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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. vol.15 no.2 Itatiba ago. 2016
Intenção empreendedora em estudantes universitários: adaptação e validação de uma escala (QIE)
Entrepreneurial intention among university students: Adaptation and validation of a scale (QIE)
Intención emprendedora en estudiantes universitarios: adaptación y validación de un cuestionario (QIE)
Belkis Maria da Fonseca Oliveira1,IDiana Aguiar VieiraII; Ana LaguíaIII; Juan Antonio MorianoIII; Vasco Jorge Salazar SoaresIV
IUniversidade Portucalense Infante D. Henrique
IIISCAP/IPP Politécnico do Porto
IIIUniversidad Nacional de Educación a Distancia
IVInstituto Superior de Entre Douro e Vouga
RESUMO
O objetivo deste artigo é a validação de uma escala sobre a Intenção Empreendedora (QIE) em universitários de Portugal. Essa escala foi desenvolvida e validada na Espanha, tendo sido posteriormente validada em outros países e idiomas. O QIE se enquadra na Teoria da Ação Planificada, traduzindo-se no modelo mais amplamente utilizado para prever as intenções empreendedoras. A TAP constitui um marco teórico coerente e de aplicação geral que permite compreender e prever as intenções empreendedoras, tendo em consideração não só os fatores pessoais, mas também sociais. Neste estudo de validação participaram 326 estudantes de várias universidades do norte de Portugal. Os resultados do modelo de fatores estruturais confirmam que o QIE tem uma alta fiabilidade e validade preditiva sobre a intenção empreendedora e que é uma escala aplicável ao contexto português.
Palavras-chave: intenção empreendedora; estudantes universitários; validação de uma escala.
ABSTRACT
The current research aims to validate the Entrepreneurial Intention Questionnaire (EIQ) in Portugal. The scale was developed and validated in Spain, and later validated in other countries and languages though not yet in Portugal. The EIQ draws on the Theory of Planned Behavior, the most widely used model for predicting entrepreneurial intention. The TPB provides a coherent theoretical and general application framework that allows us to understand and predict entrepreneurial intentions, taking into account not only personal fators but also social ones. This validation study has involved a sample of 326 Portuguese university students. The results of the structural equation modeling confirm that the EIQ has a high reliability and predictive validity of entrepreneurship intention and, except for some items, this is a scale applicable to Portuguese context.
Keywords: entrepreneurial intention; university students; scale validation.
RESUMEN
El objetivo de este artículo es la validación de uma escala de intención emprendedora (CIE) en Portugal. Esta escala ha sido desarrollada y validada en España, y posteriormente validada en otros países e idiomas, aunque todavía no en Portugal. El CIE se enmarca en la Teoría de la Acción Planificada, que es el modelo más ampliamente utilizado para predecir las intenciones emprendedoras. La TAP ofrece un marco teórico coherente y de aplicación general, que nos permite entender y predecir las intenciones emprendedoras, teniendo en cuenta no sólo fatores personales, sino también sociales. En este estudio de validación ha participado una muestra de 326 estudiantes universitarios portugueses. Los resultados del modelado de ecuaciones estructurales confirman que el CIE tiene una alta fiabilidad y validez predictiva sobre la intención emprendedora y que, a excepción de algunos ítems, es una escala aplicable al contexto portugués.
Palabras-clave: intención emprendedora; estudiantes universitarios; validación escala.
O empreendedorismo é considerado, na atualidade, um fenômeno de grande importância para o desenvolvimento da economia e um dos motores do crescimento mundial (Acs, Audretsch, Braunerhjelm, & Carlsson, 2012; Gonçalves Capontes, 2012).
