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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. vol.20 no.2 Campinas abr./jun. 2021
https://doi.org/10.15689/ap.2021.2002.16993.13
ARTIGOS
Estudo de Correlações entre Indicadores Cognitivos do Teste de Pfister e do Zulliger-SC
Study of Correlations between Cognitive Indicators of the Pfister Test and the Zulliger-SC
Estudio de Correlaciones entre Indicadores Cognitivos de la Test de Pfister y el Zulliger-SC
Lucila Moraes CardosoI; Gabriel Vitor Acioly GomesII; Thicianne Malheiros da CostaIII
IUniversidade Estadual do Ceará, Fortaleza - CE, Brasil. https://orcid.org/0000-0002-8890-9352
IIUniversidade São Francisco, Campinas - SP, Brasil. https://orcid.org/0000-0001-6565-3094
IIIUniversidade Federal do Ceará, Fortaleza - CE, Brasil. https://orcid.org/0000-0001-9856-6181
RESUMO
Os testes das Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC) e do Zulliger pelo Sistema Compreensivo (ZSC) se propõem a avaliar aspectos da personalidade. Objetivou-se buscar evidências de validade convergente para o TPC por meio de correlação com o ZSC entre seus indicadores de funcionamento cognitivo. Contou-se com os protocolos do ZSC e TPC de 172 crianças de Fortaleza com idade entre 6 e 11 anos e 6 meses (M = 8,64; DP = 1,434). Realizaram-se análises de estatística descritiva e correlação de Pearson pelo SPSS. Constataram-se 34 correlações significativas (p < 0,05), que foram discutidas a partir, principalmente, dos manuais dos testes. Ainda que essas correlações tenham sido fracas, as interpretações dos indicadores sugerem que o Pfister e o Zulliger podem ser usados de maneira complementar na avaliação da personalidade.
Palavras-chave: validade estatística; técnicas projetivas; desenvolvimento cognitivo
ABSTRACT
The Pfister Colored Pyramids Test (CPT) and the Zulliger test in the Comprehensive System (ZSC) are projective methods that aim to evaluate aspects of the personality. The aim was to seek evidence of convergent validity for the CPT through correlation with the ZSC, specifically regarding their indicators of cognitive functioning. Accordingly, 172 children from Fortaleza (CE), aged between 6 and 11 years and 6 months (M=8.64, SD=1.434) participated. The Raven Colored Progressive Matrices - Special Scale, the ZSC and the CPT were used. Descriptive statistics and Pearson's correlation analyses were performed using the SPSS software. The results presented 34 significant correlations (p<.05), which were mainly discussed in the test manuals. Although these correlations were weak, the interpretations of the indicators suggest that the Pfister and Zulliger tests can be used in a complementary way in the evaluation of the personality.
Keywords: statistical validity; projective techniques; cognitive development.
RESUMEN
Los tests de las Pirámides de Colores de Pfister (TPC) y el Zulliger por el Sistema de Comprehensivo (ZSC) son métodos proyectivos que se proponen a evaluar aspectos de la personalidad. Por lo tanto, el objetivo es buscar evidencias de validez convergentes para TPC a través de correlación con el ZSC, específicamente, aquellos relacionados con el funcionamiento cognitivo. Se utilizaron los protocolos ZSC y TPC de 172 niños de Fortaleza (Ceará) con edades comprendidas entre 6 y 11 años y 6 meses (M=8.64, DS=1.434). Las Matrices Progresivas Coloreadas de Raven - Escala Especial, el ZSC y el TPC fueron utilizados. Se realizaron estadísticas descriptivas y análisis de correlación de Pearson utilizando el software SPSS. Los resultados presentaron 34 correlaciones significativas (p<0.05), que se discutieron principalmente con base a los manuales. Aunque estas correlaciones han sido débiles, las interpretaciones de los indicadores sugieren que Pfister y Zulliger pueden utilizarse de forma complementaria en la evaluación de la personalidad.
Palabras clave: validación estadística; técnicas proyectivas; desarrollo cognitivo.
Historicamente os métodos projetivos têm recebido severas críticas por serem considerados testes de baixo rigor científico quando comparados aos de autorrelato (Villemor-Amaral & Pasqualini-Casado, 2006). Tal fato ocorre pelas correlações costumeiramente fracas que são encontradas nos estudos com esses instrumentos, seja quando avaliados dois métodos projetivos (Franco & Villemor-Amaral, 2009) ou entre um projetivo e um de autorrelato (Mihura et al., 2013; Pimentel, 2019).
