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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.64 no.3 Rio de Janeiro dez. 2012

 

ARTIGOS

 

Habilidades sociais e administração de tempo no manejo do estresse

 

Social skills and time management on stress handling

 

Habilidades sociales y administración del tiempo en manejo del estrés

 

 

Carla Fernanda de Sousa PellegriniI; Sandra Leal CalaisII; Manoel Henrique SalgadoIII

IEspecialista em Psicologia da Saúde. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Bauru. Estado de São Paulo. Brasil
IIDocente. Programa de PósGraduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Bauru. Estado de São Paulo. Brasil
IIIDocente. Departamento de Engenharia de Produção. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Bauru. Estado de São Paulo. Brasil

Endereços para correspondência

 

 


RESUMO

Recentes pesquisas sugerem as habilidades sociais e o gerenciamento do tempo como variáveis de controle do estresse. Para investigar as relações entre essas variáveis e o estresse, foi conduzido um estudo descritivo com uma amostra de conveniência. Oitenta e três universitários primeiranistas, de ambos os sexos, dos cursos de Biologia, Engenharia Civil e Psicologia, responderam aos inventários de Estresse (ISSL), de Habilidades Sociais (IHS) e um inventário adaptado de Administração de Tempo (ADT). Salientase que a metodologia de adaptação utilizada foi o sistema proporcional, não baseado em critérios rigorosos de psicometria, o que pode causar alteração da configuração do instrumento e dos dados dele advindos. A maioria dos participantes ficou abaixo da média para habilidades sociais, e 72,29% "administram mal e mediocremente o tempo". O índice de estresse encontrado foi de 48,19%. O déficit em habilidades sociais foi associado à má administração de tempo, e houve correlação entre má administração de tempo e presença de estresse. Não houve relação estatística entre estresse e déficit em habilidades sociais. Os estudantes de Engenharia Civil tiveram o menor índice de estresse e o maior déficit em uma categoria de habilidades sociais.

Palavras-chave: Habilidades sociais; Administração de tempo; Estresse; Universitários.


ABSTRACT

Recent searches suggest that social skills and time management as control variables of stress. In order to analyze possible relations between these variables and stress, it was done a descriptive study with a sample of convenience. Eighty three freshmen students, both of gender, of Biology, Civil Engineering and Psychology answered the Stress Inventory (ISSL), Social Skills Inventory (IHS) and a Time Management Inventory adaptation (ADT). It is emphasized that methodology of adaptation, the pro rata system, was not based on high standards of psychometry, which can lead to change of configuration of the instrument and the data it provides. The most of participants were under the media in Social Skills and 72,29% "manage badly the time". The stress rate was 48,19%. It was found connection between bad time management and stress and the lack of social skills was associated to bad time management. There wasn't statistic connection between stress and social skills lack. Students in Civil Engineering had the smaller stress rate, as well as the bigger lack of a Social Skills category.

Keywords: Social skills; Time management; Stress; College students.


RESUMEN

Las investigaciones recientes sugieren las habilidades sociales y el manejo del tiempo como variables de control del estrés. Para investigar la relación entre estas variables y el estrés se realizó un estudio descriptivo con una muestra de conveniencia. Ochenta y tres universitarios de primer año, ambos los sexos, cursos de Biología, Ingeniería Civil y Psicología, responderan a los inventarios de estrés (LSSI), Habilidades Sociales (IHS) y Administración del Tiempo (ADT, adaptado). Cabe señalar que la metodología utilizada fue el sistema proporcional, que no presenta criterios rigurosos de psicometría, el que puede causar el cambio en la configuración del instrumento y los datos procedentes de él. La mayoría de los participantes estaba abajo del promedio de las habilidades sociales y 72,29% "manejan poco y mal el tiempo". El índice de estrés se encontró al 48,19%. El déficit en habilidades sociales se asoció con mal manejo del tiempo y la correlación entre la mala administración del tiempo y la presencia de estrés. No hubo ninguna relación estadística entre el estrés y el déficit en habilidades sociales. Los estudiantes de Ingeniería Civil tuvo el menor índice de estrés y el déficit más grande en una categoría de Habilidades Sociales.

Palabras-clave: Habilidades sociales; Administración del tiempo; Estrés; Estudiantes universitarios.


 

 

Nos últimos anos, o estresse tem sido objeto de estudo de muitos pesquisadores, uma vez evidenciada sua relação com a saúde. Para entender essa relação é necessário conhecer o conceito de estresse.

Conforme aponta Lipp (2004), foi o artigo sobre a Síndrome do Estresse, publicado na revista Nature pelo fisiologista canadense Hans Selye, em 1936, que introduziu o termo estresse na área da saúde. Segundo França e Rodrigues (1997), esse termo vem do campo da física e significa o grau de deformidade que uma estrutura sofre ao ser submetida a uma força. Selye transportou o termo para as ciências biológicas e, de acordo com Silva (2000), definiu estresse por reações do organismo vivo submetido a situação que exige esforço para sua adaptação.

