portal.pepsic.bvsalud.org111/applications/scielo-org/sso/loginScielo.php/applications/scielo-org/sso/logoutScielo.php01000002007020100/cgi-bin/mimetex.cgihttp://scielo-log.scielo.br/scielolog/ofigraph20.php?app=scielopepsichttp://scielo-log.scielo.br/scielolog/ofigraph21.php?app=scielopepsic01000001100011010UA-26722651-1psihttp://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1806-58212005000200004&script=sci%5C_arttextofflineaHR0cDovL3BlcHNpYy5idnNhbHVkLm9yZy9zY2llbG8ucGhwP3BpZD1TMTgwNi01ODIxMjAwNTAwMDIwMDAwNCZzY3JpcHQ9c2NpJTVDX2FydHRleHQ= 20250118 080909 6 17 pt iso sci_arttext S1806-58212005000200004 scielopepsic PEPSIC 1 1 0 no cc pepsic.bvsalud.org /cgi-bin/wxis.exe /cgi-bin/ / ScieloXML/ /revistas/ /pepsic_bvsalud/htdocs/xsl/ /img/ /img/revistas/ /iah/ iah/ /pepsic_bvsalud/htdocs/ http://statbiblio.pepsic.bvsalud.org/ http://statbiblio.pepsic.bvsalud.org/ Isis_Key (v4901): SM=1806-582120050002-00003 Isis_Key (v4900): SM=1806-582120050002-00004 SM=1806-582120050002- 1806-582120050002-00003 Isis_Key (v7085): 1806-582120050002-00003 O Conceito de potencial múltiplo da inteligência de Howard Gardner para pensar dispositivos pedagógicos multimidiáticos Sonhos lúcidos: o surgimento da lucidez onírica e o seu estudo Ciências & Cognição Ciênc. cogn. cc APPLIED SOCIAL SCIENCES 1806-5821 1806-5821 1806-5821 Instituto de Ciências Cognitivas Revista Ciências & Cognição A/C Prof. Dr. Alfred Sholl Franco Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho Sala G2-032, Bloco G, Av. Carlos Chagas Filho S/N - Cidade Universitária - Ilha do Fundão 21941-902 Rio de Janeiro - RJ - Brasil Tel.: +55 21 2562-6562 revista@cienciasecognicao.org Ciênc. cogn. vol.5 no.1 Rio de Janeiro jul. 2005 en pt Construtivismo e ciências humanas Construtivismo e ciências humanas Gustavo Arja Castañon GUSTAVO ARJA CASTANON Universidade Estácio de Sá F:\SciELO\serial\cc\v5n1\markup\v5a4.html <html> <head> <title></title> <meta http-equiv="Content-Type" content="text/html; charset=iso-8859-1"></head> <p align="right"><font face="Verdana" size="2"><b>Artigo Cient&iacute;fico</b></font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="4"><b>Construtivismo e ci&ecirc;ncias humanas</b></font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana"><b>Constructivism and human sciences</b></font></p> <p>&nbsp;</p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="2"><b>Gustavo Arja Casta&ntilde;on</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Universidade Est&aacute;cio de S&aacute;, Rio de Janeiro, Brasil</font></p> <p>&nbsp;</p> <p>&nbsp;</p> <hr size="1" noshade=""> <p><font face="Verdana" size="2"><b>RESUMO</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Nos &uacute;ltimos anos assistimos a uma prolifera&ccedil;&atilde;o do termo <i>construtivismo</i> em disciplinas como Psicologia, Educa&ccedil;&atilde;o, Sociologia e Filosofia da Mente. No entanto, se tomamos este conceito em seu sentido estrito, como a posi&ccedil;&atilde;o que defende o papel ativo do sujeito na sua rela&ccedil;&atilde;o com o objeto do conhecimento e constru&ccedil;&atilde;o de suas representa&ccedil;&otilde;es da realidade, vemos que diversas posi&ccedil;&otilde;es auto-denominadas <i>construtivistas</i> assumem teses que contrariam o esp&iacute;rito original desta tradi&ccedil;&atilde;o filos&oacute;fica. Este artigo faz uma breve investiga&ccedil;&atilde;o das mais influentes utiliza&ccedil;&otilde;es contempor&acirc;neas do termo, pelas correntes do Construtivismo Piagetiano, Construcionismo Social, Construtivismo Radical e Construtivismo Social. Conclui que estas tr&ecirc;s &uacute;ltimas correntes n&atilde;o s&atilde;o estrito senso construtivistas, porque dissolvem o sujeito epist&ecirc;mico. Al&eacute;m disso, demonstra que Construtivismo n&atilde;o implica em idealismo, e que o Racionalismo Cr&iacute;tico e o Construtivismo Piagetiano s&atilde;o os leg&iacute;timos representantes de uma tradi&ccedil;&atilde;o construtivista que, aderindo ao realismo, se mant&eacute;m no campo da Ci&ecirc;ncia Moderna. <i>&copy Ci&ecirc;ncias &amp; Cogni&ccedil;&atilde;o 2005; Vol. 05: 36-49.</i></font></p> <p><font face="Verdana" size="2"><b>Palavras-chave: </b> epistemologia; construtivismo; construtivismo social; construtivismo radical; racionalismo cr&iacute;tico.</font></p> <hr size="1" noshade=""> <p><font face="Verdana" size="2"><b>ABSTRACT</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">In the last years, we observed a proliferation of the term <i>constructivism</i> in disciplines such as Psychology, Education, Sociology and Philosophy of Mind. Nervertheless, if we took this concept in its strict sense, as the position that defends an active role of the subject in his relation with knowledge object and in the construction of their reality representations, we see that several positions self-named constructivists adopts theories that contradicts the spirit of this philosophical tradition. This article makes a brief investigation on the most influential contemporary uses of this term, like Piagetian Constructivism, Social Construcionism, Social Constructivism and Radical Constructivism. It concludes that these last three currents are not strict sense constructivists, because they dissolve the epistemic subject. After that, it demonstrates that Constructivism does not implicate idealism, and that the Critical Rationalism and Piagetian Constructivism are the legitimate representatives of the constructivist tradition that, adhering to realism, behold in Modern Science field. <i>&copy Ci&ecirc;ncias &amp; Cogni&ccedil;&atilde;o 2005; Vol. 05: 36-49.</i> </font></p> <p><font face="Verdana" size="2"> <b><i>Keywords: </i></b> <i>epistemology; constructivism; social constructivism; radical constructivism;</i> <i>critical rationalism.</i></font></p> <hr size="1" noshade=""> <p>&nbsp;</p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Introdu&ccedil;&atilde;o</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">O termo <i>construtivismo</i> surge na Psicologia com a obra de Jean Piaget, no contexto de sua Epistemologia Gen&eacute;tica, para indicar o papel ativo do sujeito na constru&ccedil;&atilde;o de suas estruturas cognitivas. Desde ent&atilde;o, observamos muitas abordagens te&oacute;ricas em Psicologia (Construcionismo Social, Construtivismo Radical, Construtivismo Cr&iacute;tico), Sociologia (Construtivismo Social) e Educa&ccedil;&atilde;o (Pedagogia Construtivista) se abrigando sob este r&oacute;tulo. Entretanto, essas teorias assumem posi&ccedil;&otilde;es ontol&oacute;gicas e epistemol&oacute;gicas muito distintas entre si, tornando o sentido do termo <i>construtivismo</i> cada vez mais obscurecido e confuso. Assim, neste artigo busca-se um esclarecimento da defini&ccedil;&atilde;o de construtivismo filos&oacute;fico para posteriormente avaliar o quanto cada uma das abordagens acima citadas &eacute; compat&iacute;vel com esta tradi&ccedil;&atilde;o. </font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Os Construtivismos</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Para o psic&oacute;logo Michael Mahoney (2003), presidente e fundador da <i>Society for Constructivism in the Human Sciences,</i> a diversidade de teorias que se apresentam como construtivistas apresentam &ecirc;nfase nos temas da proatividade humana; ordenamento ativo de informa&ccedil;&otilde;es; consci&ecirc;ncia e self; redes sociais simb&oacute;licas e desenvolvimento durante a vida. &Eacute; no entanto uma defini&ccedil;&atilde;o relativamente vaga, que n&atilde;o parece ser compartilhada nem pelos membros fundadores da sociedade. E essa sensa&ccedil;&atilde;o de indefini&ccedil;&atilde;o aumenta quando conhecemos o corpo de <i>honored contributors </i>da mesma, onde est&atilde;o juntos psic&oacute;logos c&eacute;lebres e de concep&ccedil;&otilde;es muitas vezes diametralmente opostas, como o neo-behaviorista Albert Bandura, o cognitivista Jerome Bruner, o humanista Joseph Rychlak, o fenomen&oacute;logo-existencial Viktor Frankl, o relativista p&oacute;s-moderno Kenneth Gergen e o construtivista radical <hyperlink rId13"><u>Ernst </u><u>von</u><u> Glasersfeld</u></hyperlink>. Como o pr&oacute;prio Mahoney (1998) reconhece em outro texto, o termo construtivismo tem conhecido um aumento exponencial de sua utiliza&ccedil;&atilde;o nos &uacute;ltimos vinte anos, sendo utilizado por abordagens das mais diferentes, o que dificulta o estabelecimento de defini&ccedil;&otilde;es b&aacute;sicas.