Para Villemor-Amaral e Pasqualini-Casado (2006), as correlações fracas não indicam problemas nas evidências de validade, pois os resultados precisam ser compreendidos a luz dos significados das interpretações dos indicadores. Desse modo, compreende-se que ao trabalhar com métodos projetivos é mais importante preocupar-se com a direção e nível de significância das correlações, visto que a interpretação dos indicadores nos métodos projetivos envolve duas premissas.
A primeira premissa é que um mesmo indicador poderá ter diferentes significados interpretativos de acordo a incidência aumentada ou diminuída no protocolo do examinando. A exemplo, cita-se a cor verde do TPC, que seria a cor "que mais se relaciona à esfera do contato e dos relacionamentos afetivos e sociais" (Villemor-Amaral, 2012, p.74) quando em proporções medianas. Já o aumento de verde, não indica, como precipitadamente poderia imaginar excelente aptidão para interação social, ao invés disso representa "sobrecarga de estimulação que pode gerar ansiedade e provocar ruptura do equilíbrio interno" (Villemor-Amaral, 2012, p.74), enquanto sua diminuição significaria "dificuldade de adaptação ao ambiente que assumiria proporções psicopatológicas (enrijecimento afetivo, atitude padronizada ou estereotipada)" (Villemor-Amaral, 2012, p.74).
A segunda premissa é que um indicador, para ser interpretado, precisa ser analisado em função da relação com os demais indicadores. Cita-se como exemplo a porcentagem de uso do Espaço em branco (S) no ZSC, que indica "busca de independência e autoafirmação que acentua os componentes mais individuais das pessoas, sem indicar nada patológico, ou suporá um estilo de opção e negativismo que indica rejeição às demandas reais das situações e, com isso, dificuldades de adaptação" (Exner & Sendín, 1999). Assim, o S combinado com respostas que indicam uma percepção distorcida da realidade (FQ-) indicam "distorções na compreensão dos fatos que podem ser consequência de afetos negativos tais como raiva" (Villemor-Amaral & Primi, 2009), já o S combinado com uma percepção adequada da realidade (FQ+/o/u) é própria de pessoas inteligentes e autônomas (Zdunic, 2007).
De um lado, essas premissas, dificultam o uso de certas análises estatísticas e o estabelecimento dos parâmetros psicométricos tal qual outros testes psicológicos, por outro lado, possibilitam a validade com um enfoque mais clínico, isto é, a compreensão de características idiográficas da pessoa que responde a esses métodos. Nesse sentido, cabe ressaltar que o uso de multimétodos na avaliação psicológica é fundamental para abranger os diferentes modos de expressão da personalidade (Villemor-Amaral & Pasqualini-Casado, 2006).
Destaca-se que, ao responder o TPC, o examinando é convidado a preencher esquemas de pirâmides com quadrículos coloridos. A tarefa exige do examinando, percepção de um esquema de pirâmide e das cores, além da seleção dos estímulos (quadrículos coloridos) que mais lhe agrada para combiná-las de modo que consiga compor pirâmides bonitas (Villemor-Amaral, 2012, 2014). Assim, a maneira como dispõe os quadrículos sobre o esquema (aspecto formal) e a abertura e estabilidade na escolha das cores (fórmula cromática) revelam características sobre o modo como os aspectos emocionais podem interferir no funcionamento cognitivo do examinando, sugerindo maior desorganização emocional ou cognitiva (aspecto formal tapete) até um funcionamento que indica maior estabilidade emocional e cognitiva (aspecto formal estrutura), bem como índices de restrita ou ampla abertura à experiência e que sugerem desde instabilidade (fórmula cromática instável) até estabilidade (fórmula cromática estável) na tomada de decisão (Villemor-Amaral, 2012, 2014).
O Zulliger, assim como o TPC, é um método projetivo. No Zulliger é solicitado que o examinando diga com que se parecem algumas manchas de tinta ambíguas (Villemor-Amaral & Primi, 2009). As respostas dos examinandos são codificadas e agrupadas de modo a compor a tríade cognitiva, que envolve o processamento e a mediação cognitiva e a ideação. De modo geral, a tríade informa como o indivíduo incorpora as informações exteriores, como identifica ou traduz para outros códigos e como elabora novos conceitos a partir das suas impressões (Exner & Sendín, 1999; Nascimento, 2010; Resende, 2016).
