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Revista Brasileira de Terapias Cognitivas
versão impressa ISSN 1808-5687versão On-line ISSN 1982-3746
Rev. bras.ter. cogn. vol.12 no.2 Rio de Janeiro dez. 2016
https://doi.org/10.5935/1808-5687.20160019
ARTIGOS DE REVISÃO
TCC e as funções executivas em crianças com TDAH
CBT and executive functions in children with TDAH
Simone Pletz Ribeiro
Mestre em Educação - (Psicóloga clínica ) - Florianópolis - SP - Brasil. Psicóloga clínica, Psicopedagoga (UNISUL), Pós-graduada em Terapia Cognitivo-Comportamental (ICTC), Mestre em Educação (UFSC). simone.pletz.ribeiro@gmail.com.br
RESUMO
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade é um transtorno do desenvolvimento cujos sintomas ocasionam dificuldades na vida pessoal e interpessoal. Em crianças, compromete sua vida funcional com reflexos diretos no contexto escolar, ocasionando problemas de aprendizagem. Além de fatores genéticos, traços biológicos e sociais estão correlacionados ao desenvolvimento do transtorno. O presente artigo faz uma revisão das principais técnicas voltadas à modificação do comportamento, baseadas na Terapia Cognitivo Comportamental, e que servem de apoio ao trabalho terapêutico com pacientes portadores do transtorno. Estas técnicas objetivam instrumentalizar o paciente ao enfrentamento dos conflitos, desenvolvendo algumas funções importantes como: a atenção, o planejamento e a resolução de problemas, diretamente relacionadas às funções executivas, que se mostram precárias em pacientes que apresentam déficits atencionais. Existem evidências na literatura especializada que a aplicação destas técnicas sugerem ganhos no desenvolvimento das funções executivas.
Palavras-chave: Terapia cognitivo comportamental; Funções executivas; Tdah
ABSTRACT
Attention Deficit Hyperactivity Disorder is a developmental disorder whose symptoms cause difficulties in personal and interpersonal life. In children, it compromises their functional life with direct reflexes in the school context, causing learning problems. In addition to genetic factors, biological and social traits are correlated to the development of the disorder. This article reviews the main behavioral modification techniques, based on Cognitive Behavioral Therapy, that support the therapeutic work with patients with the disorder. These techniques aim at instrumentalizing the patient to face conflicts, developing some important functions such as: attention, planning and problem solving, directly related to executive functions, which are precarious in patients who present with attention deficits. There is evidence in the specialized literature that the application of these techniques suggests gains in the development of executive functions.
Keywords: Cognitive behavioral therapy; Executive functions; Tdah
INTRODUÇÃO
Atualmente, tem se discutido a respeito do uso de diagnósticos psiquiátricos em crianças para justificar problemas de aprendizado, de comportamento ou ainda de dificuldades na educação familiar. As diversas informações na mídia tornaram conhecidos os sintomas de vários transtornos, entre eles, o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Este transtorno tem sido utilizado como um bom exemplo para justificar o comportamento de crianças sem limites ou cheias de energia, no entanto, ele não pode ser atribuído à criança apenas por ela apresentar comportamentos agitados ou desatentos em determinadas situações.
No processo de construção do diagnóstico, além dos sintomas típicos como a desatenção e/ou a hiperatividade persistentes, é importante atentar para as alterações do funcionamento cognitivo que interferem diretamente nas funções executivas, na linguagem e nas habilidades motoras que constituem parte do quadro e que ficam evidenciadas, especialmente, no contexto escolar (Ribeiro, 2013).
Neste sentido, este artigo teórico tem por objetivo elencar e refletir sobre algumas técnicas de intervenção em crianças que apresentam Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, baseadas na Terapia Cognitivo-Comportamental, que trabalhem aspectos considerados necessários e importantes para o desenvolvimento das funções executivas, sem a pretensão de eleger um melhor tratamento nem de esgotar a discussão. Para tanto, inicialmente será feita uma rápida passagem pela definição e pela caracterização do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade.
O TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE NA INFÂNCIA E SUAS CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS
O Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) surgiu no século XX, como o primeiro transtorno psiquiátrico a ser diagnosticado e tratado em crianças. Diversos autores o consideram como um transtorno neurocomportamental, com início na infância e que acomete cerca de 3% a 6% das crianças em idade escolar. A prevalência maior em meninos do que em meninas se dá em função dos sintomas de hiperatividade e impulsividade serem mais facilmente percebidos pelos familiares no sexo masculino. Acredita-se que ao redor do mundo o transtorno pode afetar cerca de 8% a 12% das crianças (Barkley, 2008; Malloy-Diniz, Alvarenga, Abreu, Fuentes & Leite, 2011).
Este transtorno tem um grande impacto na vida familiar, escolar e social da criança (Benczik, 2010), pois causa prejuízos no desempenho escolar, no funcionamento intelectual, nas habilidades sociais e no funcionamento ocupacional (Gattás, 2014). Os sintomas de TDAH podem perdurar até a idade adulta, causando prejuízos educacionais, ocupacionais e interpessoais, por isso, torna-se importante a identificação precoce de pacientes com este transtorno e o encaminhamento a um tratamento adequado (Benczik, 2010; Ribeiro, 2013).
