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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. v.4 n.2 Porto Alegre nov. 2005
ARTIGOS
Estudo no contexto brasileiro de três questionários para avaliar aracnofobia
Study of three questionnaires for assessing arachnophobia inside the brazilian context
Laura Carmilo Granado I, 1 , 2; Francisco Javier Ropero Peláez3; Mirian Garcia-Mijares4
I Universidade de São Paulo
RESUMO
Este estudo visou estudar, em uma amostra brasileira, a confiabilidade e a validade do Questionário para Medo de Aranha (FSQ), do Questionário para Fobia de Aranha (SPQ) e do Questionário de Automaticidade e Irracionalidade (AI). Os questionários foram traduzidos do Inglês e corrigidos por professores de Inglês. A amostra foi constituída de 120 pessoas. 84 estudantes de graduação e 36 indivíduos com medo de aranha. Os testes mostraram-se altamente correlacionados. Os coeficientes alfa de Crombach demonstraram consistência interna dos instrumentos. Os escores dos universitários diferiram significativamente dos escores de aracnofóbicos (25 sujeitos), demonstrando validade de critério concorrente. Para os três instrumentos a análise fatorial sugeriu adaptações sócio-culturais.
Palavras-chave: Fobias, Avaliação psicológica, Questionários.
ABSTRACT
The objective of this research is to study, in a Brazilian sample, the reliability and validity of three questionnaires for assessing spider fear: the Fear of Spider Questionnaire (FSQ), the Spider Phobia Questionnaire (SPQ) and the Automaticity and Irrationality Questionnaire (AI). The questionnaires were translated from English and corrected by English teachers. The sample was formed by 120 subjects, 84 undergraduate students and 36 subjects with spider fear. The testes were highly correlated. The Cronbach's alpha coefficient showed the internal consistency of the questionnaires. The undergraduate scores were significantly different from the score of arachnophobic patients (25 subjects) demonstrating the validity of concurrent criteria. Factorial analysis performed over the three questionnaires, yielded for each factor eigenvalues and variance percentages that were similar to original studies. For the three instrumentst, the factor analysis suggested social-cultural adaptation.
Keywords: Phobias, Psychological assessment, Questionnaires.
Introdução
O medo é uma resposta adaptativa que surge em situações ameaçadoras. Porém, quando o medo se torna mais intenso do que a situação justificaria, ou começa a ocorrer em situações impróprias, caracteriza-se um transtorno de ansiedade (Marks, 1987; Öhman, 1993). A ansiedade é um estado emocional com componentes psicológicos e fisiológicos. Entre outros aspectos, abrange sensações de medo, sentimentos de insegurança e antecipação apreensiva, conteúdo de pensamento dominado por catástrofe, aumento de vigília ou alerta, tensão muscular e uma variedade de desconfortos somáticos conseqüentes da hiperatividade do sistema nervoso autonômico. As escalas de ansiedade, de modo geral, medem o humor (apreensão, sensação de medo), cognição, comportamento, estado de hiperalerta, sintomas somáticos e outros (Andrade & Gorenstein, 2000).
Dentre os diversos transtornos de ansiedade temos as fobias específicas (300.29). A fobia específica é um transtorno de ansiedade em que há o medo é revelado pela presença ou antecipação do objeto ou situação temida (situação fóbica). Assim como nos demais transtornos de ansiedade, esse medo é acentuado e persistente, excessivo ou irracional. A exposição do paciente ao estímulo fóbico provoca, quase sempre, uma resposta imediata de ansiedade. O indivíduo que apresenta este transtorno reconhece a irracionalidade de seu medo, ou admite o quanto ele é excessivo. Geralmente a situação fóbica é evitada pelo sujeito ou suportada com grande ansiedade e a fobia interfere significativamente na rotina normal do paciente, em seu funcionamento ocupacional (ou acadêmico), em atividades ou em relacionamentos sociais, ou, ainda, existe um sofrimento acentuado em função de se ter a fobia. Em amostras comunitárias, foi constatada uma taxa de prevalência de 9% de fobias específicas (APA, 1995).
A fobia, como um transtorno de ansiedade, não é um fenômeno unitário, mas a manifestação de três componentes: o verbal-cognitivo, o fisiológico e o comportamental. Estes três sistemas não são simplesmente formas diferentes de abordar um mesmo fenômeno, mas são parcialmente independentes. Por exemplo, as medidas fisiológicas e comportamentais, raramente coincidem, elas apresentam baixa correlação. O componente cognitivo também pode estar dissociado da resposta fisiológica e o comportamento motor pode ou não variar conjuntamente a qualquer um dos outros dois sistemas (Hugdahl, 1980).
O componente cognitivo pode ter três diferentes significados. Ele pode estar relacionado à percepção pelo sujeito de sua resposta autonômica, de modo que ele a classifica como medo ou ansiedade. Pode também ser conceituado como uma preocupação ou como pensamentos negativos que surgem durante a exposição ao estímulo fóbico, incluindo o medo de não estar apto a lidar com a situação. Um terceiro significado do termo o cognitivo-verbal relaciona-se à mudança no humor e o sentimento de irrealidade, incontrolabilidade, culpa, auto-acusação, etc. do sujeito quando exposto ao estímulo fóbico ou quando pensa sobre o estímulo. A resposta fisiológica corresponde a respostas autonômicas, corticais ou neuromusculares ao objeto fóbico e o componente comportamental geralmente refere-se à fuga ou esquiva ao objeto fóbico. Em geral, um sujeito fóbico não apresenta somente um componente, de um modo dicotômico, mas mostra maior ou menor ativação em cada um dos três sistemas (ver Hugdahl, 1980).
