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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.12 no.1 Itatiba abr. 2013

 

 

Construção e Validação de uma Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho

 

Development and Validation of a Quality of Life at Work Scale

 

Construcción y validez de una Escala de Evaluación de Calidad de Vida en el Trabajo

 

 

Fabián Javier Marín Rueda1; Fernanda Ottati; Lariana Paula Pinto; Thatiana Helena de Lima; Juliana Maximila de Paula Bueno

Universidade São Francisco

 

 


RESUMO

O objetivo do estudo foi desenvolver uma escala para avaliar a Qualidade de Vida no Trabalho. Nesse sentido foi realizado estudo de validade com base na análise da estrutura interna, assim como análise da consistência interna. Participaram 248 trabalhadores, com idades entre 18 e 63 anos, sendo 80,2% do sexo feminino. Na análise dos resultados, após a verificação da fatorabilidade da escala, recorreu-se à análise fatorial exploratória que apontou a existência de quatro fatores, explicando 48,70% da variância, a saber, ‘QVT relacionada à integração, respeito e autonomia', ‘QVT relacionada à compensação justa e adequada', ‘QVT relacionada a possibilidades de lazer e convívio social' e ‘QVT relacionada a incentivo e suporte'. A análise da consistência interna evidenciou valores de alfa considerados muito bons. Sugere-se que novos estudos de validade sejam feitos, especialmente com variáveis critério, para fornecer mais evidências sobre a adequação do instrumento.

Palavras-chave: qualidade de vida no trabalho; psicologia do trabalho; instrumentos de medida; psicometria; avaliação psicológica.


ABSTRACT

The aim of the study was to develop a scale to assess the Quality of Working Life. In this sense validity study was conducted based on the analysis of the internal structure, as well as internal consistency analysis. 248 employees participated, aged 18-63 year-old (M\ SD), with 80.2% female. In analyzing the results, after checking the factorability of the test, it was used exploratory factor analysis which indicated the existence of four factors, explaining 48.70% of the variance, namely, 'QWL related to integration, respect and autonomy', QWL related to fair and adequate compensation', 'QWL possibilities for leisure and social interaction' and 'QWL related to encouragement and support.' The analysis of internal consistency showed alpha coefficients considered very well. It is suggested that further studies on validity must be made, especially with criterion variables, to provide more evidence about the suitability of the instrument.

Keywords: quality at work life; industrial psychology; measurements; psychometrics; psychological assessment.


RESUMEN

El objetivo del estudio fue construir una escala para evaluar la Calidad de Vida Laboral. Para eso fue realizado un estudio de validez basándose en el análisis de la estructura interna, así como el análisis de la consistencia interna. Participaron 248 trabajadores con edades entre 18 y 63 años, siendo 80,2% del sexo femenino. Después de verificar la factorabilidad de la escala, en el análisis de los resultados se recurrió al análisis factorial exploratorio y se identificó la existencia de cuatro factores, explicando 48,70% de la variancia, siendo ellos, ‘CVL relacionada a integración, respeto y autonomía', ‘CVL relacionada a compensación justa y adecuada', ‘CVL relacionada a posibilidades de ocio y convivio social' y ‘CVL relacionada a incentivo y apoyo'. El análisis de la consistencia interna mostró valores de alfa considerados muy buenos. Se sugiere que sean realizados otros estudios de validez, especialmente con variables de criterio, para ofrecer más evidencias sobre la calidad del instrumento.

Palabras-clave: calidad de vida laboral; psicología del trabajo; instrumentos de medida; psicometría; evaluación psicológica.


 

 

A qualidade de vida é um constructo considerado relevante em várias áreas de estudo, como por exemplo, medicina, saúde pública, sociologia, economia, administração e psicologia (Wallander & Schmitt, 2001). Como definição, pode-se entender a qualidade de vida como um conceito subjetivo, que está relacionado à percepção que as pessoas têm sobre suas vidas, referindo-se a satisfação com as suas próprias expectativas e projetos (Espinosa & Morris, 2002). Além disso, também está relacionada com a tomada das próprias decisões, organização da própria vida e relacionamento pessoal e aspectos que constituem o seu entorno (Poveda e cols., 2004). Vale a pena destacar que o conceito de qualidade de vida teve sua origem em uma evolução conceitual que incluiu felicidade, o bemestar e o nível e as condições de vida, sendo estes antecessores e não sinônimos (Schwartzmann, 2003).

