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Psicologia USP

versão On-line ISSN 1678-5177

Psicol. USP v.1 n.2 supl.2 São Paulo dez. 1990

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Motivação no trabalho: abordagens teóricas

 

Work motivation: theoretical approaches

 

 

Juan Pérez-Ramos

Prof. Adjunto na área de Psicologia do Trabalho, pela UNESP, e Prof. Orientador da Pós-graduação em Psicologia Clínica — Instituto de Psicologia — USP

 

 


RESUMO

Analisa, sucintamente, as principais teorias atuais sobre motivação no trabalho. Com esse fim as mesmas são agrupadas em "teorias de conteúdo" (identificação das necessidades e exame dos comportamentos dirigidos a satisfazê-las) e teorias de processo (comportamento motivacional consciente e racional). Nesse contexto classificatório são objetos de revisão, sob o enfoque de "conteúdo", as teorias da Hierarquia de Necessidades (Maslow), teorias X e Y (McGregor), Teoria Bifatorial de Motivação-Higiene (Herzberg), Teoria sobre poder, afiliação e realização (McClelland), Teoria E. R. G. (Alderfer) e Teoria Z (ouchi), entre outras, tomadas como parâmetros de referência. No enfoque de "processo" motivacional, a revisão efetuada inclui as seguintes formulações teóricas: Teoria da Comparação Social (Festinger), Teoria da Eqüidade (Adams), Teoria da Expectância, conhecida também como da instrumentalidade, e ainda como Teoria VIE (Vroom), Teoria do Estabelecimento de Metas (Locke), Teoria de Desempenho-Satisfação (Porter & Lawer), Teorias de Atribuição (da Atribuição Causal, (Kelly), da Avaliação Cognitiva, (Heider) e da Auto-percepção, (Bem). O nível de interesse, em relação ao tema da motivação no trabalho, vem crescendo consideravelmente no ambiente acadêmico e, também, no campo empresarial. A criação de um clima de trabalho estimulador, satisfatório e produtivo será benéfico, tanto para a organização como para seus integrantes. Importantes implicações práticas podem ser derivadas das contribuições teóricas expostas. Seu valor baseia-se na sua potencialidade de sensibilizar pesquisadores e gerentes sobre a importância dos fatores de motivação que podem incidir sobre o comportamento dos indivíduos na situação de trabalho.

Descritores: Motivação do trabalhador. Satisfação no trabalho. Atitudes do trabalho. Psicologia Industrial.


ABSTRACT

The paper consists of a concise review of the main contemporary theoretic approaches on motivation in work organizations. These theoretic approaches are grouped into "content theories" and "process theories". The theories of the first group ("content theories") are based in the assumption that the human behavior has its ground in an unconscious psychophysical disposition. Individuals not always conscious of all their desires an needs; therefore, the motivational phenomenon is seen as resulting from unknown forces even to the individual himself. The "process theories" are based in the tenet that major determinants of the human behavior are the beliefs, expectations and anticipations that individuals have concerning future events. Behavioral motivations are seen as purposeful and goal directed, based on conscious intentions.
In the context of such dichotomy are examined the following approaches: first, the "contents theories"; Maslow's Need Hierarchy Theory; Theory X and Theory Y (McGregor); Two-factor Theory: Motivation-Hygiene (Herzberg); Power, affiliation and achievement Theory (McClelland); E. R. G. (Existence-Relatedness-Growth), Theory (Alderfer), and Theory Z (Ouchi). Second, the "process theories": Social Comparison Theory (Festinger); Equity Theory (Adams); Expectancy Valence (VIE) Theory (Vroom); Goal Setting and Cognitive Theory (Locke); Performance-Satisfaction Theory (Porter & Lawler); Attribution Theories: Causal Attribution Theory (Kelly), Cognitive Estimate Theory (Heider) and Self-perception Theory (Bern).
This review points out the increasing interest on the topic in work motivation, both on the academical environment and also in the organizations. The creation, of a stimulating, productive and satisfactory work environment can be benefical for both management and employees. However, the main role of this process belongs to the managers, because of their influence in determining the characteristic of the performance environment. Important implications can be drawn from the theoretical reviewed. Their value lies in their capacity to render sensitive both to researchers and managers on specific factors and processes of the motivational approaches that can have an important bearing on the behavior of people at work.

Index terms: Employee motivation. Job satisfaction. Employee attitudes. Industrial psychology.


 

 

1. INTRODUÇÃO

Motivar os empregados para alcançar altos níveis de satisfação, desempenho e produtividade, constitui o ponto central da Psicologia do Trabalho. Muitos autores vêm contribuindo nesse sentido, formulando teorias, definindo conceitos e situações motivadoras, interpretando comportamentos e atitudes, estabelecendo metas e objetivos no processo motivacional e propondo modelos e planos de ação, embora apresentando diversidade nos seus pontos de vista. Apesar das divergências de opinião, pode-se observar que existe consenso generalizado em considerar o fenômeno da motivação, representado por um processo de tomada de decisões que, na situação de trabalho, leva os indivíduos a executarem suas tarefas e a desempenharem suas atribuições na medida de suas melhores capacidades e esforços. A compreensão desse fenômeno permitirá, às organizações, chegarem a determinações mais efetivas e acertadas em suas decisões, no sentido de que as mesmas sejam tomadas com melhor conhecimento de seus recursos e de seu eficaz aproveitamento, com previsão de seus resultados.