Historicamente, um aumento de diagnóstico de qualquer transtorno pode vir acompanhado de questionamentos acerca de um possível modismo, no entanto, o TDAH é amplamente estudado no âmbito científico, sendo reconhecido na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), da Organização Mundial da Saúde (OMS, 1993). Portanto, o aumento do número de diagnóstico do transtorno pode estar associado a uma maior difusão do conhecimento e não apenas a um mero modismo.
Sintomatologia e diagnóstico
A característica principal do Transtorno de Déficit de Atenção / Hiperatividade é um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade mais frequente do que aquele observado em crianças de mesma idade e fase de desenvolvimento (Benczik, 2010). Barkley (2008) aponta que os sintomas do TDAH, na criança, surgem nos primeiros anos de vida e ocorrem em diversas situações. O autor ainda explica que a inquietação motora e os períodos reduzidos de atenção ficam aquém das expectativas para a sua idade, geralmente apresentam imaturidade, assim como uma diferença entre o nível cognitivo e os problemas de autocontrole.
Além disso, as crianças podem apresentar má articulação e fala desorganizada, implicando dificuldades na organização do pensamento e das respostas; podem também apresentar dificuldades na coordenação motora fina, ocasionando problemas com a qualidade da escrita (Anderson, 2002). Estes sintomas se tornam mais evidentes quando a criança ingressa na escola, mas é importante ressaltar que nem todas as crianças apresentam problemas em todas as áreas, podendo variar na diversidade da sua manifestação e nos sintomas (Benczik, 2010).
De acordo com o DSM-5-Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (APA, 2014), o TDAH é caracterizado pela presença de seis ou mais sintomas de desatenção e/ou seis ou mais sintomas de hiperatividade/impulsividade que devem ter estado presentes em um período de, no mínimo, seis meses, em grau mal-adaptativo e inconsistente com o nível de desenvolvimento, em crianças antes dos doze anos de idade, e constatados em mais de um contexto. A apresentação atual do transtorno pode ser caracterizada da seguinte forma: com predomínio da desatenção, com predomínio da hiperatividade/impulsividade e combinada, além de ser classificada como leve, moderada e grave, dependendo do grau de comprometimento que os sintomas causam na vida do paciente. Silva (2009) ainda reforça que uma pessoa com este transtorno pode ou não apresentar a hiperatividade física, mas jamais deixará de apresentar forte tendência à desatenção.
Um dos desafios para o diagnóstico e tratamento corretos do TDAH está relacionado à alta frequência de comorbidades. Estima-se que cerca de 70% dos pacientes com TDAH apresentem, pelo menos, um diagnóstico comórbido, que 33% apresentem dois transtornos psiquiátricos e que 18% apresentem três ou mais diagnósticos combinados. Outra dificuldade para o diagnóstico correto é o fato de que os sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade podem aparecer em outros quadros psíquicos, independentemente do diagnóstico da criança. Portanto, ressalta-se a importância da coleta de dados objetivos sobre os sintomas e aspectos comportamentais, além de uma avaliação subjetiva e de um estudo clínico cuidadoso (Gattás, 2014).
Há fortes indícios e aceitação na literatura especializada de que as causas do TDAH são multifatoriais e estejam relacionadas a alterações neuroquímicas, provavelmente de origem genética, com a contribuição de fatores ambientais ao seu desenvolvimento. Além disso, traumatismos neonatais, baixo peso no nascimento, tabagismo e etilismo da mãe na gravidez também estão correlacionados ao TDAH (Benczik, 2010; Gattás, 2014; Ribeiro, 2013).
Tratamento
O tratamento do TDAH deve envolver uma abordagem multidisciplinar, associando o uso de medicamentos a intervenções psicoeducativas e psicoterapêuticas (Teixeira, 2013). Nesse sentido, entende-se que uma avaliação detalhada do paciente, de sua família, do ambiente e a aplicação do tratamento adequado pode proporcionar ao paciente um desenvolvimento global positivo muito mais do que apenas o controle dos seus sintomas (Ribeiro, 2013).
Os medicamentos de primeira escolha para o tratamento psicofarmacológico disponíveis no mercado brasileiro são o metilfenidato e a lisdexanfetamina, sendo que o primeiro é o mais utilizado, capaz de reduzir a hiperatividade e a desatenção e, com isso, proporcionar um melhor funcionamento social, acadêmico e comportamental (Gattás, 2014; Ribeiro, 2013; Teixeira, 2013). No entanto, Benczik (2010) e Ribeiro (2103) apontam alguns possíveis efeitos colaterais desse medicamento, que podem levar o paciente a dores abdominais, insônia, perda de apetite, cefaleia, ansiedade e crises de irritabilidade. Apesar dos desconfortos causados pelo uso do medicamento, cerca de 70% dos pacientes tratados com psicofarmacoterápicos apresentam melhoras comportamentais significativas (Gattás, 2014), reduzindo os prejuízos diários que o transtorno causa ao longo da vida do paciente (Malloy-Diniz et al., 2011).
