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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof v.5 n.1 São Paulo jun. 2004

 

ARTIGOS

 

 

Mudando de opinião: análise de um grupo de pessoas em condição de re-escolha profissional

 

Changing mind: analysis of a group of people in process of professional reselection

 

Cambiando de opinión: análisis de un grupo de personas en situación de nueva elección profesional

 

 

Cynthia Borges de Moura* 1; Mirtes Viviani Menezes**

Universidade Estadual de Londrina, Londrina

 

 


RESUMO

Os altos índices de desistência nos cursos superiores evidenciam a importância de se conhecer as variáveis presentes na condição de insatisfação dos indivíduos com a opção realizada, com vistas não apenas ao atendimento desta população, mas também à prevenção deste quadro de alta evasão no nível superior. O presente estudo teve por objetivo realizar um levantamento preliminar da condição de pessoas que se diziam insatisfeitas com sua opção profissional, de forma a caracterizar tal população. Os participantes foram entrevistados individualmente e suas respostas foram gravadas, transcritas e categorizadas. Foram observadas quatro condições distintas dos sujeitos em relação à condição de re-escolha profissional. As similaridades e especificidades intergrupos e intragrupo permitiram caracterizar a população amostrada, e viabilizaram propostas para o delineamento e condução de programas de orientação específicos à condição de re-escolha profissional.

Palavras-chave: Re-escolha profissional, Orientação profissional, Redirecionamento de carreira.


ABSTRACT

The high rates of college dropping out show how important it is to know the variables involved in the dissatisfaction of those who had made their career choice, in order to support this population, and also prevent evasion. This study’s goal was to trace the preliminary condition of satisfaction of people that described themselves as dissatisfied are classified as unpleased with their career choice, in an effort to characterize them. Those who participated were interviewed individually and their answers recorded, transcribed and categorized. Four different levels were noted concerning their process of professional reselection. The similarities and particularities among groups and inside each group made it possible to characterize this sample population, and to review guidance programs designed for people in career resettlement.

Keywords: Professional choice, Professional guidance, Career resettlement.


RESUMEN

Los altos índices de abandono de las carreras universitarias sugieren la importancia de conocer las variables relacionadas con la insatisfacción de los individuos con la opción profesional realizada. La finalidad es ofrecer orientación a esta población y también prevenir ese cuadro de evasión en el nivel superior. El presente estudio tuvo por objetivo realizar un análisis preliminar de la situación de personas que se decían insatisfechas con su opción profesional, y caracterizar a esa población. Los participantes fueron entrevistados individualmente y sus respuestas fueron grabadas, transcritas y categorizadas. Se observaron cuatro diferentes variables de los sujetos con relación a la condición de nueva elección profesional. Las similitudes y especificidades intergrupos e intragrupo permitieron caracterizar la población estudiada, y hacer viables propuestas para el diseño y la conducción de programas de orientación específicos a la condición de nueva elección profesional.

Palabras clave: Nueva elección profesional, Orientación profesional, Redireccionamiento de la carrera.


 

 

A escolha profissional é uma questão séria e complicada. Os altos índices de desistência nos cursos superiores, que chegam a 40% em alguns casos, revelam a gravidade do problema (Marini, 2001). Os prejuízos são inúmeros, o ônus atinge desde as instituições de ensino, aqueles que não podem ter acesso à vaga abandonada, e em última análise o próprio estudante desistente que acumula o custo pessoal de uma nova escolha. Esta situação evidencia a importância de se conhecer as variáveis envolvidas na insatisfação dos indivíduos com a opção profissional realizada, com vistas tanto ao atendimento desta população, quanto à prevenção deste quadro de alta evasão no nível superior.

A insatisfação com a opção realizada ou com a formação profissional conquistada, é corroborada pela crescente demanda de universitários ou ex-universitários por trabalhos de orientação profissional (Hotza & Lucchiari, 1998). Conhecer as dificuldades e necessidades vivenciadas por aqueles que se encontram em condição de re-escolha é condição sine qua non para aumentar a efetividade dos programas de orientação voltados a atender tal demanda.

Fazer uma escolha ou re-escolha profissional implica em tomar uma decisão, processo para o qual a maior parte das pessoas não é devidamente preparada, quer seja na família, escola ou demais instituições educativas vigentes. Quando se considera uma escolha satisfatória como aquela com baixa probabilidade de incorrer em desistências posteriores e alta probabilidade de resultar em satisfação pessoal, nota-se, por um lado, a complexidade da tarefa de escolher e, por outro, a necessidade de uma análise madura das opções de escolha anterior à tomada de decisão.

Uma escolha profissional madura, ajustada, pressupõe capacidade de adaptação, interpretação e juízo da realidade; de discriminação, análise e integração de conhecimentos sobre si e sobre a realidade profissional; e aprendizagem do processo de tomada de decisão ( Neiva, 1995; Moura, 2001; Levenfus & Nunes, 2002).

Segundo Neiva (2002) a maturidade para a escolha profissional é composta por duas dimensões: atitudes e conhecimentos. A dimensão atitudes compreende a determinação e a responsabilidade para a escolha profissional, além da independência no processo de escolher uma profissão A dimensão conhecimentos compreende o autoconhecimento e o conhecimento da realidade educativa e socioprofissional. Estas subdimensões são reconhecidas também por outros autores como partes fundamentais dos processos de orientação profissional (Biggers, 1971; Blustein, 1992; Elwood, 1992; Munson, 1992; Lucchiari, 1993; Betz, 1994; Neiva, 1995; Carvalho, 1995; Macedo, 1998; Magalhães & Redivo, 1998). Os autores concordam também que indivíduos de diferentes idades podem apresentar maior maturidade em relação a algumas dimensões e imaturidade em relação a outras.