A fobia à aranha ou aracnofobia é uma das mais comuns formas de fobia específica (Bourdon e colaboradores, 1988). Ela é foco de diversos estudos científicos por ser um modelo útil para a investigação de outras ansiedades e da efetividade das psicoterapias (Szymanski & O'Donohue, 1995). Os sintomas da aracnofobia são similares aos das outras fobias de animais. Por exemplo, sujeitos aracnofóbicos se esquivam de locais onde sabem que habitam aranhas ou onde já observaram aranhas e mostram comportamento de fuga e reações de ansiedade quando se deparam com aranhas.
O tratamento da aracnofobia dependerá, em parte, da intensidade e da predominância de algum dos seus componentes. Uma forma de avaliar esses dois aspectos é através do uso de escalas (Lotufo Neto, 2000). Wolpe e Lang (1964) desenvolveram o Fear Survey Schedule, um inventário de medo com 72 itens sobre diversas situações que podem provocar medo, como animais, doenças e morte, situações sociais, barulhos, etc. e que o sujeito avalia de "nada" a "muito" o quanto aquela situação o perturba.
A escala de fobia mais utilizadas, inclusive com versões adaptadas e utilizadas no Brasil (Lotufo Neto, 2000), foi desenvolvida por Marks e Matheus (1979). Nesta escala o sujeito avalia de 0 a 8 o quanto ele evita determinadas situações devido ao medo ou ao desprazer causados pela situação descrita. Entre outras situações estão: injeções, comer ou beber na frente de outras pessoas, hospitais, viajar sozinho de ônibus ou de carro. O sujeito avalia em uma escala de 0 a 8 o quanto ele é incomodado pelos problemas listados.
Os medos e as fobias podem também ser mensurados através de hierarquias das situações de medo construídas pelo próprio sujeito, em que ele lista situações de pouco medo ou ansiedade até situações de máximo medo ou pânico. Além disso, são usados os diários para automonitoração em que o sujeito anota seu mal-estar ou esquiva, por exemplo, em situações de medo. Esses instrumentos podem ser usados para avaliar o progresso no tratamento para os mais diversos medos: cobras, aranhas, ratos, dentista, obesidade, aparência corporal , etc. (Lotufo Neto, 2000)
Os três componentes da fobia, o verbal-cognitivo, o fisiológico e o comportamental, costumam ser abarcados por esses questionários, mas há forma diretas de mensurá-los através de escalas específicas de avaliação. O componente verbal-cognitivo, conceituado como a percepção da resposta autonômica, pode ser medido, por exemplo, por uma escala de unidade subjetiva de perturbação (Wolpe, 1978), em que o sujeito avalia de 0 a 100 o medo subjetivo quando se confronta com o objeto fóbico. Geralmente, esse teste é feito dentro do contexto do Teste de Aproximação Comportamental (BAT-Behavioral Avoidance Test) (Lang & Lazovik, 1963), um teste que inicialmente foi desenvolvido para avaliar o componente comportamental. Neste teste pede-se que o sujeito se aproxime o máximo que ele consegue do objeto fóbico e mede-se a distância. Este teste geralmente é feito antes e após tratamentos para fobia. Usando-se o BAT é possível ainda medir as respostas fisiológicas, como resposta cardiovascular (Hugdahl, 1980), condutância da pele (Öhman, 1993, Öhman & Soares, 1993; Öhman & Soares, 1994) ou através de neuroimagem funcional (Walen e colaboradores, 1998; Morris, Bonis & Dolan, 2002).
O BAT, por ser um teste que permite medir fobias específicas, pode ser usado para avaliar a aracnofobia. Contudo, esse teste é limitado, pois não fornece informação sobre os diferentes aspectos de cada componente, como por exemplo, a fuga, parte do componente comportamental, ou os pensamentos associados ao estímulo fóbico quando este está ausente. Uma avaliação mais completa da aracnofobia requer, portanto, o uso de instrumentos específicos que abarquem mais de um aspecto dos componentes cognitivo, comportamental e fisiológico.
Na literatura internacional podem ser encontrados três questionários que avaliam a fobia específica a aranhas: o Questionário para Fobia de Aranha (Spider Phobia Questionnnaire-SPQ) (Watts & Sharrock, 1984), o Questionário para Medo de Aranha (Fear of Spider Questionnaire -FSQ) (Szymanski & O'Donohue, 1995), e o Questionário de Automaticidade e Irracionalidade (Automaticity Irrationality Questionnaire-AI) (Mayer, Merckelbach & Muris, 2000).