As intervenções psicoeducativas se referem à educação e à aprendizagem de pais, professores e paciente acerca do transtorno, para que possam praticar estratégias de manejo dos sintomas de modo a promover mudanças na rotina (Teixeira, 2013).
Já as intervenções psicoterapêuticas atuam nas relações do paciente com o contexto no qual está inserido. Nesse sentido, a Terapia Cognitivo-Comportamental, além de identificar as crenças centrais do paciente, relacionadas aos sentimentos de fracassos recorrentes ocasionados pelo transtorno, também pode contribuir para o desenvolvimento do autocontrole, da recuperação da autoestima, da regulação da atenção e da resolução de problemas, proporcionando mudanças efetivas de modo a favorecer certa qualidade de vida ao paciente e à sua família. Além disso, possibilita a reversão de quadros de ansiedade e depressão, resultantes de vivências de rejeição, fracasso e exclusão social (Ribeiro, 2103; Teixeira, 2013).
O paciente TDAH no contexto social
As principais queixas em crianças portadoras do TDAH costumam estar relacionadas ao mau desempenho acadêmico, ao mau comportamento ou a dificuldades de relacionamento social, que se destacam especialmente no ambiente escolar.
Manifestando-se sobre o assunto, Ribeiro (2013) comenta que as dificuldades relativas à escola e à aprendizagem, decorrentes do transtorno, tornam-se problema para o portador quando ele depende desses resultados para ter aprovação social e familiar. A autora ainda enfatiza que essas crianças não apresentam comprometimento da sua capacidade intelectual, mas a desatenção e a inquietação se tornam impedimentos importantes para que a aprendizagem ocorra com sucesso.
Outro ponto importante a considerar é como os sintomas do TDAH afetam o relacionamento com outras crianças, fora do contexto escolar, uma vez que a impulsividade, a inquietação e a inabilidade em aceitar regras e combinados dificultam a participação nas atividades sociais, gerando rejeição por parte dos amigos e, consequentemente, favorecendo o isolamento social e comprometendo o desenvolvimento sadio das habilidades sociais nessas crianças (Mattos, 2001). Estas experiências podem gerar distorções na tríade cognitiva (em sua visão de mundo, de si mesmas e das outras pessoas), acarretando prejuízos não somente no âmbito social, mas também no âmbito emocional, além de favorecer o desenvolvimento de comorbidades (Malloy-Diniz et al., 2011).
IMPLICAÇÕES COGNITIVAS NOS PACIENTES COM TDAH
Um aspecto importante na caracterização clínica do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade está relacionado aos prejuízos cognitivos específicos que são comuns aos portadores do transtorno e que se referem às dificuldades na memória de trabalho, na fluência verbal, na flexibilidade cognitiva e no controle inibitório (Malloy-Diniz et al., 2011). Em seus estudos, Barkley (2008) define o TDAH como uma desordem neurogenética do sistema executivo do cérebro, o que tem sido corroborado por autores, como Biederman et al. (2006) e Rohde e Mattos (2013). Estes autores sugerem problemas nas funções executivas envolvendo o controle inibitório, a capacidade de planejamento, a organização, a flexibilidade mental e a atenção sustentada.
Dentro desta perspectiva, é importante desenvolver o conceito de funções executivas e sua complexa rede de interferência, para que se possa compreender melhor o fundamental papel que ocupa no desenvolvimento de uma criança portadora do TDAH.
Matlin (2003) aborda o conceito de executivo central como uma função responsável por integrar informações provenientes do circuito fonológico, do campo visuo-espacial, das memórias de trabalho e de longo prazo. Ao mesmo tempo reforça que esse executivo desempenha um papel importante na atenção, uma vez que planeja estratégias e coordena comportamentos, separando informações pertinentes e irrelevantes, auxiliando a pessoa a decidir e a manejar o que fazer e o que não fazer, de modo que não se afaste do objetivo inicial.
Por sua vez, Cosenza e Guerra (2011) definem as funções executivas como aquelas que permitem ao indivíduo interagir com o mundo em diferentes contextos e situações. Elas são essenciais para garantir o sucesso de suas ações no dia-a-dia e estão presentes nas tarefas rotineiras, em decisões e planejamentos de curto e de longo prazo. Ainda possibilitam a organização do pensamento, a adequação às normas sociais com padrão comportamental apropriado, o resgate de experiências e conhecimentos armazenados na memória, as expectativas em relação ao futuro respeitando os valores e propósitos individuais. Ao mesmo tempo elas direcionam o indivíduo a atingir o objetivo, estabelecendo estratégias de comportamentos para que a ação seja finalizada, de maneira objetiva, porém flexível.