O presente trabalho consta de uma breve revisão sobre o tema em estudo, destinada a contribuir para melhor interpretar as principais tendências atuais que vigoram neste importante campo do conhecimento. Para esse fim, podemos agrupar os modelos teóricos propostos em "teorias de conteúdo" e "teorias de processo", classificação sugerida por Tribett e Rush (1984), a qual tomamos como esquema de referência em nossa análise. As primeiras partem da determinação das necessidades humanas para explicar o fenômeno motivacional, identificando conseqüentemente o comportamento dirigido à satisfação das mesmas, mas sem entrar em cogitação sobre as operações psicológicas, tanto conscientes como insconscientes, que o processo envolve. Estas teorias se caracterizam pela ênfase que atribuem à identificação dos diferentes tipos de necessidades e aos métodos utilizados na sua satisfação, partindo do suposto de que um empregado satisfeito é um empregado produtivo, e também pela natureza intrínseca de certos motivos: a recompensa virá da satisfação que proporciona o trabalho em si mesmo.

As segundas, "teorias de processo" focalizam sua atenção nas sucessivas etapas do fenômeno motivacional, nas percepções e perspectivas do indivíduo no estabelecimento de metas e objetivos pessoais e, principalmente, nos mecanismos conscientes da tomada de decisões. Isso explica o fato de que estas teorias sejam conceituadas como cientificamente mais definidas do que as de "conteúdo". Por outro lado, e talvez pela mesma razão, apesar de terem maior aceitação no mundo acadêmico, sua repercussão no ambiente do trabalho é ainda limitada.

 

2. TEORIAS DE CONTEÚDO

Dos autores que seguem esta direção o mais conhecido é Maslow, com sua Teoria da Hierarquia de Necessidades, tanto pelos psicólogos do trabalho como pelos executivos e profissionais do campo das ciências empresariais. Cabe a este autor o mérito de haver proposto uma teoria clara, coerente e funcional, baseando-se nas suas experiências acumuladas em muitos anos de prática clínica. Ele identificou as principais necessidades do ser humano e as classificou conforme uma escala ascendente de hierarquização. O aspecto fundamental desta teoria baseia-se na suposição de que cada tipo de necessidade deve ser satisfeito suficientemente antes do que os outros colocados nos níveis mais altos na escala proposta. À medida que as necessidades do nível hierárquico inferior vão sendo satisfeitas, surgem como preponderantes as de categoria imediatamente superior, as quais passam, então, a motivar mais intensamente o comportamento. Este modelo é bastante flexível nesse aspecto, uma vez que o próprio Maslow reconhece a existência de variações individuais, especialmente no que diz respeito à intensidade das necessidades e ao momento em que se manifestam como prevalescentes. Neste sentido, o autor admite que, especialmente as de nível mais elevado na escala (necessidades psicológicas), possam também aparecer sem que as de categorias inferiores tenham sido plenamente satisfeitas.

É importante esclarecer que após várias revisões, a escala de sete níveis proposta por Maslow (1954) sofreu modificações quanto ao número de categorias, constituindo-se finalmente de cinco, cujas definições são arroladas a seguir para a melhor compreensão das idéias desse autor:

1ª — Necessidades fisiológicas: Respondem à finalidade de manter a homeostase do organismo, sendo sua satisfação indispensável à sobrevivência do indivíduo e da espécie.

2ª — Necessidades de segurança: Compreendem o desejo de proteger-se contra o perigo, a ameaça e a privação (doenças, acidentes, catástrofes, instabilidade econômica etc.), tanto em relação ao próprio indivíduo como de sua família.

3ª — Necessidades sociais: Referem-se ao desejo de pertencer, de formar parte, de participar, de ser aceito pelos outros, de dar e receber afeto e amizade.

4ª — Necessidades de estima: Traduzem o desejo do indivíduo de destacar-se no grupo do qual participa e de ser prestigiado pelos demais. Manifestam-se através de outras formas mais específicas, como as necessidades de prestígio e de poder. As primeiras se caracterizam pela busca de status e de reconhecimento social, e as seguintes, pela ascendência que o indivíduo deseja exercer sobre os outros.

5ª — Necessidades de auto-realização: Incluem o desejo de crescimento psicológico, de aprimoramento das capacidades pessoais e de excelência nas realizações, constituindo, assim, um desafio permanente na vida do indivíduo.

As contribuições de Maslow têm servido para estimular o desenvolvimento de novos modelos teóricos e suas formulações continuam sendo objeto de atenção por parte dos cientistas do comportamento (Herzberg, 1959; McGregor, 1960; McClelland, 1961; Alderfer, 1969; Steers & Porter, 1983, entre outros). Por outro lado, suas proposições teóricas vêm possibilitando a organização de programas de desenvolvimento de recursos humanos nas organizações, baseados no conhecimento das capacidades e das necessidades de seus empregados (Pérez-Ramos, 1987).

Outra importante abordagem na constelação das "teorias de conteúdo" que queremos destacar, é a Teoria Bifatorial de Motivação — Higiene, concebida por Herzberg e seus colaboradores (1959). Os estudos e pesquisas desses autores sobre a motivação humana, especialmente os relacionados com as necessidades, motivos e atitudes das pessoas no ambiente de trabalho, permitiram formular suposições fundamentais para compreender o comportamento dos empregados nas organizações, partindo do princípio de que os mesmos tendem a descrever suas experiências ocupacionais satisfatórias em termos de fatores intrínsecos ("fatores de motivação") referidos ao conteúdo e à natureza do trabalho em si mesmo. Por outro lado, tendem também a referir as experiências insatisfatórias em termos de fatores extrínsecos, por sua relação mais direta com determinadas características das condições do trabalho, mas não com seu conteúdo, ou seja, com a tarefa especificamente. Os fatores de ordem intrínseca, denominados "motivadores", incluem variáveis de caráter mais pessoal, como as de realização, reconhecimento, sentido de responsabilidade, atração e desafio do próprio trabalho, possibilidade de progresso e crescimento psicológico. Os fatores extrínsecos, são chamados "fatores de higiene", porque incluem aspectos de natureza preventiva e ambiental, não relacionados diretamente com a tarefa ou o trabalho em si mesmo. São eles as normas administrativas, os sistemas de salários, o relacionamento entre os membros da organização, os estilos de supervisão, entre outros.