A atual crise econômica tem realçado o interesse pelo empreendedorismo, embora o estudo do comportamento empreendedor tenha começado no início do século XX, nas ciências econômicas, na área da Psicologia, o empreendedorismo surge como uma linha de investigação no início da década de 1970 com o trabalho de David C. McClelland, em que se analisou como a motivação para o sucesso em estudantes universitários se relaciona, 14 anos depois, com as suas ocupações. Nesse estudo, verificou-se que os diplomados com alta motivação para o sucesso tinham desenvolvido a sua carreira profissional como empreendedores (McClelland, 1965). Esse estudo pioneiro marca o início de numerosas investigações sobre as principais características psicológicas que distinguem as pessoas empreendedoras das não empreendedoras (Ahmed, 1985; Brockhaus, 1980).
Como resultado às críticas teóricas e metodológicas a essa abordagem baseada nas diferenças individuais entre empreendedores e não empreendedores (Robinson, Stimpson, Huefner, & Hunt, 1991; Shane & Venkataraman, 2000), e a sua limitada capacidade preditora (Krueger, Reilly, & Carsrud, 2000) surgiu uma perspetiva que sugere o estudo da intenção empreendedora resultante da análise da decisão voluntária e consciente de empreender.
A criação de uma empresa é um processo que requer tempo, planificação e elaboração cognitiva, pelo que é possível considerar que o comportamento empreendedor pode ser considerado como um comportamento planificado (Katz & Gartner, 1988). Dentro do estudo do comportamento empreendedor, a intenção empreendedora situa-se na fase de pré-lançamento e é o antecedente mais estudado na criação de empresas (Liñán, Nabi, & Krueger, 2013; Moriano, Gorgievski, Laguna, Stephan, & Zarafshani, 2012).
Tem-se verificado que a intenção é o melhor preditor de qualquer tipo de comportamento planificado, especialmente quando esse comportamento é pouco habitual, difícil de observar e/ou implica atrasos imprevisíveis (Krueger et al., 2000). Criar uma empresa implica em uma série de requisitos, o que conduz a que se possa considerar um tipo de comportamento planificado, onde os modelos teóricos sobre as intenções resultam adequados no âmbito da investigação.
A Teoria da Ação Planificada (TAP; Ajzen, 1991, 2011), amplamente utilizada em diversas áreas com o objetivo de prever diferentes tipos de intenções comportamentais, constitui o modelo mais utilizado no estudo da intenção empreendedora (Autio, Keeley, Klofsten, Parker, & Hay, 2001; Fayolle & Liñán, 2014; Haus, Steinmetz, Isidor, & Kabst, 2013; Moriano et al., 2012; van Gelderen et al., 2008).
A TAP assenta na premissa de que a intenção depende da influência de três componentes: (a) atitude face ao comportamento, (b) a norma subjetiva, e (c) o controle comportamental percebido. No entanto, cada um desses componentes pode ter um peso diferente variando a sua importância em função dos comportamentos e das situações (Ajzen, 1991). De fato, estudos prévios sobre a intenção empreendedora mostram que a influência de cada um dos componentes do modelo varia nas investigações (Krueger et al., 2000), fruto de variáveis sociodemográficas, tais como, por exemplo, o sexo (Haus et al., 2013; Moriano, Palací, & Morales, 2007). Na maior parte das investigações realizadas, o controle comportamental percebido é considerado como o preditor mais robusto do comportamento. Especificamente para a intenção empreendedora, a variância explicada a partir desses três componentes oscila entre 20% e 65% (Autio et al., 2001; Liñán et al., 2013).
Nesse contexto, estudos realizados em vários países, como Alemanha (Jacob & Richeter, 2005), Espanha (Moriano, Palací, & Morales, 2006), Estados Unidos, Finlândia, Suécia (Autio et al., 2001), Índia e Irã (Moriano et al., 2012), Noruega (Kolvereid, 1996) e Rússia (Tkachev & Kolvereid, 1999), salientam a importância da TAP como forma de predizer a intenção empreendedora uma vez que essa teoria permite compreender e predizer a intenção, não só a partir de fatores psicológicos, como também sociais (Krueger et al., 2000).