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Um dos <i>honored contributors</i> mais c&eacute;lebres da <i>Society</i>, Joseph Rychlak, afirma (1999: 383) que, desafortunadamente, o termo construtivismo &eacute; usualmente empregado em dois sentidos b&aacute;sicos, o que provoca uma grande confus&atilde;o em discuss&otilde;es te&oacute;ricas . O primeiro &eacute; o que considera constru&ccedil;&atilde;o o processo de associa&ccedil;&atilde;o de partes separadas para a forma&ccedil;&atilde;o de algo. Esse processo dispensa a presen&ccedil;a de um sujeito que constr&oacute;i, e para Rychlak &eacute; o sentido na qual Kenneth Gergen e o Construcionismo Social usa o termo. Ele no entanto defende um outro significado no qual o termo &eacute; usado. Para ele, constru&ccedil;&atilde;o indica o processo de forma&ccedil;&atilde;o mental de algo, incluindo conceitos, interpreta&ccedil;&otilde;es, dedu&ccedil;&otilde;es e an&aacute;lises. Esta acep&ccedil;&atilde;o do termo pressup&otilde;e a exist&ecirc;ncia de um sujeito ativo e construtor de suas cogni&ccedil;&otilde;es.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Este segundo sentido &eacute; o que defendo aqui. Mas gostaria de circunscrev&ecirc;-lo melhor. Analisando etimologicamente o termo<i> Construtivismo</i>, estabelecemos a origem do verbo <i>construir</i> no verbo latino <i>struere</i>, que significa organizar, dar estrutura. Necessariamente, &eacute; uma intelig&ecirc;ncia que organiza e d&aacute; estrutura a algo. Se &eacute; verdade que muitas vezes encontramos refer&ecirc;ncias ao suposto car&aacute;ter precursor do construtivismo presente na filosofia de S&oacute;crates, ou ainda de Vico, para uma correta compreens&atilde;o do construtivismo contempor&acirc;neo, devemos recorrer &agrave; obra de Imannuel Kant, fundadora da Filosofia Contempor&acirc;nea. <i>&Eacute; a invers&atilde;o do sentido da rela&ccedil;&atilde;o entre sujeito e objeto que &eacute; a raiz do construtivismo</i>. Tradicionalmente, a filosofia ocidental pensava o conhecimento como uma determina&ccedil;&atilde;o do sujeito cognoscente pelo objeto conhecido. Kant apresenta o processo do conhecimento como a organiza&ccedil;&atilde;o ativa por parte do sujeito - atrav&eacute;s das estruturas da mente - do material que nos &eacute; fornecido pelos sentidos. Ou seja, para o construtivismo, o sujeito constr&oacute;i suas representa&ccedil;&otilde;es de mundo, e n&atilde;o recebe passivamente impress&otilde;es causadas pelos objetos. O sujeito para o construtivismo &eacute; proativo, &eacute; foco de atividade do universo, e n&atilde;o um aglomerado de c&eacute;lulas que recebe passivamente est&iacute;mulos do ambiente, sendo movidas por estes.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A assim chamada "revolu&ccedil;&atilde;o copernicana na Filosofia" de Kant teve v&aacute;rios desdobramentos, gerando interpreta&ccedil;&otilde;es construtivistas idealistas (como as de Hegel, Fitche ou ainda de Schopenhauer), pragmatistas (como a de Hans Vaihinger) e realistas (como a de Karl Popper). Schopenhauer afirma na primeira frase de sua obra prima <i>O Mundo como Vontade e Representa&ccedil;&atilde;o</i>: "O mundo &eacute; uma representa&ccedil;&atilde;o minha<i>.</i>". Hans Vaihinger, em <i>A Filosofia do "como-se"</i>, argumentou que nossas teorias seriam fic&ccedil;&otilde;es conscientes cujo objetivo n&atilde;o &eacute; alcan&ccedil;ar a verdade sobre o mundo, e sim, orientar nossas a&ccedil;&otilde;es eficientemente, pragmaticamente. Karl Popper, que d&aacute; o nome &agrave; escola filos&oacute;fica fundada por ele de "Racionalismo Cr&iacute;tico" em homenagem ao criticismo kantiano, acredita (Popper, 1977) que sua filosofia &eacute; uma interpreta&ccedil;&atilde;o realista da filosofia kantiana.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Toda essa trajet&oacute;ria do construtivismo contempor&acirc;neo na Filosofia teve seus reflexos na Psicologia. Antes do surgimento do Construcionismo Social, fundado por Kenneth Gergen; e do Construtivismo Radical, de Ernst von Glasersfeld e Paul Watzlawick; o termo <i>construtivismo</i> foi introduzido na Psicologia por um dos maiores psic&oacute;logos de todos os tempos, Jean Piaget, que lhe conferiu o sentido original. Vamos nos referir a esta esp&eacute;cie de construtivismo a partir daqui pelo nome de <i>Construtivismo Piagetiano</i>.</font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Construtivismo Piagetiano</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A quest&atilde;o central da obra de Jean Piaget (1973) &eacute; o problema do conhecimento. O que &eacute;, o que conhecemos, como obtemos conhecimento. Aceitando a distin&ccedil;&atilde;o de Leibniz entre verdades de raz&atilde;o e verdades de fato, Piaget distingue conhecimento formal (l&oacute;gica e matem&aacute;tica) de conhecimento emp&iacute;rico (f&iacute;sica, qu&iacute;mica, biologia, psicologia, sociologia). As afirma&ccedil;&otilde;es das ci&ecirc;ncias formais (todos os pontos da circunfer&ecirc;ncia de um c&iacute;rculo s&atilde;o eq&uuml;idistantes do centro, dois mais dois &eacute; igual a quatro) n&atilde;o obt&ecirc;m seu valor de verdade atrav&eacute;s de observa&ccedil;&otilde;es emp&iacute;ricas; s&atilde;o verdades necess&aacute;rias e universais. J&aacute; as afirma&ccedil;&otilde;es das ci&ecirc;ncias emp&iacute;ricas (corpos com densidade maior que a da &aacute;gua afundam, dois avi&otilde;es atingiram as torres do WTC em 11 de setembro de 2001) adquirem seu valor de verdade em fun&ccedil;&atilde;o da possibilidade da verifica&ccedil;&atilde;o dos fatos que enunciam.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Esses dois tipos de conhecimento s&atilde;o irredut&iacute;veis. Assim sendo, as verdades de fato n&atilde;o podem ser alcan&ccedil;adas por algum tipo de dedu&ccedil;&atilde;o l&oacute;gica <i>a priori</i>, pois elas s&atilde;o contingentes, nem as verdades formais podem ser alcan&ccedil;adas a partir da experi&ecirc;ncia emp&iacute;rica, pois elas s&atilde;o necess&aacute;rias. No entanto, apesar dessa irredutibilidade, os fen&ocirc;menos f&iacute;sicos podem ser representados e inclusive antecipados por modelos matem&aacute;ticos. Como podemos ent&atilde;o explicar esse acordo entre matem&aacute;tica e realidade? Como explicar que um modelo elaborado independentemente da realidade emp&iacute;rica adeque-se explicativamente a esta? Isto nos leva ao problema ontol&oacute;gico da regularidade do objeto, ou mais especificamente, da racionalidade da realidade.