As proposições de Herzberg são assim compatíveis com as de Maslow, embora ambos autores apresentem pontos de vista diferentes. Enquanto que Maslow centraliza sua atenção nas necessidades humanas, Herzberg o faz referindo-se também aos incentivos utilizados para a satisfação das mesmas. Para este último autor, os "fatores de higiene" se relacionam diretamente com as necessidades fisiológicas, de segurança e sociais de Maslow, enquanto que os "fatores de motivação" encontram correspondência com as necessidades de estima e de auto-realização do esquema de Hierarquia de Necessidades (Davis, 1972).

Um dos principais resultados imediatos derivados das contribuições de Herzberg foi o desenvolvimento, em escala apreciável, dos estudos sobre motivação no próprio ambiente ocupacional. Até 1959, época em que este autor apresentou sua teoria, poucos esforços tinham sido realizados nesse sentido, o que se explica pelo fato de que, anteriormente, as formulações teóricas sobre motivação se baseavam principalmente em observações clínicas e estudos de laboratório (Murray, 1938, e Maslow, 1954). Herzberg veio preencher esse vazio com seus esforços dirigidos a compreender a importância da motivação no meio organizacional transferindo a tarefa de pesquisar o fenômeno motivacional para a situação real de trabalho. Além disso, a Teoria Bifatorial é exposta de maneira simples e sistemática, à altura da compreensão da maioria dos integrantes das organizações, formulando, ao mesmo tempo, recomendações práticas e específicas dirigidas a melhorar os níveis de satisfação.

Entre as principais formulações teóricas que também vinculam as contribuições de Maslow à realidade organizacional, destacam-se as apresentadas por McGregor (1960), em sua conhecida Teoria Y. É importante esclarecer que esta formulação tem seus antecedentes na chamada Teoria X, do mesmo autor, que a elaborou baseando-se nas idéias de Elton Mayo (1933), resumidas em sua muito controvertida "Hipótese da ralé", segundo a qual, o homem é concebido como um ser sem motivação para enfrentar o trabalho ou assumir responsabilidades, preferindo ser conduzido, em vez de empregar sua própria iniciativa no desempenho de suas atividades. Esta concepção resultou totalmente modificado à luz das idéias de Maslow, dando lugar à Teoria Y, do próprio McGregor, como proposta substitutiva da Teoria X.

Nesta nova direção (Teoria Y), seu autor postula que o ser humano é motivado principalmente por suas necessidades de realização pessoal, de trabalho produtivo, de aceitação de responsabilidades e de adequação de suas metas pessoais com as de organização ou grupo de trabalho, percebendo seu desempenho como real fonte de satisfação. Ambos posicionamentos teóricos de McGregor (Teoria X e Teoria Y) representam uma polarização nos estilos de gerência e administração dos recursos humanos ainda utilizados nos ambientes organizacionais. Na Teoria X, a ênfase é atribuída às metas da organização, administrando seus recursos humanos em forma autoritária, coincidindo, assim com o Sistema 1 (autocrático) de Likert (1967). Por outro lado, na Teroia Y a atenção é dirigida à valorização do empregado, proporcionando-lhe condições estimuladoras para alcançar suas metas e satisfazer suas necessidades. O estilo de gerência, concebida desta forma, enquadra-se no chamados sistema 4 (democrático) igualmente de Likert.

As formulações da Teoria Y apresentam também certa afinidade com as idéias de Argyris (1957), formuladas anteriormente. As colocações desse autor destacavam a importância de equacionar as necessidades individuais com as da organização, conforme princípios de integração eficaz das respectivas metas. Para Argyris, que nesse sentido se aproxima ainda mais dos postulados de Maslow, o ambiente organizacional ideal é aquele que propicia um efetivo desenvolvimento ocupacional e um contínuo crescimento psicológico do empregado e sua autêntica conscientização de que ele é parte integrante da organização.

Também é importante neste grupo de "teorias de conteúdo" a contribuição de McClelland (1961). Suas formulações descritivas dos motivos de Poder, Afiliação e Realização, foram derivadas de seus estudos sobre as necessidades predominantes em diferentes culturas e estratos sociais. Vale mencionar que o exame das necessidades que prevalecem no comportamento das pessoas já tinha sido objeto de análise, não só por parte de Maslow (1954), como também, anteriormente, por Murray (1938).

O principal mérito que se atribui aos trabalhos de McClelland é o que se relaciona com a identificação, categorização e interrelação das necessidades humanas que se definem como fatores de motivação. Este autor, em estudos posteriores (1975), confirmou sua proposição inicial de que na maioria das pessoas estão presentes aqueles três tipos de necessidades e acrescentou que os mesmos se interrelacionam e se apresentam em diferentes graus de intensidade nos indivíduos, sendo possível até configurar um perfil psicológico para cada um deles. Assim, aquelas pessoas que apresentam elevados índices nas necessidades de realização tendem a esforçar-se para alcançar altos níveis no seu desenvolvimento, maior autonomia no seu desempenho e melhor aceitação de responsabilidades no seu trabalho, assumindo desafios realísticos. No contexto organizacional, estas características se traduzem em sucesso gerencial e independência de ação. Contudo, quando tais características se manifestam em forma exacerbada, seus efeitos podem chegar a ser negativos, a menos que sejam atenuados pelo peso e influência das outras duas categorias de necessidades (afiliação e poder). Os estudos de Andrews (1967), sobre liderança e sucesso gerencial, mostram a existência de um alto grau de associação, com o predomínio combinado, das necessidades de realização e de poder.

