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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. v.6 n.1 Porto Alegre jun. 2007
ARTIGOS
Lançamento da Escala Fatorial de Extroversão (EFEx) e Escala Fatorial de Socialização (EFS)
Carlos Henrique Sancineto da Silva Nunes *
Estão sendo lançadas pela Editora Casa do Psicólogo a Escala Fatorial de Extroversão (EFEx) e Escala Fatorial de Socialização (EFS). De autoria de Carlos Henrique Nunes e Claudio Hutz, os instrumentos foram construídos para a avaliação da personalidade no modelo dos Cinco Grandes Fatores, da mesma forma que a já publicada Escala Fatorial de Neuroticismo / Estabilidade Emocional - EFN (Hutz, & Nunes, 2001). Recentemente aprovadas pelo CFP, no Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI), a EFEx e EFS são recomendadas para psicólogos que buscam avaliar aspectos da personalidade associados a Extroversão e Socialização em pesquisas, avaliações clínicas, no contexto da psicologia do trabalho e organizacional, avaliações de triagem, orientação profissional, entre outras que estão sendo pesquisadas.
A Escala Fatorial de Extroversão
A EFEx é uma escala objetiva, de auto-relato, composta por 57 itens que descrevem sentimentos, crenças e atitudes associados a traços de personalidade considerados centrais para a avaliação de Extroversão. A escala foi desenvolvida no Brasil, levando em conta os valores culturais, diversidades regionais, e especificidades dos quadros clínicos no país. Tal característica a diferencia de outros instrumentos para a avaliação desse construto, criados em outros países e adaptados para o Brasil. A Escala também apresenta como diferencial a inclusão de itens que avaliam indicadores associados a quadros clínicos e podem fornecer informações importantes para os psicólogos em variados contextos sem, no entanto, servirem isoladamente para a realização de um diagnóstico.
A EFEx avalia extroversão a partir de quatro facetas: Nível de Comunicação (E1), Altivez (E2), Assertividade (E3) e Interações Sociais (E4). A primeira faceta, Nível de Comunicação, é composta por itens que descrevem o quão comunicativas e expansivas as pessoas acreditam que são. Pessoas com escores altos nessa escala usualmente apresentam facilidade para falar em público, gostam de falar sobre si mesmos e relatam ter facilidade para conhecer pessoas novas. Este subfator também apresenta um componente associado com nível de intimidade interpessoal, que descreve quão facilmente as pessoas conseguem desenvolver vínculos consistentes com as demais.
Altivez é composta por itens que descrevem a percepção das pessoas sobre a sua capacidade e valor. Pessoas com níveis muito altos de altivez tendem a apresentar uma idéia grandiosa sobre si próprias, podendo essa característica interferir na forma como elas se relacionam com os demais, uma vez que crêem que merecem especial atenção e tratamento diferenciado. Com isso, pessoas altas em altivez tendem a ser percebidas pelas demais como arrogantes e "convencidas". Pessoas que apresentam baixos escores em Altivez tendem a ser humildes, o que não significa que necessariamente sejam baixas em auto-confiança ou auto-estima.
A terceira faceta da EFEx, Assertividade, é composta por itens que descrevem características como assertividade, liderança, nível de atividade e motivação. Pessoas altas nessa faceta tendem a ter facilidade para tomar decisões, desenvoltura para expressar e defender suas opiniões, tendem a ser muito ativas e relatam não ter receio em envolver-se em muitas atividades. É importante notar que os traços cobertos por esse fator cobrem parte das características associadas com Empreendedorismo (Ferreira, & Souza, 2006; Luminet, Bagby, Wagner, Taylor, & Parker, 1999; Schinka, Dye, & Curtiss, 1997) e, portanto, pode ser de especial interesse para avaliações no contexto organizacional e orientação profissional.
A quarta faceta da EFEx, Interações Sociais, descreve pessoas que buscam ativamente situações que permitam contato com outras pessoas, como festas, atividades em grupo, etc. Indivíduos com altos escores nessa escala tendem a ser gregários e esforçam-se para manter contato seus conhecidos. Além disso, têm uma busca ativa por situações estimulantes e lúdicas. Pessoas com escores baixos nessa faceta tendem a preferir atividades solitárias ou que exijam pouco contato com outras pessoas. Tal característica não deve ser confundida com animosidade ou antipatia, mas apenas reflete uma preferência pessoal por poucas interações interpessoais.