Para Lipp (2004), estresse refere-se ao processo de alterações psicofisiológicas dos organismos, como resposta a situações percebidas pelo sujeito como ameaçadoras da homeostase. Essas situações podem amedrontar, irritar, excitar ou até tornar a pessoa eufórica - uma vez rompido o equilíbrio interno, impõem necessidade de adaptação e retorno à homeostase. Na busca pelo reequilíbrio, esforços são despendidos para eliminar a fonte estressora ou enfrentála de forma adequada. Para tanto, o corpo se prepara para lutar ou fugir da situação estressora por meio dessas alterações psicofisiológicas que funcionam como estratégias de defesa.

Selye postulou um modelo trifásico do estresse em 1952; em extensão, Lipp propôs o modelo quadrifásico em 2000. Os três estágios de estresse apontados por Selye são: alarme, resistência e exaustão. No estágio de alarme, em ratos, ele observou alterações fisiológicas como o aumento e hiperatividade do córtex das suprarrenais, a diminuição do timo, baço e nódulos linfáticos e o surgimento de úlceras no estômago e intestinos. Passada a fase de alarme, o organismo que não se adapta passa à fase de resistência, e não havendo ainda adaptação, o organismo entra em exaustão, não podendo mais resistir (Selye, 1956).

Durante a padronização do Inventário de Sintomas de Estresse para Adultos, Lipp (2000a) propôs uma fase intermediária à resistência e exaustão e a chamou de quaseexaustão. Para a autora, as quatro fases do estresse são: alerta, resistência, quase-exaustão e exaustão. Na fase de alerta, iniciase o mecanismo de luta ou fuga, pela produção de noradrenalina e adrenalina, que aumentam a energia e a motivação. Na resistência, o organismo gasta bastante energia, porém passa a acumular parte dela para resistir; a sensação de cansaço é presente nesta fase do estresse. As defesas começam a ceder na fase de quase-exaustão, oscilando entre momentos de resistência e de não resistência, quando algumas doenças começam a surgir. Na fase de exaustão, observase aumento das estruturas linfáticas, exaustão física e psicológica, podendo culminar com a morte.

As alterações que caracterizam o estresse são amplamente estudadas pelos pesquisadores do tema, e alguns autores, como Deffenbacher e Suinn (1987) e Suinn e Deffenbacher (1980), descrevem o processo de forma mais detalhada, dividindo-o em três níveis: autonômic-ofisiológico, somático-comportamental e cognitivo-afetivo. Para Margis, Picon, Cosner e Silveira (2003), as alterações do estresse se dão nos níveis cognitivo, comportamental e fisiológico. O nível cognitivo diz respeito à avaliação sobre o grau de ameaça que dado estímulo oferece à pessoa. Inicialmente ocorre na dimensão afetiva (pela ativação do sistema límbico), e de acordo com o repertório comportamental são avaliadas as capacidades de enfrentamento (no tálamo e córtex) que auxiliam na seleção da resposta ao estressor, mobilizando então os recursos comportamentais e fisiológicos em função dessa escolha. Esse postulado é corroborado por Storch, Gaab, Küttel, Stüssi e Fend (2007), porquanto defendem que a avaliação subjetiva influencia as respostas emocionais, biológicas e comportamentais ao estresse.

No nível comportamental, existem três respostas básicas aos estressores: enfrentamento, evitação ou passividade. A resposta selecionada, por sua vez, define os recursos fisiológicos a serem mobilizados. No nível fisiológico, o hipotálamo coordena alterações cardiovasculares (elevação da pressão arterial, taquicardia, vasodilatação nos músculos estriados e vasoconstrição na pele e vísceras), com liberação de adrenalina pelas suprarrenais. Essas alterações aumentam a oxigenação dos músculos e do cérebro, além de evitar sangramentos em caso de ferimentos superficiais, pois o sangue se concentra nos músculos, e não na pele. Para aumentar a captação de oxigênio, ocorre a dilatação dos brônquios e taquipneia, sendo o oxigênio transportado pelo sistema circulatório mais rapidamente. Quando a ameaça está sob controle, a superprodução de adrenalina cessa. Porém, se a ameaça persiste, ocorre aumento da glicogênese (Margis et al., 2003).

