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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431

Aval. psicol. vol.11 no.3 Itatiba jul./set. 2012

 

 

Evidências de validade do teste de Pfister para avaliação de crianças

 

Validity Evidence of the Pfister test for children assessment

 

Evidencias de Validez del test de Pfister para evaluación de niños

 

 

Anna Elisa de Villemor-Amaral1; Pâmela Malio Pardini; Raquel Rossi Tavella; Fabiola Cristina Biasi; Paula Bertoni Migoranci

Universidade São Francisco

 

 


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi verificar a validade do teste das pirâmides de Pfister em crianças, mais especificamente, sua sensibilidade para identificar diferenças no desenvolvimento cognitivo e emocional. Foram avaliadas 85 crianças de 6 e 12 anos, de ambos os sexos. As aplicações foram feitas nas escolas e de forma individual. Compararam-se os dados quanto à frequência das cores, síndromes cromáticas e o aspecto formal. As crianças menores tiveram uma frequência significativamente maior de amarelo e síndrome de estímulo, assim como tapetes puros e com início de ordem. As crianças maiores apresentaram aumento das cores branca e preta em relação às crianças menores, assim como mais estruturas em manto. Esses achados demonstram que o teste de Pfister é sensível para revelar indicadores de maior controle emocional decorrentes do desenvolvimento cognitivo, conforme esperado teoricamente, o que constitui uma evidência de validade para o seu uso na população infantil.

Palavras-chave: avaliação psicológica; Pfister; pirâmides coloridas; crianças.


ABSTRACT

The aim of this study was to verify the validity of the Pfisters Pyramids Test in children, specifically its sensibility to identify differences in cognitive and emotional development. 85 children were assessed, of 6 and 12 years old, both genders. The test was taken individually, in the school. The frequency of colors, chromatic syndrome and formal aspect were compared. The main results showed that the younger children had a significantly higher frequency of yellow and stimulation syndrome, as well as pure carpets and carpets with begin of organization. The children showed an increase in white and black in relation to young children. The 12 years have also revealed the structure of the mantle further increased. These findings demonstrate that the Pfister test is sensitive to reveal indicators of greater emotional control resulting from cognitive development, as expected theoretically, which is an evidence of validity for its use in children.

Keywords: psychological assessment; Pfister; color pyramid test; children.


RESUMEN

El objetivo fue comprobar la validez de las pirámides de Pfister con niños, específicamente su sensibilidad para identificar diferencias en el desarrollo cognitivo y emocional. Se evaluaron 85 niños de 6 y 12 años, ambos sexos. Las aplicaciones se realizaron en las escuelas y de forma individual. Se compararon los datos sobre la frecuencia de colores, síndromes cromáticos y aspecto formal. Los niños más pequeños presentaran una frecuencia significativamente mayor de síndrome de estímulo y de amarillo, así como alfombras puras y con inicio de orden. Los niños mayores mostraron un incremento del blanco y negro en relación a los más pequeños, así como más estructuras en manto. Estos hallazgos demuestran que la prueba de Pfister es sensible para revelar los indicadores de un mayor control emocional, como resultado del desarrollo cognitivo, como se esperaba teóricamente, lo que representa una evidencia de validez para su uso en la población infantil.

Palabras-clave: evaluación psicológica; Pfister; pirámides coloridas; niños.


 

 

A avaliação psicológica na infância é especialmente complexa uma vez que este período da vida é marcado por diferentes fases do desenvolvimento. Os recursos para acompanhar e verificar dificuldades emocionais e cognitivas em cada etapa precisam ser suficientemente refinados de modo a contribuir para identificar fraquezas e potenciais e fazer orientações confiáveis e seguras (Nascimento, Pedroso & Souza, 2009). A avaliação psicológica infantil é um processo que deve envolver várias técnicas, com características diferentes, que possibilitem a expressão de si mesmo de maneiras diversificadas. Isso propicia uma apreensão mais abrangente e profunda da maneira de ser da criança e uma tomada de decisões de acordo com suas potencialidades e condições do ambiente em que ela está inserida (Satller, 2001, citado por Schelini, Gomes & Wechsler, 2006).