De acordo com Both e cols. (2006), a qualidade de vida tem sido um tema bastante discutido e estudado, sendo que a Organização Mundial de Saúde (WHO) a define como a percepção do indivíduo sobre sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações. A WHO concebe a qualidade de vida como um termo subjetivo e multidimensional, incluindo tanto facetas positivas quanto negativas.

Os autores Near, Rice e Hunt (1978) destacam que o indivíduo poderá encontrar-se em melhor ou pior qualidade de vida dependendo de alguns fatores, tais como, os econômicos, os psicológicos, ou aqueles relacionados ao seu trabalho. Afirmam ainda, que a qualidade de vida de uma pessoa como um todo está relacionada com sua satisfação com o trabalho e outras variáveis relacionadas a sua atividade ocupacional.

Nesse sentido, pode-se dizer que a expressão Qualidade de Vida no Trabalho (QVT) surgiu na literatura no início do século XX, sendo o termo inicialmente utilizado para representar a satisfação do trabalhador no ambiente de trabalho e na tentativa de proporcionar melhorias das condições de trabalho (Sampaio, 1999). Já de acordo com French (1996), o conceito de QVT foi originário de uma série de conferências realizadas no final da década de 1960 e início de 1970, pelo Ministério do Trabalho dos Estados Unidos e pela Fundação Ford. Nesses eventos, foi considerado como sendo mais do que satisfação com o cargo ocupado e incluía outros aspectos, como a participação em alguns momentos de tomada de decisão, o aumento da autonomia na rotina do trabalho e a reorganização da estrutura organizacional, como forma de estimulação para o aprendizado, promoção, interesse e participação no trabalho.

Porém, segundo Vieira (1996) o termo foi implantado em 1970 e trabalhado até 1974, pois com a crise de petróleo da época, o interesse passou a ser com os fatores econômicos e não com os trabalhadores, o que mudou a partir de 1979, uma vez que em 1980 começaram as participações dos trabalhadores nas decisões das empresas. Já na década de 1990, o objetivo das grandes companhias era com os valores ambientais e humanos. No que se refere à QVT no Brasil, Deus (2006) afirma que começou a ser trabalhada e estudada por conta da competitividade, e que em países como a Alemanha o conceito está bastante desenvolvido no que se refere às questões práticas.

Em que pese ao conceito de QVT não ser novo, é um termo que apresenta certa dificuldade de definição, uma vez que tem particularidades relacionadas à subjetividade e à multidimensionalidade, ou seja, depende em grande parte dos valores e crenças dos indivíduos, assim como de seu contexto cultural e sua história pessoal, implicando na valoração objetiva e subjetiva das diferentes dimensões das necessidades humanas (Baltazar, Santacruz, & Estrada, 2007). Ainda, apesar de amplamente estudado, o conceito de QVT possui diversas definições, que tendem a convergir, e a seguir serão apresentadas algumas delas.

O modelo de QVT proposto por Walton (1973) enfatiza as necessidades e aspirações do ser humano, bem como a responsabilidade social do trabalhador. Dessa forma, o autor propõe oito categorias conceituais que enfatizam os fatores de influência na QVT, quais sejam, 1) compensação justa e adequada, referindo-se à remuneração justa e apropriada, apesar de não haver um consenso sobre a melhor maneira de avaliar a adequação salarial; 2) condições de trabalho, que está relacionado tanto com a estrutura física do ambiente quanto com critérios que minimizem o risco de doenças e lesões, a quantidade da carga horária e o ajustamento de funções a pessoas mais velhas; 3) oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades, permitindo que o trabalhador desenvolva habilidades e conhecimento; 4) oportunidade de crescimento contínuo e segurança, este fator se refere à estabilidade no emprego e plano de carreira, bem como aperfeiçoamento profissional; 5) integração social no trabalho, alude a experiências interpessoais isentas de preconceitos, igualitarismo entre estruturas hierárquicas, mobilidade, apoio ao grupo, senso de comunidade e relacionamento interpessoal; 6) constitucionalismo, compõe deveres e direitos dos trabalhadores como privacidade, liberdade de expressão e o direito a um tratamento equitativo; 7) trabalho e o espaço total da vida, considerando que as experiências no trabalho podem influenciar outras esferas da vida do indivíduo; 8) relevância social, que se refere ao trabalho social que a organização se propõe perante a sociedade. As oito dimensões inter-relacionadas formam um conjunto que possibilita ao pesquisador apreender os pontos percebidos pelos trabalhadores como positivos ou negativos na sua situação de trabalho.