O SPQ, desenvolvido originalmente na Inglaterra, é uma escala auto-aplicada, constituída de 33 perguntas, com opções de resposta do tipo "sim" ou "não". O SPQ tem como objetivo cobrir vários aspectos dos componentes cognitivos e comportamentais, mas não fisiológicos, da aracnofobia. Especificamente, esse questionário avalia dois aspectos comportamentais, lidar (esquiva/fuga) com aranhas independentemente e buscar ajuda, e dois aspectos cognitivos, vigilância e preocupação interna. Segundo Watts e Sharrock (1984) o SPQ é um instrumento apropriado para distinguir fóbicos de não fóbicos e é sensível para detectar mudanças decorrentes de terapias. Porém, Szymanski e O'Donohue (1995) discordam e alertam para o fato de que o formato "sim/não" do SPQ pode não ser sempre sensível a diferenças entre fóbicos e não fóbicos ou a efeitos de tratamentos e afirmam que este instrumento utiliza termos para os itens os quais não são explícitos sobre o período de tempo em questão.
O FSQ (Szymanski & O'Donohue, 1995), desenvolvido originalmente nos Estados Unidos, é uma escala auto-aplicada, constituída de 18 questões, em que as respostas são classificadas pelo sujeito em uma escala de 1 (concordo muito) a 7 (discordo muito) referindo o quanto a afirmação se aplica a ele. O objetivo do instrumento é cobrir os três componentes descritos por Hugdhal, (1980), o cognitivo, o comportamental e o fisiológicos. O FSQ é similar ao SPQ no que se refere às medidas comportamentais, avaliando os aspectos de esquiva e fuga da aracnofobia, porém mais abrangente em relação aos aspectos cognitivos, incluindo o medo de dano por aranha e a ideação associada a esse medo. Além disso, o FSQ inclui questões relativas ao componente fisiológico, que como foi apontado, não são avaliadas pelo SPQ. Segundo Szymanski e O'Donohue (1995) o FSQ é um instrumento mais útil que o SPQ para detectar diferenças após o tratamento devido a seu formato escalar de resposta. Outra diferença em relação ao SPQ é o uso de questões referidas aos comportamentos ou cognições atuais do sujeito, o que permite detectar com maior facilidade os efeitos dos tratamentos.
O AI (Mayer, Merckelbach & Muris, 2000) foi desenvolvido originalmente na Holanda. É também um instrumento de auto-aplicação, composto de 20 questões respondidas em uma escala que varia de 1 (discordo muito) a 5 (concordo muito). A irracionalidade avaliada pelo questionário, refere-se ao quanto o sujeito com fobia reconhece que seu medo é excessivo ou irracional. Embora o DSM IV afirme que o sujeito com fobia reconhece a irracionalidade de seu medo (APA, 1995), alguns estudos opõem-se a essa afirmação, mostrando que do ponto de vista do paciente é racional reagir com um medo intenso ao objeto fóbico, pois os fóbicos têm uma série de idéias negativas sobre aranhas que justificam seu medo (Arntz, Lavy, Van den Berg & Van Rijsoort, 1993) ou realmente acreditam que irão sofrer prejuízos se confrontados com aranhas (Thorpe & Salkovskis, 1995). A irracionalidade avaliada por esse questionário refere-se a um aspecto do componente cognitivo descrito por Hugdahl (1980), que abarca a percepção que o sujeito tem do quanto seu medo irracional. A automaticidade é caracterizada por itens com conteúdo cognitivo, pois avalia o quanto o fóbico considera seu medo como uma resposta que não está sob o controle intencional. Mas por referir-se à descrição do quanto o indivíduo experiencia seu medo como automático e involuntário (Mayer e colaboradores, 2000), também há um componente fisiológico e um aspecto comportamental sendo descritos por estes itens referentes à automaticidade.
Embora esse questionário avalie os três componentes descritos por Hugdahl (1980), os componentes comportamentais são abarcados somente quando se referem à automaticidade. Por isso, esse instrumento não é tão completo quanto o FSQ e embora também avalie o componente fisiológico, é menos abrangente que SPQ para avaliar os componentes cognitivos e comportamentais. Isso talvez porque o AI tenha sido desenvolvido originalmente com os objetivos bem circunscritos: a) verificar se pacientes fóbicos reportavam escores mais altos em automaticidade e irracionalidade que sujeitos não fóbicos, b) verificar se a automaticidade e irracionalidade auto-reportadas estavam positivamente intercorrelacionadas e c) verificar seus efeitos sobre os resultados da terapia de exposição ao vivo (Ost, 1989). Mayer e colaboradores (2000) verificaram que os fóbicos apresentaram escores mais altos que os sujeitos não fóbicos nos escores para automaticidade mas não para a irracionalidade e que, portanto, esses aspectos da aracnofobia não se estavam relacionados entre si.
No Brasil, não existem instrumentos especialmente desenvolvidos ou validados para avaliar aracnofobia, o que limita tanto o estudo de tratamentos como o estudo desse transtorno na população brasileira. O presente estudo teve o objetivo de testar, em uma amostra brasileira, a confiabilidade e a validade de versões traduzidas para o português dos questionários SPQ, FSQ e AI.
Método
Participantes
Duas amostras participaram do estudo (Tabela 1). A primeira amostra (n=84) foi constituída por estudantes de graduação, com idade média de 23,43 ( 4,81) anos, sendo 48 do sexo feminino e 36 do sexo masculino. Estes sujeitos foram selecionados de forma aleatória, sendo solicitados a participar da pesquisa para a validação de questionários.
