por ela como as mais representativas para avaliar a ação sensório-motriz. Para a autora, a habilidade sensório-motora pode variar com o padrão de desenvolvimento, nível maturacional do indivíduo e de acordo com o seu estado funcional.
Bender (1938) usava os cartões com finalidade clínica e não criou um sistema objetivo de correção que pudesse atribuir pontuações aos desenhos, avaliando-os apenas de maneira qualitativa. Se, por um lado, isso dificultou a utilização do instrumento, por outro, permitiu que diversos pesquisadores estudassem propostas de correção/interpretação dos desenhos, alguns deles passíveis de quantificação. Quanto aos principais sistemas de correção criados Field, Bolton e Dana (1982) destacaram que entre as décadas 50 e 60 foram desenvolvidos pelo menos oito sistemas, a saber, Billingslea, Hutt, Kitay, Koppitz, Pascal-Suttel, Pauker, Hain e Peek-Quast. Além desses, outros são conhecidos no cenário brasileiro como o de Clawson (1982), o de Santucci e Pêcheux (1981) e o de Puente e tentou preencher uma lacuna existente na literatura em relação à utilização do Bender com crianças.
Tendo por base o caráter evolutivo associado à aprendizagem das funções gestálticas viso-motoras, Koppitz (1963, 1975) procurou distinguir dentre as distorções ocorridas nos desenhos, aquelas relacionadas à imaturidade perceptiva e aos fatores emocionais. A autora apoiou-se no pressuposto de que o comportamento viso-motor preciso é uma habilidade que poderia ser alcançada pelo uso de padrões complexos, que exigiriam a utilização de princípios específicos de organização.
A construção da escala ocorreu com base na seleção de 20 categorias iniciais de pontuação, a saber, distorção de forma, rotação, rasuras, omissões, ordem confusa, superposição das figuras, compres-são, segunda tentativa, perseveração, círculos ou traços em vez de pontos, linha ondulada, desvio na inclinação, traços ou pontos em vez de círculos, achatamento, número incorreto de pontos, quadrado e curva que não se juntam, ângulos na curva, omissão ou adição de ângulos e moldura nas figuras. Após as análises iniciais, foram mantidas as categorias que se mostraram estatisticamente significativas.
No total, o sistema inclui 30 itens, divididos entre as categorias de 'distorção de forma', 'integração', 'rotação' e 'perseveração'. Alterações em cada uma destas categorias são pontuadas, significando que uma alta pontuação indica um desempenho pobre, enquanto uma baixa pontuação é qualificada como um bom desempenho. Dada a dificuldade que este tipo de avaliação proporciona, a autora alerta para que sejam computados apenas os casos em que haja desvio evidente. Assim, sugere que, no caso de dúvida, não se deve atribuir pontuação.
As normas elaboradas por Koppitz foram obtidas tendo como a referência a aplicação de seus cartões em uma amostra de 1104 crianças de 20 escolas públicas diferentes. As crianças tinham entre 5 e 10 anos 11 meses e a aplicação se deu de maneira individual, sendo que todos os protocolos foram corrigidos pela autora. A validade foi investigada por meio da verificação da sensibilidade do instrumento e os resultados indicaram que ele é adequado de idade em idade, dos 6 aos 10 anos. A precisão da escala maturacional foi investigada por Koppitz (1975) por meio da técnica do teste-reteste. Foram encontradas correlações entre 0,55 e 0,66, consideradas estatisticamente significativas ao nível de p=0,001, pela autora. No entanto, há que se considerar que essas correlações, pautando-se no critério de Prieto e Muïïiz (2001) pode ser considerada apenas adequada com algumas carências, ou seja, abaixo da aceita como boa (0,75 a 0,80).
Valendo-se da técnica de precisão entre três especialistas, Neale e McKay (1986) obtiveram um alto índice de correlação geral com os critérios de Koppitz (1975). No entanto, encontraram problemas relacionados ao julgamento de erros de angulação em algumas figuras. Além disso, identificaram que os erros mais discriminativos foram os relacionados à integração, distorção e substituição nas figuras.