Os autores Cosenza e Guerra (2011) ainda apontam evidências que relacionam a execução dessas funções à porção anterior do córtex pré-frontal. Esta região demora a amadurecer ao longo do desenvolvimento infantil e vai se modificando até o final da adolescência, ou seja, tais funções não estão totalmente desenvolvidas até o início da vida adulta. Assim, as funções executivas são fundamentais para o sucesso escolar, em todas as etapas de educação, mas é preciso compreender que o processo de aprimoramento dessas funções é contínuo, se desenvolvendo paulatinamente.
Dando sua contribuição ao tema, Gattás (2014) reforça que as funções executivas incluem inibição, memória de trabalho, flexibilidade mental, controle de interferências, planejamento e atenção sustentada. O que corrobora o conceito de funções executivas, definido por Lezak, Howieson e Loring (2004) como a capacidade que permite ao indivíduo manter um comportamento de autorregulação intencional e independente.
As funções executivas possuem um sistema neural distribuído, onde o córtex pré-frontal desempenha um papel importante, mediando diferentes aspectos envolvidos no funcionamento executivo. Este córtex pré-frontal apresenta níveis de especialização funcional, significando que cada um de seus sistemas neurais está envolvido com aspectos cognitivos e comportamentais específicos. As funções executivas desenvolvem-se de modo mais intenso entre os seis e oito anos, atingindo seu ápice por volta dos vinte anos. Este longo processo de amadurecimento faz com que a interação do indivíduo com o meio molde as redes neurais que sustentam o funcionamento executivo (Fuentes, Malloy-Diniz, Camargo & Cosenza, 2008).
Estudos de neuroimagem funcional e estrutural mostraram pacientes diagnosticados com TDAH com pequenas reduções de volume na área do córtex pré-frontal, região onde se localizam essas funções executivas, além de identificar que as substâncias químicas chamadas de neurotransmissores (principalmente dopamina e noradrenalina) sofreram alterações de quantidade no cérebro desses pacientes (Benczik, 2010). Por sua vez, estudos que utilizam o metilfenidato indicam que o uso desta medicação aumenta a quantidade dessas substâncias no cérebro fazendo com que os sintomas diminuam (Ribeiro, 2013).
As funções executivas, comprometidas nos pacientes que apresentam TDAH, são determinantes para o desenvolvimento dos problemas e das dificuldades que as crianças enfrentam no mundo contemporâneo, uma vez que precisam lidar assertivamente com um grande número de informações e atividades num intervalo de tempo cada vez menor (Malloy-Diniz et al., 2011). Diante desse panorama e com estas dificuldades, as crianças com TDAH podem ser rotuladas como desobedientes e inconvenientes, sem conseguir se adaptar e corresponder adequadamente ao contexto (Benczik, 2010).
TÉCNICAS DE MODIFICAÇÃO DO COMPORTAMENTO QUE AUXILIAM NO DESENVOLVIMENTO DAS FUNÇÕES EXECUTIVAS EM PACIENTES COM TDAH
Atualmente, diversas técnicas de intervenção cognitiva vêm sendo desenvolvidas e utilizadas com sucesso, desde o seu surgimento, no final da década de 60. Pesquisas avaliam a viabilidade do uso da Terapia Cognitivo-Comportamental para o tratamento de diversos transtornos, entre eles, o TDAH, com o objetivo de oferecer à criança ferramentas para desenvolver as funções de controle executivo, em que se incluem estratégias de autocontrole, parar e pensar em alternativas e o treinamento de resolução de problemas, por exemplo. Desta forma, é importante oportunizar para a criança técnicas cujas aplicações sejam trabalhadas por meio da brincadeira e do desenho, de modo que haja um aprendizado experiencial, ou seja, que a criança aprenda por meio da ação e possa aplicá-la em seu cotidiano (Bunge, Gomar & Mandil, 2012).
As técnicas de modificação de comportamento que têm como objetivo trabalhar as funções do controle executivo são úteis nos transtornos externalizantes, pois, além de serem direcionadas ao exercício destas funções, ainda desenvolvem o interesse e a motivação da criança no enfrentamento dos problemas (Bunge et al., 2012).
O TDAH apresenta prejuízos na atenção e no controle de comportamentos impulsivos, que afetam a noção de competência social e de controle da própria vida, e podem gerar pensamentos automáticos, capazes de causar comportamentos mal-adaptativos, porém não estão necessariamente ligados a esquemas básicos ou crenças disfuncionais. Neste sentido, a abordagem da terapia cognitivo-comportamental é eficaz ao enfocar o controle e a inibição da impulsividade, gerando ajustes dos processos da atenção assim como do seu direcionamento (Malloy-Diniz et al., 2011).
O plano de tratamento e a escolha das técnicas a serem aplicadas devem levar em consideração o prejuízo dos sintomas, as comorbidades, a motivação do paciente e a disposição da família. Assim, apesar da Terapia Cognitivo-Comportamental utilizar um modelo estruturado e focado no problema, é importante que exista a flexibilidade para ajustar o tratamento e o uso das técnicas conforme a realidade do paciente e de sua família (Lyszkowski & Rohde, 2008).