Para French (1996), QVT trata de uma filosofia de gestão que se preocupa com o empregado, realizando mudanças culturais com vistas ao desenvolvimento pessoal desse funcionário. Por sua vez, Gibson, Ivanicevich e Donelly (1996) ainda acrescentam que a QVT busca promover a produtividade e melhorar a motivação das pessoas, dando ênfase à participação das pessoas, bem como eliminando os aspectos disfuncionais da estrutura organizacional.

A QVT também é definida por Albuquerque e Limongi-França (1998) como o conjunto de ações de uma empresa, que envolve diagnóstico e implantação de melhorias e inovações de gerenciamento, tecnológicas e estruturais dentro e fora do ambiente de trabalho. Para outros autores, como Herrera e Cassals (2005), a QVT é o grau em que os membros de um coletivo são capazes de satisfazer as necessidades pessoais por meio de suas experiências no contexto organizacional, atuando sobre aspectos importantes para o desenvolvimento psicológico, social e profissional do indivíduo, provocando motivação para o trabalho e melhorando a capacidade de adaptação às mudanças no ambiente de trabalho, e melhorando a criatividade e a vontade para inovar e aceitar as mudanças organizacionais. Por sua vez, Baltazar, Santacruz e Estrada (2007) definem QVT como sendo um conceito multidimensional que se baseia na satisfação, por meio do emprego de várias necessidades pessoais, sendo a QVT chave para a realização pessoal, familiar e social, e um meio de preservar a economia e a saúde.

Com base nessas definições, é possível observar a importância de dois aspectos, quais sejam, o desenvolvimento pessoal do trabalhador e a eficiência empresarial. No Brasil, a discussão sobre a QVT é recente e, em geral, as pesquisas visam à compreensão a respeito de situações individuais dos trabalhadores em seus ambientes laborais, incluindo aspectos comportamentais e de satisfação individuais (Limongi-França, 2004). Destaca-se que o modelo de Walton (1973) é um dos mais aceitos e utilizados por pesquisadores brasileiros e estrangeiros, e por isto, no presente trabalho, ele será o referencial teórico.

No que se refere à construção de instrumentos para avaliação da QVT no Brasil, são poucos os estudos encontrados na literatura que tenham trabalhado com este objetivo. Dessa forma, percebeu-se a necessidade de descrever os estudos com QVT encontrados, mesmo quando não relacionados diretamente com construção de instrumento, com o intuito de clarificar a importância de pesquisas na área.

O estudo de Deus (2006), entre outros objetivos, apresentou a análise da estrutura fatorial de uma escala de QVT, a partir da aplicação em 227 trabalhadores, sendo 173 do setor privado e 54 do setor público, com ensino médio completo. A escala de QVT tinha como base o modelo de análise proposto por Walton e elaborada e validada por Petroski (2005). O instrumento originalmente possuía 34 itens a serem respondidos por meio de escala Likert de sete pontos. Porém, para o estudo, Deus (2006) utilizou somente 14 itens, que possuíam carga fatorial superior a 0,40. A partir dessa escala reduzida, o método PAF com rotação varimax foi realizado, suprimindo valores absolutos com carga inferior a 0,40 e os resultados indicaram a existência dos 8 fatores de QVT, porém, um único fator explicou 32,59% do construto, ficando cada um dos outros 7 com uma capacidade explicativa muito restrita, uma vez que em conjunto eles explicaram 19,78% da variância. A partir desses resultados, a autora concluiu que a QVT teria uma estrutura unidimensional.