Uma das principais críticas apontadas ao estudo da TAP (Moriano et al., 2012) é a utilização de questionários díspares em vários países sem validação das suas propriedades psicométricas, podendo esse aspecto explicar as diferenças nos resultados obtidos entre diferentes estudos.
Os estudos sobre intenção empreendedora frequentemente são realizados com amostras de estudantes do ensino superior (Autio et al., 2001; Krueger et al., 2000). Autores como Liñán e Chen (2006) justificam a adequação da eleição de uma amostra de estudantes universitários do último ano com os seguintes argumentos: (a) esse tipo de amostra é comum na investigação empírica sobre a intenção empreendedora; (b) os estudantes do último ano fazem parte do grupo etário com mais tendência a empreender - 25 a 34 anos; e (c) ao ter de fazer opções profissionais, poderão responder às perguntas de forma mais consciente.
O Estudo da intenção empreendedora
Os modelos de intenção empreendedora surgem a partir das limitações e críticas aos modelos de traços de personalidade (Robinson et al., 1991; Shane & Venkataraman, 2000), uma vez que o desenvolvimento de intenção empreendedora depende da combinação de fatores pessoais e de fatores sociais. Krueger et al. (2000) refere que os modelos de intenção empreendedora funcionam como modelos sólidos, generalizáveis e constituem um marco teórico robusto para analisar e predizer a intenção empreendedora a partir de uma perspetiva integradora e ecossistêmica da pessoa e do seu contexto.
Nos últimos anos, tem vindo a aumentar o número de estudos que utilizam o modelo da Teoria da Ação Planificada (TAP) de Ajzen (1991) para o estudo da intenção empreendedora, entre os quais Tkachev e Kolvereid (1999), Kolvereid (1996), Krueger et al. (2000), Autio et al. (2001) e Moriano, Gómez, Laguna e Roznowski (2008). Segundo essa teoria, a intenção é o resultado das atitudes face ao comportamento empreendedor, da norma subjetiva e do controle comportamental percebido (autoeficácia). A principal diferença desse modelo relativamente aos anteriores é o papel do contexto social (norma subjetiva) sobre a intenção para a realização do comportamento. Em seguida, serão descritas os componentes da TAP.
Atitude face ao comportamento empreendedor
A atitude face ao comportamento empreendedor refere-se ao grau em que a pessoa realiza uma avaliação positiva ou negativa do comportamento. Assim, uma atitude favorável estará associada a uma maior intenção de agir (Moriano et al., 2007). A atitude é determinada por diversas crenças que a pessoa tem em relação ao objeto (coisa, pessoa ou instituição) e pela avaliação que as pessoas realizam dessas crenças. Essa avaliação é o componente mais afetivo da atitude, determinando a motivação e a força da intenção do comportamento. Podem existir diversas crenças, mas essas, por si só, não levam à ação (Ajzen, 1987; Fishbein & Ajzen, 1975). Uma avaliação positiva de empreender pode permitir ser mais criativo e inovador, no entanto, uma pessoa pode valorizar a situação como desejável, enquanto outra pode considerá-la como indesejável. A atitude da pessoa face ao comportamento pode ser calculada segundo a seguinte fórmula: Ac = ∑ ci ei. Ac = atitude da pessoa relativamente ao comportamento; ci = crença da consequência do comportamento; ei = avaliação que a pessoa pode fazer da consequência do comportamento; i = subíndice que indica cada crença e a sua avaliação, numerada desde 1 até N.
Em investigações anteriores, foi possível constatar que as atitudes podem explicar aproximadamente entre 30% e 50% da variância da intenção empreendedora (Ajzen, 1987).
Norma subjetiva
A norma subjetiva diz respeito à pressão social exercida para realizar ou não um comportamento e reflete o efeito dos valores sociais (Morales, Rebolloso, & Moya, 1994), sendo determinada pela percepção das crenças que as pessoas importantes para o indivíduo possuem sobre o comportamento que ele deve realizar e também pela motivação do indivíduo para satisfazer as expectativas que os outros têm sobre ele.