Outros estudos têm apontado o Bender como um instrumento válido para a avaliação do desenvolvimento percepto-motor. Nesse sentido, alguns deles têm demonstrado a existência de correlação significativa entre os escores do Bender e outros testes de avaliação percepto-motora, de inteligência e de personalidade (McCarron & Horn, 1979; Sohlberg, 1986; Harper, 1998).
Mazzeschi e Lis (1999) trabalharam com 1065 crianças italianas de 3 anos e 5 meses a 11 anos e 4 meses. Focalizaram especificamente os erros de cada desenho e sua relação com a pontuação geral resultante da soma dos erros em todas as figuras seguindo a classificação de Koppitz (1975). Além disso, buscaram identificar possíveis influências culturais em sub-grupos de várias regiões do país e de diferentes etnias. Os resultados indicaram que a média de erros diminuiu à medida que a idade aumentou e que não havia diferença significativa, considerando-se os aspectos étnicos, regionais ou sócio-culturais. Com resultados semelhantes estão os achados de Arrillaga, Eschebarria e Goya (1981), Moura (1982), Kroeff (1988, 1992) e Jing, Deqing e Longhui (2001) que apontaram o teste como sensível para diferenciação das idades.
Embora o Bender seja um dos instrumentos mais usados em âmbito nacional ou internacional também sofreu críticas contundentes. Buckley (1978) apontou que faltam evidências de validade para muitos dos usos para os quais é indicado, como por exemplo, para a predição de rendimento escolar ou problemas neurológicos. Outros autores questionaram o valor dos critérios de correção utilizados, afirmando que há limitações na interpretação da pontuação obtida, com conseqüentes problemas para sua utilização no diagnóstico neuropsicológico, bem como na identificação de aspectos desenvolvimentais (Lacks & Newport, 1980; Taylor, Kauffman & Partenio, 1984; Shapiro & Simpson, 1995). Em razão de dificuldades detectadas na utilização do sistema de classificação de Koppitz para captação de diferenças entre crianças da faixa etária para a qual o teste foi destinado, Brannigan, Aabye, Baker e Ryan (1995), Moose e Brannigan (1997) e Brannigan e Brunner (2002) têm trabalhado numa versão modificada do teste, bem como na proposta de um outro sistema de avaliação.
Puente e Maciel Jr. (1984) discordaram do sistema de avaliação quantitativo do instrumento, afirmando que os critérios foram capazes apenas de uma avaliação em termos de normalidade/anormalidade. Os autores defenderam uma avaliação qualitativa, associada à quantitativa, que permitiria um diagnóstico mais completo. Moura (1982) afirmou que a percepção visual e a expressão motora, por serem fatores independentes, deveriam ser avaliadas separadamente. Anteriormente, Rie, Rie, Stewart e Rettemnier (1980) já haviam identificado, com a utilização do Bender em crianças com problemas de aprendizagem, a existência de dois fatores neurocognitivos distintos, relacionados à integração verbal-motora e viso-motora.
O estudo realizado com 398 crianças do estado no Rio de Janeiro por Britto e Santos (1996) apontou que o teste de Bender foi válido para identificar aspectos psicopatológicos. No entanto, recomendaram cautela na utilização das normas propostas para a discriminação de variáveis relacionadas à idade e ao gênero aqui no Brasil. No mesmo sentido, o estudo desenvolvido por Sisto, Noronha e Santos (2003) com crianças das séries iniciais do ensino fundamental forneceu correlação negativa entre idade e deformação em algumas figuras, o que era esperado, pois conforme aumentou a idade, diminuiu a intensidade da deformação. Nada obstante, os resultados não foram os esperados para uma medida sensível ao caráter maturacional do desenvolvimento infantil. Além disso, os valores de alfa indicaram consistência frágil.
Dentre as inúmeras pesquisas desenvolvidas com o Bender, destaca-se a realizada por Pinelli Jr. (1990) que ao aplicar a análise fatorial no sistema de correção proposto por Koppitz, observou a existência dos quatro fatores com consistência interna aceitável. No entanto, sugere que os itens precisam ser organizados de outra forma, principalmente no que se refere ao aumento do seu número em alguns fatores. Os dados obtidos revelaram uma estrutura multifatorial, contraditória à estrutura unifatorial supostamente existente no sistema analisado.