Outro estudo com a proposta de elaboração de instrumento capaz de avaliar a qualidade de vida no trabalho foi proposto por Timossi, Pedroso, Pilatti e Francisco (2009), e teve como objetivo adaptar o modelo de Walton para um instrumento sobre QVT no Brasil. Os autores dividiram o estudo em quatro etapas, quais sejam, organização e adaptação das questões; desenvolvimento das escalas de respostas; aplicação do instrumento adaptado a 99 indivíduos; e análise dos coeficientes de consistência encontrados por fator e do instrumento como um todo. O instrumento adaptado tinha uma escala de respostas do tipo Likert, polarizada em cinco pontos e fundamentada no modelo de respostas utilizado no WHOQOL-100, proposto pela Organização Mundial da Saúde. Os resultados indicaram alta consistência interna, apresentando um coeficiente alfa de Cronbach igual a 0,96. Dessa forma, os autores concluíram que a simplificação dos itens da escala favoreceu também pessoas de baixa escolaridade e garantiu resultados fidedignos sem alterar os critérios e objetivos do instrumento original.

Por sua vez, verificar a validade de conteúdo e fidedignidade da Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho Percebida por Professores de Educação Física do Ensino Fundamental e Médio (QVT-PEF) foi o objetivo do estudo de Both e cols. (2006). A escala possui 34 itens distribuídos em oito fatores, propostos na teoria de Walton e, originalmente, foi construída para uso com professores de ensino superior e, por isto, foi realizado o novo estudo. Para a validação de conteúdo, 19 especialistas na área realizaram a verificação da adequação e representatividade dos itens aos oito fatores, e os resultados indicaram concordância acima de 70%, chegando a 100% em algumas questões. No que se refere à avaliação da fidedignidade, a escala foi aplicada em 58 professores de Educação Física das redes municipal, estadual e particular de Florianópolis em dois momentos, com intervalo de uma semana entre eles. A análise por meio da correlação de Spearman verificou que todas as dimensões da escala tiveram valores de magnitude forte. Por fim, a análise da consistência interna revelou um alfa de Cronbach de 0,95, considerado excelente. Os autores concluíram que a escala ainda deve ser aperfeiçoada, a partir de estudos com amostras maiores e representativas, mas que sua utilização em pesquisas é justificada.

Diante do exposto, observa-se a importância da avaliação da qualidade de vida no trabalho, assim como também a escassez de instrumentos que permitam respostas fidedignas, o que dificulta esta avaliação. Dentro desse contexto, o presente estudo se propõe a apresentar a construção e as análises psicométricas de uma Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho, tendo como base a proposta teórica de Walton (1973).

 

Método

Construção dos itens

Os itens da Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho foram construídos com base nas oito dimensões propostas por Walton em 1973, quais sejam, ‘compensação justa e adequada', ‘condições de trabalho', ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades', ‘oportunidade de crescimento contínuo e segurança', ‘integração social no trabalho', ‘constitucionalismo', ‘trabalho e o espaço total da vida' e ‘relevância social da vida no trabalho'. Inicialmente cinco profissionais, sendo um doutor, três doutorandas e uma mestranda, todos em psicologia, elaboraram de forma separada entre quatro e seis itens para cada uma das dimensões. Nesse primeiro momento, foram criados 193 itens (média de aproximadamente 24 itens por dimensão).

De posse desses itens iniciais foram realizados cinco encontros de aproximadamente 90 minutos cada, nos quais os itens de cada um dos fatores foram discutidos pelo grupo com o intuito de eliminar aqueles com enunciados semelhantes, assim como também aqueles que não se referiam ao fator em questão ou que apresentavam enunciado dúbio. Assim, após essa etapa, o fator ‘integração social no trabalho' ficou composto por nove itens, os fatores ‘compensação justa e adequada' e ‘condições de trabalho' ficaram com oito itens cada, ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades' e ‘trabalho e o espaço total da vida' com sete itens e, por fim, as dimensões ‘oportunidade de crescimento contínuo e segurança', ‘constitucionalismo' e ‘relevância social da vida no trabalho' ficaram compostos por seis itens cada um. Dessa forma, a versão inicial elaborada pelos cinco profissionais ficou composta por 57 itens.

