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Estudos e Pesquisas em Psicologia

versão On-line ISSN 1808-4281

Estud. pesqui. psicol. vol.21 no.2 Rio de Janeiro maio/ago. 2021

https://doi.org/10.12957/epp.2021.61059 

Estudos e Pesquisas em Psicologia
2021, Vol. 02. doi:10.12957/epp.2021.61059
ISSN 1808-4281 (online version)

 

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO

 

Programas Baseados em Mindfulness para Alunos Universitários: Relato de Experiência de um Projeto de Extensão

 

Mariana Ladeira de Azevedo*; Carolina Baptista Menezes**
Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Florianópolis, SC, Brasil
Endereço para correspondência

 

RESUMO

Extensão universitária é um dos pilares da universidade brasileira, juntamente com ensino e pesquisa. A oferta de programas baseados em mindfulness para alunos de graduação como ação de extensão lhes oferece a oportunidade de desenvolverem habilidades psicológicas e sociais para manejar o estresse e promover a saúde e a qualidade nas interações acadêmicas. O presente trabalho tem como objetivo relatar a experiência de gerenciamento de um projeto de extensão universitária de programas baseados em mindfulness para alunos de graduação em uma universidade pública durante três anos. Para tanto, o trabalho foi organizado nas seções iniciação, planejamento, execução, monitoramento e encerramento do projeto. Procedimentos foram detalhados e os principais desafios e benefícios percebidos foram relatados juntamente com as lições aprendidas. O índice de interesse na intervenção foi elevado, havendo demanda superior à oferta de vagas. A realização de programas de mindfulness na universidade depende também da formação do instrutor que os ministrará e da disponibilidade de recursos e estrutura física para oferecê-los. Por fim, considera-se que ações como essas são possíveis no contexto universitário, recomendando-se o seu registro e formalização como extensão, avaliando recursos disponíveis, calendário e demandas acadêmicas e fidelidade ao currículo ministrado.

Palavras-chave: relato de experiência, extensão universitária, atenção plena, promoção da saúde, estudantes.


 

Mindfulness-Based Programs for Undergraduate Students: Experience Report of an Extension Project

 

ABSTRACT

Extension activities at the University are one of the pillars of the Brazilian higher education, along with teaching and research. Mindfulness-based programs offers to undergraduate students the opportunity to improve psychological and social skills for stress coping and health promotion in academic interactions. This work aims to report the experience of managing a university extension project of mindfulness-based programs for undergraduate students at a public university for three years. The report is organized according to project phases initiation, planning, execution, monitoring and closing. Procedures were detailed, main challenges and perceived benefits were reported along with lessons learned. There was a high interest in the intervention, with more demand than places avaliable. The implementation of mindfulness programs in the university context depends on availability of resources and physical structure as also on qualification of the facilitator whom will deliver them. Finally, it is considered that such interventions are possible in the university context with recommendations on registering and formalizing it as an extension activity, evaluating available resources, considering academic calendar and on delivering it in line with the program curriculum.

Keywords: experience report, university extension, mindfulness, health promotion, students.


 

Programas Basados en Mindfulness para Estudiantes Universitarios: Informe de Experiencia de un Proyecto de Extensión

 

RESUMEN

La extensión universitaria es uno de los pilares de la universidad brasileña, junto a la enseñanza y a la pesquisa. La oferta de programas basados en Mindfulness para estudiantes universitarios como acción de extensión les ofrece la oportunidad de desarrollar habilidades psicológicas y sociales para el manejo del estrés y la promoción de la salud y la calidad en las interacciones académicas. Este trabajo tiene como objetivo informar sobre la experiencia de la gestión de un proyecto de extensión universitaria de programas basados en mindfulness para estudiantes universitarios en una universidad pública durante tres años. El informe está organizado según las fases de iniciación, planificación, ejecución, control y cierre del proyecto. Se detallaron los procedimientos y se describieron los principales desafíos y beneficios percibidos junto con las lecciones aprendidas. El índice de interés en la intervención fue elevado, habiendo una demanda superior a la oferta de vacantes. La realización de programas de mindfulness en la universidad depende también de la formación del instructor que los dictará y de la disponibilidad de recursos y estructura física para ofrecerlos. Por último, se considera que acciones como estas son posibles en el contexto universitario, y se recomienda su registro y formalización como extensión, evaluando los recursos disponibles, el calendario, y las demandas académicas y la fidelidad al programa impartido.

Palabras clave: informe de experiencia, extensión universitaria, mindfulness, promoción de la salud, estudiantes.


 

 

Na população acadêmica, um estudo sobre prevalência de depressão exclusivamente em populações de estudantes de graduação analisou 24 estudos de países da América do Norte, Europa e Ásia, totalizando 48.650 participantes de diversos cursos. A prevalência de depressão verificada foi de quase um terço da amostra total (30,6%) (Ibrahim, Kelly, Adams, & Glazebrook, 2013).