A duração e a frequência desses mecanismos fisiológicos podem ocasionar esgotamento dos recursos do sujeito e o aparecimento de transtornos psicofisiológicos diversos. Posto que a ativação do eixo hipotálamopituitárioadrenal em toda situação de estresse afeta o sistema imunológico, como afirmaram Sapolsky, Romero e Munck (2000), invariavelmente ocorre imunodepressão. Embora, para esses autores, a liberação dos hormônios do eixo hipotálamopituitárioadrenal auxilie no reequilíbrio durante o estresse, a recorrente liberação desses hormônios acarreta prejuízos para a saúde, conforme constataram McEwen (1998) e Seeman, McEwen, Rowe e Singer (2001). Dessa forma, o estresse, que não é uma doença, pode propiciar a ocasião para o desenvolvimento de hipertensão, cardiopatias, diabetes, ansiedade, depressão e toda sorte de patologias, uma vez que muitas doenças se relacionam com falha do sistema imunológico. Conforme Lipp (2000b), o que determina o órgão ou sistema a ser afetado ("órgão de choque") é a predisposição genética.

Sabendo que o estresse, ao reduzir a defesa imunológica, torna o organismo vulnerável ao desenvolvimento e manutenção de somatizações, faz-se imprescindível o estudo das variáveis que possam controlá-lo - fatores de proteção ou de enfrentamento da situação estressora. Para tanto, devemse conhecer os estímulos que podem determinar o estresse.

Segundo Lipp (2004), os eventos só se tornam estressores para uma pessoa se ela assim os interpretar. Afora os estressores universais (frio, dor, calor, entre outros), a maioria dos estressores não é comum a todas as pessoas. Por isso, embora alguns pesquisadores (Araújo, Ferreira, Paone, Silva, & Ventura, 2008; Pereira et al., 2004) apontem o alarmante índice de estresse de 90% na população mundial, divulgado pela Organização Mundial de Saúde, estudos nacionais mostram resultados bastante variados. Lipp (1996) encontrou 32% de pessoas estressadas em uma amostra com mais de 1.800 pessoas. Algumas populações mais propensas ao estresse, como prévestibulandos (Calais, Andrade, & Lipp, 2003; Peruzzo et al., 2008) e juízes do trabalho (Lipp & Tanganelli, 2002), apresentaram níveis de 83% e 61,7% (prévestibulandos, respectivamente) e 71% (juízes do trabalho). Os professores pesquisados por Goulart Júnior e Lipp (2008) tiveram 56,6% de estresse, e estudantes de Medicina apresentaram 49,7%, segundo Sâmia Mustafa Aguiar, A. P. G. F. Vieira, K. M. F. Vieira, Sabrine Mustafa Aguiar e Nóbrega (2009). Isso permite concluir que a mesma condição - de trabalho, por exemplo - pode ser estressante para algumas pessoas e não para outras.

Alguns dados sobre o estresse são mais constantes, como a prevalência no sexo feminino (Sâmia Mustafa Aguiar et al., 2009; Areias & Guimarães, 2004; Calais et al., 2003; Calais, Carrara, Brum, Batista, Yamada, & Oliveira, 2007; Costa, Accioly Júnior, Oliveira & Maia, 2007; ElGilany, Amr, Awadalla, & ElKhawaga, 2008; Lipp, Pereira, Floksztrumpf, Muniz, & Ismael, 1996; Souza & Menezes, 2005) dos sintomas psicológicos (Costa et al., 2007; Peruzzo et al., 2008) e da fase de resistência (Costa et al., 2007; Lipp & Tanganelli, 2002; Peruzzo et al., 2008). A maior incidência de estresse nas mulheres ocorre, segundo Seeman (1997), em função da ciclicidade dos hormônios femininos estrogênio e progesterona, que aumentam as respostas de estresse. Porém, há que se considerarem também os fatores psicossociais, como a sobrecarga de tarefas, conhecida como "dupla jornada" feminina (trabalho e família). Calais et al. (2003) citam pesquisas sobre o tema mostrando que a diferença sexual quanto à vulnerabilidade ao estresse é muito específica, dependendo do tipo de estressor envolvido, não devendo, portanto, ser generalizada.

Para Lazarus e Folkman (1984) e Spielberger (1979), os estressores são entendidos como eventos internos e externos, sendo os segundos influenciados pelos primeiros. Para esses autores, os estressores internos seriam os pensamentos, emoções, valores, enfim, as atividades cognitivas de interpretação dos eventos ambientais. Assim, o tipo de avaliação cognitiva sobre o estressor externo, bem como a resposta selecionada (enfrentamento, fuga ou passividade), podem constituir-se como fontes adicionais de estresse ou de prevenção a ele.