Várias técnicas de Terapia Cognitivo-Comportamental têm sido utilizadas para o manejo de TDAH, entre elas, podem ser citadas: o treinamento de solução de problemas, a repetição e verbalização de instruções, as atividades interpessoais orientadas, o treinamento de habilidades sociais e as técnicas de contingências de reforço.
O treinamento de solução de problemas envolve estratégias de enfrentamento favorecendo as habilidades de autogerenciamento e autorregulação, uma vez que aumenta a flexibilidade na escolha de alternativas, analisando o custo e o benefício de determinada ação. A técnica de repetição de instruções leva o paciente a criar uma regra utilizando uma estratégia de execução mais elaborada que será repetida como forma de controle de atitudes impulsivas. O treino em habilidades sociais auxilia o paciente a ser mais assertivo e a evitar comportamentos desadaptativos, fazendo com que possa avaliar as consequências de seus atos (Malloy-Diniz et al., 2011).
Uma das técnicas conhecidas proposta por Barkley (2002) sugere sete passos para o treinamento do autocontrole e da busca de soluções, levando a criança a se tornar o agente da própria mudança. Esses passos são descritos a seguir:
a) definir claramente o problema;
b) definir qual é o objetivo pretendido e qual a alternativa desejada para a solução do problema;
c) listar as possíveis alternativas para resolver o problema;
d) avaliar de 1 a 10 cada opção que represente, desde a mais negativa até a mais positiva;
e) selecionar a melhor opção e colocá-la em prática por uma semana ou pelo tempo que for necessário; caso a opção não dê certo, praticar as outras opções listadas até que o problema possa ser resolvido;
f) estar aberto a discordar; caso a tentativa inicial não der certo, ser honesto para aceitar as falhas e buscar outras opções para solucionar o problema;
g) cumprir o plano e avaliar os resultados.
Outra técnica bastante tradicional para o manejo de portadores do transtorno é o programa proposto por Kendall (1992), que envolve o uso de técnicas de solução de problemas associado à autoinstrução e ao treinamento de habilidades sociais. Neste programa, num primeiro momento, o paciente identifica o que deve ser feito, ou seja, define qual é o problema a ser enfrentado. A partir disso, elenca as suas características para, no momento seguinte, identificar quais possibilidades de solução existem para o problema. Após estas etapas, o paciente escolhe qual ação lhe parece mais eficiente para resolver o problema, de modo que entenda o custo e o benefício de tal ação. Para finalizar, o paciente coloca em prática a alternativa escolhida e avalia sua eficácia. Dessa forma, o programa trabalha duas dificuldades cognitivas encontradas nos pacientes com o transtorno, que são: a impulsividade e a inflexibilidade cognitiva. Estas dificuldades impedem o paciente de agir de maneira controlada e de considerar diversas alternativas para solucionar os problemas (Malloy-Diniz et al., 2011).
A seguir, apresenta-se a síntese do Programa Pare e Pense, de Kendall (1992), explicado resumidamente em etapas:
a) Vamos começar! Nesta sessão, o terapeuta ensina algumas regras básicas do programa, como: o sistema de pontos; a lista de reforçadores e a pontuação equivalente à obtenção de cada um deles; as regras do banco "Pare e Pense"; o custo de resposta e a pontuação por autoavaliação.
b) Seguindo as instruções. Etapa que envolve o treinamento de habilidades necessárias para a solução de problemas com tarefas em que a criança deve seguir instruções.
c) Múltiplas tarefas. Nessa etapa, trabalha-se o uso de tarefas mais elaboradas que envolvam o raciocínio verbal.
d) Matemática. Utilizam-se os passos de solução de problemas para resolver questões de raciocínio lógico matemático.
e) O que é mais? O que é menos? Etapa em que se desenvolve a internalização gradativa das regras de solução de problemas.
f) Busca de palavras. Etapa de incentivo do uso das estratégias de solução de problemas em oposição àquelas baseadas em tentativa e erro.
g) Traga a sua própria atividade. Nessa etapa as estratégias são utilizadas em questões específicas em que o paciente apresente maiores dificuldades.
h) Jogo de damas. Nesse momento, a criança é encorajada a aplicar os passos de solução de problemas em atividades estruturadas de contato interpessoal. São tarefas com objetivos bem definidos, instruções a serem seguidas e recebimento de reforço por execução.
i) Gato e rato. Nessa etapa, a criança treina a aplicação dos passos de solução de problemas em novas tarefas interpessoais, sendo encorajada a identificar problemas de seu cotidiano.
j-l) Reconhecendo e lidando com as emoções. Etapa em que é trabalhada a identificação das emoções e sentimentos, de modo que o paciente entenda como elas podem influenciar a forma de lidar com os problemas.
m-n) Identificando as consequências dos comportamentos. Momento em que o terapeuta leva o paciente a pensar em alternativas abstratas para problemas variados e a avaliar as suas consequências.
o-p) Simulação de situações reais. São apresentadas situações simuladas de problemas cotidianos para que a criança represente a solução mais adequada, permitindo generalizações para situações da vida real.
q) Você é o expert! O terapeuta incentiva o paciente a elaborar um comercial sobre o programa Pare e Pense, explorando as suas ideias sobre o programa.
r) Revisão do programa. Revisão das atividades que precisam ser mais elaboradas ou em que a criança teve mais dificuldade.
s-t) Fazendo comercial. Nessa etapa, a criança é incentivada a mostrar para outras crianças o que aprendeu com o programa. Há a troca final dos pontos pelo prêmio, recebimento de um certificado de conclusão e discussão das necessidades relacionadas à aplicação futura das técnicas de solução de problemas (Artigas-Pallarés, 2009).