A norma subjetiva é a componente mais social do modelo na medida em que incorpora a influência de pessoas significativas para o sujeito na decisão de desenvolver a sua carreira profissional por meio do empreendedorismo. Os valores da norma subjetiva podem ser calculados a partir das crenças normativas e da motivação para acomodar-se aos outros significativos (Fishbein & Ajzen, 1975), com a seguinte fórmula:
NS = ∑ cni mai
NS = norma subjetiva; cni = crenças normativas relativamente a outros significativos ou referentes; mai = motivação para acomodar-se aos outros significativos ou referentes; i = subíndice que indica cada crença normativa e a motivação para acomodar-se aos outros significativos, numerados de 1 a N.
Controle percebido
O terceiro componente do modelo é o controle comportamental percebido. As pessoas manifestam comportamentos que acham que são capazes de controlar e dominar. Esse conceito é similar, inclusive o mesmo conceito que o da autoeficácia de Bandura (ver Bandura, 1982). Os dois conceitos estão associados à capacidade percebida para manifestar um comportamento, por exemplo, iniciar uma atividade empresarial. Vários autores referem a esse componente como uma variável- -chave em diversas vertentes acadêmicas, tanto na transição do ensino superior para o trabalho (Vieira, Maia, & Coimbra, 2007), bem como no desenvolvimento de políticas de gestão acadêmica (Polydoro & Guerreiro- Casanova, 2010). Nessa investigação, considera-se a autoeficácia como as crenças sobre a capacidade de executar com êxito determinados comportamentos. Essas crenças podem ter origem na própria experiência em relação ao comportamento, em informação obtida pela observação do comportamento de familiares e amigos, bem como em outros fatores que aumentem ou diminuam a dificuldade percebida para realizar o comportamento. Dessa forma, quanto maior é o número de recursos e de oportunidades que se percepcionam, menor são os obstáculos que se antecipam e maior será o controle comportamental percebido (Ajzen, 1991). A autoeficácia é referida na literatura como uma característica definidora do perfil empreendedor em numerosos estudos (Baron, 2002). É esperado que indivíduos com um nível geral de autoeficácia elevado sejam mais persistentes, trabalhem de forma mais efetiva, se esforcem mais na realização das tarefas e tenham a confiança de possuir as competências necessárias para conseguir os seus objetivos.
A intenção empreendedora
A intenção empreendedora é a cognição que orienta e guia a ação do empreendedor para a criação e desenvolvimento de uma nova empresa (Moriano et al., 2007). A intenção surge como o antecedente do comportamento e, quanto mais forte é a intenção de desenvolver um determinado comportamento, maior será a probabilidade da sua realização efetiva (Ajzen, 1987). Esse componente da TAP forma-se a partir das atitudes (A), da norma subjetiva (NS) e da autoeficácia empreendedora (AE). Seguidamente, apresenta-se a fórmula que relaciona as quatro variáveis:
Uma vez que as investigações assinalam a importância da utilização de um questionário estandardizado de intenção empreendedora, tendo como base a TAP, este estudo visa apresentar a validação do Questionário de Intenção Empreendedora CIE para o contexto português. Tendo em consideração a investigação prévia e com base no modelo teórico apresentado na Figura 1, as seguintes hipóteses de investigação foram formuladas: Hipótese 1: A atitude face ao comportamento empreendedor possui um efeito positivo e significativo na intenção de empreender. Hipótese 2: A norma subjetiva possui um efeito positivo e significativo na intenção de empreender. Hipótese 3: A autoeficácia empreendedora possui um efeito positivo e significativo na intenção de empreender. Método Participantes Neste estudo, participaram 326 estudantes universitários do norte de Portugal, 216 (66%) mulheres e 110 (34%) homens, com idades entre 17 a 57 anos (M=25 