A segunda amostra (n=36) foram participantes voluntários de uma pesquisa sobre um novo tratamento para o medo de aranha, divulgada, em um jornal de televisão, em jornais impressos e em revistas. A média da idade era de 30,11 ( 7,55) anos, sendo 29 do sexo feminino e 7 do sexo masculino. Todos os sujeitos desta amostra relatavam apresentar medo de aranha, mas apenas 25 foram considerados aracnofóbicos segundo os critérios do DSM IV para fobia específica avaliada pela SCID (Structured Clinical Interview- Entrevista Clínica Estruturada para Transtornos do Eixo I) (First, Spitzer, Gibbon & Williams, 1998). Os participantes aracnofóbicos tinham em média 31,3 ( 7,4) anos de idade e 23,0 ( 8,6) anos de duração da fobia. Esta segunda amostra foi recrutada para completar a amostra pelo fato de que na população em geral há uma proporção muito baixa de sujeitos fóbicos.
As duas amostras foram combinadas para analisar os questionários, totalizando, assim, 120 participantes.
Instrumentos
1) Questionário para Fobia de Aranha: Spider Phobia Questionnnaire (SPQ)
O SPQ é uma escala auto-aplicada, constituída de 33 perguntas, às quais o sujeito deve responder "sim" ou "não". O estudo da validação do SPQ utilizou como amostra 176 indivíduos que relatavam ter medo de aranha (Watts & Sharrock, 1984). O questionário original continha 43 itens referentes a aspectos cognitivos e comportamentais da aracnofobia, agrupados a priori em quatro domínios: (1) lidar com aranhas independentemente (2) evitar e buscar ajuda (3) vigilância e (4) preocupação interna (os sujeitos se sentem assombrados por aranhas, imaginam-nas vividamente, constantemente sonham com aranhas, tentam pensar o mínimo possível sobre aranhas, etc), (5) Conhecimento factual sobre aranhas.
Após a validação, 10 itens foram eliminados da escala original, restando os 33 itens que constituem a escala atual. É importante notarmos que os autores não realizaram uma nova análise fatorial do instrumento com os 33 itens restantes. Cinco desses itens, relativos ao conhecimento factual de aranhas, apresentaram muito pouca correlação com os outros itens e os outros cinco não apresentaram carga fatorial para nenhum fator; os resultados da validação também revelaram a presença de apenas 3 fatores, que foram rotulados pelos autores como: 1) vigilância, 2) preocupação e 3) evitação-enfrentamento. É importante notar que os autores consideraram itens para os quais houve uma carga muito baixa (a partir de 0,25). Não temos dados sobre a confiabilidade do SPQ.
2) Questionário para Medo de Aranha: Fear of Spider Questionnaire (FSQ) (Szymanski & O'Donohue, 1995)
O FSQ foi desenvolvido e validado por Szymanski e O'Donohue, (1995). É composto de 18 questões, às quais o paciente deve responder, em uma escala de 1 a 7, o quanto a afirmação se aplica a ele. 1 significa "concordo muito" e 7 "discordo muito".
No estudo de Szymanski e O'Donohue, (1995), o instrumento original estava composto de 22 itens que pretendiam avaliar os componentes cognitivo, comportamental e fisiológicos, descritos por Hugdhal, (1980). Essa versão inicial foi aplicada a uma amostra composta de 338 estudantes de graduação (204 mulheres e 104 homens com média da idade de 18,6). Após uma primeira análise fatorial do instrumento original foram eliminados 4 itens. Uma segunda análise fatorial foi realizada com os 18 itens restantes que indicou uma solução de dois fatores. O fator 1 foi responsável por 44,3% da variância, e foi considerado similar ao fator evitação/buca de ajuda do SPQ (Watts & Sharrok, 1984). O fator 2 foi responsável por 10,7% da variância e foi relacionado ao medo de dano por aranhas.
O coeficiente alfa de Cronbach, usado como indicador da consistência interna do instrumento, foi alto (0,92). Além disso, o FSQ mostrou-se significativamente correlacionado com o SPQ e o BAT e apto para diferenciar fóbicos de não fóbicos,
Em resumo, os resultados do estudo de validação do FSQ parecem mostrar que esse instrumento possui suficiente validade e confiabilidade como instrumento de avaliação da aracnofobia. No entanto, é necessário chamar a atenção para a possibilidade de os participantes não terem sido selecionados aleatoriamente, pois segundo relatam os autores 64% deles foram considerados fóbicos e segundo o DSM IV (APA, 1995) a prevalência de fobias específicas dentro da população é de 9% .
3) Questionário de Automaticidade e Irracionalidade: Automaticity Irrationality Questionnaire (AI) (Mayer, Merckelbach & Muris, 2000) (Anexo 3).
O AI, desenvolvido e validado por Mayer, Merckelbach e Muris (2000) é uma escala auto-aplicada de 20 questões que são respondidas em uma escala que varia de 1 (discordo muito) a 5 (concordo muito). A amostra para validar o questionário foi composta por 39 mulheres aracnofóbicas (segundo os critérios do DSM IV) e 41 mulheres controle.
