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Revista Brasileira de Orientação Profissional

versão impressa ISSN 1679-3390versão On-line ISSN 1984-7270

Rev. bras. orientac. prof vol.16 no.2 Florianópolis dez. 2015

 

ARTIGO

 

Florescimento no Trabalho: Interfaces com Comportamentos de Carreira

 

Flourishing at work: Interfaces with career behaviors

 

Flourishing en el trabajo: interfaces con comportamientos de carrera profesional

 

 

Lígia Carolina Oliveira-SilvaI; Ana Paula dos Santos Souza SilvaII

IUniversidade Federal de Uberlândia, Uberlândia-MG, Brasil
IIInstituto de Educação Superior de Brasília, Brasília-DF, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O florescimento no trabalho se apresenta como um objetivo de muitos profissionais que investem em suas carreiras nos dias atuais. Porém, pouco ainda se sabe sobre quais fatores relativos à carreira ajudariam o profissional a florescer. Neste sentido, este estudo investigou de que forma comportamentos de carreira se relacionam com florescimento no trabalho. Foram testadas quatro hipóteses, que propuseram relações entre exploração de carreira, planejamento de carreira, comprometimento com a carreira e o florescimento no trabalho. Participaram deste estudo 149 profissionais, a maioria com até 45 anos de idade e, em média, sete anos de experiência profissional. Os resultados indicaram que o planejamento e exploração da carreira predizem maior florescimento, sendo esta relação mediada pelo comprometimento com a carreira. As evidências encontradas podem ser úteis para profissionais autônomos, orientadores profissionais, pesquisadores de carreira e organizações que buscam o florescimento no trabalho através do desenvolvimento de carreira.

Palavras-chave: desenvolvimento profissional, carreira, florescimento no trabalho


ABSTRACT

Flourishing at work is a goal pursued by many professionals who put effort in their career nowadays. However, little is known about which career factors would help someone to flourish at work. Thus, this study investigated how career behaviors are related to flourishing at work. Four hypotheses were tested, proposing relations between career exploration, career planning and career commitment with flourishing at work. The study included 149 professionals, most were under 45 years old and had an average of seven years of professional experience. Results indicated that both career exploration and planning predict flourishing at work, being this relationship mediated by career commitment. These evidence may be useful for autonomous workers, professional advisors, career researchers and organizations which aim for flourishing at work through career development.

Keywords: professional development, career, flourishing at work


RESUMEN

Flourishing en el trabajo es un objetivo perseguido por muchos profesionales que ponen esfuerzo en su carrera hoy en día. Sin embargo, poco se sabe sobre qué factores de carrera ayudarían a alguien a desarrollar en el trabajo. Por lo tanto, este estudio investigó cómo las conductas de carrera se relacionan con el flourishing en el trabajo. Cuatro hipótesis fueron probadas, que propusieron las relaciones entre la exploración de carreras, planes de carrera y el compromiso profesional con el flourishing en el trabajo. En el estudio participaron 149 profesionales, la mayoría eran menores de 45 años de edad y tenían un promedio de siete años de experiencia profesional. Los resultados indicaron que la planificación y exploración de carreras están directamente relacionadas con el flourishing en el trabajo y esta relación es mediada por el compromiso con la carrera profesional. Las evidencias pueden ser útiles para los trabajadores autónomos, asesores profesionales, investigadores profesionales y organizaciones que buscan prosperar en el trabajo a través del desarrollo de carrera.

Palabras clave: desarrollo profesional, carrera profesional, flourishing en el trabajo


 

 

Ao iniciar uma trajetória profissional e delimitar objetivos e metas para a carreira, um dos anseios mais comuns é o desejo subjacente de sentir prazer no trabalho. Uma vez que as pessoas estão cada vez mais responsáveis por suas próprias carreiras (Costa, 2010; Duarte et al., 2010) e, consequentemente, por seu sucesso profissional, o indivíduo enfrenta a necessidade de fazer as escolhas que são compatíveis com seu perfil para que possa tirar o máximo do seu trabalho e florescer. Porém, alcançar um estado de satisfação e bem-estar com a carreira representa um desafio para qualquer profissional, pois muitas vezes não se tem o conhecimento das estratégias necessárias para obter uma carreira frutífera.