Ainda que os dois instrumentos avaliem aspectos do funcionamento cognitivo e da dinâmica emocional, a natureza da tarefa é ligeiramente diferente em alguns aspectos. A primeira diferença se refere ao tipo de estímulo na medida em que as manchas de tinta do Zulliger são menos estruturadas que os estímulos do TPC. O grau de ambiguidade da tarefa é um fato importante de ser considerado já que nos métodos projetivos parte-se do pressuposto que quanto menos estruturada a tarefa mais será necessário o examinando dar de si para organizar o material (Nascimento, 2010). Outro aspecto que diferencia ambos instrumentos envolve o tipo de resposta que é esperada na medida em que o TPC é um método não verbal, isto é, o examinando não precisará organizar sua resposta por meio da fala. Já no Zulliger, a resposta fornecida envolve a verbalização da associação do que o examinando estabeleceu entre a mancha observada e o que verbalizou. Assim as atividades desses dois métodos são levemente diferentes.
As revisões de literatura, tanto do Pfister (Silva & Cardoso, 2012) quanto do Zulliger (Cardoso, Gomes, Pacheco, et al., 2018; Grazziotin & Scortegagna, 2016), embora não tenham sido sistemáticas, conforme recomendação em revisões feitas com o Rorschach (Mihura et al., 2019), indicaram que, ao longo dos anos, tem aumentado investigações constatando evidências de validade desses dois instrumentos. Nesse sentido, foi feita uma busca por estudos que envolveram o uso conjunto dos dois instrumentos, sendo encontrado três artigos (Franco & Villemor-Amaral, 2009; Miguel et al., 2017; Villemor-Amaral & Quirino, 2013).
No estudo de Franco e Villemor-Amaral (2009), objetivou-se buscar evidências de validade por meio de correlações entre indicadores afetivos e cognitivos do TPC e do ZSC. A amostra de 223 indivíduos, que responderam ambos os testes, foi proveniente de dois bancos de dados. Foram elaboradas e testadas 36 hipóteses a partir dos dados dos protocolos desses indivíduos, sendo 28 hipóteses afetivas e oito cognitivas. Os resultados evidenciaram que não houve nenhum valor significativo do ponto de vista estatístico, mas o fato de não ter sido encontrada nenhuma correlação negativa foi considerado pelas autoras como um bom resultado psicométrico por evidenciar que esses dois instrumentos não se contradizem. Dessa forma, os resultados indicaram correspondência e complementaridade entre o Zulliger e o Pfister, ressaltando a importância de que os dois instrumentos podem ser usados em conjunto para uma maior apreensão da dinâmica da personalidade do sujeito.
Com o objetivo de investigar as evidências de validade do ZSC com crianças de escolas públicas de São Paulo, Villemor-Amaral e Quirino (2013) correlacionaram as respostas de cor no Zulliger (FC, CF e C) com o aspecto formal no Pfister (Tapetes, Formações e Estruturas). As crianças foram divididas em dois grupos de 30 estudantes cada um, sendo o primeiro grupo composto por crianças de 6 anos de idade e o outro por crianças de 12 anos. Nesse estudo, o grupo de crianças de 12 anos apresentou correlação do indicador de respostas impulsivas no ZSC (C) com o aumento de Estruturas do Pfister. Os autores discutiram que o fato de o grupo das crianças mais velhas terem apresentado maior desenvolvimento emocional e cognitivo (Estrutura TPC), porém mostrarem-se de forma mais impulsivas (indicador C no ZSC), pode ter sido devido à influência das alterações hormonais decorrentes do período de desenvolvimento.
No estudo de Miguel et al. (2017) também foram observadas as relações entre variáveis do TPC e do Zulliger. Nesse caso, a pesquisa contou com 98 participantes e teve como objetivo verificar quais variáveis do TPC seriam preditoras do indicador de regulação cognitiva das emoções no Zulliger. A análise de regressão linear indicou a diminuição na frequência de Tapetes Puros e de Tapetes Furados do TPC como preditoras da fórmula de regulação emocional do Zulliger.