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Mas de onde v&ecirc;m esses dois tipos de conhecimento? As respostas tradicionais a esta pergunta s&atilde;o as estritamente empiristas e as estritamente racionalistas. Para o empirismo, que defende aquilo a que o construtivismo se refere geralmente como objetivismo, a origem do conhecimento estaria na realidade externa que o imporia ao esp&iacute;rito. Para o racionalismo, o conhecimento &eacute; inato e sua evolu&ccedil;&atilde;o seria apenas atualiza&ccedil;&atilde;o de estruturas pr&eacute;-formadas. O construcionismo de Piaget postula um terceira resposta poss&iacute;vel, que &eacute; a construtivista. Para ele, a constru&ccedil;&atilde;o do conhecimento exige uma colabora&ccedil;&atilde;o necess&aacute;ria entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido. &Eacute; o sujeito que, ativo e a partir da a&ccedil;&atilde;o, constr&oacute;i suas representa&ccedil;&otilde;es de mundo interagindo com o objeto do conhecimento.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Piaget desenvolveu um modelo de desenvolvimento cognitivo construtivista, ricamente sustentado por dados emp&iacute;ricos, que apresentava o sujeito como art&iacute;fice principal, atrav&eacute;s da sua a&ccedil;&atilde;o no mundo, de suas pr&oacute;prias estruturas cognitivas. Dois dos conceitos principais de Piaget, que esclarecem a forma como ele explicava o processo de constru&ccedil;&atilde;o do conhecimento por parte do sujeito, s&atilde;o os de <i>assimila&ccedil;&atilde;o</i> e <i>acomoda&ccedil;&atilde;o</i>. Quando uma crian&ccedil;a ou qualquer pessoa tem uma experi&ecirc;ncia que n&atilde;o se coaduna com seus esquemas e teorias, ela primeiramente tenta <i>assimilar</i> essa experi&ecirc;ncia em seus esquemas existentes. No entanto, se a pessoa ver que suas explica&ccedil;&otilde;es e predi&ccedil;&otilde;es s&atilde;o repetidamente desmentidas, prevalece a tend&ecirc;ncia no sentido de o esquema se modificar de modo a <i>acomodar-se</i> a esta nova informa&ccedil;&atilde;o. Ou seja, somos ativos quando interpretamos a experi&ecirc;ncia para assimil&aacute;-la aos nossos esquemas e teorias, e somos ativos quando mudamos nossos esquemas e teorias de forma a acomodarem-se &agrave; realidade. Piaget, claramente, &eacute; um realista. De forma semelhante a Popper, ele acredita que o mundo vai moldando nossos esquemas quando os desmente seguidamente, exigindo uma nova acomoda&ccedil;&atilde;o.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Mas a despeito do construtivismo realista de Piaget, e do car&aacute;ter moderno da filosofia construtivista, este termo foi apropriado por formas contempor&acirc;neas de relativismo e idealismo, mesmo dentro da Psicologia. &Eacute; o que passaremos a ver agora.</font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>O Construcionismo Social</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Construcionismo Social &eacute; o nome que passou a designar o movimento de cr&iacute;tica &agrave; Psicologia Social "modernista" que tem sua principal refer&ecirc;ncia te&oacute;rica em Kenneth Gergen. Em dois artigos hoje c&eacute;lebres, "<i>Social Psychology as History</i>" de 1973, e "<i>The Social Constructionist Movement in Modern Psychology</i>", de 1985, Gergen tra&ccedil;ou os fundamentos cr&iacute;ticos e o panorama dessa abordagem da Psicologia Social, que se baseia em tr&ecirc;s grandes pressupostos: O primeiro &eacute; que a realidade &eacute; din&acirc;mica, n&atilde;o possuindo qualquer tipo de ess&ecirc;ncia ou leis imut&aacute;veis. A segunda &eacute; que o conhecimento &eacute; somente uma constru&ccedil;&atilde;o social, baseado em comunidades ling&uuml;&iacute;sticas. A terceira &eacute; que o conhecimento tem conseq&uuml;&ecirc;ncias sociais, e que s&atilde;o estas que devem determinar se ele &eacute; v&aacute;lido ou n&atilde;o.Gergen (1973,1985,1992), em alguns artigos em que faz uma an&aacute;lise panor&acirc;mica do quadro da Psicologia Social contempor&acirc;nea, estabelece o movimento do Construcionismo Social como uma oposi&ccedil;&atilde;o aos princ&iacute;pios b&aacute;sicos que norteiam a ci&ecirc;ncia psicol&oacute;gica, classificada por ele de "modernista". Essa classifica&ccedil;&atilde;o se d&aacute; pela ades&atilde;o da Psicologia Social "padr&atilde;o" (Gergen,1992) aos princ&iacute;pios b&aacute;sicos do otimismo epistemol&oacute;gico, do realismo ontol&oacute;gico, do m&eacute;todo emp&iacute;rico de investiga&ccedil;&atilde;o da realidade, da regularidade do objeto e do progresso cient&iacute;fico. Para os autores que se inserem no que eles classificam como a "virada p&oacute;s-moderna" da Psicologia Social, o movimento construcionista social, esses princ&iacute;pios b&aacute;sicos n&atilde;o s&oacute; s&atilde;o negados como substitu&iacute;dos por seus opostos. Kendall &amp; Michael (1997) avaliam que esse movimento "p&oacute;s-moderno" na Psicologia Social possui quatro caracter&iacute;sticas te&oacute;ricas e metodol&oacute;gicas b&aacute;sicas. A primeira, &eacute; a tentativa de dissolver o tradicional objeto da Psicologia, substituindo a realidade da mente e do comportamento pelas conven&ccedil;&otilde;es e recursos ling&uuml;&iacute;sticos que "constr&oacute;em socialmente" o mundo. A segunda, &eacute; o abandono da busca por propriedades universais na pesquisa psicol&oacute;gica e a ado&ccedil;&atilde;o da reflex&atilde;o hist&oacute;rica e contextual como centro da atividade em Psicologia. A terceira, &eacute; a marginaliza&ccedil;&atilde;o do m&eacute;todo e sua classifica&ccedil;&atilde;o, em vers&otilde;es mais radicais desse movimento, como um truque ret&oacute;rico. A quarta, seria o abandono da grande narrativa do progresso da ci&ecirc;ncia rumo a uma verdade objetiva para a ado&ccedil;&atilde;o de uma concep&ccedil;&atilde;o de conhecimento como fragment&aacute;rio e contingente hist&oacute;rica e socialmente. Como afirma Zuriff (1998), a ess&ecirc;ncia da posi&ccedil;&atilde;o ontol&oacute;gica do Construcionismo Social &eacute; a proposi&ccedil;&atilde;o de que n&atilde;o h&aacute; realidade objetiva a ser descoberta; seres humanos constr&oacute;em o conhecimento. Barbara Held (1998) acrescenta a isso o termo "socialmente". Para o Construcionismo Social n&oacute;s constru&iacute;mos teorias a respeito do funcionamento do mundo atrav&eacute;s da intera&ccedil;&atilde;o social.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Essa &eacute; a ess&ecirc;ncia da posi&ccedil;&atilde;o ontol&oacute;gica deste movimento, conforme expressa reiteradamente por Gergen (1985, 1992, 1994) e seus argumentos anti-representacionistas. Por representacionismo Gergen (1994) define a doutrina que defende existir ou poder existir uma rela&ccedil;&atilde;o est&aacute;vel entre as palavras e o mundo que elas representariam. Seguindo Wittgenstein (1975) e Rorty (1989), Gergen (1985, 1994) defende que a linguagem &eacute; um convencionalismo. O significado n&atilde;o se baseia nos objetos, no processo mental ou em entes ideais. Adquire-se atrav&eacute;s do contato social com outros habitantes da cultura em quest&atilde;o. Fora da linguagem n&atilde;o h&aacute; ponto de apoio objetivo nem independente para o pensamento, portanto, a linguagem n&atilde;o representa nada fora dela mesma, &eacute; auto-referente e dependente de jogos de linguagem particulares. Assim, para o Construtivismo Social (Shotter 1992) nossas teorias socialmente constru&iacute;das n&atilde;o nos aproximam de uma descri&ccedil;&atilde;o mais acurada do "mundo como ele &eacute;", de uma realidade objetiva, independente do sujeito do conhecimento. Isso acarreta de qualquer maneira alguma forma de anti-realismo.