anos; DP=7.3). Os estudantes são provenientes das seguintes áreas de conhecimento: Gestão (32%), Solicitadoria (31%), Ciências da educação (21%), Direito (9%) e Economia (7%). Cerca de um terço da amostra refere ter um familiar empresário (35%) e 2% indica ter tido contato com um centro de empreendedores. Instrumento O Questionário de Intenção Empreendedora (QIE) foi desenvolvido e validado em Espanha (Moriano et al., 2012) sendo constituído por 20 itens no formato de resposta tipo Likert de sete pontos. O instrumento de recolhimento de dados apresenta uma parte dedicada aos dados sociodemográficos bem como às quatro escalas do QIE cuja descrição é efetuada seguidamente. Atitude. Essa escala avalia a atitude que a pessoa demonstra relativamente a ser empreendedor, explorando o que significa para o indivíduo criar uma empresa (questões A1 a A6) e o grau de desejabilidade que tem para a sua vida as situações propostas (questões B1 a B6), por exemplo: em que medida é desejável para si e na sua via em geral enfrentar novos desafios. A escala de resposta é tipo Likert de sete pontos, desde 1 (totalmente improvável) a 7 (totalmente provável). A pontuação é obtida pela combinação dos resultados obtidos em A e em B de forma a obter uma medida da atitude (Ajzen, 1991). A fiabilidade dessa subescala (alfa de Cronbach) foi 0.83, pelo que se considera que a consistência interna é adequada já que supera o valor recomendado de 0.70 (Nunnally, 1978). Norma subjetiva. Essa escala constitui a componente mais normativa do modelo e reflete a influência que o contexto imediato do sujeito (os seus outros significativos) exerce sobre o comportamento. Por exemplo: em que medida estaria de acordo se decidisse ser empreendedor os seus amigos/as. A escala de resposta é tipo Likert de sete pontos, desde 1 (nada de acordo) a 7 (totalmente de acordo), avaliando as crenças normativas face aos outros significativos (C1 a C3) e a motivação para se acomodar à opinião dos outros significativos ou referentes (D1 a D3). Quanto mais elevada for a pontuação global, maior será a norma subjetiva. A fiabilidade da escala é satisfatória, com um alfa de Cronbach de 0.77. Autoeficácia empreendedora. Essa escala é uma versão reduzida da escala de autoeficácia empreendedora De Noble, Jung, e Ehrlich (1999) e visa avaliar em que medida o indivíduo se considera eficaz para realizar tarefas associadas à criação e à gestão de empresas. Por exemplo: até que ponto seria capaz de realizar eficazmente a definição da minha ideia de negócio e a estratégia de uma nova empresa (questões E1 a E6). A escala de resposta é tipo Likert de sete pontos, desde 1 (totalmente ineficaz) a 7 (totalmente eficaz). Quanto maior a pontuação, maior a autoeficácia empreendedora. A fiabilidade da escala é muito satisfatória, com um alfa de Cronbach de 0.92. Intenção Empreendedora. Essa escala avalia a intenção de criar um negócio ou uma empresa. A intenção consiste na avaliação de uma pessoa numa dimensão de probabilidade subjetiva que inclui uma relação entre a pessoa em si e a ação (Fishbein & Ajzen, 1975, p. 28). A intenção empreendedora é avaliada por meio de cinco afirmações, por exemplo: assinale o grau de intenção de que consiga vir a criar uma empresa um dia. Numa escala de resposta tipo Likert desde 1 nada a 7 totalmente (questões F1 a F5, o item 3 é invertido). A fiabilidade dessa escala é satisfatória, com um alfa de Cronbach de 0.85. Variáveis sociodemográficas e outras variáveis de controle. No questionário foram colocadas questões relativas ao sexo, idade, situação laboral, áreas de conhecimento, contato prévio com centros de empreendedorismo e presença/ausência de familiares empreendedores. Procedimento Antes da administração do questionário, efetuou-se a tradução e tradução inversa (back-translation), uma vez que este é um dos procedimentos indicados para garantir a equivalência idiomática (Hambleton & de Jong, 