Margis et al. (2003) classificam os estressores em dependentes e independentes, sendo os primeiros dependentes da relação do sujeito com o meio (comportamento) e sua postura nas relações interpessoais, nas quais seu próprio comportamento pode ser desfavorável (aversivo) para si. Os eventos estressores independentes seriam os eventos ambientais que rompem a homeostase corporal. Porém, estes sempre são influenciados pelos dependentes, uma vez que todo processo de estresse passa pela avaliação da ameaça potencial do estressor, ou seja, embora a dor seja um estressor para todas as pessoas, a avaliação das capacidades de resistir ou enfrentála altera seu valor aversivo. A percepção da ameaça estaria ligada a fatores filogenéticos, ontogenéticos e culturais, e a avaliação da capacidade de enfrentála estaria condicionada ao repertório comportamental do sujeito, remetendo a sua história pessoal de reforçamento negativo, ou seja, seus sucessos e fracassos em evitar ou reduzir estímulos aversivos.

A tentativa de controle dos estímulos estressores é conhecida pelo termo enfrentamento (do inglês coping), sendo descrito por Lazarus e Folkman (1984) como esforços para administrar demandas, conflitos e pressões que excedem aos recursos pessoais. Esses autores identificaram duas estratégias de enfrentamento, a focada na emoção (postura passiva diante do estressor) e a focada no problema (postura ativa frente ao estressor). A estratégia focada na emoção (expressão de sentimentos negativos, como chorar) é considerada por Scheier, Weintraub e Carver (1986), Snow, Swan, Raghavan, Connell e Klein (2003) e Soderstrom, Dolbier, Leiferman e Steinhardt, (2000) como eficaz quando o estressor é breve ou não pode ser modificado, porém em relação a estressores de longo prazo está associada a maior risco de doenças do que a técnica focada no problema. Estratégias focadas no problema visam mudar ou eliminar os estressores ou seus efeitos. Algumas pesquisas, de acordo com Scheier et al. (1986), sugerem que o uso de estratégias focadas na emoção impede o uso de estratégias focadas no problema. Desta maneira, as intervenções de manejo de estresse envolvem o treino de estratégias focalizadas no problema por intermédio da identificação e alteração dos estressores ou seus efeitos. Segundo Murphy (1996), os programas de manejo de estresse se enquadram em cinco diferentes categorias, de acordo com as técnicas utilizadas: relaxamento muscular progressivo, meditação, biofeedback, treinamento de habilidades cognitivo-comportamentais e uma combinação entre essas técnicas.

O treinamento de habilidades sociais é uma das estratégias focadas no problema e corrobora a afirmação de Lazarus e Folkman (1984) de que as interações sociais mais satisfatórias diminuem o estresse. Baseados nessas relações, pesquisadores do estresse demonstraram correlação entre nível elevado deste e déficit em habilidades sociais, como, por exemplo, Ayres (1996), Furtado, Falcone e Clark (2003), Lipp e Rocha (1994) e Maciel (1996), estabelecendo as habilidades sociais como uma variável importante no manejo do estresse - o que foi confirmado por estudos experimentais de treinamento dessas habilidades, resultando em diminuição do nível de estresse, como os de Lipp (1996) e Murta (2007). O déficit nessas habilidades seria considerado como um estressor dependente, portanto passível de mudança e controle pelo próprio sujeito, condicionando os estressores internos, que seriam os pensamentos, valores, regras e a própria avaliação do evento como estressor ou não, bem como sua capacidade para enfrentá-lo ou resistir-lhe.

Segundo Murta (2005), as habilidades sociais são comportamentos necessários a uma relação interpessoal bemsucedida, conforme parâmetros típicos de cada cultura e contexto, incluindo comportamentos de iniciar, manter e finalizar conversas; fazer e responder perguntas; falar em público; expressar sentimentos positivos e negativos; defender os próprios direitos; pedir favores; recusar pedidos; cumprir deveres; aceitar elogios; expressar opiniões pessoais, inclusive discordantes; expressar de forma justificada o incômodo, desagrado ou enfado; admitir erro e/ou desculparse; solicitar mudança no comportamento alheio; lidar com críticas e elogios, dentre outros. Esses comportamentos são importantes em diversos tipos de situações sociais: na família, no trabalho, em locais de consumo e lazer, transportes coletivos e ocasiões formais.

A aquisição de habilidades sociais amplia a percepção da pessoa sobre sua competência, estabelecendo a autoconfiança em resolver problemas, ou seja, responder adequadamente aos estressores sociais. Assim, elas se estabelecem como variáveis importantes no controle do estresse.

Além do treinamento em habilidades sociais, alguns grupos de controle de estresse ocupacional têm abordado o manejo de tempo em intervenções multimodais, como Murta (2007) e Van Der Heck e Plomp (1997), sugerindo que este seja uma variável importante no manejo de estresse. A administração de tempo pode ser entendida como a habilidade para planejar quais atividades devem ser realizadas, como cumprilas e quando fazêlas (Maher, 1981). Esse planejamento envolve o estabelecimento de prioridades, ou seja, as atividades que tenham grau considerável de importância e urgência determinarão as metas e, a partir delas, as estratégias para alcançá-las.