Uma metanálise brasileira sobre prevalência de problemas de saúde mental na população universitária em cursos de medicina considerou 57 estudos, totalizando uma amostra de 18.015 pessoas. A análise de 25 estudos indicou uma prevalência de depressão de 30,6%. Ainda foi verificada a prevalência de ansiedade-traço (89,6%) em quatro estudos; ansiedade-estado (62,1%) em dois estudos; ansiedade geral (32,9%) em seis estudos; baixa qualidade de sono (51,5%) e sonolência diurna excessiva (46,1%) em quatro estudos; burnout (13,1%) e uso de álcool (32,9%) em três estudos; transtorno de compulsão alimentar (10%) e transtorno obsessivo-compulsivo (3,8%) em um estudo. Todos os resultados foram estatisticamente significativos (Pacheco et al., 2017).

Os dados acima evidenciam a expressiva presença de sintomas que afetam tanto a vida pessoal dos estudantes quanto o seu desempenho acadêmico, possivelmente dificultando a experiência da formação profissional. Neste sentido, observa-se que existem diversas iniciativas de intervenções que buscam oferecer formas de suporte psicossocial no contexto universitário.

Uma metanálise internacional (Huang, Nigatu, Smail-Crevier, Zhang, & Wang, 2018), por exemplo, investigou intervenções para lidar com depressão, transtorno de ansiedade, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno de estresse pós-traumático entre estudantes de graduação e pós-graduação. Dos 51 estudos selecionados, quatro categorias de intervenção foram identificadas: (a) intervenções cognitivas e comportamentais ou similares; (b) intervenções baseadas em mindfulness; (c) modificação da atenção/percepção; e (d) outras intervenções. Três estudos utilizaram intervenções baseadas em mindfulness para ansiedade e/ou depressão. As intervenções baseadas em mindfulness tiveram tamanho de efeito médio para depressão (g = -.52, 95%, CI [.88, -.16]) e para transtorno de ansiedade generalizada (g = -.49, 95%, CI [.84, -.15]) indicando potencial do uso destes programas no contexto universitário.

Kabat-Zinn (2017) ofereceu uma definição operacional de mindfulness como a consciência que emerge ao se prestar atenção, de forma intencional e sem julgamento, à experiência do momento presente. Tal conceito é aplicado a programas de intervenção clínica em saúde, chamados de Programas Baseados em Mindfulness (MBP). Estes programas estruturados como protocolos, geralmente, de oito sessões – sendo uma por semana, cuja duração varia de duas a três horas cada – utilizam técnicas terapêuticas e de meditação mindfulness; os protocolos estão fundamentados nas práticas contemplativas e baseados em evidências científicas, nos conhecimentos da psicologia, da medicina e da educação (Crane et al., 2017). Dentre os MBPs, o Mindfulness-based Stress Reduction  ([MBSR, Redução do Estresse Baseado em Mindfulness], Kabat-Zinn et al., 1992) é bem estabelecido na literatura científica para manejo do estresse e da ansiedade, enquanto o Mindfulness-based Cognitive Therapy ([MBCT, Terapia Cognitiva Baseada em Mindfulness], Segal, Williams, & Teasdale, 2013), outra modalidade de MBP, é bem  estabelecido para prevenção de recaída em depressão.

O'Driscoll, Byrne, Gillicuddy, Lambert e Sahm (2017) realizaram uma revisão sistemática de 11 estudos com intervenções baseadas em mindfulness realizadas com estudantes de graduação de áreas da saúde e assistência social. De forma geral, os resultados estatisticamente significativos indicaram benefícios nos níveis de estresse, ansiedade, bem-estar, autocompaixão e habilidades de enfrentamento, além de afetar o humor e o mindfulness disposicional (ou seja, traço minfulness) dos participantes, apesar das intervenções terem variado de 5 a 10 sessões com duração de 60 a 150 minutos cada. Os autores concluíram que a maioria dos estudos apresentou cuidado ao descrever a qualificação dos facilitadores dos MBPs, garantindo o atendimento às diretrizes de melhores práticas para o ensino de mindfulness. Contudo, faltam dados sobre os efeitos sustentados, provenientes de acompanhamentos de longo prazo, e detalhes sobre a fidelidade do programa ministrado nos estudos – ou seja, em que medida o programa ministrado adere a forma, temas, conteúdos e recomendações dos respectivos manuais, também chamados de currículos (como MBSR ou MBCT, por exemplo).

Havendo poucos estudos sobre intervenções baseadas em mindfulness no Brasil e ainda menos com estudantes universitários ou sobre formatos específicos para o contexto acadêmico, o presente trabalho tem como objetivo relatar a experiência de gerenciamento de um projeto de extensão universitária de programas baseados em mindfulness para alunos de graduação em uma universidade pública durante três anos. A respeito do relato de experiência, Daltro e Faria (2019) consolidam elementos essenciais para a sua elaboração: é um documento que contempla narrativas, necessitando que, pelo menos, um dos autores "seja sujeito participante do contexto da vida real em estudo", gerando noções teóricas e problematizações a partir da experiência de quem o escreve (p. 234). O relato de experiência deve ser apresentado em linguagem e estrutura acessíveis, descrevendo a experiência vivida e o contexto em que a experiência ocorre, e apresentar resultados e lições aprendidas, caracterizando a singularidade da experiência apresentada também com seus paradoxos, desafios e dificuldades.