Um dos instrumentos que podem ser úteis nesse contexto é o Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC) - uma técnica projetiva que propicia a avaliação de aspectos de natureza cognitiva e da dinâmica emocional de um indivíduo. O Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister foi desenvolvido pelo psicólogo, coreógrafo e arquiteto suíço Max Pfister, em 1951. Essa técnica possui a vantagem de ser não verbal e ter características lúdicas, o que facilita bastante aceitação e o engajamento na tarefa a ser executada (Villemor-Amaral, 1978; Villemor-Amaral, 2005) tanto por adultos quanto pelas crianças.

Em 1948, Max Pfister publicou seus primeiros trabalhos sobre o Teste das Pirâmides Coloridas. No Brasil, foi Fernando de Villemor-Amaral quem publicou o primeiro estudo de adaptação e validação da técnica, em 1966. Os estudos que se preocupavam com a validade do teste foram escassos desde então e somente no ano de 2003 publicou-se um estudo que contribuiu com dados normativos mais recentes, considerando-se a frequência das cores de 109 participantes classificados como não-pacientes, por não estarem em atendimento psicológico, nem fazendo uso de medicamento. Os valores obtidos foram semelhantes aos apresentados na edição de 1978, acrescentando-se tabelas com valores para uma amostra normativa referente à frequência do aspecto formal, não contemplado nos estudos anteriores (Villemor-Amaral, Primi, Farah, Cardoso & Franco, 2003).

Para compreender melhor como a técnica de Pfister contribui na avaliação da personalidade, é importante antes compreender qual o papel das cores nos métodos projetivos no contexto do diagnóstico psicológico. Hermann Rorschach (1921, citado por Villemor-Amaral, 2005) já havia sistematizado muitas informações para compreender a personalidade do indivíduo com base na maneira com que reage às cores. As cores fazem parte da vida do indivíduo como estímulos naturais e em todas as culturas as cores têm participado de manifestações artísticas e religiosas, com atribuições simbólicas comuns que se repetem através dos anos, com poucas variações em diferentes grupos culturais (Villemor-Amaral, 2005).

Segundo o Pfister, a escolha das cores indica o modo de contato afetivo e de aproximação emocional com o meio, podendo apontar estados mais excitados, no caso das cores quentes, ou mais calmos e contidos, em se tratando das cores frias (Villemor Amaral, 1978). No grupo das cores quentes estão o vermelho, o laranja e o amarelo, já no grupo das cores frias estão o azul, o verde e o violeta. O cinza, preto e branco são denominadas acromáticas e consideradas como indicadores de contenção, inibição ou negação (Villemor-Amaral, 2005).

Não apenas as frequências e combinações de cores utilizadas devem ser analisadas na produção final do sujeito. A análise completa envolve principalmente a observação do modo de execução do trabalho, da configuração formal das pirâmides e da maior variabilidade da escolha das cores na construção das três pirâmides.

A configuração ou o chamado aspecto formal, identificado pela disposição das cores em cada pirâmide, é um indicador de maturidade emocional e do nível de desenvolvimento cognitivo (Villemor-Amaral, 2005). O maior ou menor grau de estruturação das pirâmides demonstra níveis diferentes de maturidade cognitivo-emocional, o que indica controle sobre os estados emocionais. É a precisão da forma atribuída à pirâmide, associada às cores que a compõe, o que permite uma compreensão mais abrangente da dinâmica emocional de quem a produziu. É possível que o mesmo aspecto formal adquira significados diferentes dependendo das cores utilizadas.