A idéia da idade cronológica como parâmetro para avaliar a maturidade para a escolha deve ser relativizada (Albion & Fogarty, 2002). A relação entre idade e maturidade profissional é foco de diversos estudos (Herr & Enderlein, 1976; Watson & Van Aarde, 1986; Powell & Luzzo, 1998; Patton & Creed, 2001), com resultados ora convergentes, ora divergentes à idéia de que quanto maior a idade, maior a maturidade.

Independente da idade cronológica do indivíduo, o que se processa numa escolha madura é o intercruzamento da análise das variáveis pessoais e contextuais. A dimensão pessoal abarca aspectos genéticos (em termos de potencialidades) e principalmente os aspectos relacionados à história de desenvolvimento do indivíduo. Por um lado tem-se a herança genética que irá determinar, em particular, as características físicas que poderão favorecer uma aptidão maior para determinadas áreas (Macedo, 1998) e, por outro, as experiências do indivíduo quando este entra em contato com o universo material e social, experiência esta que contribui para a construção de seus interesses, habilidades, valores, qualidades, limitações, conhecimentos, capacidade de resolução de problemas, entre outros. Estes aspectos, resultando de uma história de aprendizagem social, compõem o quadro das chamadas características pessoais, as quais se constituem em fatores potenciais de influência no processo de escolha profissional, conforme destacado em estudos como os de Lent, Brown e Hackett (1994); Betsworth e Fouad (1997); Lent e colaboradores (2002).

A dimensão contextual, diretamente implicada na constituição da dimensão pessoal, envolve fatores de ordem econômica, política, ideológica, religiosa, social, educacional, familiar (Rodrigues & Ramos, 1997; Moura, 2001; Soares, 2002; Levenfus & Nunes, 2002). Tais fatores se intercruzam e formam uma cadeia de determinantes com alto grau de influência, que pode ser positiva ou negativa, por facilitar ou dificultar a escolha da profissão.

Estas dimensões atestam a existência de uma ampla gama de variáveis que interferem na escolha profissional. Diante deste fato, considera-se que uma escolha amadurecida é aquela em que o indivíduo observa, analisa e adquire conhecimentos sobre todos os aspectos possíveis da situação em que se encontra (Banaco, 1998), pondera as vantagens e desvantagens das opções disponíveis e só então, toma sua decisão. Fazer isso é compor de forma consistente os critérios sob os quais a decisão será tomada.

Porém, o que se vê com muita freqüência, são escolhas realizadas na ausência de tais critérios ou com base em critérios pouco consistentes. É o que ocorre quando, ao reduzido número de informações, por exemplo, aliam-se as visões distorcidas, idealizadas ou estereotipadas, acerca das opções profissionais, (Lassance, Grochs & Francisco, 1993; Rodrigues & Ramos, 1997) ou quando a possibilidade de status, o prestígio de cursar uma universidade, é vivenciado como mais relevante do que a escolha propriamente dita, ou ainda a facilidade de ingresso na universidade, dada a baixa concorrência, é o único motivo de opção pelo curso (Lassance e colaboradores, 1993; Magalhães & Redivo, 1998) Tais critérios de escolha, em especial as idealizações e estereotipias, podem produzir, posteriormente, sentimentos de arrependimento e de decepção com o curso escolhido, que caracterizam dificuldades entre aqueles que se encontram em processo de re-escolha profissional (Gati, Houminer & Fassa, 1997).

Tendo feito uma escolha profissional nestes moldes, o indivíduo não tarda em manifestar uma série de dificuldades ou preocupações. A decepção com o curso foi uma das categorias temáticas encontradas por Magalhães & Redivo (1998) em seus estudos sobre o processo de re-opção profissional entre universitários. Neste estudo, a decepção foi vinculada ao caráter teórico das disciplinas cursadas, e a falta de uma visão da prática profissional. Segundo Lassance (1997), a decepção com o curso, com os professores ou com a instituição, se dá após uma fase de entusiasmo com a conquista de uma vaga na universidade, quando há então contato com a realidade do curso escolhido, que culmina num repensar a escolha realizada. Neste momento, a re-opção de curso se torna uma das alternativas encontradas pelo indivíduo na busca de uma maior satisfação pessoal-profissional.

Além da decepção e sentimentos de arrependimento, a falta de habilidades compatíveis à profissão escolhida, e problemas com o progresso acadêmico são aspectos considerados como barreiras que dificultam o momento de re-escolha profissional, quando não se tornam impeditivos a determinadas opções profissionais (Lent e colaboradores, 2002; Magalhães & Redivo, 1998; Hotza & Lucchiari, 1998).

As condições financeiras dos indivíduos ou relativas às profissões, revelam-se como importantes barreiras ou motivo de preocupações, também entre aqueles que pretendem mudar de curso (Lent e colaboradores, 2002). Por um lado, a falta de recursos financeiros faz com que muitos cursos que requerem grande investimento sejam descartados. Por outro lado, segundo Magalhães & Redivo (1998), os sujeitos valorizam em suas escolhas, a inserção no mercado e o retorno financeiro, visto que se mostram preocupados com o padrão de vida no futuro, direcionando suas escolhas.

Problemas com decisões profissionais e mudança de carreira são relativamente comuns ao longo da trajetória de vida dos indivíduos (Whitaker, 1997). Há, segundo Soares-Lucchiari (1997), várias possibilidades do que chamou de re-orientação, relacionadas a diferentes momentos de vida da pessoa. Há a orientação do jovem durante o período universitário; a orientação buscada no meio da carreira ou na aposentadoria. No primeiro caso o jovem busca a OP dada sua condição de insatisfação com o curso e visão de possibilidade de fazer uma ‘re-opção’ ou ‘re-escolha’; ou dada sua condição de seguir seus estudos de Pós-graduação, momento que se propõe a redefinir sua escolha anterior.

Saber da existência desta alta variabilidade de condições ou momentos de vida que demandam uma reavaliação profissional, e conhecer as generalidades e especificidades de cada momento, em termos de dificuldades e necessidades, é condição imprescindível para o alcance do objetivo de orientar.