O projeto de extensão foi composto de dois eventos: a palestra introdutória sobre mindfulness, seguida do curso de extensão dos programas baseados em mindfulness. O relato está organizado de acordo com as etapas de um projeto: iniciação, planejamento, execução, monitoramento e controle, e encerramento. Tais fases não são estáticas, sobrepondo-se e relacionando-se ao longo de todo o projeto, num fluxo contínuo e adaptativo. (Project Management Institute, 2017). Neste relato, estão contidos os principais procedimentos necessários para realizar iniciativas de MBPs no contexto da extensão universitária brasileira, o que inclui a preparação do instrutor/facilitador; a formalização da intervenção como ação de extensão, adequando-a ao calendário acadêmico; o planejamento e a execução, que incluem sua operacionalização em termos de infraestrutura física, material e a condução dos programas em si; o monitoramento e a mensuração dos resultados, que envolve a elaboração e/ou aplicação de instrumentos de medida pré/pós-curso; e o encerramento, incluindo também o relatório de atividades. Ao final deste trabalho, é apresentada uma avaliação geral sobre vantagens e desvantagens de MBPs no contexto universitário, bem como as lições aprendidas sobre o processo, e considerações para a realização de ações similares em outras instituições de ensino superior.

 

Iniciação do Projeto: Formatação e Registro de Extensão Universitária

O projeto de extensão intitulado "Intervenções baseadas em Mindfulness (MBIs) para Estudantes de Graduação", foi realizado entre abril de 2017 e junho de 2019 na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). O objetivo do projeto de extensão foi divulgar conhecimentos e técnicas de mindfulness através de protocolos de MBPs entre alunos da graduação de diversos cursos e fases, por meio de eventos de extensão. A intenção foi ensinar os alunos para que estes desenvolvessem autonomia na prática pessoal de mindfulness, contribuindo para o manejo do estresse, promoção da saúde mental e da percepção de qualidade de vida.

Extensão e pesquisa, juntamente com o ensino, formam o tripé que sustenta o papel social e transformador da universidade brasileira. Esta base de sustentação está prevista na Carta Magna do país em seu Art. 207 que, além da autonomia (didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial) das universidades, faz saber que tais instituições obedecerão ao "princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão" (Brasil, 1988). Essa prerrogativa provoca o diálogo entre setores da sociedade e viabiliza a operacionalização do compromisso social inerente à universidade brasileira. Também faz surgir a necessidade e a urgência de institucionalizar e regulamentar as atividades e extensão, criando procedimento administrativos e acadêmicos que permitam a plena integração da extensão universitária com o ensino e com a pesquisa.

Segundo a Política Nacional de Extensão (Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras, 2012), a extensão se integra ao ensino ao considerar o estudante como protagonista de sua formação técnico-profissional e como agente de transformação social. Já na relação com a pesquisa, a extensão favorece a atuação dos pós-graduandos em ações de extensão, resultando em produção científica. Além disso, as ações de extensão podem dar origem a projetos de pesquisa, através dos quais pode-se utilizar métodos científicos que auxiliem o monitoramento e a documentação dos resultados de tais ações.

A Resolução nº 7, de 18 de dezembro de 2018 (Ministério da Educação, 2018) normatiza, dentre outras coisas, que as atividades de extensão devem compor, pelo menos, 10% da carga-horária curricular dos alunos de graduação. Essa norma também organiza os tipos de ações de extensão (I - programas, II - projetos, III - cursos e oficinas, IV – eventos, V - prestação de serviços) e define a necessidade de uma contínua autoavaliação crítica das atividades realizadas.

Na etapa de iniciação, o projeto de extensão foi elaborado, registrado no Sistema Integrado de Gerenciamento de Projetos de Pesquisa e Extensão (SIGPEX) da universidade, e aprovado pela Coordenação de Extensão do Departamento de Psicologia da UFSC. Vinculado ao projeto, seguiu-se o registro e estruturação da palestra introdutória e do MBP.

A palestra introdutória sobre o tema foi registrada no SIGPEX como um evento de extensão do tipo "outros", que define uma ação pontual de mobilização visando a um objetivo definido. Já a intervenção MBP foi registrada como curso de extensão presencial, com duração de até 30 horas e do tipo iniciação, cujo objetivo é oferecer noções introdutórias em uma área específica do conhecimento. Até o momento, foram oferecidos cinco MBPs, um por semestre.

Os MBPs oferecidos foram precedidos pela palestra introdutória, sendo que a participação na mesma foi definida como pré-requisito para participação nos programas de mindfulness. O registro da ação no SIGPEX e a reserva do espaço físico para os eventos foram realizadas com antecedência média de 2 meses em relação ao início do MBP.

 

Planejamento do Projeto: Preparo para a Intervenção

Durante a etapa de planejamento, bem como ao longo da execução dos eventos, pode ser profícuo o auxílio de um ou dois alunos de graduação voluntários e/ou bolsistas de extensão, os quais podem contribuir na elaboração do convite e na divulgação, controle da lista de presença e dos formulários preenchidos pelos participantes, organização dos espaços, análise de resultados e elaboração do relatório final.

O projeto relatado contou com a participação de cinco alunos voluntários em diferentes fases. Para atuar como voluntário, o requisito foi ter participado de um dos cursos de extensão em MBP ofertados anteriormente e se comprometer com a prática pessoal diária de mindfulness durante o curso. A atividade dos alunos voluntários incluiu reuniões periódicas com a coordenação do projeto para reporte das atividades, leitura de artigos e debate sobre pesquisa e prática profissional relacionadas tanto a mindfulness quanto à psicologia. O caráter do vínculo voluntário também foi formalizado, sendo concedido certificado de participação em projeto de extensão. Desta forma, a atividade de extensão também se integra à dimensão ensino, contribuindo para a formação técnica dos alunos graduandos.