Neste contexto, observa-se que o florescimento envolve o trabalho humano de forma geral e não necessariamente a posição ocupada numa determinada organização, o que se conecta às discussões já tradicionais acerca da carreira sem fronteiras e/ou proteana (Arthur & Rousseau, 1996; Hall, 2002). A partir da compreensão de que as pessoas planejam suas carreiras de forma a tirar o máximo proveito das mesmas, e, consequentemente, florescer, o objetivo deste estudo visa analisar como comportamentos de carreira podem contribuir para o florescimento profissional.

Florescimento no trabalho

O florescimento no trabalho representa um aspecto que tem recebido cada vez mais atenção no âmbito dos comportamentos positivos no trabalho. O interesse no florescimento, associado não só à carreira, como também ao trabalho e à vida, é consistente com o crescente corpo de pesquisas acerca do comportamento organizacional positivo (Cameron, Dutton & Quinn 2003; Seligman, 2002).

De forma geral, o florescimento diz respeito a um estado de saúde mental positivo, no qual o indivíduo funciona bem tanto no âmbito psicológico quanto social (Keyes & Haidt, 2003). Para se alcançar o florescimento, seria necessário que as pessoas experimentassem um alto grau de propósito, significado, otimismo, competência e satisfação com a própria vida (Diener, Ng, Harter & Arora, 2010). Já o florescimento no trabalho refere-se a uma situação de prosperidade e desenvolvimento, ou seja, um estado progressivo de satisfação e bem-estar no contexto de trabalho (Mendonça, Caetano, Ferreira, Sousa, & Silva, 2014). Em suma, o florescimento no trabalho é definido como prosperidade no trabalho, sendo associado à felicidade, emoções positivas e engajamento (Bono, Davies & Rasch, 2012).

A importância de se investigar o florescimento no âmbito da carreira se relaciona à compreensão atual do sucesso na carreira, que está ligada a fatores intrínsecos, tais como satisfação, engajamento, significado, aprendizado e crescimento (Hall, Feldman & Kim, 2013). Tal ideia também se associa ao conceito de carreira proteana (Hall et al., 2013), segundo o qual os indivíduos gerem sua carreira em função de seus valores primordiais e da busca de sentido. Porém, o que se observa nos dias atuais é um movimento justamente na direção contrária daquela proposta tanto pelo florescimento quanto pela carreira proteana. É possível perceber que as queixas laborais em relação à sobrecarga de trabalho e condições inadequadas são cada vez mais frequentes. Burke (2015), por exemplo, aponta várias evidências de que as pessoas não estão florescendo nem no trabalho atual nem na carreira como um todo. Algumas delas são: baixos níveis de engajamento no trabalho; longas horas de trabalho, poucas férias ou até mesmo trabalho nas férias; altos níveis de estresse e desgaste; sentimentos de fracasso na carreira; escolhas empobrecidas de estilo de vida; saúde física e mental precárias; e frustração das mulheres e das minorias - barreiras ao avanço na carreira, discriminação, estereótipos e ausência do uso completo dos talentos e capacidades.

Além dos fatores apresentados por Burke (2015), ao se partir de uma análise mais ampla, é possível supor que boa parte dos problemas laborais, tais como absenteísmo, rotatividade, insatisfação, inadequação e desmotivação no trabalho podem advir de escolhas equivocadas no tocante à carreira. Tais escolhas podem ser consequências do baixo investimento em exploração, planejamento e comprometimento com a carreira, o que, por sua vez, faz o florescimento parecer algo ainda mais irrealista e inatingível. Neste sentido, pesquisas indicam que a autodeterminação e a motivação intrínseca e autônoma se relacionam com maior prevalência de florescimento no trabalho (Bono et al., 2012). Estes achados apoiam a premissa de que o funcionamento saudável (físico e psicológico) é volitivo, ou seja, está sob o controle do indivíduo (Rothmann, 2014). Logo, compreende-se que a oportunidade de experimentar o estado de florescimento pressupõe que o indivíduo tem liberdade, ou ao menos um controle significativo, sobre sua vida.