As síndromes cromáticas também devem ser analisadas considerando-se agrupamentos típicos de cores. As quatro síndromes principais são normalidade, estímulo, fria e incolor. A síndrome de normalidade resulta da soma das cores azul, vermelha e verde, que costumam predominar nas pessoas em geral e, tal como respostas populares ou banais nos testes de manchas de tinta, sugere a capacidade de manter uma conduta normal e adaptada, decorrente de certa estabilidade e equilíbrio emocional. A síndrome de estímulo, composta pelas cores vermelha, amarela e laranja, agrega as cores consideradas mais estimulantes ou quentes, indicando mais energia, tendência à extroversão e ao contato afetivo e social mais expansivo, mas, quando aumentada, pode indicar tendência ao egocentrismo e à desadaptação. A síndrome fria – azul, verde e violeta - constituída pelas cores frias, aponta para características antagônicas a das cores quentes e seu aumento exagerado foi observado em quadros patológicos com características esquizoides (Villemor-Amaral, 1978). Se a elevação for maior devido à elevação do verde ao invés do violeta, por exemplo, será menos patológico, uma vez que costuma ser a elevação do violeta, acima do valor normativo, que, segundo Villemor-Amaral (1978) estaria mais associada à patologia. A síndrome incolor, resultante da soma do preto, branco e cinza, também chamada síndrome de neutralidade ou acromática, aparece comumente de forma reduzida, e representa uma negação ou anulação dos estímulos coloridos propriamente ditos. Seu aumento indica, portanto, fuga de situações afetivas ou estimulantes como tentativa de manutenção de um equilíbrio frágil. Se o preto for a cor mais aumentada desse grupo, maior será a repressão, enquanto que se o aumento decorrer devido à elevação do branco, a fragilidade e a insegurança serão mais relevantes.

Além disso, é também relevante, no teste, a análise da fórmula cromática que indica a amplitude e a constância da escolha das cores. Diz respeito à quantidade de cores usadas no teste e a sua repetição ou omissão ao longo das três pirâmides. A classificação e interpretação de suas variações possibilita compreender o grau de receptividade e retraimento em relação aos contatos interpessoais e se refere à estabilidade emocional da pessoa (Justo & Van Kolck, 1976).

Dadas as características desse teste e a hipótese fundamental de que, por meio da repostas, é possível apreender aspectos da personalidade do indivíduo, deve-se considerar de que modo uma teoria sobre o desenvolvimento infantil pode respaldar algumas interpretações atribuídas aos indicadores do teste e aos resultados apresentados por crianças. Para isso, neste trabalho, buscou-se destacar alguns pontos centrais nas concepções de Piaget e Wallon que possam apoiar as discussões dos dados obtidos na presente pesquisa.

Piaget descreve o desenvolvimento infantil marcado por estágios que se definem por modos distintos de funcionamento cognitivo, classificados em quatro períodos: sensório-motor, pré-operatório, operatório-concreto e operatório-formal. O sensório- motor se inicia no período do nascimento e vai até aproximadamente dois anos de idade. É caracterizado por percepções sensoriais e ações motoras em que a criança não retém representações mentais, necessitando assim da permanência do objeto. Já o período pré-operatório costuma se estender aproximadamente dos dois aos sete anos e neste estágio se ampliam os processos de simbolização, se desenvolve a linguagem oral, os pensamentos são mais sustentados por conceitos, a lógica é interiorizada. Caracteriza-se também por egocentrismo cognitivo, ausência de reversibilidade, elaboração do pensamento voltada aos indícios perceptivos e raciocínio intuitivo.

A etapa seguinte é denominada de operatória concreta e abrange aproximadamente as idades dos sete aos doze anos. Suas principais características refletem o raciocínio lógico menos autocentrado e a possibilidade de a criança realizar operações mentais para resolver problemas, surgindo aí a noção de massa, quantidade e forma e também se estabelecendo a reversibilidade do pensamento. As limitações dessa fase se referem à lógica que é restrita à realidade presente e imediata da criança. Por último, há o período das operações formais, que vai dos doze anos em diante, no qual a capacidade simbólica da criança está bem estabelecida e operações mentais com alto grau de abstração podem ser realizadas. Aos 12 anos, de acordo com a teoria de Piaget, o ser humano está apto a entrar no estágio final do desenvolvimento cognitivo, caracterizado pela capacidade de pensar abstratamente. Essa é a fase das operações formais, que proporciona uma maneira mais flexível de manipular as informações (Piaget, 1970). A capacidade de pensar em termos abstratos também traz implicações emocionais. Antes, por exemplo, a criança podia amar os pais ou odiar um colega. Agora “o adolescente pode amar a liberdade ou odiar a exploração. O possível e o ideal cativam tanto a mente quanto os sentimentos” (Ginsburg & Opper, 1979 citado por Papalia, 2010, p. 416).