Ao lado desses questionamentos e resultados não muito congruentes das pesquisas sobre o sistema Koppitz para o teste Bender, há também que se considerar a realidade brasileira em relação aos instrumentos de avaliação psicológica. As recentes re-soluções do Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2001, 2003) enfatizaram a necessidade de maiores cuidados com a elaboração e a utilização de instrumentos no Brasil. Assim, a resolução nº 002/2003 especificou os procedimentos técnicos de trabalho dos psicólogos relacionados à avaliação psicológica, visando oferecer serviços de qualidade, cada vez melhor, à sociedade brasileira. Além disso, determinou que apenas os instrumentos que atendessem certos padrões poderiam ser utilizados por profissionais nos diferentes campos de atuação do psicólogo.
O Bender tem sido muito usado no Brasil (Noronha & cols, 2003), assim como vem fazendo parte de programas de disciplinas em muitos cursos de psicologia das universidades brasileiras (Pereira & Carellos, 1995; Alves, Alchieri & Marques, 2002). Tais fatos justificam a relevância de pesquisas nacionais com o instrumento, como também de projetos amplos de revisão. Esta pesquisa se insere em um projeto dessa natureza.
Com vista a estruturar este estudo, considerou-se principalmente duas observações. Uma delas re-fere-se ao achado na pesquisa de Pinelli Jr (1990) quando constatou que os critérios de pontuação de Koppitz apresentavam uma estrutura multifatorial. A outra, está relacionada ao fato de que em protocolos com sujeitos lesionados e ao estudar a confiabilidade da pontuação, Koppitz (1963) analisou cada critério separadamente.
Nesse contexto, o presente estudo circunscreve-se à análise dos critérios relativos à integração, considerando sua sensibilidade para captar o caráter evolutivo. Dessa forma, investiga-se a validade de diferenciação das idades cronológicas desse critério, tal como proposto pelo sistema de Koppitz (1975), mais especificamente o método intitulado Developmental Bender Test Scoring System.
Método
Participantes
Participaram desta pesquisa 314 crianças, ambos os sexos, de primeira à quarta série de uma escola pública, tal como apresentado na Tabela 1.
Instrumento
Teste gestáltico viso-motor de Bender
O Teste Gestáltico Visomotor de Bender foi originalmente construído por Lauretta Bender (1938) com o propósito de proporcionar um índice de maturação percepto-motora. Consiste em nove figuras (A, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7 e 8) que são apresentadas uma a uma, para serem copiadas pelo sujeito em uma folha em branco, sem auxílio mecânico.
Neste estudo, optou-se pelo critério de Koppitz (1975), e foram avaliadas as figuras A, 2, 3, 4, 5 e 7, sendo atribuído um ponto para cada erro cometido pela criança. Além da correção por figura, considerou-se a pontuação total, resultante da soma das pontuações anteriores. Assim, foram estudadas sete medidas de integração.
Procedimento
Diferentemente do sistema de aplicação usado por Koppitz, os instrumentos foram aplicados coletivamente, em sala de aula, por uma equipe de cinco estudantes de graduação e um mestrando de psicologia. Um conjunto de cartões foi entregue a cada criança e os aplicadores acompanharam e auxiliaram os sujeitos individualmente, quando necessário. A correção foi realizada por um grupo de seis pessoas que concordaram entre si na atribuição de cada ponto aos erros cometidos pelos sujeitos.
Resultados
Primeiramente os dados foram analisados com relação ao gênero. A prova t de Student indicou diferença significativa [t(342)=-2,57 e p<0,01] para a pontuação total, sendo que os meninos tenderam a apresentar uma média de 0,63 (desvio padrão 0,77) e as meninas de 0,87 (desvio padrão 0,92). Em outros termos, na média as meninas apresentaram menos integração que os meninos. Quanto à cada figura em particular, as diferenças foram atribuídas ao acaso.