O questionário original consistia de 23 itens referentes à automaticidade e à irracionalidade envolvida na resposta fóbica a aranhas. A análise fatorial desse questionário mostrou que 3 dos itens sobre irracionalidade não apresentaram carga convincente em seus fatores e foram eliminados restando um total de 20 itens, que conformam o instrumento atual. A análise desta versão final confirmou a estrutura de dois fatores. Os itens sobre automaticidade carregaram convincentemente no primeiro fator (autovalor de 10,36, explicando 51,8% da variância) enquanto os itens sobre irracionalidade carregaram claramente no segundo fator (autovalor de 2,66, explicando 13,3% da variância). O coeficiente alfa de Crombach para as escalas de automaticidade e irracionalidade na amostra total foram 0,97 e 0,70, respectivamente.
Os grupos de fóbicas e normais diferiram significativamente em seus escores médios na escala de automaticidade 55 (DP=5,3) e 20,2 (DP=6,9), respectivamente (t78=35,3, p<0,001), mas não diferiram com relação à escala de irracionalidade, a média sendo de 24,6 (DP=5,7) para as fóbicas e 24,7 (DP=4,4) para o grupo controle (t78<1).
Os resultados do estudo de validação do AI parecem mostrar que esse instrumento possui suficiente validade e confiabilidade como instrumento de avaliação da automaticidade e irracionalidade na aracnofobia.
Procedimento
O FSQ e o SPQ foram traduzidos para o português, corrigidos por professores de Inglês e depois foram aplicados em 9 pessoas com nível educacional alto (4 pessoas com superior completo, 2 cursando superior e 3 com 2° grau completo) com média de idade de 36,33 ( 13,50) anos, sendo 6 do sexo masculino e 3 do sexo feminino. A partir da aplicação nesta amostra, sugestões de modificações foram coletadas. Os questionários foram então aplicados em 10 pessoas (todos homens) com média de idade de 38,4 (±16,02) anos. Destes, dois tinham o curso superior completo, 1 estava cursando o superior, 2 tinham o 1° grau completo e 5 têm o segundo grau completo. Nesta amostra foi realizada uma análise da compreensão dos questionários e novas mudanças foram feitas.
O questionário sobre Automaticidade e Irracionalidade foi traduzido e corrigido por professores de Inglês.
As versões em português finais dos questionários foram aplicadas às duas amostras. Os participantes da primeira amostra, estudantes universitários, responderam ao questionário em sala de aula. Na sala de aula o pesquisador solicitou aos participantes que respondessem a três questionários sobre aracnofobia segundo as instruções no próprio questionário. Os indivíduos da segunda amostra responderam o questionário em uma sala da Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Era solicitado individualmente que o participante respondesse aos instrumentos segundo as instruções no próprio questionário.
Análise de dados
A correlação entre os instrumentos foi avaliada através do coeficiente de Correlação de Pearson. Para avaliar a consistência interna (confiabilidade) foi calculado o coeficiente alfa de Crombach para cada instrumento.
Para avaliar a validade de critério concorrente, foi realizada uma ANOVA de medidas independentes, de cada questionário, entre os estudantes universitários da primeira amostra, e os 25 participantes diagnosticados como aracnofóbicos da segunda amostra.
Para cada instrumento foi realizada uma análise fatorial. No estudo original do FSQ a rotação usada foi Varimax (Szymanski & O'Donohue, 1995), mas os autores não relatam o método de extração. No atual estudo foi realizada uma Análise de Componentes Principais com rotação Varimax. Para o SPQ e o AI foi usado como método de extração dos fatores a Análise de Fatores Principais com rotação Varimax, da mesma forma que a análise realizada pelos autores do instrumento (Mayer, Merckelbach & Muris, 2000; Watts & Sharrok, 1984).
O número de fatores foi determinado usando como critério a obtenção de um autovalor igual ou maior a 1. Uma carga fatorial igual ou maior a 0,60 foi usada como critério de decisão na alocação do itens em um determinado fator.
Resultados e Discussão
Conforme mostra a Tabela 2, os três instrumentos estão altamente correlacionados, sendo que todas as correlações são maiores que 0,90. Esse dado é relevante, pois a correlação entre o FSQ e SPQ encontrada nesta pesquisa é maior do que a relatada pelo estudo de Szymanski e O'Donohue, (1995), que foi de 0,65.
A consistência interna dos instrumentos também foi alta para os três instrumentos: os coeficientes alfa de Crombach foram maiores do que 0,80 para todos os instrumentos. O coeficiente obtido para o FSQ (0,81) não é muito discrepante em relação ao estudo original (0,92) (Szymanski & O'Donohue, 1995).
As médias e os desvios-padrão obtidos pelos 84 universitários foram comparados aos obtidos pelos 25 pacientes aracnofóbicos e constam na Tabela 3. Segundo os resultados das ANOVAS, os escores dos dois grupos (universitários e fóbicos) foram significativamente diferentes para cada um dos questionários: F(1,107) = 150,63, p=0,00 para o SPQ, F(1,107) = 176,17 para FSQ p=0,00 e F = (1,107) = 150,03, p=0,00 para o AI.
Análise fatorial
1) Questionário para Fobia de Aranha (SPQ)
Na tabela 4 pode-se observar que a Análise fatorial da versão do SPQ em português resultou em três fatores, sendo 40,49% da variância total foi explicada pelo fator 1, 8,82% pelo fator 2 e 3,61% pelo fator 3. Portanto, os três fatores, em conjunto, explicam 52,93% da variância do SPQ, o que pode ser considerada uma porcentagem relativamente pequena.