Quando as necessidades prevalecentes são as de afiliação, as pessoas tendem a ter mais preocupação em desenvolver e manter um adequado relacionamento social do que em melhorar seu desempenho. Contrariamente às necessidades de realização, as de afiliação têm sido pouco estudadas em função das conseqüências que provocam no comportamento dos indivíduos. Contudo, as limitadas contribuições existentes mostram que as pessoas nas quais predominam as necessidades de afiliação caracterizam-se por um intenso desejo de aprovação por parte dos demais, de identificação com os sentimentos dos outros, de fácil interrelacionamento e adequada capacidade de adaptação às normas sociais (Steers & Porter, 1983). Na situação de trabalho, desempenham com eficiência as funções que envolvem contatos interpessoais (vendas, ensino, relações públicas, aconselhamento, entre outros).

Por último, quando as necessidades de poder são as que predominam, os comportamentos mais freqüentes são aqueles que abrangem o desejo de ser prestigiado, de dominar e de controlar as atitudes e ações dos demais. Os indivíduos com alto nível dessas necessidades procuram desempenhar tarefas de liderança nas atividades de grupo, contando freqüentemente com apreciável fluência verbal que utilizam para persuadir os outros. Os trabalhos de Steers & Porter (1983) mostram que os empregados com as características deste perfil, freqüentemente revelam adequado nível de desempenho e evidentes qualidades de direção dependendo, naturalmente, de uma conveniente combinação com as outras categorias de necessidades (realização e afiliação). É, válido assinalar que os estudos sobre as necessidades de poder vêm de longa data. Já Adler (1930) considerava-as como meta essencial de muitas pessoas no seu desenvolvimento individual. Embora trabalhos posteriores, como os de Murray (1938) e do próprio McClelland (1975), não atribuíssem a mesma importância que Adler conferia às necessidades de poder, nem por isso deixaram de lhes conceder um apreciável valor.

Nos finais da década dos anos sessenta surgiu uma nova e importante proposta às "teorias de conteúdo", com relevante impacto no campo da motivação no trabalho. Trata-se da Teoria ERG (Existência-Relacionamento-Crescimento) formulada por Alderfer (1969), também derivada diretamente das idéias de Maslow e do seu Esquema Hierárquico de Necessidades. A diferença entre ambas orientações teóricas consiste, não só no número de categorias que definem a escala de necessidades (cinco no modelo de Maslow e três no de Alderfer), mas, principalmente, no sentido ou direção do desenvolvimento motivacional. Para Maslow, o processo se realiza em forma progressiva, ascendente, de nível a nível de categoria nas necessidades da escala hierárquica; para Alderfer, esse processo pode dar-se também em sentido regressivo, descendente; isto é, de frustração-regressão, e não unicamente na direção de satisfação-progressão, conforme Maslow. O sentido de frustração-regressão pode ser resultante de barreiras e bloqueios na satisfação das necessidades de categorias hierárquicamente mais altas na escala, produzindo, nesse caso, um retorno ou descenso às inferiores, sempre que nestas últimas o indivíduo tenha experimentado satisfação. Landy & Trumbo (1980) esquematizaram este processo de duplo sentido reversível combinando as três categorias de necessidades do sistema ERG de Alderfer, de forma a identificar, na escala proposta por este autor, tanto o sentido ascendente, de progressão, como o descendente, de regressão. Além disso, o modelo ERG revela possuir maior flexibilidade do que o de Maslow, uma vez que prevê a coexistência e ação simultânea de duas ou mais das categorias de necessidades propostas.

A correspondência entre as categorias de necessidades de ambos modelos tem sido objeto de minuciosa análise por autores como Steers & Porter (1983), de cujos resultados elaboramos o seguinte esquema comparativo:

 

 

O modelo ERG tem recebido críticas por autores como Kornhauser (1965) devido, especialmente, à reduzida amplitude da escala (três níveis) e também pela delimitação pouco definida das categorias representadas nesses níveis. Tais observações, contudo, refutadas categóricamente pelo próprio Alderfer, não diminuem o mérito de sua contribuição ao estudo do fenômeno da motivação.

O esforço por encontrar novas vias de compreensão desse importante fenômeno motivacional, determinante do comportamento humano na situação de trabalho, continua com renovado vigor, como são as mais recentes formulações de Ouchi (1983), configurando um esquema teórico que denominou de Teoria Z. Este enfoque tem tido ultimamente ampla repercussão, tanto nos meios acadêmicos como nos empresariais, principalmente por sua especial conotação cultural e no que diz respeito à sua influência no desempenho e na produtividade. O principal interesse despertado por esta nova orientação se centraliza no ambiente organizacional, incluindo o estilo gerencial e a identificação do empregado com a organização e o trabalho. São aspectos que caracterizam a empresa japonesa, à qual são atribuídos os expressivos índices alcançados na produtividade. Ouchi descreve seu modelo teórico a partir dos princípios que distinguem a sociedade industrial japonesa, e se refere ao mesmo denominando-o de "estilo Z", propondo sua adaptação a outras culturas, cujos modelos qualifica como de "estilos não Z". Para o autor, o "estilo Z" se caracteriza pela importância que atribui aos recursos humanos sobre outros fatores que intervêm no processo da produção, como também pelo valor concedido ao ambiente organizacional estimulador.