No que tange à relação entre idade e integração, esperava-se que houvesse uma correlação negativa e significativa entre idade e pontuações nas medidas de integração, ou seja, que conforme as crianças fossem ficando mais velhas, os problemas de integração diminuíssem. Os resultados encontram-se na Tabela 2.
Os resultados indicaram que em cinco das sete medidas a expectativa foi confirmada. Entretanto, os coeficientes foram baixos, explicando muito pouco da variância. Nos outros casos, o aumento da idade não se relacionou com o aumento ou diminuição de integração nas figuras.
É possível que, mesmo não havendo correlação entre idade e as medidas de integração, as idades se diferenciassem quanto à presença ou ausência de integração. Para isso, os dados foram estudados por meio de análise de variância (ANOVA) e seus resultados encontram-se na Tabela 3.
A tendência dos resultados encontrados foi similar às análises anteriores, pois as cinco medidas que se correlacionaram com a idade foram as que também diferenciaram as idades. O teste de Tukey, no entanto, indicou que todas as figuras que acusaram diferenças significativas não diferenciaram todas as idades, como pode ser observado na Tabela 4.
Os resultados obtidos permitiram observar que as pontuações das figuras, bem como a pontuação total, formaram apenas dois subconjuntos. Na realidade, para fornecer subsídios para a hipótese evolutiva do critério o esperado seriam quatro subconjuntos para cada medida. Em uma análise mais atenta observou-se que os dados das figuras diferenciaram nítida e sistematicamente a idade de 7 anos da de 10 anos e algumas vezes as outras idades. Mesmo a soma de todas as figuras formou apenas dois grupos, diferenciando as crianças de 7 anos das de 9 e 10 anos.
Na Tabela 5 são apresentados, por idade e no geral, as médias, desvios padrões e o coeficiente de consistência interna de Cronbach (alfa) em relação a todas as figuras analisadas. Por esses dados, pôde-se constatar que as médias por idade diminuíram conforme a idade dos sujeitos aumentou. Como se informou anteriormente, as diferenças entre elas são estatisticamente significativas, embora não discriminem idade por idade, mas formem apenas dois blocos de idades distintos. Vale destacar que o índice de alfa obtido para cada agrupamento não foi satisfatório, indicando baixa consistência interna dos itens para as quatro idades estudadas e independentemente delas.
Analisou-se, também, a correlação item-total, cujos dados encontram-se na Tabela 6. O critério usado para indicar problemas de adequação foi o de correlações inferiores a 0,30 (Guilford & Fruchter, 1978).
Dos 30 coeficientes de correlação obtidos, apenas dois deles não demonstraram problemas de adequação, quais sejam, o da figura 3, aos 7 anos e o da figura 7, aos 9 anos. Estes dados indicaram uma composição heterogênea, na qual a participação de cada item (figura) incluiu informação diferente da dos outros itens. Esse fato pôde ser observado em cada idade separadamente e independentemente delas. Dessa forma, não se pode afirmar que as seis medidas estudadas tenham apresentado comunalidade com a medida geral de integração.
Discussão e Conclusões
Muito se tem discutido sobre a possibilidade do teste de Bender ser um instrumento capaz de diferenciar a maturidade percepto-motora de crianças, tal como defendeu Koppitz (1963,1975). Desde a publicação de sua primeira versão, a autora afirmou que os 30 itens do teste eram válidos para avaliar a maturidade neurológica de crianças de 6 a 10 anos. A precisão estabelecida em 1975 por meio do testereteste foi considerada adequada, com base em cor-relações significativas encontradas à época.
Apesar disso e diante das divergências existentes na literatura (Buckley, 1978; Lacks & Newport, 1980; Taylor, Kauffman & Partenio, 1984; Shapiro & Simpson, 1995; Silvestre, Salaverry & Gonzales, 1995; Britto & Santos, 1996), julgou-se pertinente a continuidade de estudos, visando a identificação de possíveis evidências de validade. No entanto, enquanto que os outros estudos se pautaram em análises considerando a pontuação como um todo, optou-se por analisar apenas um dos quatro critérios que compõe a pontuação global da pessoa. Nessa mesma direção, o estudo de Sisto, Noronha e Santos (2003) já indicou problemas com o critério de deformação para avaliar as figuras, pois não foram encontrados evidências de que ele discriminasse as idades estudadas.