A carga fatorial dos itens em cada um dos três fatores é apresentada na Tabela 5. Os resultados dessa tabela mostram que 16 dos 33 itens não tiveram a carga fatorial igual ou maior a 0,60, valor usado como critério de inclusão em um determinado fator. Isto é, mais da metade dos itens não carregam em nenhum dos fatores obtidos. Dos 17 itens restantes, 10 carregaram no fator 1, 7 no fator 2 e nenhum no fator 3. Portanto, esse último fator não será discutido.
Os dois fatores obtidos para a versão em português do SPQ podem ser categorizados da forma a seguir:
Fator 1 - Cognição: todos os itens que compuseram este fator referem-se a um componente cognitivo fazer planos, pensar, ter a impressão da presença sem ver e ter pesadelos.
Fator 2 - Comportamento (lidar com situação): Todos os itens alocados neste fator referem-se a um aspecto comportamental, especificando o que a pessoa faria no caso de encontrar uma aranha, seja enfrentando-a, seja buscando ajuda.
No estudo de Watts e Sharrok (1984), a análise fatorial revelou três fatores para a versão do SPQ em inglês o que é semelhante aos resultados obtidos para a versão em português desta pesquisa. Porém, a análise de itens da versão em português levou à exclusão do terceiro fator, o que está em desacordo com o estudo de Watts & Sharrok, 1984, em que três fatores foram mantidos: vigilância, preocupação e evitação-enfrentamento. Outras diferenças entre ambos os estudos referem-se a alocação de alguns dos itens nos fatores e à inclusão/exclusão dos itens no instrumento. Por exemplo, no estudo de Watts e Sharrok (1984) muitos dos itens que foram alocados nos fatores de vigilância e preocupação, carregaram no presente estudo em apenas um fator, o fator cognição.
Essa discrepância de resultados entre ambos os estudos pode ser explicada por algumas diferenças entre ambas as pesquisas. Primeiro, Watts e Sharrok (1984) utilizaram como amostra somente pessoas fóbicas, enquanto que nesta pesquisa a amostra foi formada tanto por fóbicos como por não fóbicos. Segundo, no estudo de Watts e Sharrok (1984) não parece ter havido um critério de exclusão de itens, já que, como pode ser observado na tabela 5, itens com carga fatorial tão baixas quanto 0,25 foram alocados em fatores. Terceiro, o instrumento em inglês tinha originalmente 42 itens e a análise fatorial dessa versão levou os autores a excluir 9 itens, ficando assim os 33 itens usados na presente pesquisa. Infelizmente, os autores não realizaram uma análise fatorial do instrumento resultante de 33 itens, o que impõe limitações às comparações entre o presente estudo e o de Watts e Sharrok (1984).
É importante ressaltar que no presente estudo, todos os itens que se referem ao enfrentamento do animal com instrumentos, que constituíram inicialmente um fator isolado (fator 3) foram descartados por não atingirem o critério estabelecido. Talvez esses itens somente façam sentido no país de origem do estudo (Inglaterra), pois no Brasil, não é comum, por exemplo, enfrentar uma aranha utilizando um chuveirinho, como afirma o item 22 ou utilizando um livro ou jornal, como afirma o item 10.
Em resumo, diferenças metodológicas de recrutamento da amostra e análise podem explicar as diferenças entre os resultados obtidos com a versão em português do SPQ e a versão em inglês desse instrumento. Cabe chamar a atenção para o fato de que os critérios usados para analisar a versão em português foram mais rigorosos que os usados para avaliar a versão em inglês. Por outro lado, a análise da versão em português do SPQ sugere que 17 itens, 2, 4, 6, 7, 8, 12, 15, 16, 17, 18, 20, 21, 23, 25, 27, 29 e 31, devem ser mantidos no instrumento e que os itens restantes sejam reformulados ou eliminados.
2) Questionário para Medo de Aranha (FSQ)
Como pode ser visto na Tabela 6 e na Tabela 7 os autovalores, que refletem a importância do fator (Artes & Barroso, 2000) e a variância obtidos para o FSQ no atual estudo e no estudo original foram muito semelhantes. Em ambos os estudos, a porcentagem de variância explicada pelos fatores foi de pouco mais de 50% (54,73% no estudo atual e 55% no estudo original), uma porcentagem pequena.
A carga fatorial dos itens em cada um dos dois fatores é apresentada na Tabela 8. Os resultados dessa tabela mostram que 6 dos 18 itens não tiveram a carga fatorial igual ou maior a 0,60, valor usado como critério de inclusão em um determinado fator. Isto é, 1/3 dos itens não carregam em nenhum dos dois fatores obtidos. Dos 12 itens restantes, 4 carregaram no fator 1 e 8 carregaram no fator 2. Os dois fatores obtidos para a versão em português do SPQ podem ser categorizados da forma a seguir:
Fator 1 - Comportamento: Três dos itens alocados no fator 1 no presente estudo referem-se a comportamento (1) pediria a alguém para removê-la (12) ...para matá-la, (5) preocupado em entrar em um ambiente onde tivesse visto uma aranha antes. Somente o item (14) ficaria com medo, não se refere a comportamento.