Para a presente pesquisa, foram consideradas as variáveis do TPC que tivessem algum tipo de associação com o funcionamento cognitivo. Pode-se considerar, especificamente, o aspecto formal e a fórmula cromática. Por meio do aspecto formal é possível observar que a precisão da forma depende do desenvolvimento da capacidade intelectual, por estar associado ao pensamento e à percepção, principalmente relativos à percepção real do ambiente. Nessa categoria, a classificação pode ser feita em quatro tipos de tapetes, cinco tipos de formações ou cinco tipos de estrutura. A fórmula cromática trata da abertura aos estímulos e estabilidade nas escolhas e pode ser organizada em nove possibilidades de composição (Villemor-Amaral, 2014). Assim, no TPC foram utilizadas 21 variáveis. Quanto ao Zulliger, foram selecionadas todas as variáveis do quadro de Recursos e controle, Processamento, Mediação e Ideação. Desse modo, ao todo foram consideradas 36 indicadores do ZSC.
Partindo do princípio de que o TPC e ZSC se propõem a avaliar aspectos da dinâmica emocional e funcionamento cognitivo, pretende-se buscar evidências de validade convergente para o TPC por meio de correlação com o ZSC entre seus indicadores de funcionamento cognitivo. Acredita-se que, tal como pesquisas realizadas com outros indicadores desses instrumentos, serão obtidas correlações fracas entre o TPC e o ZSC e espera-se que haja uma coerência em relação ao significado das interpretações.
Método
Participantes
Esta pesquisa envolveu os protocolos do TPC e do ZSC de 172 crianças da cidade de Fortaleza, no estado do Ceará, com a idade entre 6 anos e 11 anos e 6 meses (M = 8,64; DP = 1,434). Constatou-se que 53,5% da amostra eram do sexo feminino e 48,3% proveniente de escolas públicas. As crianças que participaram da pesquisa estavam em séries escolares correspondentes às suas idades, não tinham histórico de atendimento psicológico ou psiquiátrico.
Instrumentos
Os testes utilizados foram o Zulliger Sistema Compreensivo (ZSC) e as Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC). Durante a coleta de dados, havia uma troca na ordem de apresentação dos instrumentos de modo que, em 57% dos casos, o TPC foi o segundo instrumento aplicado.
Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister (TPC)
O Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister é um método projetivo que avalia aspectos da dinâmica emocional e funcionamento cognitivo de quem o responde. O instrumento tem parecer para ser utilizado com crianças e adultos e sua forma de administração é individual. O TPC é formado por três esquemas de pirâmides e por quadrículos coloridos de 10 cores diferentes que variam em tonalidades, totalizando uma variedade de 24 tons. O examinador dá instruções padronizadas para que o avaliando preencha um esquema de pirâmide com os quadrículos coloridos. Após esse momento novas instruções são dadas para a construção de mais dois esquemas de pirâmides. Quando o examinando termina de construir as três pirâmides é feito um inquérito para investigar suas preferências de cores (Villemor-Amaral, 2012, 2014). Além do manual, encontra-se na literatura científica pesquisas que buscaram evidências de validade para o Pfister, tais como as de Cardoso, Lopes, et al., (2018) e Villemor-Amaral, Biasi, et al. (2016).
Método de Zulliger pelo Sistema Compreensivo (ZSC)
O método de Zulliger é um instrumento projetivo composto por três pranchas com manchas de tintas ambíguas. O método avalia aspectos cognitivos e emocionais da personalidade, possui parecer favorável para uso com adultos e tem sido estudado para que também possa ser utilizado com crianças, tendo tais pesquisas indicado evidências de validade (Cardoso & Oliveira, 2018; Cardoso, Gomes, et al., 2018; Carvalho & Resende, 2018; Villemor-Amaral & Vieira, 2016; Villemor-Amaral, Pavan, et al., 2016).
A administração é individual e tem duas fases, sendo elas a de associação e a de inquérito. Na primeira fase, o examinador apresenta as três pranchas de tintas em uma sequência padronizada e solicita ao avaliando que diga com que aquela mancha de tinta se parece. Na fase do inquérito, ao avaliando são apresentadas novamente as manchas de tintas na mesma sequência, o examinador repete as respostas que foram dadas e solicita que o avaliando responda o que deu a ideia para as respostas e qual a parte da mancha foi associada. Após a administração, o protocolo é codificado de acordo com as características do Sistema Compreensivo que é composta por nove categorias de análise (Villemor-Amaral & Primi, 2009).