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Aqui encontramos duas posi&ccedil;&otilde;es ligeiramente diferentes dentro do Construcionismo Social, entre as vers&otilde;es ontol&oacute;gicas que Held (1998: 198) classifica de "mais radical" e "menos radical". A vers&atilde;o ontol&oacute;gica "mais radical" desse movimento considera que uma vez que o sujeito do conhecimento constr&oacute;i esse conhecimento atrav&eacute;s da linguagem e com nada al&eacute;m que a linguagem; a linguagem se constitui na <i>realidade mesma</i> para o sujeito. N&atilde;o existe realidade al&eacute;m da linguagem constru&iacute;da pelo sujeito atrav&eacute;s de suas intera&ccedil;&otilde;es sociais. Essas manifesta&ccedil;&otilde;es de anti-realismo ontol&oacute;gico est&atilde;o presentes fundamentalmente nos autores deste movimento mais influenciados pelo desconstrucionismo de Jacques Derrida, como por exemplo Richer (1992) ou Shotter (1992). Contrasta com a posi&ccedil;&atilde;o "menos radical" de alguns outros autores como Gergen (1985, 1992) e Polkinghorne (1992), que consideram que a teoria constru&iacute;da sobre os objetos do conhecimento atrav&eacute;s da linguagem, intermedia a rela&ccedil;&atilde;o entre o sujeito e o mundo de forma imperme&aacute;vel, de forma que a realidade objetiva, independente do sujeito, pode at&eacute; existir, mas &eacute; inacess&iacute;vel. Aqui, apesar de n&atilde;o aderir a um anti-realismo ontol&oacute;gico, vemos o Construcionismo Social aderindo a um pessimismo epistemol&oacute;gico.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Harr&eacute; (1989) &eacute; um dos construcionistas sociais mais representativos e mais preocupados com a quest&atilde;o ontol&oacute;gica, quest&atilde;o em cima da qual, segundo ele, a ci&ecirc;ncia psicol&oacute;gica precisa estar assentada. Ele procurou desenvolver uma ontologia que pudesse escapar do dilema anti-realista exposto acima. Harr&eacute; (1989: 440) assume o pressuposto de que existem duas realidades humanas distintas, pass&iacute;veis de serem estudadas cientificamente. Uma delas &eacute; fisiol&oacute;gica, a natureza biol&oacute;gica do ser humano e seus sistemas de intera&ccedil;&atilde;o molecular. A outra &eacute; nossa "natureza social" como elementos de uma rede de intera&ccedil;&otilde;es simb&oacute;licas mediadas. Ele afirma que no desenvolvimento de uma metodologia de pesquisa, os processos fisiol&oacute;gicos e as intera&ccedil;&otilde;es sociais precisam ser tratadas como ocorrentes em realidades independentes, reconhecendo que sua posi&ccedil;&atilde;o consiste num novo dualismo. </font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Assim, para a natureza biol&oacute;gica do homem, cr&ecirc; Harr&eacute; (<i>op. cit.</i>), o tratamento das pessoas como indiv&iacute;duos seria adequado. Mas para a natureza social esse tratamento seria inadequado, pois as pessoas n&atilde;o seriam mais do que "<i>n&oacute;s numa rede, n&oacute;dulos numa estrutura, elementos num coletivo</i>" (p.440). Seu argumento &eacute; que, tomados de um ponto de vista biol&oacute;gico, indiv&iacute;duos podem ter propriedades &uacute;nicas, como &aacute;tomos isolados, mas tomados coletivamente, os atributos de uma pessoa somente podem existir em virtude de suas rela&ccedil;&otilde;es com outras.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Deste modo, Harr&eacute; intenta dirigir a aten&ccedil;&atilde;o da Psicologia para as atividades ling&uuml;&iacute;sticas do ser humano, concentrando a atividade te&oacute;rica e experimental desta ci&ecirc;ncia no mapeamento do caminho pelo qual fen&ocirc;menos psicol&oacute;gicos como mem&oacute;ria, emo&ccedil;&atilde;o, percep&ccedil;&atilde;o, dependem do lugar que a pessoa ocupa na rede de trocas comunicacionais da sociedade. Sendo que o conceito de trocas comunicacionais abrange toda aquela s&eacute;rie de comunica&ccedil;&otilde;es verbais e n&atilde;o-verbais onde o significado das trocas de sinais &eacute; convencional. Harr&eacute; (1989) sabe que esta &eacute; uma ontologia radical. Ele pretende, ao adot&aacute;-la, enfatizar a estrutura &agrave;s custas de outras possibilidades ontol&oacute;gicas, principalmente daquela que ele chama de "<i>ontologia cartesiana</i>", que seria a ontologia das Ci&ecirc;ncias Cognitivas. Enquanto a ontologia do Construcionismo Social de Harr&eacute; define o objeto da Psicologia como sendo as intera&ccedil;&otilde;es sociais, a "<i>ontologia cartesiana</i>" prop&otilde;e que existe uma subst&acirc;ncia mental, onde se d&atilde;o os processos psicol&oacute;gicos. Poder&iacute;amos concluir disso que a ontologia proposta por Harr&eacute; nega a exist&ecirc;ncia da mente humana como entidade real. Isto podemos depreender da incr&iacute;vel afirma&ccedil;&atilde;o feita por ele em outra obra (1984: 4 e 5), de que:</font></p> <p><font face="Verdana" size="2"><i> "n&oacute;s devemos come&ccedil;ar com o pressuposto de que o local prim&aacute;rio dos processos psicol&oacute;gicos (em ambos os sentidos temporal e l&oacute;gico) &eacute; coletivo antes que individual" </i>.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Gergen (1989) tamb&eacute;m defende que o Construcionismo Social &eacute; uma outra revolu&ccedil;&atilde;o em curso na Psicologia, contrapondo-se ao Cognitivismo e sua ontologia e epistemologia comprometida com os princ&iacute;pios de uma metaf&iacute;sica dualista cartesiana, onde a mente deve funcionar como espelho do mundo. Para ele (Gergen, <i>op.cit.</i>, 1989: 471), a revolu&ccedil;&atilde;o cognitiva &eacute; uma "<i>revolu&ccedil;&atilde;o equivocada</i>", e s&oacute; serve para "<i>cegar a disciplina para a muito mais penetrante revolu&ccedil;&atilde;o</i>" do que ele denomina <i>epistemologia social</i>. Gergen (1989: 471) formula sua vers&atilde;o para uma "revolu&ccedil;&atilde;o epistemol&oacute;gica" na Psicologia partindo do princ&iacute;pio de que o local do conhecimento n&atilde;o &eacute; mais visto como sendo a mente individual, mas sim como sendo os padr&otilde;es das narrativas sociais. Ele explica isto argumentando que ao abandonarmos o foco de nossa concentra&ccedil;&atilde;o da mente e do mundo e o dirigirmos para o problema da rela&ccedil;&atilde;o entre as palavras e o mundo, n&oacute;s mudar&iacute;amos tamb&eacute;m a aten&ccedil;&atilde;o antes dirigida &agrave;s "<i>proposi&ccedil;&otilde;es em nossa cabe&ccedil;a</i>" para as proposi&ccedil;&otilde;es em nossa linguagem escrita e falada. Uma vez que a linguagem n&atilde;o &eacute; privada, mas por defini&ccedil;&atilde;o deve permitir a comunica&ccedil;&atilde;o e portanto ser social, Gergen conclui que as proposi&ccedil;&otilde;es de conhecimento n&atilde;o s&atilde;o conquistas da mente individual, mas conquistas sociais.