Sabe-se relativamente pouco acerca dos fatores do trabalho e de carreira que são importantes para o florescimento (Kidd, 2008). Logo, é de suma importância investigar quais fatores estão associados ao florescimento das pessoas, assim como também propor intervenções que ajudem a promover o florescimento (Rothmann, 2014). Estudos anteriores apontam a influência de aspectos como demandas do trabalho, natureza das tarefas, relações entre supervisores e colegas de trabalho e remuneração no florescimento (May, Gilson & Harter, 2004; Rothmann & Rothmann, 2010; Schaufeli & Bakker, 2004). Outros defendem que o florescimento é afetado pelo tipo ou qualidade das atividades em que o indivíduo se engaja, de forma que a positividade das experiências e a possibilidade de perseguir metas pessoais aumentariam os níveis de florescimento (Sheldon et al., 2010). Porém, observa-se que a análise de fatores de carreira, mais especificamente de comportamentos de carreira, ainda é escassa. Sendo assim, a seguir será discutido como os comportamentos de exploração, planejamento e comprometimento com a carreira podem influenciar o florescimento.

Exploração, planejamento e comprometimento com a carreira: impactos no florescimento

A abordagem evolutiva do desenvolvimento vocacional de Super (1963) identifica cinco estágios do desenvolvimento vocacional: crescimento, exploração, estabelecimento, manutenção e desengajamento. A exploração ocupa papel central na maioria das teorias de escolha e desenvolvimento de carreira (Gore, Bobek, Robbins, & Shayne, 2006). Inicialmente, a exploração era considerada apenas um momento de transição e tradução do autoconceito em uma carreira específica, identificado ao longo da adolescência e da adultez jovem, quando o indivíduo organiza suas preferências vocacionais em torno da experimentação, do teste de hipóteses e do desempenho de papéis (Super, 1957). Posteriormente, a exploração passou a ser compreendida como um comportamento que acompanha todas as etapas do desenvolvimento de carreira (Super, 1963).

O comportamento exploratório tem por objetivo realçar o autoconhecimento e conhecimentos relevantes sobre si mesmo e o ambiente (Flum & Blusteim, 2000). Os comportamentos exploratórios vocacionais são caracterizados como se tratando de ações presentes na preparação pessoal para a escolha de uma carreira. Esses comportamentos podem ser descritos como iniciativas para buscar informações sobre locais de trabalho, estabelecer contatos com profissionais da área e buscar estágios e cursos que possam facilitar a obtenção de emprego ou trabalho (Teixeira & Gomes, 2005). Isto pode aumentar as chances de uma tomada de decisão mais informada e consciente por parte do indivíduo e, consequentemente, proporcionar o florescimento no trabalho. Deste modo, propõe-se a seguinte hipótese:

H1: Há uma relação significativa positiva entre exploração de carreira e florescimento no trabalho, de forma que a exploração de carreira antecede o florescimento no trabalho e escores mais elevados na exploração estão associados a um maior florescimento.

Na mesma direção da exploração, o planejamento de carreira tem sido considerado um fator importante no que diz respeito à tomada de decisões na carreira (London, 1983; Super & Hall, 1978). O planejamento de carreira representa o processo através do qual a pessoa tem percepções realistas de si mesma e relaciona essas percepções com metas de carreira (London, 1983). Portanto, clareza de metas, orientação para o futuro, objetividade, expectativas reais e tomada de decisão são dimensões relacionadas positivamente com planejamento. O planejamento de carreira também é considerado um comportamento ativo de carreira e está diretamente ligado à noção de metas de carreira, uma vez que planejar a carreira significa ter uma visão clara de futuro e estabelecer um alvo que servirá como guia para as ações tomadas (Greenhaus, Callanan & Kaplan, 1995; Zikic & Klehe, 2006).