Correlações entre estresse e administração de tempo são encontradas em estudos com trabalhadores e estudantes universitários (Macan, 1994; Macan, Shahani, Dipboye & Phillips, 1990), que apontam que ter maior controle sobre o tempo torna as pessoas menos estressadas, mais eficientes e mais satisfeitas, sofrendo menos tensão somática. Dessa forma, o déficit em comportamentos de administração de tempo tem sido considerado uma fonte de estresse e de baixo desempenho acadêmico (Longman & Atkinson, 1988; Walter & Siebert, 1981), por se relacionar com sobrecarga, tensão no trabalho e tensão somática.

Em seu estudo sobre estresse, administração de tempo e desempenho acadêmico, Macan et al. (1990) verificaram que os estudantes que relataram maior estruturação e sentido no uso do tempo demonstraram bemestar psicológico, otimismo sobre o futuro, hábitos mais eficientes de estudo, menos sintomas físicos, menos depressão e desesperança. Esse dado está em consonância com a literatura sobre estresse, que descreve a administração de tempo como uma forma de diminuir o nível de estresse e ampliar a eficiência, satisfação e saúde (Schuler, 1979). A análise desse estudo revelou que as medidas de desempenho acadêmico e estresse se relacionam mais significativamente com o fator Percepção do controle do tempo do que com os fatores Estabelecer metas e prioridades (analisando necessidades e desejos) e Listar coisas a fazer. Esse sentimento de controle do tempo ligase à autoeficácia, saber dizer não (uma das citadas habilidades sociais) e interromper atividades não produtivas, entre outros comportamentos investigados por Britton e Tesser (1991).

A eficaz administração de tempo, porém, pode estar relacionada a outros fatores, além do treinamento em estabelecer metas e listar atividades a serem distribuídas no tempo. Um estudo sobre procrastinação em universitários (Solomon & Rothblum, 1984) indica que os fatores Medo de falhar e Aversividade da tarefa estão mais fortemente associados com o comportamento de procrastinar. Esses fatores correlacionaramse significativamente com medidas de autorrelato para depressão, crenças irracionais, baixa autoestima, ansiedade e baixa assertividade, ou seja, fatores relacionados com estresse. Isso indica que a procrastinação não envolve apenas hábitos de estudo ou administração de tempo, mas a percepção sobre autoeficácia, condicionada à interação da pessoa com seus ambientes e seu histórico em enfrentar estressores, como, por exemplo, ser habilidosa socialmente.

Sendo as habilidades sociais e a administração de tempo estratégias de resolução de problemas, podem ser consideradas como respostas de enfrentamento ao estresse. Isso corrobora o postulado de Storch et al. (2007) sobre a prevenção de consequências adversas das respostas biológicas ao estresse, por meio de intervenções que influenciem a percepção da ameaça, uma vez que a aquisição dessas habilidades deve diminuir a aversividade do estressor, tornando a pessoa capaz de enfrentálo.

Determinados grupos podem ser mais suscetíveis ao estresse, como os universitários calouros perante as novas demandas desse momento de vida: mudar de cidade, morar sem a família, com pessoas desconhecidas - "república" -, estar cursando nível superior, assumir novas responsabilidades, como administrar a organização de sua rotina, alimentação, limpeza, contas a pagar, além de conciliar essa nova realidade com outras atividades, como cursos extracurriculares e emprego. Certamente são situações que requerem adaptação e geram estresse, como sustentou o estudo de Misra e McKean (2000), confirmando o maior nível de estresse, em universitários, nos dois primeiros anos de graduação, quando é nítido o aumento de responsabilidade e de competitividade associadas a ansiedade e estresse.

Tendo em vista a relação do estresse com a saúde, o presente estudo fundamentouse na possível correlação das variáveis habilidades sociais, administração de tempo e estresse em calouros universitários.

 

Método

Participantes

Participaram da pesquisa, em uma amostra de conveniência, 100 estudantes universitários primeiranistas, de uma universidade pública paulista, dos cursos de Biologia, Engenharia Civil e Psicologia. Desses, 16 deixaram de responder a alguma das questões, invalidando assim seus dados, e um participante ficou muito além da média de idade, restando 83 sujeitos.

Instrumentos

Para a coleta de dados foram utilizados três instrumentos de autorrelato: Inventário de Sintomas de Stress de Lipp - ISSL (Lipp, 2000a), Inventário de Habilidades Sociais - IHS - Del Prette (Z. A. P. Del Prette & A. Del Prette, 2001) e um instrumento adaptado do Inventário de Administração do Tempo - ADT (Krausz, 1994). Todos os instrumentos são originalmente de língua portuguesa (do Brasil), de autores brasileiros, e foram validados para amostras brasileiras. No entanto, o ADT é um instrumento antigo, não é da área da psicologia, e sim da administração, e não foi validado para pesquisas dentro das normas técnicocientíficas atuais, sendo um instrumento mais de levantamento do que de diagnóstico.

O Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (ISSL) é constituído por 53 sintomas, físicos ou psicológicos, e devem ser assinalados se ocorrida sua presença nas últimas 24 horas (15 sintomas), na última semana (15 sintomas) e no último mês (23 sintomas). O resultado do instrumento nos permite verificar a presença de estresse e o nível em que se encontra (alerta, resistência, quaseexaustão ou exaustão), a sintomatologia apresentada e a predominância dos sintomas (física, psicológica ou física e psicológica). Para verificar se o sujeito apresenta sintomas significativos de estresse, avaliase o escore bruto total de respostas por quadro: se no quadro 1 o participante apresenta a soma de sintomas psicológicos e físicos superior a 6, ou no quadro 2 apresenta total superior a 3, ou no quadro 3 apresenta soma maior que 8, é considerado como tendo estresse. Para determinar a fase de estresse na qual se encontra, verificamse as porcentagens correspondentes aos resultados brutos. No Quadro 2, porcentagens de até 50 indicam fase de resistência e acima de 50 indicam fase de quase-exaustão. Para determinar os sintomas predominantes (físicos ou psicológicos), verificase a porcentagem correspondente à fase de estresse em que a pessoa se encontra.

O Inventário de Habilidades Sociais (IHS) contém 38 afirmações, que devem ser avaliadas segundo a ocorrência por uma escala de cinco elementos (nunca ou raramente, com pouca frequência, com regular frequência, muito frequentemente, sempre ou quase sempre). Trinta e uma afirmações pertencem a um dos cinco fatores: (1) Enfrentamento e autoafirmação com risco, (2) Autoafirmação na expressão de sentimento positivo, (3) Conversação e desenvoltura social, (4) Autoexposição a desconhecidos e situações novas e (5) Autocontrole da agressividade; sete itens não se enquadram em nenhum fator. A avaliação do inventário permite identificar o escore de habilidades sociais de modo geral, bem como de cada fator individual. O resultado é dado em escore total e escore por fator, em posição de percentil (01 a 100), sendo avaliado o percentil 50 como repertório médio, de 50 a 75 como bom repertório (acima da média) e de 75 a 100 como repertório bastante elaborado de habilidades sociais. Abaixo de 50, até 25, a classificação é de bom repertório (abaixo da média) e com menos de 25 há indicação para treinamento em habilidade social, se o déficit é uma fonte de problemas.

O Inventário de Administração de Tempo (ADT) é um instrumento composto por 96 questões, divididas em 16 áreas: (A) Planejamento de tempo, (B) Administração por crise, (C) Organização pessoal e autodisciplina no trabalho, (D) Comunicação, (E) Tomada de decisões, (F) Diagnóstico de problemas, (G) Delegação, (H) Capacidade de dizer não, (I) Uso do telefone, (J) Delegação "para cima", (K) Estabelecimento de prioridades, (L) Utilização dos níveis de capacidade do uso do tempo, (M) Perfeccionismo, (N) Estabelecimento de objetivos pessoais, (O) Flexibilidade no trabalho e (P) Capacidade de concentração - sendo seis questões referentes a cada área, com opções de resposta sim ou não. Para a correção, contase um ponto para cada resposta "sim" e nenhum ponto para resposta "não". Esse instrumento permite dois tipos de avaliação: geral e por área. A avaliação geral se baseia no escore total de pontos obtidos, e esse resultado se refere a uma de cinco possíveis classificações: até 16 pontos: administra adequadamente o tempo; de 17 a 36 pontos: administra razoavelmente o tempo; de 37 a 56 pontos: administra mediocremente o tempo; de 57 a 76: administra mal o tempo; de 77 a 96: não administra o tempo. O total de pontos por área pode indicar os seguintes resultados: de 0 a 1 ponto - bom, não apresenta dificuldades nesta área; de 2 a 3 pontos - regular, apresenta alguma dificuldade nesta área; de 4 a 6 pontos - esta área necessita atenção, pois apresenta muitas dificuldades.