Do mesmo modo que a teoria de Piaget permite compreender de modo mais claro o desenvolvimento cognitivo, encontra-se na teoria de Wallon, muito bem discutida por Dantas (1992), o respaldo para compreender o desenvolvimento emocional, profundamente articulado com o desenvolvimento cognitivo, destacando-se o que se considerou fundamental para apoiar a discussão sobre as produções no teste de Pfister. Desse modo, sua concepção de que a emoção está na origem da razão, que surge de certa forma para regulá-la, é muito importante para compreender a dinâmica emocional ao longo do desenvolvimento e suas peculiaridades nas diferentes faixas etárias. Na sua perspectiva genética, a conduta emocional depende inicialmente da atividade cerebral subcortical e somente com a maturação pode ser processada no nível cortical, ficando suscetível ao controle voluntário. Uma forte e intensa reação emocional só poderá ser contida quando ‘corticalizada’ (Dantas, 1992, p. 88), ou seja, conhecida.

Nessa perspectiva, as emoções tendem a diminuir a eficácia do funcionamento cognitivo, tendo um caráter mais regressivo, e o comportamento que tem na origem a emoção será mais adaptado às circunstâncias dependendo da capacidade cortical de controlá-las. É justamente quando a emoção não consegue se transformar em ação mental ou motora que produzirá efeitos desorganizadores. Na sua concepção de desenvolvimento, Wallon supõe etapas em que a emoção é gradativa e dialeticamente incorporada às construções da inteligência de modo que as formas mais adultas de afetividade diferem enormemente das formas mais infantis. Depois de constituída a função simbólica, instala-se o que poderia ser chamado de uma forma mais cognitiva de vinculação afetiva com os outros (Dantas, 1992).

Sob ambos os pontos de vista, o de Piaget e o de Wallon, espera-se ações, comportamentos e produções diferenciadas em crianças dependendo do momento do desenvolvimento emocional e cognitivo em que estejam, de modo que quanto mais maduras, melhores serão as condições de usarem o pensamento como modo de conter emoções. Assim, como se está verificando a validade de um teste baseado na escolha de cores para a construção de pirâmides, é preciso indagar em que medida este fato se expressa claramente por meio da manipulação de estímulos cromáticos.

Como afirmado acima, para Herman Rorschach, já em 1921, estava claramente demonstrado que a maneira de reagir à cor era análoga à maneira de reagir aos afetos, de forma que reações à cor de modo mais puro, sem tanta consideração à forma, refletiriam estados mais primitivos do desenvolvimento emocional. A acuidade da percepção da forma, estando mais atrelada a processos racionais, teria participação mais significativa em indivíduos com maior nível de estabilidade emocional de modo que “quanto mais estáveis os afetos, tanto mais precisa é a visão de formas; quanto mais lábeis os afetos, tanto menos precisa será a visão das formas” (Rorschach, 1967, p. 32). Rorschach também chamava a atenção sobre as reações específicas das pessoas ao vermelho, embora não tenha feito referências semelhantes às demais cores que apareciam nas manchas. No Pfister, isso poderia ser expresso pelo modo como a reação às cores se integra com a percepção da forma e de que modo ambos – cor e forma – aparecem relacionados nas produções das crianças, de tal modo que níveis mais diferenciados de organização e manipulação dos estímulos possam ser observados nas mais velhas.