A habilidade para refletir sobre as próprias ações e implicações e escolher as opções que conduzirão ao bom funcionamento da vida de forma geral, independentemente das inconveniências e incômodos, contribuem para que o indivíduo floresça (Hinchliffe, 2004). Neste sentido, é possível admitir que o planejamento esteja associado a decisões profissionais mais acuradas, o que, por sua vez, resultaria no florescimento no trabalho. Pesquisas têm apontado nesta direção, uma vez que o planejamento de carreira representa um preditor do sucesso na carreira (Super & Hall, 1978; Zikic & Klehe, 2006). Adicionalmente, pesquisas apontam que o estabelecimento de metas e o planejamento de carreira contribuem para aumentar a satisfação com a carreira (Abele & Wiese, 2008). Desta forma, compreende-se que o planejamento ajuda o indivíduo a administrar o desenvolvimento de sua carreira pelo estabelecimento de metas e orientação para o futuro, o que contribui para que se obtenha uma carreira mais bem sucedida (Oliveira, 2011), e que, por sua vez, pode levar ao florescimento. Partindo destes pressupostos, propõe-se a seguinte hipótese:

H2: Há uma relação significativa positiva entre planejamento de carreira e florescimento no trabalho, de forma que o planejamento de carreira antecede o florescimento no trabalho e escores mais elevados de planejamento estão associados a um maior florescimento.

Apesar de os comportamentos de carreira estarem ligados a uma determinada atividade que detém a atenção e o esforço do indivíduo, é importante ressaltar que, atualmente, o desenvolvimento da carreira não está necessariamente ligado a uma organização. Neste sentido, o comprometimento com a carreira têm se apresentado como uma fonte significativa de sentido ocupacional, uma vez que as organizações tem se tornado cada vez mais horizontais e menos capazes de fornecer empregos ou carreiras estáveis e seguras (Aryee, Yue, & Chew, 1994).

Pesquisas no âmbito vocacional têm apontado que o indivíduo se tornou responsável pelo próprio sucesso, apresentando vínculo afetivo e comprometimento prioritariamente com a sua carreira de forma individual e não mais com uma única empresa (Bastos, 1997; Duarte et al., 2010). Neste sentido, o comprometimento com a carreira é definido como uma reação afetiva do indivíduo que constrói um sentido de trajetória e crescimento em um campo ocupacional, ou seja, é um comportamento ativo mobilizado por um apego afetivo à carreira (Bastos, 1997). Uma vez que o indivíduo demonstra afeto positivo em relação a sua carreira, ele estará mais motivado não só para permanecer na sua ocupação, como também para se engajar em atividades que realcem e ajudem no seu desenvolvimento profissional (Magalhães, 2005; Oliveira, 2011), o que pode vir a gerar florescimento. Por fim, o comprometimento com a carreira é associado à motivação de carreira (Carson & Bedeian, 1994; London, 1983), o que leva à suposição de que ele perpassa os demais comportamentos ativos de carreira, sendo transversal aos mesmos. Logo, o comprometimento com a carreira se apresenta como primordial ao florescimento, de forma que, na ausência dele, talvez os demais comportamentos ativos de carreira não sejam tão efetivos. Neste contexto, são propostas as seguintes hipóteses:

H3a: O comprometimento com a carreira é mediador da relação entre exploração de carreira e florescimento;

H3b: O comprometimento com a carreira é mediador da relação entre planejamento de carreira e florescimento.