A facilitadora atuou em caráter voluntário. No momento das intervenções, era aluna regularmente matriculada no Programa de Pós-Graduação em Psicologia, do Departamento de Psicologia da UFSC, com formação em psicologia e Pós-Graduação Lato Sensu em Psicoterapia Cognitivo-Comportamental, registro ativo no respectivo Conselho Regional de Psicologia (CRP) e treinamento profissional nos programas de mindfulness ministrados. A facilitadora é praticante regular (frequência diária) das técnicas de mindfulness ministradas e possui experiência anterior de mais de 15 anos com outras práticas contemplativas e condução de grupos. Durante o período em que as intervenções estavam sendo conduzidas, a facilitadora estava sob supervisão profissional em MBPs e seguiu as recomendações para o ensino de programas baseados em mindfulness (Crane et al., 2014; UK Network for Mindfulness-Based Teacher Trainer Organisations, 2015).

Para o curso de extensão, foram incluídos participantes com idade acima de 18 anos, de ambos os sexos, estudantes de graduação de todos os cursos/áreas e de todas as fases/semestres com matrícula ativa na universidade e que tivessem participado da palestra introdutória mediante assinatura da lista de presença. Os critérios de exclusão foram: estar usando medicação sem acompanhamento médico; declarar ter transtorno mental sem estar realizando acompanhamento psicoterapêutico; declarar ter condições de saúde em fase aguda sem acompanhamento médico; declarar diagnóstico prévio de transtornos de personalidade, esquizofrenia e transtornos psicóticos e declarar estar em situação de abuso de substâncias. Tais critérios são orientações contidas nos currículos dos programas baseados em mindfulness (Britton & Lindahl, 2018; Santorelli, Meleo-Meyer, Koerbel, & Kabat-Zinn, 2017; Segal, Williams, & Teasdale, 2013).

Conforme consta no Art. 10 da Resolução nº 7, de 18 de dezembro de 2018 (Ministério da Educação, 2018), a atividade de extensão está sujeita à contínua autoavaliação crítica incluindo a identificação quanto à pertinência da ação na creditação curricular, a contribuição da atividade para o cumprimento dos objetivos do Plano de Desenvolvimento Institucional e dos Projetos Pedagógico dos Cursos, e a demonstração dos resultados alcançados em relação ao público participante. É neste sentido que o uso de instrumentos para avaliação se faz necessário, como pré/pós-testes, além da avaliação geral de satisfação e do autorrelato dos benefícios percebidos.

O planejamento da avaliação do projeto incluiu alguns instrumentos. A lista de presença mensurou o interesse pelo tema e a adesão aos eventos palestra introdutória e MBP. O formulário de avaliação final dos eventos mensurou a satisfação dos participantes com recursos didáticos, estrutura física, conteúdo, facilitadora e carga horária, além de comparar o conhecimento sobre o tema declarado pelo participante antes e depois, bem como fornecer uma avaliação de satisfação geral do evento. Instrumentos psicológicos aplicados antes e depois da intervenção contribuem para a mensuração dos efeitos sobre construtos, tais como escalas, inventários e questionários de estresse percebido, ansiedade, depressão, afetos, mindfulness e outros. O instrumento deve ser escolhido com base nos objetivos da utilização da intervenção em cada contexto e momento. Questionários com perguntas abertas ou fechadas podem ser elaborados sob medida para avaliar frequência da realização das tarefas entre sessões, relatos pessoais sobre as dificuldades de prática, percepções sobre os efeitos do programa e relatos de experiência. Tais dados e indicadores viabilizam a elaboração de um relatório de resultados sobre a ação de extensão, oferecendo informações que subsidiam a tomada de decisão acerca da melhoria no processo de planejamento e operacionalização do MBP, manutenção da oferta, ajustes e/ou construção de programas customizados para o contexto acadêmico.

 

Execução do Projeto de Extensão: Aspectos Práticos da Intervenção

Conforme é recomentado em MBPs, primeiramente, uma palestra aberta e introdutória sobre o tema foi realizada na própria UFSC para os alunos de graduação, seguida pela oferta do curso de extensão – que envolve a intervenção em si. A divulgação do curso e da palestra juntamente, com o link de inscrição, foi feita através do envio em fóruns eletrônicos e listas de e-mail para os alunos dos cursos de graduação duas semanas antes do início. Para participar da palestra, os interessados preencheram um formulário de inscrição online.

A inscrição utilizando formulário eletrônico (ex.: google forms) proporciona redução no tempo de organização da informação coletada em comparação à inscrição realizada por e-mail. Os formulários eletrônicos também proporcionam mais precisão nos dados informados pelos participantes, evitando a omissão de informações ou equívocos na escrita dos nomes, endereços eletrônicos e números de telefone de contato. Também facilitou a confecção da lista de presença e elaboração dos indicadores de adesão. Participantes inscritos além da capacidade do espaço foram registrados em lista de espera.