O próximo passo foi realizar uma análise de juízes, com objetivo de verificar se os itens estavam adequados às definições das oito dimensões propostas por Walton (1973). Para isso, os 57 itens foram sorteados aleatoriamente para compor a versão a ser enviada aos juízes junto às definições operacionais das dimensões. Os juízes que participaram dessa etapa eram dois profissionais psicólogos com experiência em construção de instrumentos, que julgaram cada item, informando a qual fator cada um deles pertencia. A análise de juízes revelou que em 45 (78,94%) itens houve concordância, enquanto que oito (14,04%) deles apresentaram divergência, sendo que um juiz apontou a dimensão correta e o outro não. Nesse caso, os itens foram discutidos um a um pelos cinco pesquisadores, chegando à conclusão que os mesmos deveriam ser mantidos. Ainda, houve quatro itens (7,02%) que foram assinalados por ambos os juízes como sendo pertencentes a dimensões diferentes da proposta, inicialmente. Tais itens foram excluídos da escala. Assim sendo, após a análise de juízes, a escala ficou composta por 53 itens, que passaram novamente por uma revisão dos autores. Ressalta-se que, nessa última revisão, um item da escala foi retirado, pois se entendeu que poderia levar a ambiguidade de interpretação, assim como a semântica de mais quatro itens foi modificada em pequenos detalhes (vírgulas e redação), visando uma melhor compreensão.

Dessa forma, chegou-se à versão final da escala composta por 52 itens e que apresentou o seguinte enunciado para o respondente: ‘Esta escala tem como objetivo avaliar a qualidade de vida no trabalho. A seguir encontra-se uma lista com afirmações que você deverá ler com atenção e assinalar com um ‘x' o quanto você concorda ou discorda delas. Responda pensando na empresa na qual você trabalha atualmente. Não há respostas certas ou erradas. Portanto, responda com sinceridade'. Os itens foram adaptados e organizados em uma escala Likert de cinco pontos (discordo totalmente, discordo parcialmente, nem discordo/nem concordo, concordo parcialmente e concordo plenamente), que foram respectivamente pontuados de 1 a 5.

Participantes

Participaram da pesquisa 248 trabalhadores com idades variando entre 18 e 63 anos (M = 28,07; DP = 9,92), e escolaridade desde o Ensino Fundamental até a Pós-Graduação. No que se refere ao sexo, a maioria era mulher (N = 199), representando 80,2% da amostra. Destaca-se que mais da metade dos participantes eram estudantes universitários, sendo critério de inclusão na amostra que trabalhasse dentro de uma organização. No que se refere à área de trabalho, eram sujeitos que trabalhavam na área comercial, industrial ou no ramo de prestação de serviços. O tempo de trabalho dentro da organização variou de um mês até 19 anos, sendo o tempo médio de aproximadamente três anos. Ressalta-se que a quantidade de participantes que trabalhava há menos de um ano na organização representou 6,86% da amostra (17 pessoas). Por conta dessa baixa porcentagem, e mesmo sabendo que participantes com menos de um ano podem ainda não ter tido tempo suficiente de consolidarem suas percepções acerca da qualidade de vida vivenciada em seu ambiente laboral, optou-se por mantê-los na amostra.

Procedimento e análise de dados

O projeto de pesquisa foi primeiramente submetido e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade São Francisco. A coleta de dados ocorreu de forma coletiva no caso dos estudantes universitários, e de forma individual no restante da amostra. A duração foi de aproximadamente 20 minutos, sendo esclarecidos primeiramente os objetivos da pesquisa, solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e, por fim, a resposta à escala. No caso específico das respostas, informou-se aos participantes sobre a importância de preencher todos os itens e que não existiam alternativas certas ou erradas.

Para estudar a evidência de validade relativa à estrutura interna dos itens, foi realizada uma análise fatorial, utilizando-se a análise dos componentes principais, com rotação varimax. No que se refere aos índices de precisão, foram calculados pelo coeficiente Alfa de Cronbach. Por fim, os fatores obtidos na análise foram estudados por meio do coeficiente de correlação de Pearson.

 

Resultados

O primeiro passo foi realizar uma análise fatorial a fim de avaliar se os 52 itens eram passíveis de serem fatorados e quantas dimensões uma primeira análise sugeriria, utilizando como parâmetros eigenvalues igual ou maior que 1,5 e cargas fatoriais acima de 0,30. Sendo assim, o KMO foi de 0,892, apresentando χ2 = 5984,36, com nível de significância de p<0,001. Nessa análise, foram retirados sete fatores, explicando 50,80% da variância total.