A partir da análise das hipóteses propostas, pode-se criar subsídios para a formulação de intervenções tanto no período pré-decisional (antes do indivíduo realizar uma decisão em relação à sua carreira) quanto pós-decisional, no qual o indivíduo pode ser estimulado a reverter um quadro negativo de insatisfação e mal-estar com a carreira.

 

Método

Participantes

A amostra foi composta por profissionais já iniciados no mercado de trabalho, atualmente empregados ou não, totalizando 149 profissionais. Entre eles, 57% eram do sexo feminino, 54,4% eram solteiros e 42,3% eram casados (os demais eram divorciados ou viúvos), 40% estavam cursando o ensino superior (incluindo segunda e terceira graduação) e 36,9% estavam cursando ou haviam completado uma pós-graduação. Com relação à faixa etária, 42,6% tinham até 25 anos, 45,6% tinham entre 26 e 45 anos e os demais tinham mais de 45 anos, o que representa uma amostra com variação etária satisfatória para pesquisa acerca do tema de carreira. O tempo de experiência de trabalho das pessoas também apresentou uma variação razoável, incluindo desde pessoas com menos de um ano de experiência de trabalho até aqueles com mais de 30 anos de experiência. A média do tempo de experiência de trabalho foi de 7,1 anos (DP = 7,7).

Instrumentos

Escala de Florescimento no Trabalho (EFLOT): Proposta por Mendonça et al. (2014), investiga a autoimagem que o colaborador possui de suas competências, seu envolvimento e suas contribuições no ambiente de trabalho. Além disso, a escala abrange os afetos positivos, o relacionamento interpessoal e o otimismo acerca do futuro, essenciais para que o indivíduo experimente o florescimento. A EFLOT possui alpha igual a 0,80, é composta por oito itens que se estruturam em um único fator e são relativos ao funcionamento humano positivo. As respostas variam de 1 a 7 e a soma dos escores pode variar de 8, forte discordância de todos os itens, a 58, forte concordância com todos os itens da medida.

Escala de Comprometimento com a Carreira: Proposta por Bastos (1994), investiga o quanto o indivíduo se sente confortável com sua escolha de carreira e avalia sua intenção de mudança. É unifatorial e possui sete itens com alpha igual a 0,83. O instrumento utiliza como opção de resposta uma escala Likert de cinco pontos.

Escala de Planejamento de Carreira: Foi utilizada a versão brasileira (Oliveira, 2011), que representa uma adaptação da dimensão de planejamento de carreira de Carson e Bedeian (1994). Aos quatro itens originais da dimensão de estabelecimento de metas foram adicionados dois itens relativos à orientação para o futuro. A escala é unifatorial, apresenta alpha igual a 0,72 e utiliza como opção de resposta uma escala Likert de cinco pontos.

Escala de Exploração de Carreira: Proposta por Teixeira (2010), foi utilizada para avaliar o grau de comportamento de exploração. A escala é unifatorial, formada por seis itens e tem o objetivo de avaliar a exploração do ambiente ocupacional, sobretudo, a busca de informações relevantes. Apresenta alpha igual a 0,74 e utiliza como modo de resposta uma escala Likert de cinco pontos.

Questionário de dados sociodemográficos, envolvendo avaliação das condições pessoais e profissionais - sexo, idade, estado civil, escolaridade e tempo de experiência.

Procedimentos

A pesquisa foi realizada em salas de aula, sendo a coleta presencial, no formato papel e caneta. Os participantes foram recrutados na própria sala de aula, em cursos de graduação e pós-graduação, antes do início da aula, de forma que a única condição apresentada para participar da pesquisa foi que o participante deveria ter tido, ao menos, uma experiência de trabalho (incluindo voluntariado e estágio). Àqueles que aceitaram participar da pesquisa, foi solicitado que permanecessem em sala ao final da aula. O tempo de preenchimento dos questionários foi em torno de vinte minutos. Todos foram informados acerca dos objetivos do estudo e do anonimato, confidencialidade e sigilo da pesquisa. Por fim, assinaram o TCLE antes de iniciar o preenchimento do questionário. A pesquisa seguiu todas as orientações éticas, sendo aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Brasília, de acordo com o processo nº 45064514.7.0000.5540.