Um dia antes da palestra, um e-mail contendo um lembrete e as informações de localização do espaço foi enviado a todos os participantes. Novos lugares foram sendo alocados para os participantes na lista de espera na mesma proporção dos retornos sobre a impossibilidade de comparecer na palestra após envio do e-mail de confirmação. Cada palestra foi realizada em um dos auditórios da UFSC, com recursos audiovisuais e capacidade média de 80 pessoas. No dia da palestra, foi disponibilizada a lista de presença para assinatura. Quanto aos interessados que se apresentaram ao local do evento sem inscrição prévia, seus dados foram coletados no momento e foi solicitado que aguardassem até o início da palestra para tomarem um assento sem prejudicar a preferência dos que haviam se inscrito anteriormente.

O conteúdo da palestra incluiu breve contexto histórico dos programas de mindfulness, definição de mindfulness, evidências de eficácia dos MBPs, indicações de uso e restrições e, ao final, convite para o curso de extensão do programa de mindfulness (com informações sobre duração, local, recomendações e critérios de seleção). Ao final da palestra, interessados em participar do curso de extensão do MBP preencheram um Termo de Compromisso, contendo os critérios de participação e conclusão do programa para obtenção do certificado de participação, tais como frequência mínima de 80%, presença necessária na primeira sessão, sigilo e confidencialidade no grupo e que a conclusão do programa não habilita os participantes a ministrarem MBPs sob nenhuma circunstância. Também preencheram o formulário de avaliação clínica, levantando histórico de saúde conforme recomendações de Britton e Lindahl (2018), Santorelli et al. (2017), e Segal et al. (2013) para triagem dos participantes.

No dia seguinte à palestra, foi enviado por e-mail aos participantes presentes a avaliação online de satisfação com a palestra introdutória, ficando disponível por três dias. Após término da coleta das respostas, os dados foram consolidados no relatório de atividade de extensão e enviados à coordenação de extensão para aprovação, encerramento da ação no SIGPEX e emissão dos certificados de participação conforme assinaturas na lista de presença.

A triagem dos participantes interessados que preencheram o Termo de Compromisso iniciou imediatamente após a realização da palestra. O primeiro critério utilizado foram os dados coletados na avaliação clínica. Em todos os cursos ofertados houve mais interessados do que a quantidade de vagas disponíveis. Então, o segundo critério de triagem foi a seleção aleatória simples por meio de sorteio. Interessados não sorteados foram colocados numa lista de espera.

Seguiu-se uma entrevista telefônica com os participantes pré-triados, realizada pela facilitadora para confirmar os critérios de inclusão e exclusão, esclarecer dúvidas sobre o curso de extensão ou sobre o MBP, confirmando a participação na intervenção e explicando a localização do espaço. Quando houve a desistência do participante durante o contato telefônico, ou, posteriormente, até a data de início da intervenção, foram convidados aleatoriamente os demais interessados na lista de espera.

Aos interessados não selecionados, foi enviado um retorno por e-mail informando sobre o resultado da triagem e concedendo a prioridade de participação num curso futuro, caso desejado. A facilitadora também se colocou à disposição para esclarecer dúvidas sobre esta etapa, realizando encaminhamento ou acolhimento psicológico, se necessário.

Em média, duas semanas após a palestra introdutória, iniciou-se o MBP. O programa foi realizado em uma sala de grupos da clínica-escola do Departamento de Psicologia da UFSC, sendo um ambiente arejado com cerca de 35m2, boa luminosidade e ventilação, paredes brancas com uma lousa de giz numa das paredes, dezenas de almofadas e algumas cadeiras, que foram disponibilizadas como alternativa para pessoas que preferissem ou tivessem restrições em se sentar ou deitar sobre almofadas no chão.

Para preparação do espaço físico, a facilitadora chegava cerca de uma hora antes no local para dispor as almofadas em formato "U" e os tapetes de meditação (material EVA) organizados lado a lado em duas fileiras, sendo um para cada participante. A preparação do material do curso incluiu plano de aula, currículo e/ou manual do MBP, áudios das práticas em formato .mp3, formulários impressos, sino para marcação do início e término das práticas e outros materiais específicos conforme a sessão.

Os programas baseados em mindfulness foram oferecidos gratuitamente aos alunos. Foram oferecidos um programa de cinco semanas e quatro programas de oito semanas, sempre com um encontro por semana, com duração de 2,5 horas cada encontro, em conformidade com as recomendações dos currículos. Os programas de oito semanas ministrados foram Promoção da Saúde Baseada em Mindfulness (Salvo et al., 2018) e Terapia Cognitiva Baseada em Mindfulness (Segal et al., 2013); o programa de cinco semanas foi inspirado em Redução do Estresse Baseado em Mindfulness, usando-se como referência a estrutura proposta por Demarzo et al. (2017). Os programas apresentaram técnicas de mindfulness, adicionadas de conteúdos de psicoeducação e atividades complementares previstas nos currículos dos respectivos MBPs. Ao final de cada encontro, foram disponibilizados os áudios de prática e os formulários de atividades diárias para serem realizadas entre sessões (tarefas de casa).

Antes do início da primeira sessão, quando aplicável, os participantes preencheram os instrumentos pré-curso. Logo no começo das sessões, foram estabelecidos os compromissos com o programa, definindo o setting do grupo. Seguiu-se a execução das sessões semanais do MBP conforme a estrutura do seu currículo e recomendações de cada programa. Ao final da última sessão, foram preenchidos os instrumentos pós-curso.