A decisão de estudar independentemente os critérios trouxe consigo o problema de como cotejar os dados com os de outras investigações empreendidas sobre os parâmetros psicométricos do Bender, que os consideraram no seu conjunto. Todavia, algumas convergências e divergências foram detectadas nos estudos sobre o instrumento.
Assim, na presente pesquisa focalizou-se o critério de integração na busca por índices significativos entre o número de pontos em integração e as idades das crianças. No entanto, a esperada correlação negativa entre idade e pontuação não pôde ser verificada em todas as figuras. Dessa forma, essa análise não forneceu suporte para confirmar a presumida sensibilidade à maturação com os critérios utilizados para avaliá-la.
Os dados foram também submetidos à análise de variância para avaliar se dessa forma o critério empregado captava diferenças etárias. Os resultados obtidos foram significativos para algumas figuras (3, 4, 5, 7 e total). Nada obstante, ao submeter os dados ao teste de Tukey verificou-se que as idades não foram adequadamente diferenciadas em nenhuma das medidas. Assim, em cada uma delas e na pontuação total, apenas dois grupos foram formados, de forma semelhante à ocorrida no estudo que focalizou o critério de distorção de forma (Sisto, Noronha & Santos, 2003).
Tais constatações encontraram eco em pesquisas realizadas anteriormente que identificaram dificuldades com a utilização do sistema de correção proposto por Koppitz, levando alguns autores a desenvolverem sistemas alternativos (Puente & Maciel Jr., 1984; Brannigan & colaboradores, 1995, Moose & Brannigan, 1997; Brannigan & Brunner, 2002, entre outros). Em contraposição, confrontam os de Arrillaga, Eschebarria e Goya (1981), Moura (1982), Kroeff (1988, 1992), Mazzeschi e Lis (1999) e Jing, Deqing e Longhui (2001) que defenderam a diferenciação de idades por meio desse teste. Menção deve ser feita ao estudo de Neale e McKay (1986) que relata correlação significativa com os critérios de Koppitz (1975) e destacou a integração como um dos critérios de erro mais discriminantes na análise de precisão por especialistas.
Com a análise dos coeficientes de consistência interna, verificou-se que, além de não discriminarem adequadamente as idades, os valores obtidos foram baixos em cada uma das figuras medida de integração (soma de todos as figuras). Nesse contexto pôde-se interpretar a necessidade de uma revisão do critério, pois aparentemente eles estão medindo coisas distintas. Dados similares que reforçam a existência de fraca consistência interna dos critérios foram encontrados em outros estudos brasileiros (Pinelli Jr. & Pasquali, 1990; Sisto, Noronha & Santos, 2003).
A análise das correlações item-total facilitou a interpretação da existência de problemas graves de ajustamento, pois apenas duas medidas forneceram indícios de relação significativa com a pontuação total. Assim, tão somente as figuras 3 e 7, respectiva-mente para as idades de sete e de nove anos, sugeriram o ajustamento desejável a todos os itens.
Vale ressaltar que esses resultados foram obtidos com base em uma análise de um critério específico (a integração) que não é o único usado no sistema Koppitz de correção. Em decorrência, as críticas feitas não se referem ao sistema global de correção.
Outros estudos, contudo, apontaram problemas similares aos aqui relatados considerando a pontuação total do teste e identificando dificuldades em relação ao seu caráter discriminante de idades na maturação viso-motora. Dentre eles, podem ser arrolados os trabalhos de Pinelli Jr. (1990) com crianças brasileiras, o de Silvestre, Salaverry e Gonzales (1995) com crianças peruanas e o de Britto e Santos (1996) também com crianças brasileiras. De forma geral todos trouxeram o questionamento sobre a adequação dos critérios para a comparação entre crianças de diferentes idades.