O manual da EFEx apresenta os estudos de validação realizados até o momento com a escala. A validade de construto, que consiste na comparação da estrutura interna identificada por análise fatorial com o modelo utilizado para a criação da escala, foi realizada em uma amostra de 1.084 pessoas de ambos os sexos, sendo que 62,7% eram mulheres. A amostra foi coletada em cinco estados brasileiros (BA, RS, SC, SP e MG), com idade média de 22,1 anos (DP=6,42). A partir desse estudo, foram identificados as quatro facetas da escala. Nesse estudo, também foram calculados os índices de consistência interna para E1, E2 E3 e E4, calculados por Alpha de Cronbach, que apresentaram valores de 0,90; 0,78; 0,78 e 0,83, respectivamente e a escala geral apresentou uma consistência interna de 0,91. Esta mesma amostra foi utilizada para a elaboração das tabelas normativas, que são especificadas a partir do sexo dos respondentes.
O manual da EFEx também apresenta os resultados de uma pesquisa que objetivou verificar a validade concorrente da EFEx, EFS e EFN, correlacionando-as com uma medida de Bem-Estar Subjetivo (BES). Participaram deste estudo 357 estudantes universitários de ambos os sexos. Todos os estudantes responderam à escala para mensuração de BES e somente a uma escala para avaliação da personalidade (EFE, EFS ou EFN). Os grupos que responderam aos instrumentos para avaliação de Extroversão, Socialização e Neuroticismo foram compostos por 100, 59 e 198 participantes, respectivamente. Foram verificadas as correlações entre as variáveis estudadas e, dentre as facetas da EFEx, a que apresentou maior correlação com Satisfação de Vida e Afeto Positivo foi E4 (r=0,47; p<0,01). Não foi encontrada correlação significativa entre a EFEx e Afeto Negativo, resultado esse que corrobora pesquisas internacionais sobre o tema (Chico Libran, 2006; Ruiz, 2005). Foi encontrada ainda uma correlação entre Afeto Negativo e Neuroticismo significativa e moderada (r=0,44; p<0,01), o que também vai ao encontro dos achados na literatura internacional.
Escala Fatorial de Socialização
A EFS é uma escala objetiva, composta por 70 itens de auto-relato, que avaliam Socialização, que é um componente da personalidade que descreve a qualidade das relações interpessoais dos indivíduos. O fator relaciona-se aos tipos de interações que uma pessoa apresenta ao longo de um contínuo que se estende da compaixão ao antagonismo. Pessoas que são altas em Socialização tendem a ser generosas, bondosas, afáveis, prestativas e altruístas. Indivíduos que são baixos em Socialização tendem a ser pessoas cínicas, não cooperativas e irritáveis, podendo também ser pessoas manipuladoras e vingativas. A EFS é composta por três facetas, denominadas Amabilidade (S1), Pró-Sociabilidade (S2) e Confiança nas Pessoas (S3).
Amabilidade agrupa itens que descrevem o quão atenciosas, compreensivas e empáticas as pessoas procuram ser com as demais. Além disso, indica o quão agradáveis as pessoas buscam ser com os outros, observando suas opiniões, sendo educadas com elas e se importando com as suas necessidades. Pessoas altas em amabilidade tendem a ser atenciosas e amáveis com as demais, demonstrando sua preocupação com as necessidades alheias. Tendem a ser proativas para resolver os problemas das pessoas, bem como expor seu apreço por elas. Altos em Amabilidade apresentam uma preocupação em tratar bem as demais pessoas, perguntando como estão e esforçando-se para que sintam-se bem. Pessoas baixas em amabilidade tendem a apresentar pouca disponibilidade para os demais, sendo auto-centrados e indiferentes para com as necessidades alheias. Apresentam pouca preocupação em promover o bem estar das demais pessoas, podendo dirigir-se a elas de forma pouco cuidadosa, tratando de assuntos delicados de forma insensível, chegando a ser hostis.
Pró-Sociabilidade agrupa itens que descrevem comportamentos de risco, concordância ou confronto com leis e regras sociais, moralidade, auto e hetero-agressividade e padrões de consumo de bebidas alcoólicas. Pessoas com altos resultados em pró-sociabilidade tendem a evitar situações de risco, bem como atitudes consideradas transgressoras à leis ou regras sociais. Tendem a apresentar uma postura franca com os demais, evitando pressioná-las ou induzi-las. Indivíduos com baixos escores em Pró-sociabilidade tendem a envolver-se em situações que podem colocá-las ou às demais pessoas em perigo. Também apresentam pouca preocupação em seguir regras, podendo apresentar uma visão que minimiza ou ignora a sua importância. Pessoas com baixos resultados em Pró-sociabilidade podem ser manipuladoras, agindo ativamente para que as demais pessoas façam o que desejam. Podem apresentar um padrão hostil de interação com os demais, tratando-os de forma desrespeitosa ou opositora. Podem apresentar um padrão elevado de consumo de álcool, o que pode potencializar as situações de risco as quais se expõem.