Análise dos dados

Após a verificação dos pressupostos estatísticos, foi constatado que a amostra não apresentou problemas de normalidade, linearidade, multicolinearidade, homogeneidade de variâncias ou singularidade (Tabachnick & Fidell, 2001). Os casos omissos representaram menos de 5% da amostra, sendo substituídos pela média e não foram identificados casos extremos multivariados. Para testar as hipóteses propostas, foram realizadas regressões múltiplas (simples e hierárquica).

 

Resultados

Os resultados indicaram que tanto a exploração (R2 = 0,05, β = 0,238, p < 0,001) quanto o planejamento de carreira (R2 = 0,10, β = 0,321, p < 0,01) apresentam relação significativa com o florescimento no trabalho, funcionando como antecedentes do mesmo. Além disso, a relação é positiva, de forma que maiores escores de exploração e planejamento estão associados a um maior florescimento. Assim, pode-se afirmar que as hipóteses H1 e H2 foram corroboradas.

A análise das hipóteses H3a e H3b foi realizada através de regressão linear hierárquica, utilizada para verificar a presença da variável mediadora, uma vez que tais hipóteses propõem que o comprometimento com a carreira é mediador da relação entre exploração e planejamento de carreira e o florescimento. Através do suporte obtido para as hipóteses H1 e H2, atende-se à primeira condição necessária para a mediação, que é a existência de uma relação significativa entre as variáveis antecedentes e a variável dependente. A segunda condição exige que haja uma relação significativa entre a variável mediadora e a variável dependente, o que foi verificado através da análise de regressão padrão. Os resultados indicaram que o comprometimento com a carreira antecede o florescimento no trabalho (R2 = 0,054, β = 0,232, p = 0,004). Assim, atende-se à segunda condição necessária para a mediação. Por fim, foram verificadas as hipóteses H3a e H3b, que foram corroboradas, uma vez que o comprometimento com a carreira, quando adicionado à equação de regressão, aumenta o grau de explicação da variância (R2) e diminui a força da relação (β) entre as variáveis antecedentes e a dependente. Porém, observa-se a presença de uma mediação parcial, ou seja, os efeitos diretos da exploração e do planejamento em relação ao florescimento devem permanecer, ainda que reduzidos na presença do comprometimento. A Tabela 1 apresenta os coeficientes obtidos nesta análise.

 

Discussão

Diante dos resultados obtidos para as hipóteses propostas no presente estudo, é possível delinear algumas constatações no que diz respeito às conexões entre comportamentos relativos à carreira do indivíduo e seu florescimento no trabalho. Com relação às hipóteses H1 e H2, os resultados demonstraram que a exploração e o planejamento de carreira antecedem significativamente o florescimento no trabalho. A exploração e o planejamento de carreira são importantes porque representam o empenho afetivo e comportamental na descoberta, na aquisição de informações, na tomada de decisão e na realização dos planos de carreira (Thompson, Lindeman, Super, Jordaan & Myers, 1984). Os resultados demonstram que, havendo investimento na exploração e no planejamento da carreira, é mais provável que o indivíduo encontre, dentre as opções disponíveis, algo que lhe permita florescer enquanto profissional. Pesquisas anteriores vão ao encontro dos resultados obtidos, apresentando outros impactos da exploração e do planejamento de carreira. O estudo de Dykeman (1983), por exemplo, constatou que o planejamento e a exploração são significativamente correlacionados à eficiência no trabalho. No Brasil, Teixeira (2002) identificou relações entre maior comportamento exploratório e otimismo para a busca de emprego entre formandos universitários, além de uma correlação entre exploração e nível de decisão de carreira. O planejamento de carreira, por sua vez, tem sido avaliado como um preditor do sucesso na carreira (Super & Hall, 1978; Zikic & Klehe, 2006).