2003). Posteriormente, realizaram-se dois grupos focais junto de estudantes do ensino superior com o objetivo de avaliar a clareza da linguagem utilizada e foram efetuadas algumas modificações. O questionário foi aplicado em quatro instituições de ensino superior, durante as aulas, entre janeiro de 2011 e setembro de 2012. A participação voluntária e o anonimato foram respeitados e a confidencialidade foi garantida. Análise de Dados Em um primeiro momento, foi realizada uma análise fatorial exploratória, utilizando o método de extração de máxima verossimilhança e a rotação varimax de modo a permitir distribuir a variância entre os fatores e as variáveis observáveis (Lévy-Magin, Martín, & Román, 2006). Na solução encontrada, analisou-se a adequação do índice de consistência interna. Em um segundo momento, realizou-se uma análise fatorial confirmatória para avaliar a estrutura fatorial do QIE por meio da modelação de equações estruturais (SEM). Para analisar o ajustamento do modelo, recorreu- se à análise do qui-quadrado (χ2), sendo que os valores não significativos (p>0.05) indicam que o modelo proposto se ajusta aos dados. No entanto, dada a sensibilidade desse teste ao tamanho da amostra e aos desvios da normalidade dos dados (Lévy-Mangin & Varela, 2006), é necessário ter em consideração outros índices de ajustamento, como o Comparative Fit Index, (CFI) o Goodness of Fit Index (GFI) e o Root Mean Square Error of Aproximation (RMSEA). Um ajustamento aceitável é conseguido quando são obtidos valores próximos de 0,90 para o GFI e 0,95 para o CFI (um ajustamento perfeito seria o valor 1), e menores que 0,05 para o RMSEA (valores até 0,08 representam uma razoável aproximação à população; valores superiores a 0,10 são indicação de uma aproximação inadequada). Foram utilizados os programas estatísticos IBM SPSS versão 21 bem como AMOS 21. Resultados Na Tabela 1, é possível observar as estatísticas descritivas dos 20 itens que compõe o QIE, assimetria e curtose. As médias variam entre 3,31 e 5,13 e todos os desvios padrão apresentam valores superiores à unidade. Os valores para a assimetria e para a curtose variam entre -0,871 e 0,315 (Kline, 2005). As estatísticas descritivas, os índices de consistência interna e as correlações entre as escalas são apresentadas na Tabela 2. Todas as escalas apresentam uma relação positiva e significativa entre si. Os resultados obtidos mostram que os participantes tiveram pontuações médias na intenção empreendedora (M=4,52), contudo a dispersão foi elevada (DP=1,32), o que está de acordo com os resultados encontrados em estudos prévios realizados em Espanha (Moriano et al., 2012; Moriano et al., 2007). Relativamente à TAP, a média mais alta verificou-se na autoeficácia empreendedora (M=5,07, DP=1,04). Na diagonal, identificou-se o valor da raiz quadrada do AVE (Average Variance Extracted). Os resultados da análise fatorial exploratória realizada indicam que as variáveis podem ser agregadas em quatro fatores latentes, nomeadamente as Atitude, Norma Subjetiva, Autoeficácia e Intenção Empreendedora. Esses quatro fatores que explicam 59% da variância. O único item com uma carga fatorial inferior a 0,40 foi o IE3. Validade convergente e fiabilidade das medidas A validade convergente foi determinada por meio da significância estatística das cargas fatoriais dos indicadores de cada variável latente. Na Tabela 3, observa-se que a maior parte das cargas estandardizadas (λ) são superiores aos níveis mínimos recomendados de 0,60 (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2006), com exceção dos itens A4, A5, NS3 e IE3 INV pelo que se eliminou do modelo. Para avaliar a fiabilidade das medidas, calculou- -se o coeficiente de fiabilidade composta (ρc) que é mais adequado que o alfa de Cronbach já que não depende do número de itens associados a cada conceito (Hair et al., 2006). O valor mínimo que se considera adequado para esse coeficiente é 0,70 (Nunnally, 