Para melhor aproveitamento do programa pelo participante, os materiais complementares escritos, tarefas de casa e áudios de prática foram entregues após o término de cada sessão (e não todos de uma única vez no primeiro encontro). O material escrito pode ser entregue impresso ou enviado em formato digital por e-mail. Há prós e contras em cada formato. O material impresso gera consumo de recursos ambientais e financeiros, mas apresenta a vantagem de ser de acesso imediato aos participantes. Contudo, alguns participantes avaliam como negativa a utilização excessiva de papel para um conteúdo que poderia ser acessado facilmente em formato digital. Os áudios de prática podem ser disponibilizados após as sessões em formato digital por meio de aplicativos de serviço de armazenamento nas nuvens, com controle de acesso e versão (chamados de drives). Mas também podem ser entregues no formato de CD-ROM ou pendrive. Este é um item que cabe ser combinado no início do programa e deve ser ajustado aos recursos e contextos dos participantes.

 

Monitoramento e Controle: Aplicação de Instrumentos e Análise de Dados

Considerando que a presença efetiva nas palestras introdutórias foi de, em média, 63% dos inscritos (500 pessoas no total), recomenda-se abrir de 20% a 35% de vagas adicionais à quantidade de assentos disponíveis no local onde será ofertada, para melhor aproveitamento do espaço. A adesão ao curso de extensão pelos participantes da palestra tem sido de 55%, em média. Pela experiência, sugere-se a impressão dos formulários de inscrição no curso de extensão (Termo de Compromisso e avaliação clínica) na proporção de 60% da capacidade do espaço (ex.: para um espaço de 80 vagas, disponibilizar cerca de 50 formulários de cada tipo). Considerando o espaço das salas de grupo, cada curso MBP contou, em média, com 14 participantes. Recomenda-se que o espaço tenha tamanho de 2m2 por participante, limitando-se um total de 20 pessoas por curso.

As idades dos participantes variaram entre 20 e 55 anos, sendo a média de 25,1 anos. Quanto ao sexo, 72% eram do sexo feminino e 28% do sexo masculino. Tais dados encontram respaldo em um estudo representativo realizado com a população dos Estados Unidos que indicou que 19% da população adulta praticavam algum tipo de meditação, sendo o sexo feminino, e a idade mais jovem preditores da prática (Macinko & Upchurch, 2019).

Os cinco cursos tiveram a conclusão de 57 participantes considerando a frequência mínima de 80% nos encontros, resultando em uma taxa de desistência de aproximadamente 20% consistente com a literatura (Liu, Sun, & Zhong, 2018). A adesão aos programas de oito semanas foi equivalente ao programa de cinco semanas. Dos participantes que não concluíram o programa, 50% desistiram até a quarta sessão, 33% desistiram após a quinta sessão e 17% desistiram após a sexta ou sétima sessão.

Quanto à desistência, os alunos tinham o direito de deixar de participar do curso a qualquer momento e sem a necessidade de informar justificativas, apenas comunicando a decisão. Os poucos participantes que espontaneamente justificaram sua desistência relataram ter dificuldades em conciliar a participação nas sessões e a prática entre elas com as demandas acadêmica. Outros motivos também foram questões familiares, como o retorno para a residência familiar, localizada em outro município ou estado, durante períodos de interrupção de aulas ou entre feriados, e a evasão escolar.

Como resultado dos MBPs, os relatos dos participantes indicam uma mudança na forma de se relacionar com a experiência, extrapolando a vida acadêmica e impactando também a vida pessoal no relacionamento com amigos e família. Os relatos também mencionaram que a formação do grupo, incluindo as orientações para garantir segurança, sigilo, confidencialidade, abertura e aceitação durante as sessões do curso, e o compartilhamento de experiência entre os participantes, criou um ambiente de confiança e acolhimento, sendo crucial para o aprendizado individual.

Sobre a prática pessoal entre sessões, dos 55 alunos que preencheram a avaliação pós-curso, 31% declararam ter praticado de um a dois dias por semana, 53% praticaram de três a quatro dias por semana e 16% declararam ter praticado de quatro a sete dias por semana. A maioria (38%) declarou que sua prática teve uma duração média de 10 a 19 minutos; 13% declararam uma duração média de prática entre 20 e 29 minutos, 20% entre 30 e 39 minutos, 2% entre 40 e 49 minutos; 20% tiveram uma prática com duração média inferior a 10 minutos e 7% declararam ter praticado apenas durante os encontros. Uma revisão sistemática sobre a práticas entre sessões com 43 estudos aplicando MBSR e MBCT em 1.427 participantes reportou uma estimativa geral de 29 minutos de prática em seis dias por semana, mas houve heterogeneidade substancial nesta estimativa (C. E. Parsons, Crane, L. J. Parsons, Fjorback, & Kuyken, 2017).

Há indícios de que a personalidade do participante também pode ser um preditor do uso das técnicas de mindfulness durante e após o programa. Um estudo sobre a relação das cinco dimensões da personalidade (big five) com o uso das técnicas de MBSR durante e após o programa verificou que socialização (agreeableness) e abertura (openness) foram preditores da prática. Socialização estava primariamente relacionada com o uso das técnicas durante o programa, e abertura (openness) estava relacionada com o uso das técnicas durante e após o MBSR, sugerindo que a personalidade poderia explicar a manutenção da prática (Barkan et al., 2016).