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Podemos dizer com John Maze (2001), que o Construcionismo Social &eacute; na verdade um desconstrucionismo. Com sua incapacidade para afirmar qualquer coisa a respeito de qualquer coisa em virtude de seu anti-representacionismo e seu argumento de que o "objetivismo" (que ele confunde com o realismo) &eacute; inerentemente autorit&aacute;rio, o Construcionismo Social se vincula &agrave; Derrida e ao desconstrucionismo, e portanto os enganos seguem de um para o outro. Como afirma Maze (2001), embora aceite que toda teoria epistemol&oacute;gica coerente deva valer para si mesma, o Construcionismo Social nega que qualquer assertiva possa ser verdadeira, assim como nega existir realidades independentes a serem referidas por essas assertivas. No entanto, trata dos discursos como tendo exist&ecirc;ncia objetiva e assume que sua pr&oacute;pria assertiva sobre o discurso &eacute; verdadeira. Assim, o Construcionismo Social se contradiz em suas premissas b&aacute;sicas. Da mesma forma, podemos afirmar que Construcionismo Social est&aacute; muito longe de ser uma teoria construtivista, pois o sujeito aqui est&aacute; totalmente dissolvido na rede de rela&ccedil;&otilde;es ling&uuml;&iacute;sticas na qual est&aacute; inserido e que o constr&oacute;i, e n&atilde;o &eacute; constru&iacute;da por ele. Caso consider&aacute;ssemos esta corrente construtivista, estar&iacute;amos diante de um caso bizarro de construtivismo sem sujeito, onde quem constr&oacute;i s&atilde;o as redes ling&uuml;&iacute;sticas ou jogos de linguagem, que se tornam assim entidades quase m&iacute;sticas.</font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Construtivismo Radical</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A terceira corrente aqui abordada que se utiliza do termo <i>construtivismo</i> na Psicologia &eacute; o <i>Construtivismo Radical</i>, defendido por te&oacute;ricos como Ernst von Glasersfeld, Paul Watzlawick e Heinz von Foerster. O Construtivismo Radical &eacute; uma abordagem n&atilde;o-convencional ao problema do conhecimento, que parte do pressuposto que o conhecimento n&atilde;o &eacute; nada mais do que uma constru&ccedil;&atilde;o que fazemos com base nos dados subjetivos de nossa experi&ecirc;ncia. N&oacute;s viver&iacute;amos somente no mundo que constru&iacute;mos, e n&atilde;o ter&iacute;amos nenhuma base objetiva para julgar nossas representa&ccedil;&otilde;es ou as dos outros, portanto, viver&iacute;amos isolados no mundo de nossas pr&oacute;prias constru&ccedil;&otilde;es. Assim, se o sujeito &eacute; quem determina absolutamente o objeto dentro da rela&ccedil;&atilde;o de conhecimento; ou seja, se o que n&oacute;s chamamos de realidade &eacute; somente aquilo que constru&iacute;mos como tal, nossas constru&ccedil;&otilde;es acerca do mundo n&atilde;o sofrem a influ&ecirc;ncia de um mundo externo objetivo e independente. Em outras palavras, o Construtivismo Radical n&atilde;o &eacute; nada mais que uma forma contempor&acirc;nea de solipsismo, sendo um tipo especial de idealismo. Essa avalia&ccedil;&atilde;o &eacute; tamb&eacute;m compartilhada com Efran e Fauber (1995), que sustentam que esta corrente &eacute; <i>idealista</i>, n&atilde;o se preocupando com a natureza &uacute;ltima da realidade que, segundo eles, &eacute; algo que n&atilde;o &eacute; pass&iacute;vel de ser tocado pela mente humana, estando al&eacute;m de suas possibilidades.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Apesar de se declarar uma disciplina que abrangeria as Neuroci&ecirc;ncias (com Varela e Maturana) e a Educa&ccedil;&atilde;o (Glasserfeld) o Construtivismo Radical tem sua influ&ecirc;ncia principal restrita a um pequeno campo da psicoterapia contempor&acirc;nea. Mesmo no dom&iacute;nio da assim denominada Terapia Construtivista, ela &eacute; somente uma das tend&ecirc;ncias, embora a predominante. Para o Construtivista Radical Robert Neimeyer (1998), o que uniria os construtivistas &eacute; seu comprometimento com uma "epistemologia p&oacute;s-moderna", "cuja &ecirc;nfase &eacute; a busca por um sistema de cren&ccedil;as legitimado pessoal e socialmente, num mundo que n&atilde;o oferece facilmente seguran&ccedil;a, onde nenhuma perspectiva &eacute; intrinsecamente mais correta, adaptativa ou funcional que outra" (Neimeyer, 1998: 123). Para Mahoney (1991), terapeuta construtivista que se declara aderido ao pensamento cr&iacute;tico e a Piaget (fora portanto do Construtivismo Radical), os principais representantes do <i>Construtivismo Radical </i>seriam Heinz von Foerster, Ernst von Glaserfeld, Humberto Maturana, Francisco Varela e Paul Watzlawick. O nome de Robert Neimeyer e Vittorio Guidano tamb&eacute;m deveriam constar desta lista. Para a psicoterapia derivada do Construtivismo Radical, o terapeuta deve incentivar a pessoa a questionar os pressupostos b&aacute;sicos de sua vis&atilde;o de mundo, sem usar como refer&ecirc;ncia qualquer par&acirc;metro objetivo, racional ou l&oacute;gico. Em outras palavras, se como afirma o lema de Paul Watzlawick "a verdade &eacute; a mentira que deu certo", ent&atilde;o tudo vale, e podemos reconstruir nossas experi&ecirc;ncias como bem entendermos, sem levar em conta a raz&atilde;o ou a experi&ecirc;ncia. A &uacute;nica coisa que devemos levar em conta &eacute; nosso bem estar. Resta saber, se tal postura n&atilde;o pode induzir sujeitos desestruturados a surtos psic&oacute;ticos ou a posturas delirantes perante a realidade.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Assim, o Construtivismo Radical se apresenta como anti-cient&iacute;fico, anti-racionalista, idealista, solipsista, relativista e subjetivista. Mas se esta postura fosse plenamente vislumbrada por leitores leigos por detr&aacute;s do emaranhado conceitual onde ela est&aacute; escondida, seria provavelmente mais prontamente recha&ccedil;ada por todos aqueles que n&atilde;o est&atilde;o dispostos a abrir m&atilde;o da id&eacute;ia de que existe uma realidade externa a n&oacute;s e de que n&oacute;s podemos conhec&ecirc;-la em parte ao menos aproximadamente. O idealismo e o subjetivismo s&atilde;o totalmente incompat&iacute;veis com a Ci&ecirc;ncia Moderna. Portanto, o Construtivismo Radical sai do campo da Psicologia e vai para o campo da filosofia p&oacute;s-moderna, devendo ser abandonado prontamente por todos aqueles que quiserem seguir no desenvolvimento de uma psicoterapia cientificamente fundamentada.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Se como dizem Efran e Fauber (1995) os construtivistas radicais n&atilde;o sustentam que a sua posi&ccedil;&atilde;o seja objetivamente correta, nem mesmo que sejam eles que a escolham racionalmente, mas sim em virtude do meio em que se desenvolveram e tamb&eacute;m das constru&ccedil;&otilde;es que foram levados a produzir sobre esse meio, ent&atilde;o temos que perguntar se o Construtivismo Radical &eacute; verdadeiramente um construtivismo. Se o Construtivismo Radical foi desenvolvido em fun&ccedil;&atilde;o das conting&ecirc;ncias do meio, conting&ecirc;ncias s&oacute;cio-hist&oacute;ricas, ent&atilde;o em &uacute;ltima an&aacute;lise o ambiente determinaria o sujeito e suas representa&ccedil;&otilde;es, eliminando qualquer possibilidade de construtivismo. Al&eacute;m disso, esta abordagem n&atilde;o passaria de um ponto de vista como outro qualquer, que foi selecionado em determinado momento hist&oacute;rico devido a uma certa configura&ccedil;&atilde;o contingencial de fatores. Portanto, se as nossas conting&ecirc;ncias s&oacute;cio-hist&oacute;ricas s&atilde;o outras, modernas, o que poderia nos levar a aceitar como v&aacute;lido o posicionamento p&oacute;s-moderno radical? E como os construtivistas radicais poderiam nos tentar convencer a adotar algo que eles pr&oacute;prios sequer podem defender que seja verdadeiro, n&oacute;s que n&atilde;o compartilhamos de seus valores e cren&ccedil;as? Em outras palavras, se eles n&atilde;o podem defender que a teoria deles &eacute; melhor do que as outras, porque devemos aceit&aacute;-la, se em nossos constructos, que seriam t&atilde;o v&aacute;lidos quanto os deles, nossa teoria &eacute; uma aproxima&ccedil;&atilde;o da verdade melhor do que a deles?