Procedimentos
Considerações Éticas
Este artigo é resultado de uma pesquisa mais ampla intitulada "Evidências de Validade e Normatização de Métodos Projetivos para Crianças do Nordeste Brasileiro" que foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará e recebeu autorização para realização com o parecer nº 618.913. Após aprovação da pesquisa no Comitê de ética, foi retomado o contato com as escolas que haviam concedido o Termo de Anuência Institucional e foi necessário enviar aos pais das crianças o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que autorizassem a participação do filho. Com a permissão dos pais, o último documento foi o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido que essas crianças tinham que assinar para confirmar o interesse em participar como voluntárias da pesquisa. Por fim, ressalta-se que todos os dados foram resguardados e todo o sigilo envolvido na pesquisa foi respeitado.
Coleta de Dados
A coleta de dados foi realizada de maneira individual com todas as crianças participantes e teve a duração de aproximadamente 60 minutos. As crianças que aceitaram participar da pesquisa eram chamadas para a coleta de dados em algum período do seu próprio turno de aula. Foi realizado rapport com o intuito de acolher as crianças e algumas perguntas iniciais com o objetivo de anotar dados de identificação. Os dois instrumentos foram administrados em sessão única e sem intervalo.
Análise dos Dados
Os dados foram colocados em um banco de dados do programa Microsoft Excel 2010 e, posteriormente, exportado para o IBM SPSS Statistics - Versão 20. Foi nesse software, o SPSS, que foram realizadas as análises de estatística descritiva e a Correlação de Pearson entre as variáveis cognitivas do ZSC e do TPC.
Resultados e Discussão
As análises estatísticas entre as 21 variáveis do TPC e os 36 indicadores do Zulliger foram feitas por meio do teste de Correlação de Pearson, selecionando-se as correlações significativas (p < 0,05) para discutir. Como forma de organização dos resultados, os dados serão apresentados em duas tabelas, na Tabela 1 serão apresentadas as correlações entre os aspectos formais do TPC e indicadores do ZSC e, na Tabela 2, há as associações entre as fórmulas cromáticas do TPC e os indicadores do ZSC.
Na Tabela 1, observaram-se 19 correlações significativas entre aspecto formal do TPC e as variáveis do ZSC. O aspecto formal tapete furado se correlacionou negativamente com F%. A correlação sugeriu que quanto mais o indivíduo apresenta excessiva abertura às experiências e foco de atenção muito amplo (F% rebaixado; Villemor-Amaral & Primi, 2009), mais indícios de desorganização cognitiva com dissociações no curso do pensamento ele tende a apresentar (tapete furado; Villemor-Amaral, 2012, 2014).O aumento do aspecto formal tapete puro se relacionou significativamente com o aumento do WSum6. Essa correlação convergiu para a interpretação de que os indicadores dos dois instrumentos tratam de um aspecto do funcionamento cognitivo que se assemelham. Parece coerente a ideia de que uma pessoa em busca para uma adaptação à sua desorganização emocional ou cognitiva (tapete puro; Villemor-Amaral, 2012, 2014) possa apresentar alguns deslizes do pensamento (WSum6; Nascimento, 2010). A complexidade do comprometimento do WSum6 depende da análise de qual dos seis códigos especiais críticos foram elevados nos participantes. Assim, foi feita uma análise qualitativa no banco de dados e constatou-se que o código DV foi o que mais apareceu nos protocolos, sendo esse indicador decorrente do uso distorcido da verbalização, podendo causar prejuízo na comunicação (Exner & Sendín, 1999) mais do que indícios psicopatológicos propriamente ditos.
Na Tabela 1, também se observou que o aspecto formal estrutura simétrica apresentou cinco correlações significativas com variáveis do Zulliger. A única positiva foi com F%, denotando que quanto mais o indivíduo apresenta equilíbrio emocional e maturidade em seus atos (estrutura simétrica; Villemor-Amaral, 2012, 2014) maior tendência a optar por situações estruturadas para soluções de problemas simples (F%; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
As demais correlações foram negativas e sugeriram que quanto mais a pessoa apresenta capacidade cognitiva diferenciada, com capacidade de perceber a realidade de modo objetivo e nível de inteligência superior (DQ+, WDA%, XA%; Villemor-Amaral & Primi, 2009; Nascimento, 2010) ou apresenta comportamentos não convencionais e percepção distorcida da realidade (X-%; Villemor-Amaral & Primi, 2009) menos teria equilíbrio emocional e maturidade em seus atos (estrutura simétrica). Isto é, tanto uma elevada percepção da realidade com uma desenvolvida inteligência quanto a distorção da realidade teriam relação com imaturidade emocional.