Fator 2 - Cognição: Os itens alocados neste fator são predominantemente cognitivos. Os itens 2, 4, 9, 13 e 17 referem-se a aspectos cognitivos. Somente os itens 6 e 8 não se referem a fatores cognitivos.
Na análise fatorial da versão em Inglês os autores parecem ter considerado as cargas acima de 0,45 e concluem que se denotam dois fatores: o fator 1 seria referente a evitação/busca de ajuda, similar ao do SPQ (Watts & Sharrock, 1984) e o fator 2 a medo de dano. É importante notar que no estudo original o item 16 (tabela 8) teve uma carga maior para o fator 1 (de 0,46), mas os autores consideraram como pertencente ao fator 2. Além disso, a diferença entre as cargas para o fator 1 e 2 no item 17 não é tão clara (0,66 para o fator 1 e 0,48 para o fator 2), no entanto, os autores alocam esse item no fator 1.
Dado o resultado da presente análise fatorial sugere-se que sejam mantidos no instrumento traduzido, os itens 1, 2, 4, 9, 12, 13 e 17, os quais se mantiveram mesmo após o critério de utilizar somente os itens que apresentam carga maior que 0,60 (o qual é mais rigoroso que o estudo da versão em Inglês) e somente eles se encaixaram coerentemente nos fatores 1 e 2 identificados. Os itens descartados ou foram eliminados ao estipular-se o critério de 0,60 ou não constituíram uma estrutura coerente segundo os fatores identificados (item 14 incoerente com o fator 1 e itens 6, 8 e 17 incoerente com o fator 2). O item 5 também deveria ser revisto porque pode também referir-se a um fator cognitivo, ao invés de comportamental e este item provavelmente apresenta problemas de tradução, pois o no original I would be somewat afraid to enter to a room now, where I have seen a spider before, o termo somewat poderia ter sido traduzido por relativamente, ou de certa forma, pois um pouco pode denotar gradação. Ou seja, o sujeito pode entender que em uma escala que varia de muito a pouco, o sujeito se sentiria pouco.
As discrepâncias entre os resultados obtidos no atual estudo e no estudo da versão em Inglês provavelmente refletem diferenças metodológicas. No estudo da versão em Inglês 64% dos participantes foram considerados fóbicos, enquanto na pesquisa atual somente 20,83% foram considerados fóbicos. Além disso, o método de extração não foi relatado no estudo original e embora tenhamos escolhido o mais amplamente utilizado (Análise de Componentes Principais), é possível que não tenhamos aplicado o mesmo método de extração que os autores. Uma terceira diferença está no fato de termos incluído somente itens com uma carga fatorial acima de 0,60 , enquanto os autores parecem ter utilizado um critério de 0,45.
Dado o resultado da presente análise fatorial sugere-se que os itens 1, 2, 4, 9, 12, 13 e 17 sejam mantidos no instrumento em português e que os itens restantes sejam reformulados ou eliminados. Ou seja, para que o instrumento seja utilizado na população brasileira ele deverá sofrer grandes modificações.
3) Questionário de Automaticidade e Irracionalidade (AI)
A primeira análise do Questionário de Automaticidade e Irracionalidade resultou em três fatores, no entanto o terceiro fator foi determinado somente pelos itens 13 e 18. O item 13 carregou convincentemente, mas para o item 18, a carga foi de 0,59, enquanto para o fator 1 este item teve uma carga de 0,44. Para estabelecer correlações entre a atual investigação e o estudo original foi, então, estabelecido um limite de dois fatores.
Os autovalores dos fatores e as porcentagens de variância explicada por cada fator foram muito semelhante ao atual estudo após o estabelecimento do limite de dois fatores (Tabela 9) e em ambos os estudos a porcentagem de variância explicada pelos fatores foi em torno de 65% (tabela 9 e 10), uma porcentagem relativamente significativa.
Conforme mostra a Tabela 10, no estudo da versão em Inglês, os autores consideraram que os itens sobre automaticidade carregaram convincentemente no primeiro fator (autovalor 10,36, explicando 51,8% da variância), enquanto os itens sobre irracionalidade carregaram claramente no segundo fator (autovalor de 2,66 explicando 13,3% da variância). Considerando as cargas maiores que 0,60 a análise de componentes principais com rotação varimax no atual estudo também sugeriu uma estrutura com dois fatores, semelhante ao estudo original (Tabela 11).
Fator 1-Automaticidade: Os itens que carregaram neste fator no estudo atual refere-se à Automaticidade. O estudo da versão em Inglês deste instrumento mostra que aracnofóbicos experienciam suas reações como mais automáticas que sujeitos controle. 3 itens (4, 16 e 18), que no estudo original pertenciam ao fator 2, no atual estudo, compuseram o fator 1. Podemos tentar compreender porque as questões 4, 16 e 18 no atual estudo tiveram carga maior no fator 1. Jorge (2000) afirma que itens podem ser sentidos em determinadas culturas como estigmatizantes. A questão 4, em uma menor intensidade (Eu realmente acho curioso que eu seja tão temeroso a aranhas), mas principalmente as questões 16 (Eu fico envergonhado de ser tão temeroso a aranhas) e 18 (As outras pessoas vão considerar o meu medo de aranha ridículo, e eles estão certos) parecem de alguma forma denegrir a imagem do sujeito, o que pode se relacionar a um fator mais emocional, automático, ao menos na cultura brasileira e isso talvez não seja verdadeiro no país de origem do estudo (Holanda). Além disso, a questão 4 apresenta uma construção de frase um pouco confusa.