Embora haja um corpo de evidências considerável a respeito da importância da exploração e do planejamento para o desenvolvimento e sucesso na carreira, observa-se que são escassos estudos que demonstrem a influência de tais comportamentos em aspectos positivos no trabalho, tais como o florescimento. Considerando a essência do conceito de florescimento, que diz respeito a um estado progressivo de satisfação e bem-estar no contexto de trabalho (Mendonça et al., 2014), é possível compreender a importância de se investigar quais comportamentos de carreira podem contribuir para tal. O valor dos resultados encontrados no presente estudo está basicamente em demonstrar que, quanto mais o indivíduo se engaja em comportamentos relacionados à exploração e planejamento de carreira, maior é a probabilidade que ele floresça no trabalho que escolher. Tal premissa faz sentido porque, ao explorar as possibilidades de carreira, o indivíduo elimina opções que não lhe atraem e se aproxima daquelas que podem vir a lhe causar maior satisfação e sentido no trabalho. Adicionalmente, ao estabelecer prazos e metas para sua carreira, o indivíduo sente que há um propósito em suas atividades, o que pode aumentar o seu otimismo e felicidade e que, por sua vez, sinalizam a presença do florescimento.

Porém, ressalta-se que, embora os coeficientes de regressão sejam significativos, o grau de explicação (R2) tanto da exploração quanto do planejamento não são altos. Isto evidencia a necessidade de estudos que considerem outros comportamentos ou estratégias utilizadas pelo indivíduo, que possam adicionar explicação ao conjunto de fatores que contribui para que o indivíduo encontre sentido e propósito no trabalho.

No tocante às hipóteses H3a e H3b, o comprometimento com a carreira representa um fator mediador da relação entre exploração e planejamento de carreira e o florescimento (mediação parcial). Pesquisas indicam que o comprometimento com a carreira tem sido identificado como mediador de relações entre variáveis individuais de carreira e resultados positivos no trabalho, como é o caso do presente estudo. Duffy, Dik e Steger (2011), por exemplo, demonstraram que o comprometimento com a carreira é mediador da relação entre a experiência do "chamado" para uma determinada carreira e diversos aspectos positivos do trabalho, como satisfação, comprometimento organizacional e menor rotatividade. O fato de o comprometimento com a carreira funcionar como um mediador, no presente estudo, significa que quando as pessoas se comprometem com a carreira, a exploração e o planejamento têm sua importância diminuída em relação ao florescimento. Em outras palavras, quando o comprometimento com a carreira é inserido na equação, o florescimento é mais provavelmente experimentado do que se o indivíduo apenas se engajar em comportamentos de exploração e planejamento, mas não se comprometer com a carreira. Assim, o comprometimento com a carreira se apresenta como crucial para a experiência do florescimento no trabalho, sendo transversal aos outros comportamentos de carreira. Tal resultado também foi encontrado em pesquisas anteriores, que demonstram que o comprometimento tem como principais consequências a intenção de permanecer na carreira, o desenvolvimento de habilidades e a busca de objetivos e enfrentar desafios na carreira escolhida (Aryee & Tan, 1992; Bastos, 1997).

A importância dos resultados encontrados pode ser ressaltada em função da atual valorização de experiências profissionais positivas, que no caso do presente estudo é o florescimento no trabalho. Cada vez mais as pessoas procuram estratégias para extrair o máximo de suas carreiras e florescer profissionalmente. Porém, observa-se que ainda são escassos os estudos que relacionam aspectos de carreira e aspectos positivos no trabalho - em geral, as áreas de carreira e trabalho/organizações costumam analisar variáveis dentro do seu próprio contexto. Uma vez que a carreira representa algo transversal à vida laboral do humano, se estendendo ao longo de todas as suas experiências de trabalho, destaca-se a necessidade de vincular comportamentos relativos ao gerenciamento e desenvolvimento de carreira com resultados positivos no trabalho ou emprego. Assim, as evidências aqui encontradas podem ser interessantes tanto para indivíduos que, de maneira autônoma, buscam alcançar o florescimento profissional, quanto para orientadores profissionais, pesquisadores de carreira e organizações que se preocupam com o bem-estar e desenvolvimento dos trabalhadores. Embora existam outras estratégias que possam contribuir para um maior sentimento de propósito e otimismo no trabalho, o presente estudo tem sua contribuição na investigação de variáveis de carreira que podem aumentar o florescimento no trabalho.