A concepção do "estilo Z" se apoia na idéia da "família organizacional", segundo o princípio de harmonia (wa) caracterizado pela interrelação consensual entre os integrantes da organização e também pelo trabalho em equipe, baseados na consciência de grupo e na mútua cooperação, como também na definida correspondência das metas individuais e os objetivos da empresa. Existe no "estilo Z" um compromisso recíproco da "família" com seus membros, garantindo, assim, um clima de satisfação e de estabilidade no trabalho, incluindo sistemas racionais e estimuladores de benefícios e incentivos.

Em síntese, a Teoria Z, assim designada como referência derivada das anteriormente propostas por McGregor com os nomes de Teoria X e Teoria Y, tem seu fundamento em uma concepção filosófica própria de uma cultura tradicional específica, na qual são enfatizados os valores individuais e grupais. É necessário acrescentar que Ouchi, além de descrever e analisar as motivações individuais e o ambiente de trabalho especificado no "estilo Z", vai mais adiante, apresentando uma seqüência de etapas no processo de crescimento psicológico pessoal, incentivado por um clima organizacional estimulador, cujo estudo tem sido tomado como referência nas suas formulações teóricas. Embora se trate de uma teoria promissora, dirigida a compreender o processo motivador no âmbito organizacional, o fato de que seus fundamentos tenham suas raízes especialmente em características culturais e até filosóficas, forâneos às que sustentam nossos princípios e valores, autores como Steers & Porter (1983) expressam suas reservas quanto às possibilidades de êxito em sua plena aplicação às nossas organizações, sem estar precedida de amplas modificações sobre a concepção do empregado como membro realmente integrante da organização e de seu ambiente de trabalho.

 

3. TEORIAS DE PROCESSO

Como já foi exposto anteriormente, estas teorias partem do princípio de que os indivíduos decidem conscientemente se realizam, ou não, uma determinada atividade. Desta forma, tais teorias focalizam sua orientação nos modelos e etapas do processo utilizado na tomada de decisões, conforme seu valor utilitário e as probabilidades alternativas (modelos normativos), ou, ainda segundo o desenvolvimento dos mecanismos psicológicos que os envolvem (modelos cognitivos). Em outras palavras, se o empregado percebe que o alto nível de desempenho poderá levá-lo a alcançar suas metas pessoais, decidirá esforçar-se para assim atingir graus de atuação cada vez mais elevados. Em caso contrário, se a sua percepção é a de que a probabilidade de alcançar as metas desejadas não é condizente com o esforço a ser dispendido, seu desempenho tenderá a decair.

Dentre as formulações que se enquadram nas "teorias de processo" podemos citar como mais conhecidas a Teoria da Dissonância Cognitiva (Festinger, 1954) e sua derivada, a Teoria da Eqüidade (Adams, 1961-1963); a da Expectância (Vroom, 1964); a Teoria do Estabelecimento de Metas (Locke, 1968-1975); a Teoria do Desempenho-Satisfação (Porter & Lawler, 1968); as Teorias de Atribuições (Kelly, 1971); e, finalmente, a Teoria da Auto-percepção (Bem, 1972). O fenômeno da motivação na situação de trabalho será melhor compreendido através da análise sintética das principais proposições e contribuições dessas teorias.

A Teoria da Dissonância Cognitiva, formulada por Festinger (1954), parte do pressuposto de que o ser humano, mediante um processo individual de auto-avaliação, configura sua própria auto-imagem (self-concept), utilizando-a como parâmetro ou padrão referencial de medida na sua auto-apreciação e também na comparação que faz das outras pessoas com características individuais que considera como equivalentes às próprias. Quando percebe que existem incongruências ou discordâncias entre ambas avaliações, surge o fenômeno psicológico conhecido como- "dissonância cognitiva" que, em geral, se traduz por um estado de stress, mais ou menos intenso, que leva o indivíduo a desenvolver comportamentos dirigidos a superá-lo, para assim restituir a suposta condição original de "consonância" ou equilíbrio psicológico (Keef, 1988). Nessa tentativa restauradora poderão surgir barreiras e bloqueios que, quando não superados eficazmente, podem dar origem a formas erráticas ou irracionais de conduta, aumentando ainda mais o desequilíbrio originado. Do ponto de vista organizacional, os postulados de Festinger têm permitido fundamentar muitos dos programas destinados ao aperfeiçoamento e motivação dos recursos humanos, evitar e resolver situações de "dissonância" no âmbito do trabalho, assim como a estimular as de "consonância".

A Teoria da Dissonância Cognitiva tem experimentado modificações em seus postulados e, inclusive, adotado diferentes designações, embora conservando sua fundamentação original. É o que aconteceu com as contribuições de Adams (1961 e 1963) que a alterou em alguns de seus aspectos instrumentais e a denominou de Teoria da Eqüidade. Seu autor parte do princípio de que o indivíduo, na situação de trabalho, realiza continuamente comparações entre suas contribuições (desempenho, responsabilidades, formação profissional, etc.) e as compensações que recebe (salários, status atribuído, reconhecimento, entre outras) com as dos outros empregados. Dessas comparações resulta a percepção individual de "eqüidade", ou de "ineqüidade". O seguinte esquema ilustra o pensamento do autor:

 

 

Se a percepção que o empregado tem é a de "ineqüidade", tanto quanto se trata de compensação insuficiente como de supercompensação, tende a se comportar de forma a equilibrar essa relação. Procura modificar sua atuação, aumentando ou diminuindo, segundo o caso, seus níveis de desempenho e o caráter de suas atitudes ou, ainda, tratando de influir, no mesmo sentido, no desempenho e no comportamento dos outros. Trata-se de uma tentativa dirigida a incidir em alguns dos quatro elementos da equação. Quando essa tentativa é frustrada, podem surgir mecanismos pseudo-compensatórios, a ponto de não ser infreqüente, nessas circunstâncias, o abandono do emprego. Outros estudos comprovam um aumento nos níveis de desempenho naqueles empregados que sentem estar supercompensados (Adams & Rosembaum, 1962) e, uma diminuição nos subcompensados (Goodman & Friedman, 1969).