</font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>O Construtivismo Social</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2"> Muito da abordagem p&oacute;s-moderna relativista na Psicologia tem sua base na "tese forte" da Sociologia do Conhecimento, que cr&ecirc; ter colocado no &acirc;mbito da Sociologia as quest&otilde;es epistemol&oacute;gicas relativas &agrave; sua pr&oacute;pria validade. Ao rejeitar o realismo ontol&oacute;gico, o <i>Construtivismo Social</i> faz das concep&ccedil;&otilde;es socialmente constru&iacute;das da realidade a &uacute;nica e pr&oacute;pria realidade, afastando-se assim dos limites da Sociologia do Conhecimento tradicional e caindo no relativismo p&oacute;s-moderno. Essa posi&ccedil;&atilde;o foi apresentada por soci&oacute;logos como David Bloor, Barry Barnes e Bruno Latour. Rejeita a enuncia&ccedil;&atilde;o de um crit&eacute;rio de cientificidade, de demarca&ccedil;&atilde;o entre ci&ecirc;ncia e n&atilde;o-ci&ecirc;ncia; rejeita o assim chamado "objetivismo", que segundo esta abordagem &eacute; a cren&ccedil;a de que os resultados da ci&ecirc;ncia s&atilde;o determinados pela natureza, dizendo que estes resultados s&atilde;o fruto de "intera&ccedil;&atilde;o social"; dissolve o conceito de <i>sujeito </i>em redes ling&uuml;&iacute;sticas e culturais que o "constroem" e determinam; inverte o crit&eacute;rio de cientificidade do modelo da ci&ecirc;ncia natural para dar &agrave; Sociologia o poder de explicar ci&ecirc;ncias como a F&iacute;sica. Estas teses, que s&atilde;o algumas entre muitas pol&ecirc;micas e de fr&aacute;gil sustenta&ccedil;&atilde;o, caracterizam o Construtivismo Social, que se afasta assim drasticamente da tradi&ccedil;&atilde;o construtivista da filosofia ocidental, roubando no entanto o termo que a denomina. </font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A Sociologia do Conhecimento &eacute; a disciplina que inspirou o surgimento do Construtivismo Social na Sociologia e do movimento Construcionista Social na Psicologia Social contempor&acirc;nea. Seu ancestral filos&oacute;fico &eacute; Karl Mannheim, soci&oacute;logo que defendia a id&eacute;ia de que a sociedade determina toda idea&ccedil;&atilde;o humana, exceto os conceitos f&iacute;sico-matem&aacute;ticos. Em virtude dessa ressalva, afirmava n&atilde;o haver capitulado ao relativismo absoluto. A express&atilde;o <i>Construtivismo Social</i>, surge da obra de Berger &amp; Luckmann (1973), "<i>A Constru&ccedil;&atilde;o Social da Realidade</i>", de 1966. Esta &eacute; uma obra sobre Sociologia do Conhecimento que exerceu grande influ&ecirc;ncia sobre a Psicologia Social e a Sociologia contempor&acirc;nea. Sua reivindica&ccedil;&atilde;o principal &eacute; a de que a "realidade" &eacute; constru&iacute;da socialmente. Define a "realidade" como a qualidade pertencente a fen&ocirc;menos que reconhecemos terem um ser independente de nossa pr&oacute;pria voli&ccedil;&atilde;o, e o conhecimento como a certeza de que os fen&ocirc;menos s&atilde;o reais e possuem caracter&iacute;sticas espec&iacute;ficas. Berger &amp; Luckmann esclarecem que usam esses termos fora do significado estrito, no sentido do que o homem comum julga como real e como conhecimento. &Eacute; portanto uma an&aacute;lise n&atilde;o do conhecimento, mas de suas representa&ccedil;&otilde;es sociais, das concep&ccedil;&otilde;es de conhecimento constru&iacute;das pelo homem comum, independentemente de sua realidade ou irrealidade &uacute;ltima. Como afirmam Berger &amp; Luckmann: "Incluir as quest&otilde;es epistemol&oacute;gicas concernentes &agrave; validade do conhecimento sociol&oacute;gico na sociologia do conhecimento &eacute; de certo modo o mesmo que procurar empurrar o &ocirc;nibus em que estamos viajando" (1973: 27).</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">No entanto, isso &eacute; precisamente o que faz o Construtivismo Social p&oacute;s-moderno ao crer ter colocado no &acirc;mbito da Sociologia as quest&otilde;es epistemol&oacute;gicas relativas &agrave; sua pr&oacute;pria validade. Mais do que na tradi&ccedil;&atilde;o intelectual supra-citada, o Construtivismo Social se ap&oacute;ia no pensamento de alguns fil&oacute;sofos contempor&acirc;neos, entre os quais os principais nomes s&atilde;o os dos fil&oacute;sofos Ludwig Wittgenstein e Richard Rorty e os dos fil&oacute;sofos da ci&ecirc;ncia Thomas Kuhn e Paul Feyerabend. Ao rejeitar o realismo ontol&oacute;gico, o Construtivismo Social faz das concep&ccedil;&otilde;es socialmente constru&iacute;das da realidade a &uacute;nica e pr&oacute;pria realidade, afastando-se assim dos limites da Sociologia do Conhecimento e entrando no terreno do p&oacute;s-modernismo. Essa posi&ccedil;&atilde;o &eacute; o n&uacute;cleo do chamado "programa forte" em sociologia da ci&ecirc;ncia, desenvolvido por soci&oacute;logos como David Bloor, Barry Barnes e Bruno Latour.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Como afirma Oliva (2003), enquanto as filosofias da ci&ecirc;ncia tradicionais se comprometiam com a universaliza&ccedil;&atilde;o dos m&eacute;todos das ci&ecirc;ncias naturais, as epistemologias "heterodoxas" passaram a acalentar a pretens&atilde;o que os pr&oacute;prios Berger e Luckmann consideraram contradit&oacute;ria: a de explicar a racionalidade das ci&ecirc;ncias, incluindo as naturais, recorrendo &agrave;s ci&ecirc;ncias sociais, em especial &agrave; sociologia. Isso se trata de uma grande invers&atilde;o: a disciplina mais questionada em sua cientificidade, a Sociologia, passa a querer explicar a condi&ccedil;&atilde;o de cientificidade de disciplinas como a F&iacute;sica. Oliva (2003) demonstra que essa mudan&ccedil;a radical nas pretens&otilde;es da sociologia n&atilde;o decorre de nenhuma mudan&ccedil;a interna da disciplina, e sim das novas concep&ccedil;&otilde;es epistemol&oacute;gicas surgidas da "<i>nova filosofia da ci&ecirc;ncia</i>", em outras palavras, do p&oacute;s-modernismo de Thomas Kuhn e Paul Feyerabend.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A filosofia da ci&ecirc;ncia p&oacute;s-moderna afirma que a ci&ecirc;ncia n&atilde;o &eacute; um modo de produ&ccedil;&atilde;o de conhecimento superior aos outros, e que a distin&ccedil;&atilde;o entre contexto de justifica&ccedil;&atilde;o e contexto de descoberta n&atilde;o &eacute; v&aacute;lida. A posi&ccedil;&atilde;o epistemol&oacute;gica tradicional afirma que a <i>produ&ccedil;&atilde;o</i> da pesquisa pode ser explicada em termos do ambiente s&oacute;cio-cultural em que a pesquisa se d&aacute;, mas a sua <i>valida&ccedil;&atilde;o</i>, a aferi&ccedil;&atilde;o do valor epist&ecirc;mico dela, s&atilde;o determinadas por crit&eacute;rios l&oacute;gicos e emp&iacute;ricos que em nada dependem do contexto social. Esses crit&eacute;rios &eacute; que s&atilde;o questionados em sua a-historicidade e universalidade pelos p&oacute;s-modernistas Kuhn e Feyerabend e pelo Construtivismo Social, que os julga t&atilde;o condicionados pelo ambiente s&oacute;cio-cultural como as teorias cient&iacute;ficas, afinal de contas, estes crit&eacute;rios tamb&eacute;m seriam teorias.