Fator 2-Irracionalidade: Os itens que carregaram no fator 2 no estudo atual referem-se à irracionalidade, assim como o estudo da versão em Inglês. Os autores do instrumento afirmam que altos escores nestes itens significam que o indivíduo prontamente admitem que a aranha é inofensiva, enquanto baixos escores indicam que o respondente não está certo a este respeito. Fóbicos e controles normais não diferem quanto a este fator (ambos vêm a reação a aranhas como irracional) (Mayer e colaboradores, 2000). Como já foi visto, 3 itens, que no estudo original pertenciam a este fator, no atual estudo, compuseram o fator 1.
Como já vimos, as diferenças entre os resultados obtidos no atual estudo e no estudo da versão em Inglês (com relação a três itens 4, 16 e 18) provavelmente refletem diferenças sócio culturais da população em estudo. Embora este pareça ser o fator determinante das diferenças nos resultados, podemos discutir algumas diferenças de recrutamento e análise entre os estudos. 48,75% dos sujeitos na versão em Inglês eram fóbicas, enquanto na pesquisa atual somente 20,83% foram considerados fóbicos. Além disso, as participantes da pesquisa de Mayer, Merckelbach e Muris (2000) eram todas mulheres, enquanto na atual pesquisa 64,16% eram mulheres. Uma terceira diferença está no fato de termos incluído somente itens com uma carga fatorial acima de 0,60, enquanto os autores parecem ter utilizado um critério de 0,45.
Dado o resultado da presente análise fatorial sugere-se que os itens 1, 2, 3, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 19, 20 sejam mantidos no instrumento em português e que os itens restantes sofram uma adaptação cultural, pois no contexto brasileiro parecem denegrir a imagem do sujeito.
Considerações Finais
Fatores socioculturais estão presentes em quaisquer indivíduos que manifestam sinais e sintomas psiquiátricos. Sendo um determinante crítico do comportamento humano, fatores socioculturais devem ser levados em conta na avaliação psiquiátrica. A imensa maioria dos instrumentos de avaliação originam-se em países ocidentais desenvolvidos, mas quando utilizados em realidades socioculturais muito distintas surge a questão se podemos inferir se os escores resultantes dessas avaliações têm o mesmo significado para populações etnoculturais diferentes (Jorge, 2000).
No presente trabalho, os fatores sócio-culturais não influenciaram nem a consistência interna da versão em português dos instrumentos avaliados (FSQ, SPQ e AI), nem a capacidade dos instrumentos de diferenciar fóbicos de não fóbicos, pois a validade concorrente foi significativa. Esses fatores sócio-culturais parecem também não ter afetado a correlação entre os instrumentos, que foi alta e similar ao relatado para as versões em inglês (Szymanski & O'Donohue, 1995).
Diferenças metodológicas importantes tais como população, idioma e abordagem estatística podem ser aspectos que interferem na análise fatorial Gorenstein, (2000). Os resultados da análise fatorial dos instrumentos no atual estudo foram em vários aspectos diferentes dos resultados obtidos para as versões em inglês, o que é coerente com a afirmação de Gorenstein (2000). Assim, a análise fatorial das versões em português sugerem que algumas mudanças devem ser feitas ao SPQ como, por exemplo, retirar alguns itens do questionário e muitas mudanças devem ser feitas ao FSQ, retirando itens, revendo a tradução e também reformulando vários dos itens. Com relação ao Questionário de Automaticidade e Irracionalidade, algumas dos itens do devem sofrer uma adaptação cultural.
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Este projeto foi financiado pela CAPES
Recebido em Dezembro de 2005
Reformulado em Março de 2006
Aceito em Abril de 2006
1 Rua Safira, n50 casa 10 - Estância Lynce - Atibaia - SP - CEP: 12942-150, tel: (11)4413-3573, cel: (11)9718-7352 lauracgranado@gmail.com
Sobre os autores:
2 Laura Carmilo Granado: Psicóloga, mestre em psicologia pelo Programa de Neurociências e Comportamento do Instituto de Psicologia da USP. Docente na UNIESP (Faculdades Integradas Renascença) e pesquisadora do Laboratório de Saúde Mental e Psicologia Clínica Social APOIAR do Instituto de Psicologia da USP.
3 Francisco Javier Ropero Peláez: Engenheiro Eletrônico pelo ICAI (Madrid). Doutor em
Neurociências pela UAM (Madrid) e em Engenharia Mecatrônica pela USP. Ex- pesquisador da Universidade de Tóquio.
4 Mirian Garcia-Mijares: Doutora em Psicologia pelo Programa de Neurociências e Comportamento da USP, professora da Universidade de Ibirapuera dos cursos Psicologia Experimental I, Psicologia Experimental II e Técnicas de Observação do Comportamento. Pesquisadora colaboradora do Laboratório de Psicofarmacologia do Instituto de Psicologia da USP.
Agradecimento muito especial à Dra. Liana Lins Melo e ao Dr. Ricardo Primi