A técnica de solução de problemas é muito utilizada em pacientes que apresentam o TDAH, porque atua diretamente no déficit do controle inibitório, que caracteriza o agir antes de pensar. Knapp, Johannpeter, Lyszkowski e Rohde (2003) sugerem que, se as etapas de identificar o problema, de pensar em soluções para resolvê-lo, de avaliar as consequências dessas soluções, de escolher uma delas para colocar em prática, e por fim, de avaliar o resultado forem cumpridas, podem estimular o paciente a pensar de modo diferente e a considerar alternativas de resposta para a melhora do problema.
Assim, a terapia com crianças deve levar a uma ação em seu próprio meio, de modo que ela possa resolver os problemas que enfrenta cotidianamente. Crianças com TDAH geralmente apresentam um repertório escasso de alternativas para resolver problemas e, na maioria das vezes, repetem comportamentos disfuncionais, repercutindo nos problemas diários (Peres, 2014). Dessa forma, as estratégias para o controle de impulsos são úteis para o exercício das funções executivas pouco desenvolvidas, ou seja, parar e pensar antes de agir em situações de conflito e buscar alternativas para resolver problemas. Então, treinando-se estas habilidades, treina-se o pensamento antes da ação (Bunge et al., 2012; Lyszkowski & Rohde, 2008).
Um bom exemplo para desenvolver estas funções também pode ser obtido por meio do treino do Exercício do Semáforo, que desperta o interesse e a motivação para a criança enfrentar o problema. De posse de um cartão com um semáforo, a criança pode levá-lo para os lugares e recorrer a ele em momentos de tensão, quando precisa parar e pensar sobre qual a melhor alternativa para resolver o impasse em que se encontra. No momento que estiver confuso, despenderá um tempo para ver a luz vermelha e esperar um pouco (parar). Depois, pensará em possíveis formas de resolver as coisas visualizando a luz amarela (pensar em alternativas). Quando estiver preparada para se concentrar na luz verde, colocará em prática a ação escolhida (escolher a melhor alternativa e realizá-la) (Bunge et al., 2012). Ou seja, na luz vermelha o paciente é orientado a que pare um instante e respire duas vezes; na luz amarela, que pense três formas diferentes de solucionar o problema; e, por fim, na luz verde o paciente é incentivado a escolher a alternativa mais adequada para que possa colocar em prática.
Ainda com relação às técnicas, Doyle (2006) indica a técnica cognitiva "Stop, Pull Back, Evaluate, Act, and Reevaluate" (SPEAR) para o controle da impulsividade em adultos, mas que também pode ser utilizada em crianças, e que resumidamente inclui: parar, avaliar, agir e reavaliar. Assim, com esta sequência, em situações em que o paciente agiria impulsivamente, poderia aprender a controlar suas reações por meio de treinos com o terapeuta para colocar em prática em situações do cotidiano.
Outra técnica, a da Autoinstrução, aplicada ao TDAH pode ajudar a modelar o comportamento, uma vez que o terapeuta serve de modelo para que o paciente possa treinar comportamentos assertivos em situações complexas. Esta técnica deve ser repetida diversas vezes e em várias situações para que o paciente possa internalizar os comportamentos adequados. Ela envolve algumas etapas descritas a seguir:
a) o terapeuta ocupa o papel de protagonista em alguma tarefa e fala em voz alta enquanto o paciente observa;
b) o paciente repete a tarefa instruindo-se em voz alta;
c) o terapeuta modela o comportamento do paciente sussurrando as instruções;
d) o paciente repete a tarefa sussurrando as instruções;
e) o terapeuta faz a tarefa com as instruções internalizadas;
f) o paciente repete a tarefa utilizando as instruções internalizadas (Lyszkowski & Rohde, 2008).
O sistema de recompensas é outra técnica utilizada para descondicionar comportamentos disfuncionais. Esta técnica visa premiar comportamentos adequados do paciente por meio da utilização de reforçadores positivos para que o comportamento esperado aconteça. Em pacientes com TDAH, a motivação interna necessita ser trabalhada, primeiramente, com estímulos externos, para que, num segundo momento, o paciente desenvolva a motivação própria para completar e finalizar as tarefas. Este sistema funciona basicamente com a elaboração de uma lista de problemas e uma lista de recompensas. Os critérios a serem avaliados são definidos com o auxílio do terapeuta, atribuindo-se valores diferenciados. Conforme os resultados são alcançados, o paciente pode fazer a permuta por algum item da lista de recompensas. Escolhe-se um problema para resolver e nas próximas semanas segue-se com a observação do problema escolhido e inclui-se mais um até que todos os problemas da lista tenham sido trabalhados (Friedberg & McClure, 2004).