Na revisão de literatura realizada nas bases Scielo e Psycinfo, foram poucos os estudos encontrados que destacaram dados relativos às diversas etapas do desenvolvimento. Pedromonico, Lopes & Vieira (1984) estudaram estatisticamente o comportamento de escolha de cores em 128 protocolos de adolescentes do sexo feminino, com idade entre 17 e 23 anos. O objetivo da pesquisa foi obter informações para validar o uso das Tabelas de Adulto - Pirâmides Bonitas e Feias - propostas por Schaie e Heiss (1964). Porém, os resultados encontrados mostraram diferenças significativas na frequência das cores no grupo estudado, evidenciando a inadequação do uso das tabelas feitas para adultos nessa população.

Outro estudo realizado foi o de Jacob e cols. (1999) com o objetivo de demonstrar, por meio dos testes Desenho da Casa-Árvore-Pessoa (HTP) e do Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC), o funcionamento afetivo de 50 crianças com idade entre 8 e 12 anos, de ambos os gêneros. As crianças foram divididas em dois grupos de 25 sujeitos, um deles com atraso escolar, e o outro grupo apresentando desempenho escolar satisfatório e idade compatível com a série cursada. O resultado da pesquisa revelou que, no grupo de crianças sem atraso escolar, predominou uma melhor utilização dos recursos intelectuais e afetivos, associado a elevado nível de exigência, favoráveis a um aprofundamento da compreensão sobre o modo como as crianças estão vivenciando essa etapa do desenvolvimento.

Oliveira, Pasian e Jacquemin (2001) realizaram um estudo com a finalidade de analisar a vivência de idosas asiladas e também as não asiladas. Os grupos foram compostos por 25 mulheres com mais de 60 anos. Os instrumentos utilizados foram a entrevista semiestruturada, focalizando a história de vida nas diferentes fases e o Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister. O resultado obtido sobre o funcionamento lógico sinaliza que as idosas não asiladas apresentam organização e criatividade na elaboração lógica, e as idosas institucionalizadas apresentam um funcionamento lógico menos elaborado, sugerindo menor abstração e um esforço para estabilidade afetiva. Com relação à afetividade, os resultados não evidenciaram diferenças significativas, sugerindo que a afetividade é vivida de maneira semelhante em ambos os grupos, mas, qualitativamente, o grupo não asilado apresentou uma tendência maior à racionalização e à introspecção. A ansiedade ficou evidenciada em ambos os grupos.

Cardoso e Capitão (2007) avaliaram 81 crianças de 6 a 12 anos com surdez, que compararam com 37 crianças ouvintes e não relataram nenhuma dificuldade em relação às instruções da montagem do Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister. Os resultados apontaram evidências de ansiedade nas surdas quando comparadas às ouvintes. As crianças ouvintes apresentaram uma estruturação cognitiva mais sofisticada do que as surdas, sendo que as surdas apresentaram mais tapete puro e somente nas produções das ouvintes encontrou-se estrutura simétrica e formação de ladrilho.

Com base nesses estudos prévios, buscou-se encontrar evidências de validade desenvolvimental para avaliação da maturidade cognitiva e emocional, comparando-se o desempenho de crianças de 6 e 12 anos. Tanto para Piaget como para Wallon elas constituem faixas etárias com características bastante distintas do desenvolvimento.

 

Método

Participantes

Para o estudo, participaram 85 indivíduos de ambos os sexos, com idade de 6 e 12 anos, frequentando a série esperada para a idade. Dentre eles, 38 crianças de 6 anos, sendo 47,4 % do gênero feminino e 47 crianças de 12 anos, sendo 55,3% do gênero feminino. Todas as crianças frequentavam escolas públicas do interior de São Paulo, e foram selecionados por meio de amostra não aleatória por conveniência. O critério de inclusão foi a família nunca ter procurado ajuda psicológica ou psiquiátrica para a criança e esta não ter queixas específicas na escola.