É neste contexto que o presente estudo se situa, por estar voltado ao levantamento das dificuldades e necessidades de pessoas que se dizem insatisfeitas com sua opção profissional e dispostas a repensar sua escolha através do auxílio da Orientação Profissional. Os achados desta pesquisa pretendem contribuir para a compreensão dos problemas específicos vivenciados por esta população, além de trazer subsídios para a elaboração de Programas de Orientação voltados às necessidades de quem precisa fazer uma re-escolha profissional.

 

MÉTODO

Participantes

Fizeram parte desta pesquisa 21 sujeitos, inscritos num programa de orientação para a re-escolha profissional, da Clínica Psicológica da Universidade Estadual de Londrina - Paraná. A Tabela 1 apresenta os dados demográficos dos sujeitos.

Tabela 1

Caracterização demográfica dos sujeitos da pesquisa

 

 

Instrumentos2:

a) Ficha com dados de identificação pessoal para a caracterização demográfica da população entrevistada;

b) Roteiro de Entrevista Semi-Estruturada, com 11 questões abertas elaboradas a partir de Primi, Munhoz, Bighetti, Di Nucci, Pellegrini e Moggi, (2000); Moura (2001); Japur (1988); Neiva (1999); e Lent e colaboradores (2002), com o objetivo de levantar as dificuldades e necessidades da população entrevistada, em relação à escolha profissional. Os tópicos abordados nesta entrevista versaram sobre o processo de escolha do curso; opções iniciais; julgamento da escolha realizada; motivo da condição de dúvida em relação ao curso; dificuldades vivenciadas para fazer a nova escolha; expectativas em relação ao trabalho de orientação para a re-escolha; necessidades sentidas; nível de autoconhecimento e de informações acerca das profissões.

Procedimento

Foram convidadas a participar da pesquisa as pessoas inscritas na Clínica Psicológica da Universidade Estadual de Londrina (UEL) para atendimento em re-escolha profissional. O atendimento de Orientação Profissional é realizado, nesta instituição, nas modalidades individual e grupal, para indivíduos em situação de primeira escolha, e na modalidade individual para pessoas na condição de re-escolha profissional. É um serviço disponibilizado tanto à comunidade acadêmica quanto à comunidade externa. A alta demanda por orientação em re-escolha, fomentou a presente pesquisa que pretende subsidiar reformulações no atendimento ofertado.

O procedimento de coleta de dados foi iniciado após a explicação dos objetivos da pesquisa e assinatura do Termo de Consentimento Esclarecido. A coleta de dados foi realizada através do preenchimento de uma ficha com os dados demográficos dos participantes e da realização de uma entrevista semi-estruturada. As entrevistas, com gravação em áudio foram individuais e duraram aproximadamente uma hora.

Após a coleta de dados, as entrevistas foram transcritas e procedeu-se a categorização das respostas (Fagundes, 1981). As categorias foram definidas a partir da identificação de similaridades nas temáticas abordadas pelos sujeitos e em seguida as respostas foram quantificadas em termos de porcentagem de ocorrência.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As informações obtidas com as entrevistas foram categorizadas em grupos, que correspondiam à condição de cada entrevistado em relação à re-escolha profissional. Obtiveram-se, assim, quatro grupos distintos que estão representados na Tabela 2.

Tabela 2

Distribuição dos sujeitos quanto à condição de indecisão profissional

 

 

Observa-se na Tabela 2 que a maior parte dos sujeitos (66,6%) ficou distribuída entre os grupos 1 e 2, constituídos por indivíduos que estão freqüentando um curso superior. Entre estes houve uma maior concentração de sujeitos (38%) no Grupo 1, caracterizado pela condição de estar cursando e pretender concluir o curso, mas com dúvidas quanto a permanecer ou não na profissão posteriormente. A segunda maior porcentagem dos sujeitos (28,6%), correspondeu ao grupo 2, formado por indivíduos que estavam cursando e em dúvida quanto a concluir o curso ou abandoná-lo e iniciar outro. Cerca de 19% dos sujeitos se concentrou no Grupo 3, constituído por indivíduos que concluíram um curso superior e estavam em dúvida entre seguir a profissão ou fazer uma nova escolha profissional. O menor número de sujeitos (14,3%), formou o Grupo 4, caracterizado por aqueles que já desistiram de um curso superior, desejavam iniciar outro curso, mas não sabiam como fazer nova escolha profissional.

A Tabela 3 destaca as principais categorias obtidas entre os sujeitos do Grupo 1.

Tabela 3

Dificuldades, necessidades, processo de escolha e razões para terminar o curso, apontados pelo Grupo 1

 

 

Entre as principais dificuldades apontadas pelos sujeitos, quanto ao momento profissional vivido destacou-se, com 75% de ocorrência, a mudança de opinião em relação ao curso ou decepção com algo relacionado a ele. A mudança de opinião e a conseqüente falta de interesse pelo curso foram relacionadas pelos sujeitos a: a) escassez de informações ou informações distorcidas sobre os cursos no momento da escolha. Os sujeitos afirmaram que ao freqüentar e conhecer melhor o curso, se decepcionaram ao ver que no mesmo não seriam ofertadas matérias, ou conteúdos nas diferentes disciplinas, que eram de seu interesse; b) dificuldades de acompanhar o conteúdo e exigências de desempenho. c) percepção de professores descompromissados com seu trabalho e problemas com substituição de professores deixariam, na visão dos sujeitos, matérias sem serem devidamente abordadas. d) a falta de perspectiva futura com o curso, limitações de mercado e dificuldades com estágios. Alguns sujeitos consideravam suas áreas e campos de atuação relativamente novos, enquanto outros, constatavam um mercado profissional saturado. Dificuldades relativas aos estágios foram relacionadas às limitações impostas por parte de quem cede a oportunidade de estágio; à falta de horário disponível estagiar; e à cobrança de funções incompatíveis com a profissão.