As correlações entre a estrutura em escada e as notas D e D Adj foram positivas. Essas correlações indicam que os esforços para aparentar estabilidade e equilíbrio emocional diante de estados conflitivos (estrutura em escada; Villemor-Amaral, 2012, 2014) se relacionam com um aumento de recursos para lidar com situações estressoras ou de sobrecarga de estimulação (nota D, nota D Adj; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
Conforme a Tabela 1, pôde-se observar que o aspecto formal estrutura em manto foi o que teve a maior quantidade de correlações com o Zulliger, totalizando oito. A estrutura em manto apresentou três correlações positivas com variáveis que denotam produtividade associada a um elevado nível de funcionamento cognitivo e pensamento abstrato (DQ+, R, W; Villemor-Amaral & Primi, 2009). Tais correlações indicaram que, apesar do despendimento de energias para conter inquietações internas e turbulências emocionais (estrutura em manto; Villemor-Amaral, 2012, 2014), o indivíduo apresenta boa capacidade de planejamento e de tomada de decisões favoráveis (DQ+, R, W; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
A estrutura em manto também se correlacionou com variáveis que denotam um indivíduo de funcionamento cognitivo imaturo e/ou primitivo, indicando possibilidade de apresentar limitações cognitivas (DQv; Villemor-Amaral & Primi, 2009; Resende, 2016) associadas à impulsividade no pensamento e/ou no comportamento (es; Villemor-Amaral & Primi, 2009). Tais associações apontaram para indivíduos que, em decorrência do baixo funcionamento cognitivo, tendem a expressar defesas ou sufocamento de turbulência emocional ou inquietações internas (estrutura em manto; Villemor-Amaral, 2012, 2014) para lidar com os altos níveis de estimulação e exigência advindas das pessoas e de seu meio (DQv, es; Villemor-Amaral & Primi, 2009). No estudo de Franco e Villemor-Amaral (2009), foi encontrado correlação entre DQv e o aspecto formal tapete, sendo este característico de um desenvolvimento cognitivo menos elaborado. Cabe ressaltar que a forma de processamento mais primitiva e imatura (DQv) é frequentemente encontrada em crianças, desaparecendo conforme o aumento da idade (Exner & Sendín, 1999).
A correlação entre a estrutura em manto e o aumento de MOR também foi significativa. Esses indicadores correspondem à interpretação de um funcionamento psíquico baseado em mecanismo de defesa de retraimento e/ou com confusões psíquicas que geram uma percepção danificada de si ou dos objetos (MOR; Villemor-Amaral & Primi, 2009). A soma dos seis códigos especiais críticos se relacionou com o aumento da estrutura em manto e indicou que alterações de pensamento e percepção (Sum6; Villemor-Amaral & Primi, 2009) se associou a inquietações psíquicas e repressão dos impulsos. A correlação da estrutura em manto com Mp, sugeriu que o indivíduo, ao mesmo tempo em que reprime inquietações internas ou expressa defesas de fechamento em si (estrutura em manto; Villemor-Amaral, 2012, 2014), busca gratificar suas necessidades e compensar suas frustrações da vida por meio da fantasia (Mp; Resende, 2016).
A estrutura em mosaico teve correlação com FMp. Essa correlação positiva indicou um bom funcionamento cognitivo voltado para elevadas aspirações humanas (estrutura em mosaico; Villemor-Amaral, 2012) a fim de lidar com insatisfações de impulsos e necessidades básicas (FMp; Villemor-Amaral & Primi, 2009). Também indicando alto nível de funcionamento cognitivo, foi observada a correlação positiva da estrutura assimétrica dinâmica com DQ+, caracterizando o funcionamento de um indivíduo inteligente, produtivo (DQ+; Villemor-Amaral & Primi, 2009), criativo e com sensibilidade artística (estrutura assimétrica dinâmica; Villemor-Amaral, 2012).
Além das correlações apresentadas, observou-se a presença de outras 15 correlações, categorizadas em virtude dos indicadores da fórmula cromática do TPC e das variáveis do Zulliger com p < 0,05. Esses dados podem ser consultados na Tabela 2.