1978). A variância média extraída (Average Variance Extracted, AVE) recomenda- se que seja superior a 0,50 (Bagozzi & Yi, 1988; Hair et al., 2006). Nessa investigação, todas as escalas superam amplamente os valores aceitos em termos de fiabilidade (Tabela 3). Validade discriminante. Para avaliar a validade discriminante entre as escalas é necessário que a raiz quadrada de AVE seja superior à correlação entre as variáveis latentes (Chin, 1998). Tendo em consideração esses resultados, pode-se afirmar que existe uma validade discriminante entre as variáveis latentes, apesar de todos eles estarem relacionados. Validade preditiva. As correlações positivas e significativas obtidas entre as variáveis propostas pela TAP abona a favor da validade preditiva do QIE. Adicionalmente, os índices de ajustamento do modelo, com exceção do valor do qui-quadrado χ2 96=246,15; p<0,001, são adequados NFI=0,93; CFI=0,96 e RMSEA=0,07. Relativamente a relação entre as variáveis da TAP, a autoeficácia empreendedora tem o impacto mais elevado sobre a intenção empreendedora, seguida da atitude e da norma subjetiva, embora o coeficiente de regressão dessa última variável seja muito baixo β=0,10; p<0,05). Dessa forma, essas três variáveis em conjunto permitem explicar 40,8% da variância da intenção empreendedora, confirmando-se as três hipóteses deste estudo que assinalam a influência positiva e significativa das componentes da TAP na intenção de empreender. Discussão O objetivo desta investigação é a validação, para o contexto português, da escala sobre a Intenção Empreendedora (QIE), instrumento desenvolvido na Espanha e validado em outros países e idiomas, que tem demonstrado características psicométricas adequadas e boa capacidade preditora no estudo da intenção empreendedora no âmbito da Teoria da Ação planificada (TAP). Dos 20 itens que compõem a escala original, foram eliminados quatro itens na versão portuguesa devido à baixa carga fatorial: dois da escala de atitudes A4 (criar uma empresa é ter muitos rendimentos) e A5 (ter uma empresa é assumir riscos calculados), um da escala norma subjetiva (influência dos colegas) e um item da escala de intenção empreendedora (tenho sérias dúvidas se algum dia chegarei a criar uma empresa item formulado de forma inversa). Os índices de ajustamento do modelo foram adequados. Dessa forma, a escala reflete a fidelidade do questionário original. De acordo com as três hipóteses sugeridas, os três componentes do modelo TAP (atitude, norma subjetiva e autoeficácia) apresentaram uma relação positiva e significativa com a intenção de empreender. À semelhança de estudos prévios (Autio et al., 2001; Moriano et al., 2007), a norma subjetiva teve menos peso sobre a intenção empreendedora que os outros dois componentes da TAP, contudo, ainda assim significativa, o que não foi verificado em outros estudos (Krueger et al., 2000; Liñán, Rodríguez-Cohard, & Rueda-Cantuche, 2011). Nessa linha de investigação, Moriano et al. (2012) constata uma variação cultural no que diz respeito à norma subjetiva que só resulta estatisticamente significativa na Índia e na Holanda, mas não na Alemanha, na Polónia, Irã e Espanha. Uma possível explicação para os diferentes resultados obtidos relativamente à influência da norma subjetiva pode estar associada a variáveis pessoais não controladas. Por exemplo, as normas sociais são menos preditoras da intenção em pessoas com um locus de controle interno ou uma forte orientação para a ação (Krueger et al., 2000). O modelo proposto neste estudo permitiu explicar 40% da variância da intenção empreendedora, o que constitui um valor médio se comparado com os valores encontrados em investigações prévias que variam entre 20% e 65% (Autio et al., 2001; Liñán et al., 2013). De fato, esse valor da variância explicada na intenção empreendedora é semelhante ao encontrado por Moriano et al., (2012) em Espanha (39%). Este estudo permitiu aprofundar