Outra dificuldade de cerca de 75% dos sujeitos foi relacionada ao autoconhecimento. Os sujeitos mostraram-se confusos, uns por não identificarem seus interesses, outros por conhecê-los, mas não saber como analisá-los para compor sua decisão. Dúvidas sobre ter ou não as habilidades requeridas para exercer a profissão escolhida foi outra dificuldade apontada por mais da metade dos entrevistados, que afirmaram estar preocupados com a alta competitividade no mercado de trabalho, que não permitiria despender tempo desenvolvendo tais habilidades.

A dificuldade de não conseguir transformar os conhecimentos adquiridos numa prática profissional, foi relatada por 50% dos sujeitos, que relacionaram a isto sentimentos de angústia e insegurança. Foram apontadas falhas ou ausência de esclarecimento quanto à adequação prática dos conhecimentos teóricos adquiridos. Outra dificuldade apontada por 25% dos sujeitos diz respeito à questão do estereótipo do curso, o qual resultaria em preconceitos ou cobranças indevidos nos estágios.

Dentre as principais necessidades e expectativas dos sujeitos destaca-se, com 87.5% de ocorrência, orientação para a análise das dificuldades vivenciadas. Os sujeitos consideraram a orientação como um meio de se encontrarem, se descobrirem, evidenciando a expectativa de que a orientação poderia introduzir elementos ou critérios novos, que embasariam análises mais amplas. A necessidade de autoconhecimento foi apontada por 50% dos sujeitos. Analisar gostos, habilidades, aptidões, possibilidades, características pessoais, é considerado pelos sujeitos como importante condição para escolher o que fazer dentro do próprio curso ou após tê-lo terminado.

Uma necessidade, colocada como expectativa em relação a um programa de Orientação Profissional, relatada por 50% dos sujeitos, diz respeito à troca de experiências com pessoas em situação semelhante. A troca de experiências foi descrita pelos sujeitos como algo necessário tanto pela identificação com pessoas que enfrentam problemas de mesma natureza, quanto pela possibilidade de aprendizagem recíproca.

A necessidade de fazer estágio foi destacada por 25% dos sujeitos, que pretendem através do mesmo, aprofundar seus conhecimentos ou confirmar suas escolhas. Desenvolver habilidades específicas para exercer a profissão foi outra necessidade apontada por cerca de 25% dos sujeitos. Destaca-se que apesar da grande maioria dos entrevistados apontar a falta de habilidades, apenas dois sujeitos acreditam poder desenvolvê-las. Cerca de 25% dos sujeitos relataram necessitar de motivação para continuarem em suas atividades.

Os sujeitos mostraram insatisfação com o processo de escolha do curso. Não poder fazer o curso que pretendia e ter poucas informações (sobre si e sobre as opções profissionais) para analisar melhor a escolha foram ambos os aspectos destacados por 62.5% dos sujeitos. Dos oito entrevistados, os 5 que alegaram não terem podido fazer o curso pretendido, tinham como opções: Relações Públicas; Secretariado Executivo; Jornalismo e Produção Cultural e a Força Aérea Brasileira. Os entrevistados relataram que deixaram estas opções pelo fato do curso ser integral e precisarem trabalhar; por não poderem morar na cidade onde o curso era oferecido ou por terem feito mais de uma tentativa, sem sucesso. Não passar no vestibular ou provas para o curso pretendido fez com que alguns dos sujeitos optassem por outro curso, com o qual encontram-se hoje insatisfeitos. Isto foi relatado por 37,5% dos entrevistados pertencentes a esta categoria.

A razão citada por cerca de 87.5% dos sujeitos, para quererem finalizar seus cursos foi a pressão familiar, em função de dificuldades financeiras, ou pessoal, dado o avançado estágio no curso.

Quanto ao nível de informação sobre os cursos, cerca de 75% dos sujeitos do Grupo 1 atestaram terem ainda um conhecimento insuficiente sobre os mesmos.

A Tabela 4 apresenta as categorias encontradas entre os participantes do Grupo 2.

Tabela 4

Dificuldades, necessidades e processo de escolha, apontadas pelos sujeitos do Grupo 2

 

 

Os sujeitos do Grupo 2 apontaram as seguintes dificuldades enfrentadas atualmente: mudança de opinião em relação ao curso; carência de Autoconhecimento; existência de competição entre os alunos; pressão de familiares ou sugestão de colegas para terminar o curso; medo de errar de novo, além do fato de não conseguirem vislumbrar mercado de trabalho e de considerar o curso difícil ou trabalhoso.

A mudança de opinião em relação ao curso foi uma dificuldade unânime entre os sujeitos, os quais relataram sentimentos de decepção, frustração, com o curso ou profissão. Suas falas revelaram vários fatores que teriam contribuído para tal mudança: a) realização da escolha profissional baseada num pequeno número de informações sobre os cursos, a idealização dos preferidos, a vinculação da profissão às disciplinas preferidas ou rejeitadas no colégio, o poder de persuasão dos professores, a influência de percepções estereotipadas dos cursos; b) falta de análise acerca de valores pessoais; c) observações feitas por veteranos, a respeito de problemas e dificuldades encontradas na realização do curso; d) fato dos cursos não contextualizarem suas práticas, deixando de fornecer informações quanto a campos e formas de atuação possíveis.

O baixo autoconhecimento foi a segunda dificuldade mais apontada pelos sujeitos, ao lado da competição, pressão vivida, e medo de errar, todas com 66.6% de ocorrência. Quanto ao autoconhecimento alguns sujeitos sentem dificuldade em identificar seus principais interesses, valores e habilidades, enquanto outros afirmaram ter muitos interesses e não saber quais priorizar nas tomadas de decisão.

Outra dificuldade apontada foi a existência de competição entre os alunos. Os sujeitos afirmaram fazerem comparações com os colegas em termos de competência na área, preparo, nível de conhecimento e informações, fato que, em muitas ocasiões, lhes proporciona um estado de insegurança e percepção de despreparo profissional.