Confiança nas Pessoas grupa itens que descrevem o quanto as pessoas confiam nos demais e acreditam que eles não as prejudicarão. Pessoas com altos escores em Confiança tendem a apresentar uma disposição a acreditar que os outros são honestos e bem intencionados. Casos com baixos escores nessa escala tendem a ser céticos e assumem que os outros podem ser desonestos ou perigosos.
A validação de construto da EFS foi realizada com uma amostra composta por 1.100 pessoas de ambos os sexos, sendo que 70,1% eram mulheres. A amostra foi coletada em cinco estados brasileiros (BA, RS, SC, SP, PB), com idade média de 21,4 anos (DP=5,84). Foram realizadas análises fatoriais para a verificação da dimensionalidade da EFS, sendo os fatores S1, S2 e S3, com consistência interna de 0,91; 0,84 e 0,80 respectivamente. A escala geral apresentou uma consistência interna de 0,92. As tabelas normativas, separadas por sexo, foram elaboradas dessa mesma amostra.
Um estudo para verificação da validade de critério da EFS foi realizada em dois grupos, sendo um composto por 34 estudantes universitários e outro com 41 pessoas que apresentavam indicadores de transtorno da personalidade anti-social. Uma regressão logística foi realizada para verificar o poder predidivo da EFS aplicada conjuntamente com uma entrevista semi-estruturada. Com essa análise, foi verificado que a utilização combinada dessas técnicas gerou um modelo com sensibilidade de 87,8% e especificidade de 90,9%, ou seja, foi possível identificar em grande parte que grupo as pessoas estavam alocadas.
A validade concorrente da EFS foi verificada com a comparação de seus resultados com um instrumento para mensuração de Bem-estar Subjetivo, conforme já foi mencionado. Entre as facetas da EFS, a que apresentou maior correlação com Satisfação de vida foi S3 (r=0,39; p<0,01). Afeto positivo apresentou correlação estatisticamente significativa com os fatores S1 (r=0,38; p<0,01) e S3 (r=0,30; p<0,05) e foi o componente de BES que apresentou maior associação com o resultado geral da EFS (r=0,38; P<0,01). Esses resultados corroboram pesquisas internacionais sobre o tema (Chico Libran, 2006; Ruiz, 2005) e dão suporte à hipótese que Bem Estar Subjetivo pode ser explicado parcialmente pelas características de personalidade dos indivíduos.
Elementos comuns nos manuais EFEx e EFS
Os manuais das Escalas Fatoriais de Extroversão e Socialização apresentam ainda uma revisão da literatura sobre os construtos avaliados, indicando resultados de pesquisas relevantes em diversos setores. Além disso, são incluídas informações detalhadas para a aplicação, levantamento e interpretação dos resultados obtidos. Em cada manual, são apresentados dois casos ilustrativos, que facilitam a compreensão de como devem ser interpretados os escores das escalas.
Os estudos de validação da EFEx e EFS continuam a ser desenvolvidos para diversas aplicações e seus resultados serão divulgados na literatura científica da área. Estão sendo desenvolvidos aplicativos informatizados com o objetivo de automatizar o levantamento dos instrumentos, bem como agilizar o processo de atualização de tabelas normativas. Também é importante informar que está sendo realizado um trabalho para a construção da Bateria Fatorial de Personalidade (BFP), que será um instrumento objetivo projetado para avaliar todos os domínios da personalidade do modelo dos Cinco Grandes Fatores: Extroversão, Socialização, Realização, Neuroticismo e Abertura.
Referências
Chico Libran, E. (2006). Personality dimensions and subjective well-being. Span J Psychol, 9(1), 38-44.
Ferreira, A. M. & Souza, N. A. H. (2006). Traços de Personalidade em Empreendedores de Sucesso. Trabalho apresentado no II Congresso Brasileiro. Psicologia: ciência e profissão, São Paulo.
Hutz, C. S. & Nunes, C. H. S. S. (2001). Escala Fatorial de Neuroticismo. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Luminet, O., Bagby, R. M., Wagner, H., Taylor, G. J., & Parker, J. D. (1999). Relation between alexithymia and the five-factor model of personality: a facet-level analysis. Journal of Personality Assessment, 73(3), 345-358.
Ruiz, V. M. (2005). The five-factor model of personality, subjective well-being, and social adaptation: generalizability to the Spanish context. Psychological reports, 96(3 Pt 1), 863-866.
Schinka, J. A., Dye, D. A., & Curtiss, G. (1997). Correspondence between five-factor and RIASEC models of personality. Journal of Personality Assessment, 68(2), 355-368.
Sobre o autor:
* Carlos Henrique Sancineto da Silva Nunes: psicólogo, mestre e doutor em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. E-mail: carloshnunes@mac.com