O passo seguinte foi retirar os itens que se encontravam em mais de um fator e com cargas fatoriais abaixo de 0,40 (valor imposto pelos pesquisadores). Feito isso, foi realizada novamente uma análise fatorial com rotação varimax. O KMO encontrado nessa segunda análise foi de 0,900 e o teste de esfericidade de Bartlett foi significativo ao nível de p<0,001, apresentando χ2 = 3905,21. Assim, foi identificado que as correlações parciais eram bastante satisfatórias, o que permitiu que se desse prosseguimento ao modelo de análise fatorial.

Com base nos critérios impostos pelos pesquisadores, e analisando o scree-plot, verificou-se que os itens se agruparam em quatro dimensões. O atendimento do critério especificado possibilitou a permanência de 35 itens, explicando 48,70% da variância total. Dessa forma, e após a conversão em seis interações, foram estabelecidos os itens e fatores que compuseram a versão final da Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho. Essas informações, bem como as respectivas cargas fatoriais por item e as comunalidades dos mesmos estão apresentadas na Tabela 1.

 

 

A denominação dos fatores foi feita conforme a reunião dos itens obtida. Vale observar que, para a tomada de decisão sobre a nomenclatura, houve um cotejamento entre os dados empíricos e os fatores propostos e mais aqueles apontados por Walton (1973). Dessa forma, em que pese à proposta inicial de oito dimensões, foi observado que apenas quatro fatores poderiam ser explicados. Nesse sentido, os fatores foram denominados como sendo "Qualidade de Vida no Trabalho relacionada a...". Assim sendo, o Fator 1 foi chamado QVT relacionada à ‘Integração, respeito e autonomia', e ficou composto por 15 itens; o Fator 2 foi chamado QVT relacionada à ‘Compensação justa e adequada' e foi composto por seis itens; o Fator 3 foi denominado de QVT relacionada à ‘Possibilidades de lazer e convívio social' e ficaram agrupados nele seis itens; e por fim, o Fator 4 foi chamado de QVT relacionada a ‘Incentivo e suporte', ficando integrado por oito itens.

Em relação aos índices de confiabilidade, os fatores alcançaram valores de alfa muito bons, sendo que os Fatores 1 e 2 apresentaram coeficientes de 0,89, enquanto que o Fator 3 apresentou um alfa de 0,84. O Fator 4 foi o único que apresentou um índice de precisão inferior a 0,80 (α = 0,76).

Dando continuidade às análises estatísticas, realizouse uma correlação de Pearson entre os fatores encontrados na Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho. Os resultados podem ser observados na Tabela 2.

 

 

A Tabela 2 mostra que as correlações entre os fatores foram todas de magnitude moderada, exceção feita à correlação entre a QVT relacionada à possibilidades de lazer e convívio social e a QVT relacionada a incentivo e suporte, que foi de magnitude fraca (Dancey & Reidy, 2006). Esses resultados podem ser interpretados no sentido de cada um dos fatores avaliar aspectos bastante relacionados entre si, porém apresentam especificidades particulares a cada um deles que não podem deixar de ser levados em conta ao realizar uma avaliação do conceito como um todo.

 

Discussão e considerações finais

O desenvolvimento da escala proposta neste estudo é decorrente da ausência de instrumentos disponíveis para a avaliação da qualidade de vida no trabalho, principalmente no que diz respeito à área da Psicologia. Ainda, deve ser destacado que são poucos os estudos que se propuseram a estudar as propriedades psicométricas de escalas elaboradas com esse propósito. Como exemplo, podem-se citar as pesquisas de Both e cols. (2006), Deus (2006) e Timossi e cols. (2009). Em todas elas, a proposta teórica que embasou a construção dos instrumentos foi a de Walton (1973).

Destaca-se que apenas a pesquisa de Deus (2006) propôs a realização de análise fatorial, e que os resultados encontrados diferem dos da presente investigação, pois a autora conseguiu encontrar os 8 fatores propostos por Walton (1973). As demais pesquisas apresentaram apenas dados referentes à elaboração dos instrumentos e análise de consistência interna. Mas, é importante ressaltar a afirmação de Hutz (2010), de que estudos sobre propriedades psicométricas de instrumentos são necessários para o avanço da avaliação psicológica.