O ADT de Rosa Krausz é muito utilizado em empresas, pois se propõe a avaliar a administração de tempo no trabalho. Não tendo sido encontrado na literatura pesquisada outro instrumento que mensure o nível de administração de tempo em atividades que não sejam o trabalho, para esta pesquisa foi adaptado o inventário acima descrito (Figura 1). Para tanto, foram descartadas as questões dos itens I (Uso do telefone), J (Delegação "para cima") e L (Utilização dos níveis de capacidade do uso do tempo). Nos itens A (Planejamento de tempo), B (Administração por crise), C (Organização pessoal e autodisciplina no trabalho), D (Comunicação), E (Tomada de decisões), F (Diagnóstico de problemas), G (Delegação), H (Capacidade de dizer não), K (Estabelecimento de prioridades), M (Perfeccionismo), N (Estabelecimento de bjetivos pessoais), O (Flexibilidade no trabalho) e P (Capacidade de concentração), foram retiradas três questões, permanecendo as três restantes (questões 1, 14 e 27 referentes ao item A; 2, 15 e 28 ao item B; 3, 16 e 29 ao C; 4, 17 e 30 ao D; 5, 18 e 31 ao E; 6, 19 e 32 ao F; 7, 20 e 33 ao G; 8, 21 e 34ao H; 9, 22 e 35ao K; 10, 23 e 36ao M;11,24 e37 ao N; 12, 25e 38ao O;e 13, 26e 39aoP),totalizando 39 afirmações. As questões retiradas eram pertinentes exclusivamente a situações de trabalho e não se adequariam ao comportamento de estudo dos participantes. Dessa forma, neste trabalho, em acordo com seus objetivos, optouse pela classificação geral (escore total de pontos), devido ao cruzamento de dados com os outros instrumentos. Para avaliação dos resultados foi construída uma escala adaptada proporcionalmente ao instrumento original, a qual possibilitou a classificação em três grupos - até 15 pontos: administra razoável ou adequadamente o tempo; de 16 a 31 pontos: administra mal ou mediocremente o tempo; de 32 a 39 pontos: não administra o tempo. No entanto, essa não é a melhor metodologia de adaptação: o sistema proporcional pode levar a vieses no resultado, devido à alteração da configuração do instrumento.

Procedimento

O projeto foi submetido à apreciação do Comitê de Ética de uma universidade pública, recebendo parecer favorável a sua execução (Processo CEP n° 615/46/01/09). O estudo realizado foi descritivo, utilizandose do delineamento survey para fazer um levantamento de dados acerca das variáveis Estresse, Habilidades sociais e Administração de tempo.

A coleta de dados ocorreu nas próprias salas de aula da universidade. Os participantes foram convidados a participar da pesquisa, mediante esclarecimento de seus objetivos e procedimentos, e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, versando sobre o sigilo, a liberdade de participação e o direito de desistir a qualquer momento da pesquisa, de acordo com o Regulamento do Sistema Único de Saúde 2048-09.

 

Análise de dados

Para os dados de habilidades sociais e estresse nas escalas citadas, a dispersão dos dados (encontrada na literatura) nas diversas questões situase no intervalo de 0,93 a 1,40 ponto de desvio padrão. Considerouse o nível de significância de 5% e um poder do teste de 80% para encontrar diferenças entre os grupos.

Os dados coletados foram sumarizados por meio das medidas descritivas usuais (média, mediana, desvio padrão, porcentagem). Para o estudo de correlações entre variáveis, foi considerado o Coeficiente de Spearman R. Nas análises referentes à associação de variáveis categóricas e comparações de proporções, utilizou-se o teste Qui-Quadrado, e nas comparações de grupos optouse pelos testes não paramétricos de Mann Whitney e KruskalWallis, seguidos, quando necessário, do teste pos hoc de Dunn - em vista das características dos dados (escores). Os testes foram realizados utilizandose os softwares MiniTab 13 e Statistica.

 

Resultados

Dos 84 participantes com dados validados, foram descartados os de um participante por ter idade (56 anos) muito discrepante em relação aos outros membros da amostra, que variaram de 17 a 33 (média = 19,31 anos). Assim, a amostra analisada foi composta por 83 participantes, sendo 18 do curso de Biologia, 38 do curso de Engenharia Civil e 27 do curso de Psicologia. Quanto ao sexo, 39 eram mulheres e 44, homens.

Os resultados do Inventário de Sintomas de Stress de Lipp (ISSL) apresentaram diferença estatística (X2 = 16,92; p = 0,000) dos universitários dos cursos de Psicologia e Biologia em relação aos de Engenharia. Os percentuais de estresse dos alunos dos cursos de Psicologia e Biologia foram de 70,37% e 66,67%, respectivamente, enquanto o do curso de Engenharia foi de 23,68%. Destaquese que entre os cursos de Biologia e Psicologia não ocorreu diferença estatisticamente significativa (X2 = 0,069; p = 0,793). Para o IHS total não ocorreu diferença significativa entre os cursos (KruskalWallis; H = 2,47; p = 0,290), bem como quanto ao sexo (MannWhitney; W = 1531,0; p = 0,331).