A pressão, quer seja da família, amigos ou namorados (as), foi outra dificuldade apontada pelos sujeitos. Suas falas evidenciaram inconsistência nas atitudes parentais que são vistas por eles ora como sendo de apoio, ora de imposição explícita ou sutil, as quais tolheriam seus direitos de livre escolha.

A dificuldade apontada como medo de errar de novo, revela o julgamento do atual curso como uma escolha errada. Tal medo foi relacionado por eles às pressões externas, revelando não apenas problemas de ordem financeira como também a percepção de perda de tempo, uma vez que avaliam estarem retardando suas conquistas profissionais e realização pessoal.

Não vislumbrar mercado de trabalho com a profissão escolhida foi outra dificuldade apontada por 33.3% dos sujeitos, que afirmaram terem buscado informações junto aos veículos de comunicação e através de conversas informais com terceiros.

Cerca de 16.6% dos sujeitos avaliou o alto número de trabalhos acadêmicos como outra dificuldade enfrentada. O excesso de trabalhos ou dificuldades no desempenho de tais atividades estariam contribuindo para diminuir o interesse pelo curso.

Quanto às necessidades e expectativas atuais, os sujeitos deste grupo apontaram o tomar uma decisão quanto ao futuro profissional com orientação e um bom nível de autoconhecimento como as mais relevantes (83.3%). Os sujeitos vincularam a orientação à possibilidade de conhecer seus interesses, analisá-los e descobrir suas habilidades, auxiliando-os a tomar decisões de forma mais segura, sanando dúvidas, amenizando medos e sinalizando caminhos a seguir. Dois sujeitos relataram necessidade de mudanças em questões íntimas, indicando que um processo psicoterápico talvez atendesse melhor a tais necessidades do que um programa de orientação profissional.

Outra necessidade apontada por 33.3% dos sujeitos foi a obtenção de informações sobre as profissões, pois se consideravam carentes de informação ou de critérios de seleção das informações obtidas. Um dos sujeitos acrescentou como necessidade trocar experiência, conhecer outras pessoas em situação de dúvida em relação ao curso, afirmando que se sentiria mais confortado em saber que outros estão em condições parecidas, de dúvida e insatisfação.

Dentre as condições presentes no processo de escolha do curso, os sujeitos relataram a influências de terceiros (100%); informações escassas (50%); precipitações nas decisões (50%); impossibilidade de fazer outro curso (50%) e ser muito jovem (16.6). Ter sido influenciado por opiniões, sugestões, exemplos de terceiros, foi avaliado pelos sujeitos como algo negativo, um fator responsável por sua insatisfação atual. Em sua grande maioria os sujeitos lamentaram a ausência de questionamento sobre as sugestões recebidas. Os amigos e familiares apareceram como os principais agentes de influência. Conversas com professores ou a admiração por eles e os meios de comunicação foram outros fatores de influência no processo de escolha.

A escassez de informações sobre os cursos quando da escolha profissional, foi relatada por 50% dos sujeitos. Cerca da metade dos entrevistados avaliaram terem realizado a escolha da profissão de maneira muito precipitada ou impulsiva, tendo desejado não passar no vestibular. A impulsividade na escolha foi relacionada ao fato de não poderem na época prestar vestibular para o curso que lhes era de maior interesse: Geografia, Desenho Industrial e Escola Preparatória de Cadetes do Exército. Dois dos entrevistados afirmaram não terem conseguido passar nestes cursos, o que os fez considerar que poderiam não ter as habilidades requeridas para conseguir uma boa colocação nas provas. O outro entrevistado alegou que seu curso preferido era integral (Desenho Industrial), o que lhe impossibilitaria de trabalhar. Nota-se aí, ora a frustração diante de reprovações, ora as dificuldades financeiras, definindo ou re-definindo decisões, caminhos a seguir. Cerca de 83,3% dos sujeitos do Grupo 2, consideram-se ainda insuficientemente informados.

A Tabela 5, apresenta as categorias obtidas com o Grupo 3.

Tabela 5

Dificuldades, necessidades, processo de escolha, razões para desistência ou término do curso, do Grupo 3

 

 

Conforme exposto na Tabela 5, nota-se que a grande maioria dos sujeitos, cerca de 75% deles, atestaram a indecisão entre trabalhar na profissão ou começar outro curso, como a principal dificuldade enfrentada, juntamente com uma possível falta de habilidades requeridas pelo curso. O sentimento de indecisão foi relacionado tanto a falta de habilidades, quanto a outras dificuldades. Dentre estas foram mencionadas: a) ter que realizar atividades profissionais que não gosta (25%); b) julgar-se com idade avançada para iniciar outro curso, ou estar defasado em termos de conteúdo para conseguir passar no vestibular (25%); c) sentir-se arrependido por não ter feito o curso que queria para poupar gastos à família (25%); d) estar desatualizado (25%).

Quanto às necessidades e expectativas apontadas foi unânime (100%) entre os sujeitos a busca de orientação para fazer uma avaliação mais madura sobre a profissão conquistada e sobre a possibilidade de mudar de profissão. A grande maioria dos sujeitos (75%) se referiu ao autoconhecimento como um aspecto fundamental para esta avaliação. Afirmaram precisar reconsiderar seus interesses e habilidades para sentirem-se mais seguros em relação à reavaliação de seus cursos. Cerca de 25% dos sujeitos atestou que necessita neste momento complementar seus estudos, pois se sente com pouco conhecimento para atuar profissionalmente.

Os sujeitos relataram sobre o processo de escolha do curso destacando a influência negativa de familiares e amigos (50%) e o fato de não poderem ter feito opção pelo curso preferido naquele momento (50%). Tais cursos diziam respeito a Propaganda e Marketing e Psicologia. Os entrevistados alegaram dificuldades financeiras como principal motivo para a troca de opção de curso. Afirmaram que precisavam trabalhar para ajudar nas despesas familiares; a oferta do curso apenas em Universidades particulares, que aumentaria despesas, além da não permissão dos pais para morar sozinho em outra cidade.