Instrumento

O Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC) foi criado por Max Pfister (1888-1958) em 1951. O TPC propõe a execução de três pirâmides coloridas, conforme o gosto do examinando. O material necessário para a aplicação compõe-se de um jogo de três cartões em papel bege, no qual se encontra desenhada uma pirâmide, formada de cinco camadas de quadrados de 2,5 cm de cada lado. A base compreende 5 quadrados, as linhas seguintes 4 e 3 e, para terminar, 2 e 1 no vértice. O esquema da pirâmide vem acompanhado com um jogo de quadrículos coloridos compostos por 10 cores, subdivididas em 24 tonalidades. Requer-se ao menos 45 etiquetas (2,5cm x 2,5cm) de cada matiz, para que o indivíduo tenha a possibilidade de poder construir a pirâmide toda com uma só tonalidade. As cores que compõem o material do teste são o azul, o verde e o vermelho (quatro tonalidades de cada), violeta (três tonalidades), amarelo, laranja e marrom (duas tonalidades cada), preto, branco e cinza (Villemor- -Amaral, 2005).

A pessoa é convidada a construir três pirâmides e as instruções são simples e devem ser dadas de forma padronizada: “Aqui existe um esquema de uma pirâmide e com esses quadrículos coloridos você irá completar todos os quadrados da pirâmide; é permitido trocar as etiquetas já colocadas; não precisa apressar-se, você dispõe de tempo à vontade para realizar o trabalho; o importante é que a pirâmide fique bonita conforme o seu gosto”. Feita a primeira pirâmide, pede-se para o indivíduo construir outra; é preferível avisá-lo de que há ainda uma terceira (e última) a ser construída. Assim que o sujeito se declarar satisfeito com a pirâmide construída deve-se ocultá-la, para que o indivíduo construa a seguinte sem influência da anterior. Após o término das três pirâmides, pergunta-se qual das três ele preferiu e o porquê (Villemor-Amaral, 2005).

Quanto a sua validade, poucos estudos foram publicados nos últimos 10 anos, considerando-se a população infantil. Nesse sentido, destacam-se as pesquisas de Cardoso (2006) que avaliou 81crianças de 6 a 12 anos com surdez e pareou com 37 crianças ouvintes e não relatou nenhuma dificuldade em relação às instruções da montagem das pirâmides (Villemor-Amaral, 2005), mas encontrou diferenças cognitivas nos resultados entre os grupos de crianças surdas e ouvintes. Em outro estudo, Farah (2010) comparou o resultado do teste de 200 crianças entre 6 e 10 anos e não encontrou diferença significativa entre os gêneros.

Procedimentos

Este trabalho constitui-se num recorte de pesquisas que vêm sendo conduzidas, há cerca de nove anos, pela equipe do LAPSaM. Trata-se de estudos sobre as qualidades psicométricas do Pfister, pesquisas estas submetidas e aprovadas pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco.

Para levar adiante o estudo proposto, primeiramente foi feito contato com a Secretaria de Educação de uma cidade do interior paulista pedindo autorização para aplicação dos testes nas escolas. Uma vez autorizado pela secretaria, contataram- -se as escolas para pedir autorização dos diretores, enviaram-se os termos de consentimento para que permitissem a participação dos filhos.

Com as autorizações em mãos, marcaram- -se horários nas escolas para a aplicação dos testes. Os instrumentos foram aplicados individualmente em uma sala separada, apenas nas crianças cujos pais assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, tendo uma duração de cerca de 15 a 20 minutos. Feitas as aplicações, excluíram-se da amostra aquelas crianças que apresentavam, conforme o relato dos professores, queixas específicas de problemas de aprendizagem ou emocionais que demandaram encaminhamentos psicológicos ou psiquiátricos. Foram incluídas somente crianças com as idades compatíveis com a série. Embora o relato do professor nem sempre seja o melhor parâmetro para se separar grupos considerados como clínicos ou não-clínicos, tem-se encontrado na literatura estudos que levaram em conta a ausência de tratamento psicológico ou psiquiátrico como um critério possível, como é o caso de pesquisas com o Rorschach (Exner, 1993).