Ao se examinar os itens de cada um dos quatro fatores encontrados nesta pesquisa, três aspectos podem ser observados. O primeiro se refere ao fato de existirem itens que se aglutinaram em algumas das dimensões inicialmente pretendidas; itens referentes a mais de uma dimensão proposta por Walton (1973) que foram agrupados em um mesmo fator; e itens referentes à proposta de Walton que foram eliminados na análise realizada.

No caso do Fator 1 (QVT relacionada à integração, respeito e autonomia), nele ficaram agrupados itens pertencentes a quatro dimensões propostas por Walton (1973), sendo em sua maioria itens das dimensões ‘integração social no trabalho' (sete itens) e ‘constitucionalismo' (cinco itens). Ainda foram agrupados dois itens pertencentes à dimensão ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades' e um item da dimensão ‘compensação justa e adequada'. Em que pese a itens de quatro dimensões terem sido agrupados em um único fator, ressalta-se que os dois que se referem à dimensão ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades' apresentam um enunciado que se refere apenas à autonomia do funcionário (‘tenho autonomia para realizar meu trabalho' e ‘tenho autonomia para tomar decisões'). Ainda, o enunciado do item da dimensão ‘compensação justa e adequada' é ‘as responsabilidades que tenho são adequadas a minha função'.

Ao Fator 2 foi dada a denominação de QVT relacionada à remuneração. Ressalta-se que dos oito itens iniciais propostos para essa dimensão, um acabou sendo excluído das análises por não se adequar aos critérios de análise propostos (‘os benefícios oferecidos pela empresa são justos') e outro ficou agrupado no fator 1 (‘as responsabilidades que tenho são adequadas a minha função'). Em ambos os casos, observa-se que eles não partilham do enunciado dos seis itens que compõem o fator, que se referem exclusivamente à compensação salarial.

Por sua vez, no Fator 3 (QVT relacionada a possibilidades de lazer e convívio social) ficaram agrupados cinco dos sete itens inicialmente propostos para a dimensão denominada por Walton (1973) como ‘trabalho e espaço total da vida'. Ainda, um item da dimensão ‘condições de trabalho' também ficou nesse fator (‘minha carga horária é adequada'). Analisando o enunciado das frases que compuseram esse fator, percebe-se que dizem respeito ao convívio familiar, social e de lazer fora da empresa, sem que o trabalho ou as atividades realizadas na mesma interfiram nesse convívio. Dessa forma, considerar a carga horária de trabalho adequada é um requisito fundamental para que esse convívio possa acontecer.

Por fim, no Fator 4 (QVT relacionada a incentivo e suporte) ficaram agrupados itens pertencentes a quatro dimensões propostas por Walton (1973), sendo em sua maioria itens das dimensões ‘oportunidade de crescimento contínuo e segurança' e ‘condições de trabalho' (três itens de cada). Ainda foi agrupado um item pertencente à dimensão ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades' e um item da dimensão ‘relevância social da vida no trabalho'. Em que pese a itens de quatro dimensões tenham sido agrupados em um único fator, ressalta-se que o que se refere à dimensão ‘oportunidade de uso e desenvolvimento das capacidades' apresenta um enunciado que pode ser interpretado como uma preocupação de planejamento que a organização possui (‘as atividades que devo executar são planejadas com antecedência'). Ainda, o enunciado do item da dimensão ‘relevância social da vida no trabalho' é ‘a empresa me incentiva a realizar atividades culturais'.

O Fator 1 (QVT relacionada à integração, respeito e autonomia) foi o que representou o a promoção do respeito pelas diferenças individuais e pelos direitos dos funcionários, a colaboração e respeito entre os colegas, assim como a promoção da autonomia por meio de normas e regras claras. Alguns exemplos de itens que se encaixaram nesse fator foram "Os colegas de trabalho me ajudam quando preciso", "Minha vida pessoal é respeitada" e "Tenho clareza dos meus direitos e deveres na empresa". No que se refere ao Fator 2 (QVT relacionada à remuneração), os itens nele congregados são referentes à qualidade de vida que estaria atrelada à satisfação com o salário e às políticas salariais da organização. A título de ilustração, apresenta-se o item "Meu salário é justo para o esforço (físico ou mental) que realizo".