Estas técnicas ajudam a criança a controlar seus impulsos para ter clareza sobre o problema que enfrenta, aumentando a probabilidade de obter bons resultados. Elas ainda levam a criança a entender que entrar em um acordo ou em uma discussão depende de fatores que nem sempre estão sob o seu controle, ou ainda que, às vezes, não se consegue chegar ao acordo ideal ou à solução que se espera. Em outras situações, deverá se conformar com a melhor solução possível ou a solução menos ruim, trabalhando também a tolerância à frustração (Bunge et al., 2012).
Apesar de não ser o foco deste artigo, é importante citar o treinamento de pais e professores como uma ferramenta auxiliar de intervenção junto às crianças com TDAH. Como os prejuízos decorrentes do transtorno em crianças aparecem mais no contexto escolar e familiar, é produtivo conciliar as técnicas de modificação de comportamento trabalhadas na terapia com esses programas de treinamento de pais e professores. Este tipo de treinamento, de um modo em geral, enfoca a psicoeducação dos pais para que sejam esclarecidos sobre o transtorno e sejam auxiliados a criar tarefas estruturadas que possam ser aplicadas no cotidiano da criança (Malloy-Diniz et al., 2011).
As intervenções em ambientes variados aliados a Terapia Cognitivo- Comportamental oportunizam à criança portadora do transtorno trabalhar suas dificuldades de maneira mais consistente, persistindo na busca de resultados positivos permanentes.
DISCUSSÃO
Pesquisas recentes indicam que as estratégias psicoterápicas que promovem os melhores resultados para o controle dos sintomas do TDAH são as intervenções baseadas na Terapia Cognitivo-Comportamental (Benczik, 2010). Carvalho e Souza (2014) reforçam que elas são tão efetivas quanto o uso de medicação e, quando associadas ao tratamento medicamentoso, apresentam resultados ainda melhores, de modo que tais terapias permitem até a redução do uso desses medicamentos.
Bunge, Gomar e Mandil (2012) afirmam que as técnicas de modificação de comportamento são viáveis para o trabalho terapêutico e oportunizam ganhos concretos principalmente em crianças que apresentam o TDAH, uma vez que elas podem apresentar déficits na adaptabilidade, na tolerância à frustração e na resolução de problemas, os quais seriam produto das dificuldades nas funções executivas, na regulação das emoções, nas habilidades de processamento verbal, na flexibilidade cognitiva e nas habilidades sociais.
Para Diamond (2012) as funções executivas são as habilidades que envolvem três grandes eixos como: a memória operacional com a função de memorizar as informações e trabalhar mentalmente com elas; o controle inibitório que é importante para controlar o comportamento diante de impulsos e emoções, de modo a não agir de forma inadequada; e a flexibilidade cognitiva que está relacionada a capacidade de encontrar novas formas de pensar sobre um problema de modo a nos ajustarmos às mudanças. A partir desses eixos são construídas as outras habilidades de ordem superior, como o raciocínio, a capacidade de resolução de problemas e o planejamento. Elas são essenciais para o sucesso na escola, no trabalho, nas amizades e no casamento, além de importantíssimas para a nossa saúde física e mental, ou seja, para a qualidade de vida.
Nesse sentido, estes aspectos descritos podem ser observados nas técnicas de modificação de comportamento baseadas na Terapia Cognitivo Comportamental que, de modo geral, enfocam a identificação do problema e trabalham estratégias para a sua resolução e, consequentemente, auxiliam no desenvolvimento das funções executivas. Diamond (2012) ressalta que os programas que terão mais sucesso no desenvolvimento das funções executivas são aqueles que criam desafios, além de trazerem alegria e orgulho para as crianças, dando a sensação de inclusão e integração social, por isso o envolvimento da criança e sua noção de sucesso, advindo do reforçamento positivo, é tão importante para que as técnicas realmente funcionem. O uso dessas técnicas para o treinamento das funções executivas pode dar a oportunidade para a criança se igualar às demais e não ficar para trás. Do contrário, o não atendimento das necessidades emocionais, sociais ou físicas acaba resultando um baixo desenvolvimento das funções executivas.
Além da escolha adequada da técnica que vise à modificação de comportamento, é importante que se realize a psicoeducação com a criança e com o seu meio social. É fundamental ao processo que ela compreenda o porquê de apresentar dificuldades de atenção, impulsividade e outros problemas que a levam a fracassar frente às expectativas do ambiente. É importante ainda que ela aprenda noções básicas do TDAH para que possa identificar suas dificuldades diárias, além de compreender o conceito de diferenças individuais e do ritmo próprio que cada ser humano apresenta, entendendo que muitas crianças passam por essa mesma situação. Mas por outro lado, é preciso reforçar à criança que ela não deve usar o transtorno para justificar todos os seus comportamentos (Benczik, 2010). Limites e valores são bem vindos e contribuem positivamente para a adequação da criança ao seu meio, se trabalhados adequadamente pela família e pela escola.