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">O Construtivismo Social &eacute; em seu conte&uacute;do a repeti&ccedil;&atilde;o das teses b&aacute;sicas de Thomas Kuhn, Paul Feyerabend e Richard Rorty, em nada acrescentando de substancial &agrave;s cr&iacute;ticas efetuadas por estes fil&oacute;sofos &agrave; concep&ccedil;&atilde;o moderna de ci&ecirc;ncia. A &uacute;nica coisa em que o Construtivismo Social difere destes fil&oacute;sofos &eacute; a forma pela qual se apresenta. Mas esta diferen&ccedil;a s&oacute; acrescenta uma nova contradi&ccedil;&atilde;o a esse emaranhado de contradi&ccedil;&otilde;es p&oacute;s-modernas. Essa contradi&ccedil;&atilde;o &eacute; a contradi&ccedil;&atilde;o de uma disciplina pr&eacute;-cient&iacute;fica, a sociologia, que jamais conseguiu um &uacute;nico resultado generalizadamente aceito em toda a sua longa exist&ecirc;ncia, que, cansada de sua inconsist&ecirc;ncia como ci&ecirc;ncia moderna, resolve renunciar &agrave; sua longa hist&oacute;ria de fracassos honestos para passar a julgar, atrav&eacute;s de v&aacute;rios diferentes pretensos m&eacute;todos sociol&oacute;gicos, a cientificidade de outras disciplinas cient&iacute;ficas que tem acumulado resultados espetaculares nos &uacute;ltimos duzentos anos. </font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>O Problema da Realidade e sua rela&ccedil;&atilde;o com o Construtivismo</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Bruce Ryan (1999) observa que na raiz da contenda epistemol&oacute;gica entre a modernidade e p&oacute;s-modernidade est&aacute; a quest&atilde;o da natureza da realidade. Na modernidade a realidade &eacute; concebida como objetiva, externa e independente do sujeito do conhecimento, al&eacute;m de pass&iacute;vel de ser descoberta em alguns de seus aspectos pela ci&ecirc;ncia. Para a p&oacute;s-modernidade, a ci&ecirc;ncia cria, ela pr&oacute;pria, a realidade no curso de sua pr&aacute;tica. Assim, podemos resumir essa contenda com a pergunta feita por Ryan (1999: 484):</font></p> <p><font face="Verdana" size="2"><i>"A realidade existe de forma completamente independente dos sujeitos, ou os sujeitos criam a realidade, como o p&oacute;s-modernismo poderia sugerir?"</i></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Ou seja, Ryan acredita que devemos responder &agrave; pergunta sobre se os novos conhecimentos s&atilde;o criados ou descobertos. Talvez esta seja uma falsa quest&atilde;o, fruto da pr&oacute;pria confus&atilde;o p&oacute;s-moderna entre as teorias v&aacute;lidas sobre a realidade (o conhecimento), e a pr&oacute;pria realidade. </font></p> <p><font face="Verdana" size="2">O Construtivismo Filos&oacute;fico oferece uma resposta nova para a antiga quest&atilde;o da origem do conhecimento e sua rela&ccedil;&atilde;o com a realidade. Para o Construtivismo refletido nas obras de Piaget ou de Popper, n&oacute;s criamos hip&oacute;teses sobre o real, e nossa rela&ccedil;&atilde;o com o real se faz atrav&eacute;s destas hip&oacute;teses, por&eacute;m esta rela&ccedil;&atilde;o existe. N&oacute;s criamos hip&oacute;teses, e atrav&eacute;s delas e de suas falhas, des-cobrimos a realidade encoberta. As hip&oacute;teses que se tornam justificadas por uma metodologia aceita passamos a assumir como conhecimento, por&eacute;m, conhecimento provis&oacute;rio. Assim, n&oacute;s n&atilde;o constru&iacute;mos a realidade para o Construtivismo, n&oacute;s constru&iacute;mos nossas representa&ccedil;&otilde;es da realidade. Mas quem as constr&oacute;i, &eacute; um sujeito ativo. Assim, o Construtivismo tradicional &eacute; realista e defende o sujeito epist&ecirc;mico como a fonte de todo conhecimento. Essas duas cren&ccedil;as eliminam do campo do Construtivismo o Construtivismo Radical (idealista) e o Construtivismo e Construcionismo Sociais (coletivistas).</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Porque no entanto estas correntes se declaram construtivistas? O que h&aacute; de comum entre todas as abordagens que se declaram construtivistas &eacute; a rejei&ccedil;&atilde;o ao objetivismo. As formas p&oacute;s-modernas "sociais" do Construtivismo parecem acreditar que a rejei&ccedil;&atilde;o ao objetivismo &eacute; suficiente para se caracterizarem como construtivistas. <i>Objetivismo</i> pode ser definido aqui como a posi&ccedil;&atilde;o filos&oacute;fica que defende que <i>o objeto determina no sujeito a representa&ccedil;&atilde;o que este tem dele</i>. Ou seja, para o objetivismo, o objeto &eacute; algo dado, com uma estrutura que &eacute; de alguma forma imposta ao sujeito na rela&ccedil;&atilde;o de conhecimento, e as representa&ccedil;&otilde;es que temos do mundo, mesmo que n&atilde;o sejam id&ecirc;nticas a ele, s&atilde;o determinadas em n&oacute;s pelos objetos que buscamos conhecer.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Mas n&atilde;o podemos confundir objetivismo com a solu&ccedil;&atilde;o pr&eacute;-epistemol&oacute;gica para o problema da rela&ccedil;&atilde;o sujeito-objeto, que considerava as representa&ccedil;&otilde;es mentais c&oacute;pias perfeitas do mundo externo. Nem o empirismo filos&oacute;fico defendia esta tese. Mesmo Locke j&aacute; distinguia nas qualidades dos objetos que nos eram dados pelos sentidos o que seriam qualidades prim&aacute;rias e qualidades secund&aacute;rias. S&oacute; as primeiras (como a extens&atilde;o, solidez ou movimento por exemplo) pertenceriam ao objeto mesmo, enquanto as segundas (como a cor, sabor ou cheiro) pertenceriam &agrave; mente do sujeito, n&atilde;o tendo exist&ecirc;ncia objetiva (s&oacute; subjetiva), n&atilde;o se assemelhando exatamente as propriedades que est&atilde;o nos corpos e que a produziram. Portanto, como se pode ver facilmente, uma concep&ccedil;&atilde;o de objetivismo que defende ser este uma doutrina que acredita que o material dado pelos sentidos, se depurado e racionalmente trabalhado, nos revela a realidade tal como ela &eacute;, simplesmente n&atilde;o existe na filosofia desde os pr&eacute;-socr&aacute;ticos naturalistas. </font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Da mesma forma, n&atilde;o podemos confundir o objetivismo com o realismo. O objetivismo &eacute; um caso particular de realismo, que por sua vez, n&atilde;o se resume a aquele. <i>Realismo</i> &eacute; a <i>tese ontol&oacute;gica</i> que sustenta a exist&ecirc;ncia real dos objetos do conhecimento, com caracter&iacute;sticas que independem de nossas teorias e de nossa vontade. Para o realismo, nossas representa&ccedil;&otilde;es se referem a objetos que tem exist&ecirc;ncia independente de nossa mente, e que de alguma forma influenciam as nossas teorias sobre eles. Hoje, com a derrocada de uma das formas de realismo que &eacute; o objetivismo, o primeiro &eacute; sustentado pela tese do <i>realismo cr&iacute;tico</i>. Para o realismo cr&iacute;tico, nossas teorias sobre a realidade s&atilde;o constru&iacute;das por n&oacute;s, e condicionam o nosso olhar e interpreta&ccedil;&atilde;o sobre ela. <i>Condicionam</i>, por&eacute;m, n&atilde;o <i>determinam</i>. Quando nos deparamos com um erro, ou seja, quando nossas teorias sobre a realidade s&atilde;o seguidamente contraditadas por observa&ccedil;&otilde;es que n&atilde;o se adaptam a elas, acabamos por modificar nossas teorias e representa&ccedil;&otilde;es do mundo de forma a adapt&aacute;-las &agrave; experi&ecirc;ncia. Assim, nossas teorias, apesar de condicionarem nossa experi&ecirc;ncia da realidade, n&atilde;o a determinam. &Eacute; ao falharem em predizer a sucess&atilde;o de sensa&ccedil;&otilde;es que teremos (Popper, 1975b), que nossas teorias provam que n&atilde;o s&atilde;o a realidade mesma. Quando erramos, trope&ccedil;amos numa realidade que se revela independente de nossa mente. Assim, para o realismo cr&iacute;tico, apesar de nossas teorias n&atilde;o serem uma c&oacute;pia do real <i>nem terem sido produzidas por ele, mas sim pelo sujeito</i>, elas s&atilde;o suas aproxima&ccedil;&otilde;es, e o objeto do conhecimento, apesar de n&atilde;o determinar nossas representa&ccedil;&otilde;es e teorias sobre ele, influencia o processo de suas constru&ccedil;&otilde;es pelo sujeito atrav&eacute;s da resist&ecirc;ncia que oferece algumas vezes em se comportar como nossas teorias esperam.