Tais discrepâncias relacionadas ao sistema de avaliação criado por Koppitz (1963, 1975) têm levado vários autores a criticarem o sistema da autora. Assim, Puente e Maciel Jr. (1984) defenderam que essa classificação só é adequada para separar em categorias de normalidade e anormalidade e sugeriram uma forma complementar de avaliação, de caráter qualitativo. Outros autores como Rie, Rie, Stewart e Rettemnier (1980) e Moura (1982) consideraram que o teste mediu mais de um fator e contestaram a unidimensionalidade atribuída ao instrumento. Sugeriram que, no mínimo, dois fatores relacionados à integração verbal-motora e viso-motora poderiam ser considerados como independentes. Talvez esta seja uma hipótese a ser mais bem investigada, visto que os resultados aqui aferidos pelo critério integração parecem comprometer a validade e a confiabilidade da medida.
Aparentemente esta pesquisa e a literatura discutida têm apontado para a necessidade de uma revisão do sistema Koppitz para o teste de Bender. Outros estudos sobre os critérios também se fazem necessários, posto que não apenas os critérios de distorção ou integração devem ser questionados. Restam ainda a perseveração e a rotação. As análises, considerando pontuações globais, figuras ou critérios independentes (distorção e integração), convergem para um mesmo ponto, qual seja, a dificuldade de detectar a diferenciação nítida das idades envolvidas.
Referências
Alves, I. C. B., Alchieri, J. C., & Marques, K. C. (2002). As técnicas de exame psicológico ensinadas nos cursos de graduação de acordo com os professores. Psico-USF, 7, 77-88. [ Links ]
Arrillaga, S. G. P.; Eschebarria, C. C. & Goya, I. O. (1981). Una investigación sobre aspectos intelectuales en una población de deficientes de un grupo marginal. Psiquis: Revista de Psiquiatria, Psicologia y Psicosomatica, 2, 12-22. [ Links ]
Brannigan, G. G.; Aabye, S. M.; Baker, L. A., & Ryan, G. T. (1995). Further validation of the qualitative scoring system for the modified Bender-Gestalt Test. Psychology in the Schools, 32, 24-26. [ Links ]
Brannigan,G. G., & Brunner,N. A. (2002). Guide to the Qualitative Scoring System for the Modified Version of the Bender-Gestalt Test. Springfield, IL, US: Charles C. Thomas. [ Links ]
Britto, G. N. O & Santos, T. R. (1996) The Bender Gestalt test for 5-to 15-year old Brazilian children: norms and validity. Jornal de Medicina e Biologia, 29, 1513 - 1518. [ Links ]
Buckley, P. D. (1978). The Bender Gestalt Test: A review of reported research with school-age subjects. Psychology in the Schools, 15, 327-335. [ Links ]
Clawson, A (1982). Bender Infantil: Manual de diagnóstico clínico. Porto Alegre: Artes Médicas. [ Links ]
Field, K., Bolton, B., & Dana, R. H. (1982). Na evaluation of three Bender-Gestalt scoring systems as indicators of psychopathology. Journal of Clinical Psychology, 38, 838-842. [ Links ]
Guilford, J. P. & Fruchter, B. (1978). Fundamental statistic in psychology and Education. New York: McGraw-Hill. [ Links ]
Harper, H. K. (1998). Visual evoked potential correlates with visual-motor integration as measured by the bender gestalt test. Dissertation Abstracts International, 58 (8-B), 4509. [ Links ]
Jing, G., Deqing, T. & Longhui, L. (2001). Visual-motor deficit in children with learning disabilities. Chinese-Mental-Health-Journal, 15, 388-390. [ Links ]
Koppitz, E. M. (1963). The Bender Gestalt Test for young children. New York: Grums Stratton. [ Links ]
Koppitz, E. M. (1975). The Bender-Gestalt Test for young children: Research and application 1963-1973. New York: Grime & Stratton. [ Links ]
Kroeff, P. (1988). Normas brasileiras para o Teste de Bender. Psicologia: Reflexão e Crítica, 1/2, 12-19. [ Links ]