Para análise dos resultados, levaram-se em conta principais aspectos do teste. São eles, frequência das cores, síndromes cromáticas, o aspecto formal das pirâmides e fórmula cromática.

 

Resultados

Buscando diferenças entre os grupos em relação ao Teste das Pirâmides Coloridas (TPC), foram feitas comparações de média das porcentagens das cores, síndrome cromática e frequência dos aspectos formais. Como ainda não existem dados de normatização do TPC para crianças, optou-se por realizar análises que pudessem oferecer normas para esses dois grupos. No que diz respeito às cores, buscou- -se a frequência média de cada cor, considerando-se as três pirâmides realizadas por cada criança. Em relação às síndromes cromáticas, levantou-se a frequência das mesmas para todo o grupo. E para o aspecto formal, buscou-se a frequência total das formações no conjunto das três pirâmides.

Na Tabela 1, comparou-se a frequência total de cores utilizadas nas idades de 6 e 12 anos, por meio do teste t de student. Observou-se a diminuição significativa do amarelo para as crianças de 12 anos. Esse dado se associa a uma tendência ao uso menos frequente, embora não de modo estatisticamente significativo, das cores vermelho e laranja também aos 12 anos, o que pode corresponder a um certo retraimento e maior controle da expressão emocional mais exuberante, relacionado com o amadurecimento afetivo e cognitivo da criança. Com relação aos tons acromáticos, preto e branco, o resultado para as crianças de 12 anos foi significativamente mais aumentado, o que também se relaciona com a diminuição da espontaneidade infantil. Ambos achados corroboram as teorias de desenvolvimento que apontam para modos mais contidos e adaptados de expressão emocional conforme o amadurecimento com o avanço das idades. A cor cinza aumentou nas crianças de 6 anos em comparação às de 12, o que pode ser compreendido com base na tendência atribuída ao aumento dessa cor (Villemor-Amaral, 1978) à projeção dos afetos de maneira tímida e insegura de pessoas que são sensíveis, impressionáveis e vulneráveis, características encontradas em crianças dessa idade.

 

 

A Tabela 2 traz os resultados das médias das cores em função do gênero. Apenas o violeta tem resultado significativo (p= 0,003), mostrando um aumento da cor violeta para o sexo feminino.

 

 

A Tabela 3 apresenta a média dos resultados das frequências das síndromes cromáticas apresentadas nas 3 pirâmides. A síndrome de estímulo está aumentada nas crianças de 6 anos quando comparadas às de 12, podendo corresponder à capacidade de extroversão e ao contato afetivo e social, e uma tendência ao egocentrismo, que segundo Piaget (1983) é própria da fase.

 

 

O resultado da síndrome incolor apresentou aumento nas crianças de 12 anos e foi estatisticamente significativo (p=0,00). A síndrome incolor nesse grupo está principalmente determinada pelo aumento da cor branca, mostrando a fragilidade e a insegurança vivida nessa fase do desenvolvimento, relacionada ao início da puberdade, em que a interação social ganha um novo significado. Villemor-Amaral (1978) já argumentava que essa síndrome representava, em parte, um modo de controle emocional adquirido com a socialização, o que é corroborado por esse resultado.

Na Tabela 4, observam-se os resultados das síndromes comparadas ao gênero, em que não se observam diferenças significativas, embora haja uma tendência a valores mais baixos da síndrome de normalidade em meninas, o que pode ser decorrência do aumento da cor violeta nesse grupo. Na Tabela 5, apresenta-se a frequência dos aspectos formais por idade nas pirâmides, destacando-se apenas os que demonstraram diferenças significativas.