A família acaba tendo papel fundamental no reforçamento das técnicas aprendidas pela criança, para que ela possa aplicá-las em diversos contextos e efetivar mudanças em seus comportamentos. Por isso Diamond (2012) enfatiza que a repetição é fundamental, pois é preciso continuar o estímulo ao desenvolvimento das funções executivas a medida que as crianças apresentam melhoras, senão os ganhos serão limitados. Ou seja, a melhoria nas funções executivas depende do tempo gasto no trabalho dessas habilidades, de modo que haja uma força interna e externa para melhorar, mas nem sempre há o engajamento da família e do meio social na persistência para a repetição o que acaba por comprometer o sucesso do trabalho terapêutico.
CONCLUSÃO
Entende-se que o comportamento das crianças, nos primeiros anos de vida, é marcado por traços de impulsividade, com o pensamento voltado para o concreto e facilmente distraído por estímulos externos, mas no decorrer do seu desenvolvimento elas se tornam capazes de avaliar os problemas e planejar suas ações, identificando erros e sendo capazes de fazer as devidas correções para conseguir atingir os objetivos, fazer um planejamento e então lidar com as frustrações resultantes de suas ações.
Assim, as funções executivas, que vão amadurecendo ao longo do desenvolvimento, são responsáveis pela capacidade de autorregulação no indivíduo, especialmente em situações novas ou que exijam adaptação ou flexibilidade para lidar com as demandas de determinada situação como, por exemplo, a aprendizagem escolar. Mas este processo não acontece naturalmente com as crianças portadoras do TDAH. Por isto é que as técnicas da Terapia Cognitivo-Comportamental atuam diretamente no exercício dessas ações, de modo a treinar o indivíduo a lidar com os processos inibitórios, a desenvolver pensamentos mais flexíveis, a desempenhar tarefas de planejamento e o exercício da tolerância à frustração, e assim controlar as suas emoções, especialmente a raiva, expressada através de condutas agressivas.
Lidar com o stress e as situações de fracasso, tão presentes na vida do portador de TDAH e das famílias, é fator desestimulante para a continuidade do tratamento fora do círculo terapêutico. Um trabalho de parceria entre a família e a escola é imprescindível, pois a dificuldade de regular o comportamento da criança nestes espaços pode levar erroneamente ao uso indiscriminado de medicação para a busca de resultados imediatos e tranquilizadores, mas que na verdade só se revelará apenas como um paliativo. Portanto, para promover o desenvolvimento cognitivo constante e consistente do paciente é preciso psicoeducar e preparar muito bem os pais e professores para seguirem como monitores/mediadores de modo a incentivar e engajar a criança no processo de mudança comportamental para que ela mesma possa aos poucos ir detectando erros, corrigindo-os e ajustando comportamentos. Todos têm papel fundamental neste processo, pois quando há o trabalho em conjunto há também uma melhora visível na interação da criança, na motivação para mudança o que leva, consequentemente, a uma diminuição do uso de práticas disciplinares. Quando a criança se sente socialmente integrada e pertencente a um grupo, ela consegue lidar com os pensamentos e as emoções de maneira mais clara e criativa, e assim, exercer melhor a autorregulação.
Estes comportamentos em crianças, especialmente nos transtornos externalizantes, como o TDAH, implicam problemas no nível das relações e do aprendizado, ideia que é reforçada por Lyszkowski e Rohde (2008) quando indicam as intervenções baseadas na Terapia Cognitivo-Comportamental, que buscam o ensino de novas capacidades cognitivas e comportamentais para que as falhas na capacidade de planejamento, na solução de problemas, no autocontrole e nos relacionamentos interpessoais possam ser superadas.
Dessa forma, as técnicas de modificação de comportamento, baseadas na Terapia Cognitivo-Comportamental, ajudam o paciente a aprender estratégias de resolução de problemas, a desenvolver a autorregulação, a manejar adequadamente o tempo, a desenvolver a organização, a incrementar suas habilidades sociais, além de obter um maior controle sobre as emoções, especialmente sobre as emoções negativas. Redirecionando sua atenção, o paciente consegue reestruturar suas crenças e, consequentemente, mudar seu modo de pensar e agir, desenvolvendo comportamentos mais adaptativos e assertivos.
Geralmente, os pacientes portadores do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade carregam uma história de sofrimento, com uma visão negativa e incapacitante de si mesmos, ficando desgastados cognitivamente e emocionalmente pelas críticas e reclamações frequentes provenientes dos seus familiares e do seu entorno social. Os pensamentos de desvalia, de desamor e os comportamentos condicionados mal adaptativos podem ser suprimidos ou amenizados pelo treinamento das técnicas para que estes pacientes experimentem benefícios através da modificação das suas atitudes e consigam ganhos comportamentais que possam reproduzir pelo resto de suas vidas, com uma vida mais feliz e repleta de conquistas.
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Correspondência:
Simone Pletz Ribeiro
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Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBTC em 27 de março de 2017. cod. 497
Artigo aceito em 06 de março de 2018
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