 

Considerações Finais

O presente estudo teve como objetivo investigar de que maneira exploração, planejamento e comprometimento se relacionam com o florescimento das pessoas no trabalho, sendo tal objetivo atingido. Observou-se que a exploração e o planejamento de carreira influenciam o nível de florescimento no trabalho, sendo estas relações mediadas pelo comprometimento com a carreira. A importância do suporte encontrado para as hipóteses propostas sinaliza que apenas os comportamentos ativos de exploração e planejamento de carreira não são suficientes para o florescimento no trabalho, se não houver por parte do indivíduo o comprometimento com a carreira, ou seja, com suas escolhas e atividades laborais. Assim, ressalta-se a importância dos processos de orientação profissional e coaching de carreira, que devem estimular comportamentos de exploração e planejamento para que se possa aproveitar o máximo de uma ocupação. Em outras palavras, enfatiza-se que as pessoas devem explorar ao máximo as possibilidades de carreira disponíveis, conscientemente selecionando aquelas compatíveis com seus valores, habilidades e preferências, para que a ocupação escolhida lhes possibilite florescer enquanto profissionais. Adicionalmente, o planejamento contínuo da carreira, através da busca de metas significativas e avaliação constante do avanço em relação a tais metas também é importante para que a atividade laboral desempenhada tenha sentido, contribuindo para o florescimento. Entretanto, ressalta-se a necessidade de haver comprometimento com as escolhas feitas na carreira para que o florescimento aconteça. Por fim, faz-se necessário investigar que tipos de ocupações farão com que o indivíduo se comprometa com a carreira, o que provavelmente conduzirá ao florescimento na mesma.

Limitações da presente pesquisa envolvem o delineamento de corte transversal e correlacional, o que não permite assegurar uma relação causal entre os comportamentos ativos de carreira e o florescimento, por exemplo. Outro ponto a ser melhorado seria a utilização de instrumentos distintos do autorrelato, o que permitiria a triangulação dos dados, evitando os vieses do método comum e da desejabilidade social.

Recomenda-se que pesquisas futuras utilizem outras formas de mensurar os comportamentos ativos de carreira, tais como heterorrelato ou observação. Além disso, também é importante que estudos porvindouros considerem a coleta de dados longitudinal, de forma a analisar os efeitos dos comportamentos ativos de carreira em longo prazo. Dessa forma, seria possível inclusive investigar a adaptabilidade de carreira (Savickas, 1997), conceito correlato àqueles tratados na presente pesquisa, mas ainda carente de maiores investigações no contexto brasileiro.

 

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Endereço para correspondência:
Universidade Federal de Uberlândia, Instituto de Psicologia
Avenida Pará, Umuarama
38405-320, Uberlândia-MG.
E-mail: ligiacarol@ufu.br

Recebido 26/01/15
1ª Revisão 26/06/15
Aceite Final 25/11/15

 

 

Sobre as autoras:
Lígia Carolina Oliveira-Silva é doutora em Psicologia Organizacional e do Trabalho pela Universidade de Brasília - UnB e professora adjunta na Universidade Federal de Uberlândia - UFU.
Ana Paula dos Santos Souza Silva é Graduanda em Psicologia pelo Centro Universitário IESB. Membro do Grupo de Pesquisa Tamayo - Unb. Membro do Núcleo de Prática e Pesquisa em Psicologia Organizacional - Heurística, IESB Campus Oeste.

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