Todos os sujeitos passaram por um momento durante o curso, no qual pensaram em desistir do mesmo. A metade dos sujeitos afirmou ter pensado em desistir quando estava cursando o terceiro ano. Cerca de 50% dos sujeitos afirmou ter pensado em desistir em função de considerar não ter as habilidades requeridas pela profissão. Outros 50% vincularam sua vontade de desistir ao fato de não conseguir visualizar a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos, ao desinteresse de colegas quando da realização de trabalhos conjuntos (25%), bem como ao fato de não gostar do curso (25%). Um deles disse que no terceiro ano houve um grande número de desistências, o que o encorajou a fazê-lo também. Outro afirmou que ao mudar de turno enfrentou problemas de adaptação, tanto com colegas quanto com a carga de disciplinas.

Quanto às razões apontadas pelos sujeitos para terem concluído o curso, destaca-se o fato de já estarem quase terminando o mesmo (50%); a situação financeira difícil da família; e o início de relacionamento amoroso, que ficaria comprometido com a mudança de cidade.

Quanto à última categoria, nível de informação sobre os cursos, os entrevistados do Grupo 3 foram unânimes em afirmar que se consideram insuficientemente informados sobre as profissões.

A Tabela 6 apresenta as categorias obtidas com o Grupo 4 , cujos participantes desejavam iniciar outro curso, mas não sabiam como fazer nova escolha profissional.

Tabela 6

Dificuldades, necessidades e razões das desistências anteriores, apontadas pelos sujeitos do Grupo 4

 

 

Conforme a Tabela 6, cerca de 66.6% dos sujeitos afirmaram sentirem dificuldade com uma ou mais disciplinas dos cursos que estão considerando, visto que tiveram contato com tais disciplinas nos respectivos cursos interrompidos. A presença destas disciplinas, para as quais os sujeitos acham-se inábeis, é um fator que dificulta tanto a retomada do curso interrompido, quanto o início de outro. Outra dificuldade citada por 33.3% dos sujeitos diz respeito ao grande número de opções de cursos existentes, diante dos quais não sabem o que fazer.

Dentre as principais necessidades e expectativas relatadas pelos sujeitos deste grupo, a necessidade de orientação e autoconhecimento foram os mais abordados, por 66.6% dos sujeitos. Para eles o autoconhecimento relaciona-se à descoberta de aptidões, interesses, habilidades, limites e fraquezas, saber do que é capaz e compatibilizar isto com um curso que possam vir a fazer. Mais da metade relatou a necessidade de ajuda para fazer uma escolha baseada em análises mais completas, revelando uma falta de aprendizagem do processo de tomada de decisão. Cerca de 66.6% dos sujeitos consideraram como necessidade, a conquista de um diploma, para a obtenção de um valor diferenciado na sociedade.

Quanto ao processo de escolha do curso, cerca de 66.6% dos entrevistados afirmaram terem optado por um curso que possuía uma ou mais disciplinas de seu interesse. Cerca de 33.3% deles alegou ter feito opção por um curso da mesma área do preferido, só que com menor taxa de concorrência.

Dentre as principais razões relatadas pelos sujeitos para suas desistências, foi unânime a questão da reprovação em uma ou mais disciplinas. As reprovações foram vistas pelos sujeitos como sinônimo de fracasso, incompetência e algo altamente desmotivador. Tenham eles reprovado de ano, em uma ou em muitas matérias, todos verbalizaram frustração e desânimo com o fato.

A falta de habilidades, o cansaço e as dificuldades financeiras, foram, cada uma delas, apontadas por 33.3% dos sujeitos, como razões adicionais para suas desistências. Para um dos sujeitos, colegas ou professores sugeriram a troca de curso, dando a entender uma falta de habilidade do mesmo para exercer as atividades da profissão. A carga horária elevada do curso e o alto tempo de permanência diária no mesmo ambiente de trabalho (o sujeito trabalhava e estudava no mesmo local), foram descritos como variáveis relacionadas à desistência de um dos sujeitos. Dificuldades financeiras para outro foi um fator decisivo para sua desistência.

Em relação ao nível de informação sobre os cursos, os entrevistados do Grupo 4 foram unânimes em afirmar que se consideram insuficientemente informados sobre as profissões.

 

CONCLUSÃO

Os resultados revelaram quatro condições distintas vivenciadas pelos sujeitos. A existência de condições diferenciadas vem ao encontro dos achados de Soares-Lucchiari (1997), para quem há várias possibilidades do que chamou de reorientação, relacionadas a diferentes momentos de vida.

Estas diferentes condições encontradas indicam que não há uma problemática mais ou menos homogênea quanto à re-escolha, como quando se trabalha com indivíduos em condição de primeira escolha. Os sujeitos buscam por orientação profissional em diferentes momentos, trazendo diferentes razões pelas quais se frustraram com suas primeiras escolhas e desejam realizar novas tentativas. Porém, mesmo diante da diversidade podemos observar entre os grupos algumas similaridades quanto às experiências, dificuldades e necessidades atuais:

1) Insatisfação em relação à escolha profissional realizada, insegurança diante de uma nova escolha e certeza quanto à necessidade de auxílio. Em todos os grupos se evidenciou o sentimento generalizado de insatisfação com a primeira escolha. Aspectos de ordem pessoal ou contextual como: condição financeira, estruturação familiar, influência de terceiros, autopercepções de limitações, escassez de informações, foram avaliados como influências negativas no processo de escolha realizado. A dúvida apareceu como outro sentimento relacionado tanto ao momento presente (Será que se eu desistir não vou acabar descobrindo que essa era uma escolha certa?) quanto ao momento futuro (Será que não vou me arrepender novamente?). A crença de ter feito a escolha errada e o medo de que isto se repita interfere grandemente com a capacidade de resolução de problemas. Daí a busca por orientação profissional ter sido apontada como a principal necessidade de todos os entrevistados.