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Podemos resumir ent&atilde;o nosso problema da seguinte forma. Todo construtivismo &eacute; anti-objetivista. Por&eacute;m, ele pode assumir a tradi&ccedil;&atilde;o<i> realista </i>ontol&oacute;gica da filosofia ocidental, como nos casos do Construtivismo Piagetiano e do construtivismo realista do Racionalismo Cr&iacute;tico; ou assumir uma face <i>idealista</i>, que nega qualquer acesso a uma poss&iacute;vel realidade externa &agrave;s constru&ccedil;&otilde;es mentais ou ling&uuml;&iacute;sticas, como nos casos do Construtivismo Radical e do Construtivismo Social. &Eacute; o que nos coloca Held (1998: 194) quando observa que os construcionistas sociais tipicamente presumem que um processo de conhecimento ativo por parte do sujeito, que est&aacute; impl&iacute;cito no pr&oacute;prio termo 'construcionismo', necessita de uma ontologia anti-realista e uma epistemologia construcionista para se sustentar. Discordando firmemente dessa posi&ccedil;&atilde;o, ela lembra que a pr&oacute;pria epistemologia gen&eacute;tica de Piaget &eacute; uma forma de construcionismo que se baseia numa ontologia e epistemologia realistas, ao mesmo tempo em que defende a possibilidade de acesso racional do sujeito a uma realidade objetiva e independente. </font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Conclus&atilde;o</b></font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Vimos que o que divide fundamentalmente as interpreta&ccedil;&otilde;es do Construtivismo s&atilde;o os posicionamentos que cada corrente assume frente ao estatuto ontol&oacute;gico do objeto do conhecimento. Dito de outra forma, s&atilde;o as respostas &agrave; pergunta de <i>o que n&oacute;s constru&iacute;mos</i>? A "realidade" ou nossas representa&ccedil;&otilde;es dela?</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">N&atilde;o &eacute; necess&aacute;ria a ado&ccedil;&atilde;o de uma postura idealista nem relativista quando rejeitamos o objetivismo, e o maior exemplo disso &eacute; o Racionalismo Cr&iacute;tico, escola de filosofia da ci&ecirc;ncia fundada por Karl Popper &agrave; qual se atribui a responsabilidade pelo fim do Positivismo L&oacute;gico e que se tornou hegem&ocirc;nica na filosofia das ci&ecirc;ncias naturais. Sua principal id&eacute;ia &eacute; precisamente a id&eacute;ia central do construtivismo: a de que n&atilde;o existe observa&ccedil;&atilde;o neutra, objetiva da realidade, pois toda observa&ccedil;&atilde;o se faz &agrave; luz de uma teoria (Popper, 1975). Por&eacute;m, ao contr&aacute;rio das tr&ecirc;s correntes p&oacute;s-modernas que se utilizam do termo construtivismo, e em sintonia com as id&eacute;ias de Piaget, Popper demonstra que apesar de condicionar nossas observa&ccedil;&otilde;es, nossas teorias n&atilde;o as determinam. O que ele quer dizer n&atilde;o &eacute; que nossas teorias e hip&oacute;teses sobre a realidade s&atilde;o imperme&aacute;veis a ela, e sim que toda observa&ccedil;&atilde;o que &eacute; feita, sempre &eacute; feita contra ou a favor de uma teoria. A nossa garantia de acesso &agrave; realidade n&atilde;o nos v&ecirc;m de uma suposta neutralidade ou objetividade no processo de obten&ccedil;&atilde;o do conhecimento, muito menos de uma determina&ccedil;&atilde;o de nossas representa&ccedil;&otilde;es sobre o objeto do conhecimento. A garantia vem de nossos erros, de nossas predi&ccedil;&otilde;es sobre o funcionamento da realidade que n&atilde;o se confirmam. Os nossos erros s&atilde;o a prova de que nossas teorias sobre o objeto n&atilde;o o determinam, pois aquelas ao fazerem predi&ccedil;&otilde;es sobre o comportamento do objeto que se revelam falhas atrav&eacute;s da experi&ecirc;ncia, revelam uma realidade que existe apesar e para al&eacute;m delas. Para o Racionalismo Cr&iacute;tico, &eacute; quando erramos que trope&ccedil;amos na realidade. Essa falsifica&ccedil;&atilde;o de nossas hip&oacute;teses de tempos em tempos, nos obriga a construir uma hip&oacute;tese superior para dar conta da experi&ecirc;ncia emp&iacute;rica, o que faz o conhecimento ser sempre de car&aacute;ter hipot&eacute;tico e aproximativo.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Assim, <i>o Racionalismo Cr&iacute;tico &eacute; construtivista</i>, pois acredita que o processo de conhecimento parte da atividade do indiv&iacute;duo, do sujeito, que constr&oacute;i, n&atilde;o a realidade mesma, mas suas teorias e hip&oacute;teses sobre ela. Ao mesmo tempo, <i>o Racionalismo Cr&iacute;tico &eacute; realista</i>, pois considera que &eacute; a realidade, est&aacute;vel e independente do sujeito, que julga as hip&oacute;teses e teorias deste &uacute;ltimo sobre ela. Por &uacute;ltimo, <i>o Racionalismo Cr&iacute;tico de forma alguma &eacute; objetivista</i>, pois considera que nossas representa&ccedil;&otilde;es n&atilde;o s&atilde;o c&oacute;pias fi&eacute;is da realidade nem provocadas por ela, mas somente modelos simplificados desta que de tempos em tempos s&atilde;o falsificados e exigem a constru&ccedil;&atilde;o de um novo modelo por parte do sujeito.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">A segunda parte da quest&atilde;o construtivista, esquecida pelo p&oacute;s-modernismo, &eacute; a do sujeito ativo na constru&ccedil;&atilde;o do conhecimento e foco do vetor epistemol&oacute;gico, como dizia Bachelard. As formas sociais auto-intituladas "construtivistas" apresentam uma forma bizarra de "constru&ccedil;&atilde;o" sem sujeito, onde estruturas ling&uuml;&iacute;sticas onipresentes construiriam os n&oacute;dulos da estrutura do tecido social aos quais n&oacute;s, ing&ecirc;nuos modernos, chamar&iacute;amos "sujeitos". Como afirma Rychlak (1999), a ess&ecirc;ncia do Construcionismo Social &eacute; que o comportamento e as cren&ccedil;as humanas s&atilde;o desenhadas e formadas pela sociedade e est&aacute; para al&eacute;m da capacidade do "indiv&iacute;duo" mudar as coisas (p&aacute;g. 383). Dessa forma, n&atilde;o h&aacute; sujeito ativo, ele &eacute; constru&iacute;do por um novo objetivismo, que rejeita o objeto "natural" em prol de um objeto "socialmente constru&iacute;do", a linguagem. Neste novo objetivismo, o sujeito &eacute; constru&iacute;do, e n&atilde;o constr&oacute;i. Com certeza, n&atilde;o pode se tratar de um construtivismo.</font></p> <p><font face="Verdana" size="2">Assim esclarecemos a verdadeira encruzilhada das teorias auto-denominadas construtivistas. Esta se resume aos seus posicionamentos em rela&ccedil;&atilde;o ao realismo e ao idealismo, e em rela&ccedil;&atilde;o a um sujeito ativo ou determinado. O Construtivismo Social, o Construtivismo Radical e tamb&eacute;m o Construcionismo Social s&atilde;o formas p&oacute;s-modernas de teoria que se utilizam do termo <i>construtivismo</i> conferindo a este um significado diverso do original. E neste caso, temos que reconhecer que estas abordagens se colocam fora do &acirc;mbito tanto do Construtivismo como tamb&eacute;m da Ci&ecirc;ncia Moderna.</font></p> <p>&nbsp;</p> <p><font face="Verdana" size="3"><b>Refer&ecirc;ncias Bibliogr&aacute;ficas</b></font></p> <!-- ref --><p><font face="Verdana" size="2">Berger, P. L. e Luckmann, T. 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