Uma das "teorias de processo" mais conhecidas e que se destaca por seu valor elucidativo acerca do fenômeno da motivação no trabalho, é a chamada Teoria da Expectância, também conhecida como Teoria da Instrumentalidade e, ainda, como Teoria VIE (Valência, Instrumentalidade-Expectância). Suas formulações estão inspiradas em contribuições de longa data, como foram os estudos de laboratório realizados por Tolman (1932). Já nesses trabalhos iniciais foram identificados antecedentes de natureza cognitiva no processo motivacional, como são as intenções, as metas e, principalmente, os valores. Os autores que seguiram a Tolman (Rotter, 1954; Peak, 1955; especialmente Vroom, 1964, e mais recentemente, Landy & Trumbo, 1980; Tribet & Rush, 1984), apoiaram-se também na Teoria de Campo de Lewin (Blum & Naylor, 1976), para chegar a um esquema estruturado daquele processo.

Segundo Vroom (1964), principal expoente da Teoria da Expectância, o processo motivacional é desenvolvido conforme as percepções que o indivíduo tem da relação entre os esforços que conscientemente estima que deve realizar para alcançar um determinado objetivo, ou meta, e o valor que lhes atribui. A intensidade desses esforços dependerá, em todo caso, da interação dos três fatores cognitivos VIE; isto é, da Valência (força de atração ou repulsão sentida ou percebida); da Instrumentalidade (relação causal entre os resultados desejados e a potencialidade de desempenho), e da Expectância (representação antecipada da decisão a ser tomada). Segundo Landy & Trumbo (1980), esses três fatores, combinados por multiplicação (VxIxE), determinam o grau de motivação do indivíduo. Quanto maior a intensidade das forças que incidem nesses fatores, tanto maior será o nível motivacional resultante. Dado o caráter multiplicador dos mesmos, quando um deles apresenta um valor zero ou negativo, o nível motivacional também será nulo ou negativo.

Este modelo teórico pode ser estudado em termos dos conjuntos de suas variáveis principais (o empregado, a tarefa e o ambiente de trabalho). O modelo leva em conta a importância das diferenças individuais, tanto nas atribuições de valor como na percepção das forças de atração ou repulsão e do nível de eqüidade percebido nos resultados alcançados. As pessoas diferem, também, nas suas expectativas e nas suas apreciações de que determinados comportamentos lhes permitem obter as recompensas desejadas. No que concerne à variável tarefa, o trabalho em si mesmo pode constituir fonte importante de recompensa, intrínsecamente valorizada. E, quanto ao ambiente de trabalho, sua influência sobre o desempenho tem sido plenamente demonstrada através de toda uma diversidade de estudos sobre esta variável (Pérez-Ramos, 1980). Os postulados desta teoria atribuem maior importância aos fatores cognitivos; isto é, ao conhecimento que a pessoa tem de como seu próprio comportamento pode levá-la a alcançar determinadas metas ou resultados possíveis no seu trabalho. Contribuições mais recentes (Heneman & Schwab, 1972; Mitchell, 1974, e Tribett & Rush, 1984) centralizam sua atenção no estudo dessas proposições teóricas, aplicáveis a situações específicas no contexto das organizações.

Os resultados desses estudos permitem explicar o processo motivacional no âmbito ocupacional através da interrelação dinâmica daqueles três fatores cognitivos. Dessa forma, se uma pessoa pensa que tem possibilidade de executar uma determinada tarefa (Instrumentalidade) e que sua efetiva realização poderá levá-la a alcançar uma meta desejada (Expectância), à qual atribui grande valor (Valência), podemos afirmar que essa pessoa está altamente motivada. Em outras palavras, tais fatores (VIE) apresentam uma significativa associação com as atitudes, o desempenho e a satisfação no trabalho. A interpretação permite concluir que se o produto VxIxE é positivo, pode ser indicativo de uma perspectiva consciente, racional, a respeito da tarefa e seus resutados e de promissores níveis de desempenho e produtividade. Caso contrário, quando o produto se apresenta baixo, nulo ou negativo, tal resultado constitui um sinal de alarme para detectar problemas de adaptação no trabalho (altos índices de absenteísmo, rotatividade, desempenho deficiente, acidentes, entre outros).

Outros modelos cognitivos, propostos por autores como Porter & Lawler (1968), Kelly (1971), Lawler (1973) e Locke (1975), mostram um progressivo desenvolvimento das teorias psicológicas da motivação e a tendência, cada vez mais generalizada, de estudar e compreender o processo motivacional, não somente nos meios acadêmicos mas também nos organizacionais. Apesar das diferenças e particularidades que caracterizam suas respectivas formulações, tais modelos apresentam, como denominador comum, os princípios que identificam uma definida orientação cognitiva.

Cabe a Locke (1975) o mérito de conceber e divulgar os princípios da Teoria do Estabelecimento de Metas como explicação do fenômeno da motivação no trabalho. O modelo proposto por esse autor tem seu fundamento na concomitância de certos fatores determinantes do comportamento humano, como são os "valores" (importância que a pessoa atribui à meta ou objetivo que deseja alcançar) e as "metas" (objetivo desejado). Segundo o autor, tais fatores são os impulsores do comportamento dirigido para determinadas "metas" almejadas; estas são, por sua vez, indutoras conativas do processo, cuja última etapa se constitui em fator reforçador e em feedback para seu reinicio.