Em relação às fórmulas cromáticas, pôde ser visto na Tabela 2 que a fórmula ampla e flexível foi a que apresentou o maior número de correlações significativas, totalizando cinco. Observou-se uma correlação negativa entre a fórmula cromática ampla e flexível com Dd, indicando um funcionamento cognitivo em que, quando o indivíduo apresenta uma maior capacidade de ação e realização de seus atos com objetivos definidos, denotando ajustamento e maturidade (ampla e flexível; Villemor-Amaral, 2012), menos ele tende a se envolver em atividades insignificantes que sugiram fuga de situações complexas e difíceis de resolver (Dd; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
Outras correlações encontradas foram entre a fórmula ampla e flexível e as variáveis WDA%, X+% e XA%. Foi percebida uma convergência na interpretação desses indicadores para a realização de tarefas de modo objetivo e com maturidade com grande emprego de energia e capacidade intelectual (WDA%, X+%, XA%; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
A última correlação observada com a fórmula cromática ampla e flexível foi com a variável X-% do Zulliger. A associação negativa entre elas apontou que, quando a percepção da realidade está equivocada por problemas de mediação (X-%; Villemor-Amaral & Primi, 2009), há uma tendência menor de maturidade e capacidade de direcionar energia para alcançar objetivos.
Quanto à fórmula ampla e instável, foram observadas quatro correlações significativas. A primeira correlação foi com a variável EA, revelando um funcionamento em que, embora haja instabilidade e/ou inquietação interior (ampla e instável; Villemor-Amaral, 2012), o indivíduo mobiliza recursos necessários para atender às suas demandas (EA; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
A variável M- teve correlação positiva com a fórmula ampla e instável e indicou que as cargas afetivas intensas (M-; Villemor-Amaral & Primi, 2009) podem gerar uma instabilidade psíquica. Nessa mesma direção, a correlação dessa fórmula com o indicador que se relaciona a uma percepção danificada de si ou dos objetos (MOR; Villemor-Amaral & Primi, 2009), pode significar que tais indicadores podem ser interpretados como fatores de psicopatologia, por exemplo, a depressão.
Na Tabela 2, observou-se também uma correlação positiva entre a fórmula ampla e instável e WSumC. Tal associação indicou inquietação ou dinamismo interior no indivíduo, ou mesmo instabilidade patológica (ampla e instável; Villemor-Amaral, 2012, 2014), sugerindo esforço para adaptação frente às influências das emoções nas operações psicológicas para lidar com as situações vividas (WSumC; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
Com a fórmula cromática moderada e estável, conforme foi visto na Tabela 2, há apenas uma correlação significativa. A presença de maior estabilidade, segurança, capacidade de adaptação e maturidade (moderada e estável; Villemor-Amaral, 2012, 2014) associado a uma preocupação com o convencional e exigência de adequação social (P; Villemor-Amaral & Primi, 2009) converge para a interpretação de estabilidade na vida e grande ajustamento social.
Quanto à fórmula moderada e flexível, observaram-se duas correlações significativas com a variável nota D e nota D Adj. Essa relação sugeriu que, na presença de moderação de atitudes e de controle, balanceando a abertura a estímulos (moderada e flexível; Villemor-Amaral, 2012, 2014), há uma tendência à busca pelo aumento dos recursos para lidar com a sobrecarga de estimulação ou situações estressoras (nota D, nota D Adj; Villemor-Amaral & Primi, 2009).
As demais correlações significativas da Tabela 2 foram referentes à fórmula cromática moderada e instável. A correlação positiva dessa fórmula com X-% sugeriu que a presença de problemas mediacionais e de percepções distorcidas (X-%; Villemor-Amaral & Primi, 2009) tendem a uma instabilidade que ocasiona dificuldades de adaptação (moderada e instável; Villemor-Amaral, 2012, 2014).
Essa mesma fórmula se relacionou negativamente com as variáveis WDA% e XA% do Zulliger. Portanto, essas correlações apontaram para a interpretação dos dados de que, quando os fatos são percebidos de modo adequado e objetivamente (WDA%, XA%; Villemor-Amaral & Primi, 2009), menos se apresenta instabilidade (moderada e instável; Villemor-Amaral, 2012, 2014).
Considerando-se a necessidade que os testes psicológicos têm de atender às qualidades psicométricas, neste estudo, buscou-se evidências de validade convergente para o Teste das Pirâmides Coloridas de Pfister a partir de correlações com o Zulliger pelo Sistema Compreensivo para seus indicadores cognitivos. Como mencionado anteriormente, as revisões de literatura, ainda que não tenham tido uma análise de viés dos resultados como sugerido em revisões sistemáticas (Mihura et al., 2019), indicaram que a maioria dos estudos que buscaram por evidências de validade de tais instrumentos utilizaram análise de correlações (Cardoso, Gomes, Pacheco, et al., 2018; Grazziotin & Scortegagna, 2016; Silva & Cardoso, 2012) e os que utilizaram o TPC e o ZSC encontraram correlações positivas e fracas (Franco & Villemor-Amaral, 2009; Miguel et al., 2017; Villemor-Amaral & Quirino, 2013). Destaca-se, entretanto, que nos estudos obtidos trabalhou-se com um número reduzido de correlações, notando-se, desse modo, que os estudos anteriores pouco auxiliaram à compreensão dos resultados apresentados.