2) Necessidade de aumentar o conhecimento de si mesmo através da orientação, como uma forma de fundamentar uma análise mais acurada da situação atual e uma tomada de decisão mais segura. A necessidade de um maior aprofundamento nas questões pessoais foi encontrada também por Soares (2002) entre os indivíduos em condição de re-escolha. Analisar gostos, habilidades, aptidões, interesses e características pessoais foi considerada por todos os entrevistados, independentemente do grupo ao qual pertenciam, como importante condição para a avaliação da situação de indecisão vivida. Todos os sujeitos relataram que se conhecessem melhor a si mesmos com certeza fariam escolhas mais acertadas, mais consistentes com seus estilos pessoais. Esse aspecto evidencia uma maturidade destes sujeitos para a re-escolha, pois valorizam o posicionamento pessoal frente a suas decisões, porém ainda foi comum encontrar a idéia de que o trabalho de orientação descobriria algo a seu respeito. A necessidade de orientação também foi vinculada a problemas pessoais, o que indica que uma proposta de atendimento para esta população precisa considerar em que medida abordará as questões pessoais de forma a não se confundir com apoio psicoterápico.

3) Necessidade de informação sobre outras possibilidades profissionais, como uma complementação importante ao processo prioritário de autoconhecimento. Em todos os grupos os sujeitos relataram conhecimento insuficiente sobre outros possíveis cursos a serem considerados, e a esperança que a orientação profissional forneça informações importantes neste sentido. Entretanto, embora a grande maioria se julgue desinformada a respeito das profissões, quando questionados sobre suas necessidades atuais, priorizaram o autoconhecimento como foco de orientação. Enquanto os adolescentes em situação de primeira escolha parecem valorizar mais as informações sobre as profissões (Moura, 2001), indivíduos em fase de re-escolha profissional mostram-se mais interessados na busca de informações a respeito de si mesmos.

As especificidades de cada grupo quanto às razões pelas quais se frustraram com suas primeiras escolhas e as atuais dificuldades para realizar novas opções profissionais, podem ser assim sintetizadas:

1) Os Grupos 1 e 2 (sujeitos que ainda estão cursando) apontaram uma maior necessidade de conhecer a realidade prática da profissão, como um importante fator que auxiliaria na avaliação entre permanecer ou abandonar o curso e fazer nova escolha. A dificuldade de não entender como os conhecimentos teóricos poderiam ser aplicados na prática profissional foi vinculada pelos sujeitos a sentimentos de angústia e insegurança quanto à opção realizada. De maneira similar, os estudos de Magalhães e Redivo (1998) com universitários em situação de re-escolha profissional, revelaram que o caráter teórico das disciplinas cursadas e a falta de uma visão da prática profissional, estavam vinculados ao sentimento de decepção com o curso. A falha ou ausência de esclarecimento quanto à adequação prática dos conhecimentos teóricos adquiridos pode, por um lado, ser avaliada como uma falta de habilidades pessoais para o exercício da profissão e, por outro, levar a perda de interesse pelo curso.

2) O Grupo 3 (sujeitos que já concluíram um curso superior) apontou duas dificuldades importantes: a) não apresentar as habilidades requeridas para o exercício da profissão; e b) não ter conhecimento sobre o processo de inserção no mercado de trabalho. No momento de entrar no mercado de trabalho disponibilizando seus serviços profissionais, os indivíduos parecem duvidar de suas capacidades. Possivelmente a falta de experiência prática esteja subjacente à percepção de inabilidade profissional, a qual acaba por dificultar o momento de re-escolha profissional (Lent e colaboradores, 2002; Magalhães & Redivo, 1998; Hotza & Lucchiari, 1998). Além deste aspecto o próprio processo de inserção no mercado de trabalho se constitui numa dificuldade para os indivíduos na medida em função da falta de informações a respeito de como proceder para este fim. Noções sobre empregabilidade deveriam ganhar ênfase quando se pensa em auxiliar esta população. Tais dificuldades revelam a existência de uma problemática relacionada não à escolha de uma profissão, mas à análise de possibilidades dentro da profissão escolhida.

3) O Grupo 4 (sujeitos que já desistiram do curso iniciado), apontou a reprovação em disciplinas como a principal razão para o abandono do curso, dificultando também o processo de reescolha. Tal fato indica que a problemática vivenciada pode não estar relacionada à escolha realizada, mas ao desempenho acadêmico. É provável que os indivíduos estejam avaliando estas reprovações como sinais de fracasso, incompetência, inabilidade ou incompatibilidade com a profissão escolhida. Problemas com o progresso acadêmico são aspectos considerados como barreiras que dificultam o momento de re-escolha profissional, e podem se tornar impeditivos a determinadas opções profissionais (Lent e colaboradores, 2002; Magalhães & Redivo, 1998; Hotza & Lucchiari, 1998). Analisar, pois, a problemática da dificuldade de acompanhamento nas disciplinas, parece ser um elemento importante em programas voltados a esta população.

 

PROPOSTAS PARA FORMULAÇÃO E CONDUÇÃO DE PROGRAMAS DE ORIENTAÇÃO PARA RE-ESCOLHA PROFISSIONAL

O trabalho de Orientação Profissional (OP) vem se constituindo ao longo do tempo um importante recurso de auxílio na avaliação, ajustamento ou re-escolha de uma profissão, uma vez que um de seus maiores méritos, segundo Lisboa (2002), reside na possibilidade de reflexão aprofundada sobre os elementos que constituem o projeto profissional da pessoa. Neste sentido o orientador profissional deve propiciar, junto aos orientandos, reflexões que, mais do que a serviço da escolha de carreiras, estejam a serviço da construção de carreiras (Lisboa, 2002).