Para Locke, a maneira pela qual as pessoas concebem seus próprios juízos de valor, está impregnada de influências de caráter emocional. Portanto, pode-se inferir que os efeitos que as metas exercem sobre o comportamento são de natureza diretiva, guiando o pensamento em uma direção e não em outra, para uma meta e não para outra. A ação é meta-dirigida. Contudo, é necessário esclarecer que nem sempre esta influência conativa das metas conduz à atividade eficaz requerida, já que, inclusive, pode entrar em conflito com as de outras metas pessoais, ou mesmo, por razões circunstanciais, resultar em situações inapropriadas para uma determinada ação. Pode, também, acontecer, que a pessoa não conte com suficientes conhecimentos e habilidades ou, inclusive, capacidade de decisão para realizar tal ação. O próprio Locke admite que o processo pelo qual uma pessoa trata de atingir uma meta, ou mesmo de mudá-la, é realmente complexo, mas suas idéias básicas podem ser esquematizadas como se segue:

 

 

Os trabalhos desse autor e seus colaboradores permitiram determinar a intensidade da influência exercida pelas metas sobre o comportamento humano, indicando uma associação significativa entre essas variáveis. Inclusive naquelas situações em que as metas estabelecidas se localizam em planos tão elevados, que se torna difícil alcançá-las, os índices de desempenho, mostrados pelos indivíduos, são mais altos do que os de outros que fixam suas metas em níveis mais moderados. Uma vez que os postulados desta teoria provêm de experimentos de laboratório, autores como Carroll & Tosi (1973), Latham & Baldes (1975) e Kin & Hamner (1976), se esforçaram por estendê-la ao ambiente organizacional, confirmando, ao mesmo tempo, a estreita relação que existe entre metas e ações. Contudo, se evidencia, ainda, a necessidade de novos estudos para verificar as demais articulações do esquema proposto.

Porter & Lawler (1968) formularam, por sua vez, um modelo de caráter instrumental que dominaram Teoria de Desempenho-Satisfação, cujos fundamentos se baseiam nas características que distinguem o ser humano de poder antecipar ou prever eventos e de propor a gratificação desejada e, até certo ponto, a satisfação de algumas de suas necessidades. A importância que estes autores atribuem a tais características, coloca, em destaque, a natureza cognitiva de sua teoria.

O modelo proposto compreende a interação de uma diversidade de fatores de ordem pessoal que intervêm no processo motivacional: inteligência, habilidade e traços de personalidade (características relativamente estáveis), auto-percepção, esforço na execução da tarefa, desempenho, recompensa, relação esforço — recompensa e percepção da eqüidade (Adams, 1962). Como podemos observar, este modelo é atrativo, embora complexo, devido à diversidade de variáveis intervenientes e à sua complicada interação. No entanto, a ênfase dada aos aspectos cognitivos permite uma maior compreensão do fenômeno motivacional e do desenvolvimento de seu processo no ambiente organizacional. Embora a maior parte dos modelos teóricos, propostos com essa finalidade, baseie-se nos princípios que definem as teorias de impulsos, Steers & Porter (1983) consideram mais apropriado incluir a presente formulação no âmbito das teorias cognitivas, dado o caráter mais racional de seus mecanismos, os quais compreendem a antecipação dos resultados, a pôsposição da gratificação, a tomada de decisões e a utilização consciente de outros elementos.

Ainda dentro do universo cognitivo, vale destacar, especialmente pela sua importância instrumental, as chamadas Teorias de Atribuição, cujo fundamento encontra apoio em formulações que partem de um raciocínio baseado na antecipação dos possíveis resultados esperados, dos eventos previstos, para poder inferir suas prováveis causas (Steers & Mowday, 1981), em lugar do esquema de predição usualmente seguido, em que os eventos futuros são inferidos em função dos fatos já acontecidos.

Dentre as contribuições mais conhecidas deste grupo de "teorias de atribuição" está a denominada Teoria da Atribuição Causal, que parte do chamado "princípio da atenuação", proposto por Kelly (1971), segundo o qual os possíveis efeitos derivados de um determinado fator causal, podem ser atenuados ou modificados pela influência de outros incidentes. Os estudos de Bem (1972), realizados para comprovar este princípio, concluem que, quando a pessoa atua sob forte pressão externa, sentirá que seu comportamento está sendo governado por contingências extrínsecas. Contudo, quando essas pressões não existem ou são pouco intensas, perceberá que seu comportamento é guiado apenas pelo seu próprio interesse na atividade; em outras palavras, sentirá que está intrinsecamente motivado. Uma preocupação que existe a nível gerencial neste sentido é a que se deriva do fato de que os efeitos de ambas as formas de motivação (extrínseca e intrínseca) nem sempre resultam em uma somatória. Os trabalhos de Deci (1972) mostram nesse sentido, que certas recompensas extrínsecas podem diminuir os efeitos da motivação intrínseca (princípio da atenuação), a menos que aquelas recompensas sejam atribuídas de maneira contingente, especialmente se as mesmas são de natureza econômica. Em relação a esses pontos de vista, nem sempre concordantes, há pleno acordo em reconhecer que as recompensas, sobretudo a forma de salários ou prêmios em dinheiro, constituem um efetivo fator incentivador da motivação do empregado e, inclusive, de seus níveis de desempenho, sempre, em todo caso, que a tarefa se constitua em um desafio por ser interessante e atrativa (motivação intrínseca).