As dificuldades em participar das sessões ou para realizar as tarefas de casa estavam relacionadas à falta de tempo, advinda das demandas acadêmicas ou da gestão pessoal. Apesar disso, 95% declararam ser provável ou muito provável a manutenção da prática pessoal após o término do MBP, enquanto 5% declararam ser pouco provável. Essa estimativa de intenção quanto à manutenção da prática é superior ao encontrado em um ensaio clínico aleatório realizado com 55 participantes, que reportou uma redução na duração média da prática (de 23 minutos durante o MBP, para 16 minutos após o MBP) e na porcentagem de dias de prática (de 76% durante o MBP, para 55% após o MBP) (Ribeiro, Atchley, & Oken, 2018).

Com relação à satisfação geral com o programa, 98% dos participantes declararam-se satisfeitos ou muito satisfeitos com o MBP tanto de cinco quanto de oito semanas. Quanto à duração do programa, 64% dos participantes do programa de cinco semanas consideraram pouco tempo de duração total (incluindo sessões e atividades), enquanto 89% dos participantes do programa de oito semanas avaliaram a duração do programa como adequada.

A percepção da facilitadora é a de que o programa de oito semanas diferiu no vínculo entre os participantes, possibilitando partilhas de experiência mais ricas. Além disso, os relatos finais dos participantes no programa de oito semanas detalharam as atitudes e os efeitos conhecidos de MBPs em mais profundidade e com exemplos. Tais relatos incluíram temas como aceitação e não julgamento da experiência que está acontecendo, consciência e percepção de sensações físicas, autorregulação ao perceber pensamentos ansiosos ou impulsos surgirem e reavaliação da situação para buscar formas diferentes de agir.

Por sua vez, os relatos da experiência ao final do programa de cinco semanas o referenciaram sob uma perspectiva mais conceitual, como uma oportunidade para conhecer mais sobre o tema, servindo como ponto de partida para aprofundar o conhecimento e a prática de mindfulness. Outro ponto citado foi a estrutura de grupo, que ofereceu suporte e perspectivas diferentes sobre a experiência direta advinda da prática. Quando mencionados, as atitudes ou os efeitos do MBP foram menos detalhados ou exemplificados, se comparado aos relatos decorrentes dos programas de oito semanas.

 

Encerramento: Lições Aprendidas

Após cada MBP, os dados coletados através dos formulários e questionários foram consolidados, elaborando-se o relatório final do curso de extensão. O relatório foi enviado através do SIGPEX para a aprovação da coordenação de extensão do Departamento. A aprovação do relatório final no sistema encerrou a ação, liberando a emissão dos certificados de participação em curso de extensão aos participantes que concluíram o programa em acordo com o Termo de Compromisso. Os certificados de participação foram emitidos em até um mês após o término das atividades de extensão. Ao final do projeto de extensão, o encerramento também foi realizado no SIGPEX, submetendo relatório com os resultados finais do projeto, bem como as produções científicas decorrentes da realização do mesmo.

A realização de intervenções no contexto universitário apresenta uma série de desafios. O contexto da universidade pública é diretamente influenciado pelo cenário sócio-político-cultural, sendo que mobilizações diversas podem afetar a realização da atividade. Recomenda-se prever casos de paralização das atividades por uma ou mais semanas, reservando-se espaço para, pelo menos, 10% de datas além do previsto. Infraestrutura física e de materiais também podem constituir fatores de desafio e impactar a agenda das sessões.

O tamanho do espaço físico limitou a participação de uma quantidade maior de alunos, que poderia chegar a 20 por curso. Entende-se, também, que nem todas as instituições de ensino contam com salas de grupo ou clínicas-escola. Portanto, adaptações podem ser necessárias. Por exemplo: a técnica de escaneamento corporal, que tradicionalmente é feita deitada, também pode ser realizada sentada; a prática de caminhada mindful pode ser realizada em ambiente externo, desde que seja garantida a segurança e a integridade dos participantes.

Este projeto não teve subsídios financeiros, sendo o custo de material, especialmente para a impressão de formulários, um encargo da coordenação da ação. A obtenção de apoio financeiro por editais universitários para produção de materiais pode ser um fator facilitador para a oferta do curso. No presente projeto, o trabalho foi voluntário e não houve auxílio financeiro para custos. Além do custo de formação e das sessões de supervisão da facilitadora, deve-se contabilizar também o custo-hora de iniciação, planejamento, execução, monitoramento e encerramento do projeto e dos eventos. Para a palestra informativa, considerou-se cerca de dez horas desde o registro da ação até o encerramento e emissão de certificados. Para um MBP com duração de oito semanas, considerou-se cerca de 70 horas desde o registro da ação, incluindo entrevistas de triagem, condução do programa em si, análise dos dados pré/pós e encerramento da ação. Para MBP de cinco semanas, cerca de 45 horas contemplam as mesmas etapas.

A disponibilidade de recursos tecnológicos é proveitosa para inscrição e avaliação da palestra introdutória (que tem caráter opcional). Contudo, recomenda-se o preenchimento em formulário impresso de todos os instrumentos pré/pós-curso de extensão. Sua posterior tabulação nos aplicativos de análise estatística de dados deve ser considerada no planejamento do cronograma da ação. Recomenda-se o preenchimento dos instrumentos pré-curso imediatamente no início da primeira sessão e dos pós-curso ao término da última sessão, garantindo a maior adesão e correto preenchimento dos mesmos.