Por ora, tem-se que os resultados encontrados foram compreendidos sob a perspectiva dos diferentes tipos de estímulos e tarefas, justificando as correlações fracas, ao mesmo tempo em que denotam certa aproximação do ponto de vista interpretativo, conforme a direção das correlações, bem como foi ressaltado por Villemor-Amaral e Pasqualini-Casado (2006). Logo, compreende-se que o presente estudo se soma aos demais que indicam evidências de validade do Pfister (Cardoso, Lopes et al., 2018; Villemor-Amaral, Biasi, et al., 2016).
Considerações Finais
Os resultados apresentados nesta pesquisa evidenciaram diversas correlações significativas do ponto de vista estatístico entre variáveis cognitivas do Pfister e do Zulliger, indicando que existe uma relação entre eles. Ainda que essas correlações sejam de força fraca, o que mostra poucas evidências empíricas de convergência entre esses testes, compreende-se que as interpretações dos indicadores sugerem que os dois instrumentos podem e devem ser usados de maneira complementar à avaliação da personalidade do sujeito.
A discussão dos resultados ficou limitada aos manuais dos instrumentos psicológicos, pois poucos artigos trataram das correlações entre TPC e do Zulliger. Logo, sugere-se que mais estudos sejam conduzidos entre essas duas técnicas em busca de ampliar evidências para melhor compreender como se relacionam, o que demonstra a importância de tais investigações. Portanto, sugere-se que estudos futuros possam ser conduzidos com um número maior de variáveis. Além disso, se houver viabilidade, podem ser realizadas análises estatísticas mais robustas, como análise de um modelo Bifactor para os instrumentos ou outras análises que possam ampliar a compreensão psicométrica sobre esses métodos projetivos.
Agradecimentos
Não há menções.
Financiamento
Todas as fontes de financiamento para elaboração e produção do estudo (coleta, análise e interpretação dos dados, bem como, escrita dos resultados no presente no manuscrito) foram fornecidas pelo projeto de pesquisa 'Processo no 408554/2013-4 do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)'.
Contribuições dos autores
Declaramos que todos os autores participaram da elaboração do manuscrito. Especificamente, os autores Lucila Moraes Cardoso, Gabriel Vitor Acioly Gomes e Thicianne Malheiros da Costa participaram da redação inicial do estudo - conceitualização, investigação, visualização, os autores Lucila Moraes Cardoso, Gabriel Vitor Acioly Gomes e Thicianne Malheiros da Costa participaram da análise dos dados, e os autores Lucila Moraes Cardoso, Gabriel Vitor Acioly Gomes e Thicianne Malheiros da Costa participaram da redação final do trabalho - revisão e edição.
Disponibilidade dos dados e materiais
Todos os dados e sintaxes gerados e analisados durante esta pesquisa serão tratados com total sigilo devido às exigências do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Porém, o conjunto de dados e sintaxes que apoiam as conclusões deste artigo estão disponíveis mediante razoável solicitação ao autor principal do estudo.
Conflito de interesses
Os autores declaram que não há conflitos de interesses.
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Endereço para correspondência:
Lucila Moraes Cardoso
Av. Dr. Silas Munguba, 1700, Campus do Itaperi
Bloco P Curso de Psicologia A/C Lucila Moraes Cardoso
CEP 60.714.903 - Fortaleza (CE)
E-mail: lucila.cardoso@uece.br
Telefone: (85) 3101-9987
Recebido em outubro de 2018
Aprovado em fevereiro de 2021
Sobre os autores:
Lucila Moraes Cardoso é Professora Adjunta do curso de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e colaboradora no Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Gabriel Vitor Acioly Gomes é Psicólogo pela Universidade Estadual do Ceará (UECE) e mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação/UECE. Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade São Francisco (USF).
Thicianne Malheiros da Costa é Psicóloga graduada pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mestra em Psicologia pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia - PPGP/UFC. Atualmente doutoranda do PPGP/UFC.