Por sua vez, itens que se aglomeraram no Fator 3 (QVT relacionada a possibilidades de lazer e convívio social) dizem respeito às qualidades de convívio extra organização, proporcionadas com base em algumas características da própria organização, como a jornada e trabalho e carga horária. O item "Com minha jornada de trabalho tenho tempo para me dedicar à família" mostra a expressão do sentido captado nesta dimensão. Por fim, o Fator 4 (QVT relacionada a incentivo e suporte) agregou os itens relacionados ao incentivo e suporte que a organização proporciona aos seus funcionários, e que estariam refletindo na qualidade de vida dos mesmos. Tais incentivos e suporte estão relacionados a treinamentos, cursos de aperfeiçoamento, incentivo à realização de atividades culturais, por exemplo. Um dos itens que pode exemplificar o fator é 'Sou incentivado(a) a realizar cursos de aperfeiçoamento'.

No que diz respeito à precisão, os valores apurados podem ser considerados muito bons, visto que três dos quatro fatores apresentaram índices superiores a 0,80. Ainda, ressalta-se que todos os fatores apresentaram valores superiores ao apontado por Cronbach (1951) para considerar a precisão satisfatória (0,70).

Ao correlacionar os fatores obtidos, percebeu-se correlações de magnitude moderada e fraca entre eles (Dancey & Reidy, 2006). Esse resultado permite interpretar que todos os fatores estão intimamente relacionados ao construto geral de QVT, assim como também se pode inferir que eles avaliam aspectos diferentes do construto, em que pese a terem características em comum. Embora as oito dimensões propostas por Walton (1973) não tenham sido confirmadas, os quatros fatores extraídos neste estudo permitem associar os resultados a, pelo menos, seis dimensões sugeridas pelo autor. Com base nos elementos apresentados, tanto da estrutura interna da escala, como dos índices de precisão e das correlações obtidas entre as medidas, pode-se dizer que a Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho apresenta propriedades psicométricas bastante adequadas e satisfatórias.

Em função de ter apresentado boas condições psicométricas, e por sua avaliação e análise serem originárias de aspectos que buscassem retratar as condições de trabalho dos diversos ambientes organizacionais, a Escala de Avaliação da Qualidade de Vida no Trabalho pode ser utilizada em praticamente todos os setores. Diante da escassez de instrumentos voltados para a área organizacional e que apresentem adequadas propriedades psicométricas para a realidade brasileira, os profissionais que têm interesses em compreender a QVT, têm a mão um instrumento que permitirá uma medida do nível de qualidade do funcionário, a partir de sua própria percepção das condições a que está inserido.

Porém, vale ainda ressaltar que novos estudos se fazem necessários, na tentativa de buscar outras evidências de validade para o instrumento, como por exemplo, investigar sua relação com outros aspectos relacionados ao ambiente organizacional, dentre eles, satisfação no trabalho, clima organizacional, saúde ocupacional. Assim, novas pesquisas se fazem necessárias, com amostras diferenciadas e/ou com características específicas, na tentativa de representar todos os contextos ocupacionais e suprir algumas das limitações aqui encontradas.

 

Referências

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Recebido em dezembro de 2011
Reformulado em maio de 2012
Aceito em agosto de 2012

 

 

Sobre os autores

Fabián Javier Marín Rueda: é Psicólogo, doutor em Psicologia pela Universidade São Francisco, e docente do Programa de Pós- Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, Itatiba.
Fernanda Ottati: é Psicóloga, Mestre em Psicologia e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Docente do curso de Psicologia da Universidade São Francisco, Itatiba.
Lariana Paula Pinto: é Psicóloga, Mestre em Psicologia e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco.
Thatiana Helena de Lima: é Psicóloga, Mestre em Psicologia e doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Bolsista CAPES.
Juliana Maximila de Paula Bueno: é Psicóloga, mestranda em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, Itatiba. Bolsista CAPES/INEP.


1Endereço para correspondência:
Prof. Dr. Fabián Javier Marín Rueda, Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45, Centro, Itatiba-SP. CEP: 13251-900. E-mail: marinfabian@yahoo.com.br