a análise empírica de variáveis consideradas antecedentes do comportamento empreendedor, no entanto, possui certas limitações, pelo que os resultados devem ser interpretados com ponderação. Em primeiro lugar, trata-se de um estudo transversal e, apesar de vários autores referirem correlações elevadas entre a intenção empreendedora e a autoeficácia sobre o comportamento, é importante a realização de estudos longitudinais para testar essa relação na área do empreendedorismo. A intenção permite explicar 30% da variância do comportamento (Krueger et al., 2000), e as meta-análises referem que, em distintas áreas, esse valor pode variar de 0,43 a 0,53 (Ajzen, 2011). O período temporal entre a medição da intenção e a observação do comportamento modera essa influência, na medida em que quanto maior é o período temporal, maior é o número de fatores que podem intervir na mudança das atitudes, da norma subjetiva ou no controle comportamental percebido, modificando as intenções (Ajzen, 2011). Por outro lado, a ausência do controle sobre o comportamento poderá levar a uma redução da validade preditiva da intenção. Na área do comportamento empreendedor, é necessário desenvolver estudos longitudinais, como o realizado por Kautonen, van Gelderen, e Tornikoski (2013), no qual o modelo TAP explicou 41% da variância da intenção e 39% da variância do comportamento. A seleção da amostra não seguiu um procedimento probabilístico e incluiu estudantes de várias áreas de ensino enquanto em estudos anteriores participaram estudantes de gestão de empresas (Liñán & Chen, 2009). A participação de estudantes provenientes de várias universidades não permitiu analisar as possíveis diferenças entre as áreas de ensino. Poderia ser interessante analisar o impacto do curso universitário na intenção empreendedora em futuras investigações, atendendo a que já foi encontrada relação da primeira sobre a segunda. De fato, estudantes de áreas técnicas apresentam uma intenção empreendedora mais elevada (Zhang, Duysters, & Cloodt, 2014). Tendo em consideração que a avaliação de um instrumento de medida constitui um processo inacabado, pensa-se que o QIE se traduz em um instrumento útil para o estudo da intenção empreendedora dos jovens do ensino superior português. Um conhecimento mais aprofundado dos aspetos que levam os jovens universitários a empreender pode contribuir para um desenho mais adequado dos programas de formação empreendedora que estão a decorrer em muitas universidades e outras instituições. Por outro lado, como assinalam Krueger et al. (2000), promover a intenção empreendedora não é só desejável, mas possível, pois a investigação tem dado evidências nesse sentido. Desse modo, a questão atual na investigação é, por um lado, o que se deve ensinar e como no âmbito do empreendedorismo (Kuratko, 2005) e, por outro, como é possível tornar os programas de formação/educação empreendedora mais eficazes. Referências Acs, Z. J., Audretsch, D. B., Braunerhjelm, P., & Carlsson, B. (2012). Growth and entrepreneurship. Small Business Economics, 39(2), 289- 300. doi: 10.1007/s11187-010-9307-2 [ Links ] Ahmed, S. U. (1985). Aach, risk taking propensity, locus of control and entrepreneurship. 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reformulado em novembro de 2015
aprovado em fevereiro de 2016
Diana Aguiar Vieira: é professora Adjunta do ISCAP/IPP Politécnico do Porto, Porto.
Ana Laguía: é estudiante de doutorado/PhD Candidate UNED Universidad Nacional de Educación a Distancia, Madrid.
Juan Antonio Moriano: é professor contratado e doutor do Departamento de Psicologia Social e Organizações Universidad Nacional de Educación a Distancia, Madrid.
Vasco Jorge Salazar Soares: é professor coordenador do ISVOUGA Instituto Superior de Entre Douro e Vouga.
1Endereço para correspondência: Rua Aníbal Cunha, 2º andar, sala 3, Porto, Portugal. Tel./Fax: (351) 222-011-927. E-mail: oliveira.belkis@gmail.com