 

 

Como pode ser observado na Tabela 5, os resultados obtidos por meio do teste Mann-Whitney, o aumento nas respostas de tapete puro (U =574,500, p = 0,002) e de início de ordem (U = 822,500, p = 0,050) para seis anos, foi significativo. Segundo Villemor Amaral (1978), os tapetes puros e com início de ordem sempre denotam maior imaturidade ou um nível intelectual pouco diferenciado. Especificamente o tapete com início de ordem pode demonstrar certo esforço de estabilização ou estruturação da personalidade e estes dados vão ao encontro do esperado para o desenvolvimento. O aspecto formal das pirâmides, ou, a forma como ela é construída, representa um dado fundamental da análise, pois a partir dele é possível perceber como é o controle racional do sujeito sobre seus afetos e emoções. Esse dado também é importante para relacionarmos o funcionamento cognitivo, as funções de atenção e concentração apresentadas (Villemor-Amaral, 2005).

 

 

Já no que diz respeito à estrutura em manto (U = 798,000, p = 0,040) os resultados foram significativamente maiores para a idade de 12 anos. Os mantos podem representar defesas de fechamento em si, ou repressão e sufocamento dos impulsos (Villemor-Amaral, 1978), fato compatível com a entrada na adolescência, mas de certo modo revelam a tendência observada de haver maior quantidade de estruturas nas crianças maiores, em contraposição aos tapetes nas menores.

Outro aspecto formal que teve resultado significativo foi mutilação (U = 745,500, p = 0,020) para a idade de 12 anos, trata-se do uso do branco ou tons esbranquiçados concentrados em uma camada inteira. De acordo com Villemor-Amaral (1978), isso pode ser característico de uma instabilidade estrutural decorrente de conflitos e cisões que podem atingir dissociações no pensamento. Mais uma vez aí é possível encontrar apoio nas teorias do desenvolvimento e nas dificuldades que surgem no princípio da adolescência para compreender esse achado na pesquisa. Foram feitas análises comparando a frequência do aspecto formal conforme o gênero, as quais não mostraram diferenças significativas.

 

Conclusão

Com base nos resultados encontrados, pode- -se observar desempenhos diferentes das crianças com 6 e com 12 anos que acompanham as características descritas pelas teorias de desenvolvimento de Piaget e Wallon, no sentido de demonstrar níveis de maturidade cognitiva emocional diferenciados. As crianças mais velhas apresentam indicadores de maior capacidade de lidar com as emoções, ou às vezes defesas mais estruturadas que garantam o controle ou contenção de sentimentos e impulsos, como é o caso do uso de mais cores acromáticas e o aparecimento de estruturas. Assim como no estudo de Cardoso e Capitão (2007) e no estudo de Jacob e cols. (1999), prejuízos no desenvolvimento podem ser evidenciados nesse teste. Isso se constitui numa evidência de validade para o uso do teste de Pfister com crianças, revelando sua sensibilidade para identificar características da personalidade relacionadas ao desenvolvimento. Sugere-se, entretanto, mais pesquisas de validade, considerando-se grupos clínicos, por exemplo, para avançar nos estudos de validação do Pfister para uso no contexto infantil.

 

Referências

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Recebido em abril de 2012
Reformulado em maio de 2012
Aceito em julho de 2012

 

 

Sobre as autoras:

Anna Elisa de Villemor-Amaral: Doutora em ciências pela Unifesp/EPM. Pós–Doutorado pela Universidade da Savoia na França. Professora Associada Doutora do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco.
Pâmela Malio Pardini: Aluna de Iniciação Científica do curso de Psicologia da Universidade São Francisco. Bolsita PROBAIC.
Raquel Rossi Tavella: Aluna de Mestrado em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Bolsista CAPES.
Fabiola Cristina Biasi: Aluna de Mestrado em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Professora Auxiliar não concursada do curso de Psicologia da Universidade São Francisco.
Paula Bertoni Migoranci: Aluna de Iniciação Científica do curso de Psicologia da Universidade São Francisco. Bolsista CNPq.


1Endereço para correspondência:
Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45 CEP 13251-900 Tel. (11)4534-8040 E-mail: anna.villemor@usf.edu.br