Kroeff, P. (1992). Desempenho de crianças no Teste de Bender e nível sócio-econômico-cultutal. Psicologia: Reflexão e Crítica, 5, 119-126. [ Links ]
Lacks, P. (2000). Visuoconstructive abilities. Em G. Groth-Marnat, (Org.), Neuropsychological assessment in clinical practice: Guide to test interpretation and integration. (pp. 401-436). New York, NY: John Wiley & Sons. [ Links ]
Mazzeschi, C., & Lis,A. (1999). The Bender-Gestalt test: Koppitz's Developmental Scoring System administered to two samples of Italian preschool and primary school children. Perceptual and Motor Skills, 88, 1235-1244. [ Links ]
McCarron, L. M., & Horn, P. W. (1979). Haptic visual discrimination and intelligence. Journal of Clinical Psychology, 35, 117-120. [ Links ]
Moose, D., & Brannigan, G. G. (1997). Comparison of preschool children's scores on the modified version of the Bender-Gestalt Test and the Developmental Test of Visual-Motor Integration. Perceptual and Motor Skills, 85, 766 - 775. [ Links ]
Moura, M. L. S. (1982). Reconhecimento e reprodução de figuras do Teste Gestáltico Viso-Motor-Bender: Um estudo evolutivo. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 34, 50-61. [ Links ]
Neale, M. D., & McKay, M. F. (1985). Scoring the Bender-Gestalt test using the Koppitz developmental system: Interrater reliability, item difficulty, and scoring implications. Perceptual and Motor Skills, 60, 627-636. [ Links ]
Noronha, A. P. P., Oliveira, A. F., Cobêro, C.; Paula, L. M., Cantalice, L. M., Guerra, P. B. C., Martins, R. M. M., & Filizatti, R. (2002). Instrumentos psicológicos mais conhecidos por estudantes do sul de Minas Gerais. Avaliação Psicológica, 1, 151-158. [ Links ]
Pereira, A. P. C. & Carellos, S. D. M. S. (1995). Examinando o ensino das Técnicas de Exame Psicológico. Cadernos de Psicologia, 3 (4), 33-36. [ Links ]
Pinelli Jr., B. (1990). Adaptação do "Teste do Desenvolvimento da Integração Viso-Motora (VMI)" para uso no Brasil. Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, Brasília/DF, 184p. [ Links ]
Prieto, G. & Muíïiz, J. (2001). Un modelo para evaluar la calidad de los tests en Espana. Disponível em http:/ /www.cop.es/tests/modelo.htm. Acessado em 04/02/ 2001. [ Links ]
Puente, M., & Maciel Jr., J. A. (1984). Procedimentos multimodais no uso do Teste de Bender. Estudos de Psicologia, 1(2), 65-74. [ Links ]
Rie, E. D., Rie, H. E., Stewart, S., & Rettemnier, S. C. (1978). An analysis of neurological soft signs in children with learning problems. Brain and Language, 6 (1), 32-46 [ Links ]
Santucci, H. & Pêcheux, M.G. (1981). Prova Gráfica de Organização Perceptiva para Crianças de 6 a 14 anos. Em R. Zazzo. Manual para o Exame Psicológico da Criança (pp. 291-438). São Paulo: Mestre Jou. [ Links ]
Shapiro, S. K., & Simpson, R. G. (1995). Koppitz scoring system as a measure of Bender-Gestalt performance in behaviorally and emotionally disturbed adolescents. Journal of Clinical Psychology, 51, 108-112. [ Links ]
Sisto, F. F., Noronha, A. P. P., & Santos, A. A. A. (2003). Distorção de forma no Teste de Bender: Questionando seu critério de validade. Manuscrito sub-metido à publicação. [ Links ]
Sohlberg, S. C. (1985). Personality and neuropsychological performance of high-risk children. Schizophrenia-Bulletin, 11, 48-60. [ Links ]
Taylor, R. L., Kauffman, D., & Partenio, I. (1984). The Koppitz Developmental Scoring System for the Bender-Gestalt: Is it developmental? Psychology in the Schools, 21, 425-428. [ Links ]
Endereço para correspondência
Universidade São Francisco
Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia
R. Alexandre Rodrigues Barbosa, 45
13251-040 Itatiba-SP
Recebido em 20/11/2003
Aceito em 12/02/2004