Com esta preocupação e, levando-se em conta os achados desta pesquisa, algumas propostas para um processo de orientação profissional puderam ser traçadas. Um programa de OP para indivíduos em situação de re-escolha profissional poderia:

1. Ser desenvolvido na modalidade grupal. Embora se possa supor que para alguns indivíduos um atendimento individualizado poderia trazer maiores benefícios, propõe-se a elaboração de programas que possam ser desenvolvidos na modalidade grupal. Considera-se que proporcionar o contato inicial com um grupo beneficiaria em grande medida a população em condição de re-escolha. Isto porque o repensar a escolha profissional é um momento em que o impacto das pressões externas ou auto-exigências é maior se comparado aos indivíduos em situação de primeira escolha, fato que exacerba as dificuldades. Um trabalho em grupo auxiliaria principalmente no sentido de amenizar tais condições, pela troca de experiências que proporcionaria. A observação de outros na mesma condição traz uma sensação de alívio e conforto que facilita a adesão do indivíduo e melhora seu aproveitamento no processo realizado. Uma vez que o grupo englobaria indivíduos insatisfeitos com a escolha profissional de forma geral, é pertinente ao orientador atentar às especificidades da condição de cada orientando, enfocando ou chamando a atenção para temas ou análises específicas. Assim, por exemplo, para aqueles em situação similar aos Grupos 1 e 2, dever-se-ia propor em conjunto, alternativas para aumentar suas visões acerca da prática profissional. Aos do Grupo 3, um maior número de informações sobre o mercado de trabalho deveria ser fornecido. Chamar a atenção para a análise dos fatores envolvidos no baixo desempenho em algumas disciplinas, seria necessário para aqueles que compõem o Grupo 4.

2. Aumentar e incrementar a etapa de Autoconhecimento. Como encontrado na pesquisa, os sujeitos em re-escolha demandam por maior ênfase na observação e análise de suas habilidades pessoais atuais e possibilidade de desenvolvimento. Assim, priorizar o autoconhecimento pode ser uma forma de fundamentar uma análise mais acurada da situação atual e uma re-escolha mais segura. Aprofundar-se nas questões pessoais é, segundo Soares (2002) uma tendência encontrada entre esta clientela. Tal aprofundamento pode ser efetivado pelo aumento do tempo despendido para trabalhar este tema. Devem-se também empregar técnicas ou atividades que propiciem uma identificação gradual das características pessoais: desde as de menor custo como os interesses, até as que requerem maior auto-análise, como as habilidades e valores.

3. Fornecer ou viabilizar o acesso a informações relacionadas ao mundo do trabalho. O programa deve fornecer não apenas informações sobre as diferentes opções profissionais, mas principalmente, sobre temas referentes ao período de pós-graduação. Indivíduos na condição de repensar a escolha profissional demandam por informações sobre mercado de trabalho (formas de inserção no mesmo); sobre a possibilidade de continuidade dos estudos, numa pós-graduação; além de noções mais específicas sobre empregabilidade. Ampliar ou aprofundar as informações acerca dos cursos atuais pode facilitar a re-avaliação da situação vivida pelo indivíduo, e culminar numa troca de curso ou num rearranjo de possibilidades dentro do mesmo.

4. Propiciar reflexões acerca do significado do trabalho na vida do homem. Para Soares (2002), o trabalho de orientar pessoas em condição de re-escolha profissional deve ter como objetivo maior trabalhar a relação homem-trabalho, a vivência no desempenho da profissão, os sentimentos experimentados e as mudanças exigidas. Tais reflexões asseguram não apenas um redimensionamento de objetivos, como também principia o desenvolvimento de um compromisso do profissional (ou futuro profissional) com seu meio social. Para Lisboa (1998), mesmo entre adultos, não há consciência da possibilidade ou efetividade de contribuição social através do fazer profissional. Desenvolver, pois, tal consciência, além da consciência de si, parece ser um caminho para a construção e transformação da sociedade em que se está inserido. Pois, como afirma Lisboa (1998), “Não basta orientar uma pessoa para a descoberta de si. Precisamos fazê-lo com o olho no mundo” (p. 63).

Finalmente considera-se que trabalhar conhecendo melhor o que caracteriza a população em questão, com certeza facilita ao orientador atingir de forma mais efetiva as necessidades das pessoas que procuram pela re-escolha. Facilita também pensar nas estratégias com base nos objetivos já estabelecidos e aprimorar cada vez mais sua proposta de intervenção com base numa análise criteriosa dos resultados obtidos junto a cada orientando. Tanto a Orientação quanto a Re-Orientação (ou Orientação para a Re-Escolha) parecem partir dos mesmos pressupostos - conhecer de perto a população e seus problemas, para atingir os mesmos objetivos - fornecer auxilio direcionado a suas necessidades. Para isso testar hipóteses quanto às melhores estratégias de auxílio, pode ser fundamental para o aprimoramento do atendimento oferecido.

 

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Recebido: 20/02/04
1ª revisão: 06/04/04
Aceite final: 09/09/04

 

 

1 Endereço para correspondência: Departamento de Psicologia Geral e Análise do Comportamento, Universidade Estadual de Londrina, Campus Universitário, Caixa Postal 6001, 86051-990, Londrina, PR Fone: (43) 3371 4227. E-mail: cbmoura@conectway.com.br
2 Interessados podem solicitar cópia via e-mail às autoras.

 

 

Sobre os autores
* Cynthia Borges de Moura, professora assistente do curso de psicologia da Universidade Estadual de Londrina - PR mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - SP e doutoranda do programa de pós-graduação em Psicologia Clínica da Universidade de São Paulo.
** Mirtes Viviani Menezes, professora auxiliar do curso de psicologia da Universidade Estadual de Londrina - PR, especialista em psicoterapia na Análise do Comportamento e mestranda do programa de pós-graduação em Educação da Universidade Estadual de Londrina - PR.

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