Ao longo das cinco intervenções, a adesão ao programa, a frequência de aulas e a percepção da eficácia por parte da instrutora foi aumentando. Essa experiência encontra respaldo nas recomendações de Crane e colegas (2014) sobre o ensino de programas de mindfulness. A cada curso, a instrutora (que também conduziu cursos particulares externos à universidade) aprimorou habilidades no ensino de MBPs. O processo de supervisão foi essencial, havendo a percepção de uma relação positiva entre a experiência do supervisor e a habilidade de entregar conteúdos e práticas em cada sessão.

Um dos benefícios acadêmicos da participação em eventos de extensão é a possibilidade de validação de carga horária-curricular para os alunos da graduação. Outro benefício acadêmico ligado ao propósito ensino-extensão é que, para os alunos da área da saúde que desejam utilizar técnicas ou ministrar programas de mindfulness em sua prática profissional futura, o curso de extensão pode servir como o primeiro contato com a intervenção, consistindo em um dos pré-requisitos para programas de formação de instrutores de MBPs.

Considera-se que a condução do grupo em cada programa de mindfulness ofereceu suporte social necessário ao aprendizado, criando um ambiente seguro para o desenvolvimento de novas habilidades psicológicas e sociais. Como resultado dos MBPs, os relatos dos participantes indicam uma mudança na forma de se relacionar com as experiências, extrapolando a vida acadêmica e impactando também a vida pessoal no relacionamento com amigos e família. Além disso, os depoimentos dos participantes ao longo das sessões são consistentes com os relatados da literatura (Kabat-Zinn, 2017; Segal et al., 2013) sobre a percepção do processo metacognitivo ao avaliar as situações e as experiências, influenciando na forma de lidar com fatores estressores e agindo com autocuidado.

Há indícios em literatura de que alunos no fim do curso de graduação apresentam mais sintomas de ansiedade e depressão do que alunos no início, e ações de integração logo no começo da graduação também são importantes para o acolhimento do estudante (Beiter et al., 2015). A partir desta constatação, é necessário pensar a oferta de intervenções para o desenvolvimento de habilidades psicológicas e sociais com diferentes formatos e focos, aplicadas em diferentes momentos da vida acadêmica.

Cabe considerar também a variação de idade entre os participantes. Embora não tenha sido analisada estatisticamente a relação entre idade e benefícios percebidos, deve-se considerar a diferença de idade entre calouros e veteranos, adaptando-se a didática das intervenções também às faixas-etária. Já com relação ao sexo, não foi observada nenhuma particularidade que leve a concluir sobre necessidades específicas na condução.

A revisão de literatura sobre prevalência de ansiedade, depressão e estresse em estudantes apresenta dados relativos, em sua maioria, aos cursos de graduação nas áreas da saúde. Talvez isso se deva, em parte, ao fato de que o conhecimento sobre saúde mental inerente ao currículo de cursos como medicina, enfermagem e psicologia fomente o interesse sobre a incidência de sintomas na população acadêmica e estratégias de manejo e prevenção. Contudo, a experiência deste projeto de extensão indica elevada procura dos MBPs por parte de alunos dos cursos de engenharia e de outros. Devido à falta de estudos sobre saúde mental na população acadêmica dos cursos de engenharias, não é possível generalizar as características dessa demanda para outras universidades, mas cabe a reflexão sobre o potencial benefício para alunos também de outras áreas, não sendo exclusivo para os cursos de saúde.

 

Considerações Finais

Considerando a prevalência de estresse, depressão, ansiedade e outros sintomas e transtornos mentais na população acadêmica, esta experiência sugere que os MBPs podem ser uma alternativa para promoção da saúde nesta população, através do aprendizado de estratégias de enfrentamento, de autorregulação emocional e cognitiva, e da redução de sintomas. Cabe notar que a ação de extensão não visa "levar a universidade a substituir funções de responsabilidade do Estado, mas sim produzir saberes, tanto científicos e tecnológicos quanto artísticos e filosóficos, tornando-os acessíveis à população" (Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras & Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação, 2000).

Por fim, destaca-se a relevância de ministrar o programa de mindfulness atendendo às recomendações de ensino dos respectivos currículos, pois os resultados esperados relatados na literatura científica podem estar relacionados à fidelidade da intervenção. A fidelidade ao currículo também favorece a condução adequada e o encadeamento das práticas e atividades, a fim de que estas estejam bem articuladas e no tempo certo, com o devido suporte teórico e experiencial de um facilitador. Neste sentido, também se destaca a importância de que os MBPs sejam conduzidos por profissionais habilitados e capacitados a reproduzirem tais programas.

 

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Endereço para correspondência
Mariana Ladeira de Azevedo
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Recebido em: 13/12/2019
Reformulado em: 17/06/2020
Aceito em: 06/07/2020

 

 

Notas

* Mestra em Psicologia, integrante do Laboratório de Psicologia Cognitiva Básica e Aplicada.
** Professora do Departamento de Psicologia da UFSC, coordenadora do Laboratório de Psicologia Cognitiva Básica e Aplicada.

 

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