Outra proposição teórica que fundamenta os mesmos princípios de atribuição é a denominada Teoria da Avaliação Cognitiva. Seus postulados tem origem nos trabalhos de DeCharmes (1968) e de Deci & Ryan (1985), autores que destacam a importância da interação dos fatores de caráter individual (empregado) e os de natureza ambiental (organização) para explicar o fenômeno e os processos motivacionais. Estudos complementares efetuados para verificar tal proposição mostraram que, as atividades que o próprio empregado planeja, ou que estão sob seu controle, lhe são intrinsecamente motivadoras. Por outro lado, a recompensa, especialmente a realizada em forma de compensação monetária (fator extrínseco), pode colocar o empregado em situação de dependência da fonte geradora do estímulo. Tal circunstância permite compreender o fato de que, quando o empregado percebe que é bem remunerado, se sinta com menos liberdade para tomar decisões com vistas a separar-se da organização.

Algumas das proposições desta formulação teórica são discordantes com outras das teorias da "expectância" e do "estabelecimento de metas", especialmente no que concerne aos efeitos derivados dos fatores contingentes sobre a motivação, colocando, em destaque, a importância do meio ambiente como variável incidente no comportamento. Além disso, a teoria da "avaliação cognitiva" postula que o ser humano trata de manipular e adequar o meio ambiente para assim ser dono de seu próprio comportamento. Certos autores têm formulado críticas a esta teoria, especialmente no que se refere à metodologia utilizada em seus estudos e verificações, que consideram insuficiente, circunstância que coloca em questionamento suas possibilidades de generalização (Notz, 1975).

A Teoria da Auto-percepção, devida aos estudos de Bem (1972) sobre a auto-percepção, constitui uma extrapolação do já mencionado "princípio de atenuação" (Kelly, 1971). Bem parte da suposição de que as pressões contingentes, quando suficientemente intensas ou significativas, influem de tal maneira na pessoa que esta chega a se identificar com as mesmas, de forma a senti-las como próprias. Quando o empregado percebe que está submetido à pressão de um meio ambiente rígido, ou mesmo à influência de uma recompensa atrativa, sentirá que seu comportamento depende dessas causas extrínsecas. Mas, se a sua percepção é a da existência de um clima organizacional acolhedor, justo e eqüitativo, poderá concluir que seu comportamento será regido pela realização e pelo desempenho; isto é, estará intrínsecamente motivado. Já DeCharmes (1968), havia afirmado que a auto-percepção está vinculada à influência de fatores contingentes específicos, tanto extrínsecos como intrínsecos.

Embora a relação positiva entre a motivação extrínseca e a intrínseca possa ser considerada de valor, do ponto de vista acadêmico, no ambiente organizacional nem sempre a última é enriquecida pela primeira. Segundo Deci (1972), a utilização irracional de certos incentivos pode incidir negativamente na motivação intrínseca. Estas idéias são apoiadas pelos estudos de autores como Lepper, Greene & Nisbett (1973), Ross (1975) e Pritchard, Campbell & Campbell (1977).

 

4. CONCLUSÕES

Das contribuições teóricas analisadas, torna-se evidente que o fenômeno da motivação, na situação de trabalho, vem sendo objeto de interesse e estudo por parte de muitos autores. Suas proposições configuram posicionamentos e tendências que definem lineamentos de reconhecida importância científica nos meios acadêmicos e, de especial interesse, nos das organizações envolvidas no processo da produção. Apesar da diversidade de idéias e princípios em que apoiam suas formulações, tem sido possível efetuar seu exame, tomando, como referência, a classificação proposta por Tribett & Rush (1984) de "teorias de conteúdo" e "teorias de processo". Nesse contexto referencial são expostas as conclusões desta análise:

— Cada um desses agrupamentos classificatórios compreende uma diversidade de proposições teóricas, de fundamental significado para a interpretação do fenômeno da motivação na situação de trabalho. Distinguem-se, em posição de destaque, os trabalhos de Maslow (1954), no grupo das "teorias de conteúdo", e os de Vroom (1964), nas "teorias de processo". Algumas dessas contribuições enfatizam a importância do fator humano no processo motivacional, outras centralizam sua atenção no trabalho propriamente dito, e ainda outras, no meio ambiente organizacional. O exame e integração dessas contribuições permitirá chegar a uma concepção racional do fenômeno.

— É válido afirmar que as "teorias de conteúdo" têm contribuído à identificação e categorização das necessidades humanas, classificando-as em níveis e escalas de progressão, ou mesmo de regressão. Ao mesmo tempo definem e especificam os comportamentos dirigidos a satisfazer tais necessidades, com um propósito integrativo, em um contexto orientado a valorizar o indivíduo, a tarefa e o ambiente organizacional. O protótipo representativo deste grupo é a Teoria da Hierarquia de Necessidades (Maslow, 1954).

— As "teorias de processo", representadas por modelos cognitivos, estudam os mecanismos psicológicos que envolvem o processo motivacional. Compreendem, entre outros, a análise da auto-percepção, da tomada de decisões, dos conceitos de consonância e dissonância, da concomitância de fatores determinantes, do estabelecimento de metas, da atribuição de valores e da influência das variáveis relacionadas com o indivíduo, o ambiente e o trabalho. A Teoria da Expectância, (Vroom, 1964), também conhecida como de Instrumentalidade, ou mesmo Teoria VIE, é o principal expoente das "teorias de processo".

Estou convencido de que o conhecimento das teorias de motivação no trabalho é de significativa importância, não somente como objeto de estudo científico, mas também por suas repercussões no mundo do trabalho e o valor deste conhecimento se explica, principalmente, pelo interesse que desperta nos estudiosos do fenômeno, e nas possibilidades de sensibilizar as organizações sobre sua importância no processo da produção e no crescimento psicológico de seus recursos humanos.

 

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