Considerando-se os dados de toda a amostra, 48,19% dos alunos apresentaram estresse. Dentre estes, 1,2% está na fase de alerta, a maioria (43,37%) está na fase de resistência, e 3,61% na fase de quaseexaustão. A prevalência sintomatológica foi de 65% para sintomas psicológicos, 25% para os físicos e 10% para os físicos e psicológicos. A sintomatologia não diferiu entre os cursos (com a prevalência dos sintomas psicológicos), e 51,81% dos participantes não apresentaram estresse.

Com relação ao sexo, não houve relevância significativa (X2 = 1,99; p = 0,158), porém a porcentagem de homens com estresse foi de 40,91%, enquanto a de mulheres foi de 56,41%. Apenas no curso de Engenharia houve diferença estatística entre sexos (X2 = 4,059; p = 0,044), e o maior índice de estresse foi para o sexo feminino. Em Psicologia e Biologia não houve significância, porém os homens apresentaramse mais estressados, conforme a Tabela 1.

 

 

Em relação às habilidades sociais mensuradas pelo IHS (Z. A. P. Del Prette & A. Del Prette, 2001), a maioria dos participantes ficou abaixo da média (55,42%), e 36,14% foram classificados na categoria "indicação para treino", enquanto apenas 16,87% mostraram ter um repertório bem elaborado. O fator 1 (Enfrentamento e autoafirmação com risco) obteve o escore de 60,24% dos participantes abaixo da média (43,37% indicados para treino). No fator 2 (Autoafirmação na expressão de sentimento positivo), 60,24% dos participantes ficaram abaixo da média (36,14% indicados para treino). Ainda no fator 3 (Conversação e desenvoltura social), a maioria ficou abaixo da média (53,01%), sendo 33,73% indicados para treino. Em relação à Habilidade de autoexposição a desconhecidos e situações novas (fator 4), 42,17% dos participantes ficaram abaixo da média e 25,30% foram indicados ao treino. No fator 5 (Autocontrole da agressividade), 36,15% dos alunos situaramse abaixo da média e 19,28% foram indicados para treino. Comparandose os escores totais do IHS em relação às variáveis sexo e curso, não houve diferença estatística, com X2 = 5,223; p = 0,265 e X2 = 7,556; p = 0,272, respectivamente.

Quanto ao gerenciamento do tempo, 72,29% dos participantes se enquadraram na categoria "administra mal e mediocremente o tempo", não havendo associação estatística entre os sexos (X2 = 1,161; p = 0,281) nem entre os cursos (X2 = 2,013; p = 0,365).

Para estudar relações entre as variáveis Habilidades sociais, Administração de tempo e Estresse, inicialmente consideraramse os escores totais dos instrumentos ADT e ISSL, cuja correlação resultou em R = 0,410 (p = 0,00016), indicando que quanto pior a administração do tempo, maior o nível de estresse do indivíduo. Com os dados categorizados, desconsiderouse a classificação média (3) obtida no IHS, em função de esta ter uma amplitude muito limitada em relação às outras classificações permitidas pelo inventário, o que faz com que raramente os sujeitos sejam classificados com repertório médio. A escassez desses dados prejudica a análise estatística, e sua retirada não interfere de forma significativa na análise. Conforme a Tabela 2, foi encontrada associação significativa entre má administração de tempo (mal e mediocremente) e presença de estresse (X2 = 4,019; p = 0,045). O déficit em habilidades sociais (abaixo da média) também foi associado à má administração de tempo (mal e mediocremente), com X2 = 7,288 e p = 0,007. Esse resultado fica mais evidente quando se relaciona a Administração de tempo com as categorias extremas de Habilidades sociais (Indicação para treino e Bem elaborado). Neste caso, obtêm-se os valores X2 = 8,696 e p = 0,003.

 

 

O déficit em habilidades sociais não foi associado à presença de estresse (X2 = 0,003; p = 0,954). Essa relação não foi encontrada na amostra total, nem por curso isoladamente e tampouco por sexo. A maioria dos participantes apresentou pouco repertório de habilidades sociais, tanto com estresse quanto sem estresse.

Em relação ao fator 1 do IHS (Enfrentamento e autoafirmação com risco), as pessoas sem estresse apresentaram maior déficit (X2 = 11,50; p = 0,009), assim como os estudantes do curso de Engenharia, com X2 = 13,1 e p = 0,041. Não foi encontrada ainda relevância estatística em relação ao sexo para o fator 1 (X2 =7 ,436; p = 0,115). Também não houve associação estatística entre administração de tempo e os cinco fatores deste instrumento, e, no que concerne ao estresse, sexo e curso, não foi verificada significância em relação aos fatores 2, 3, 4 e 5 (p > 0,05).

 

Discussão

A população pesquisada apresentou altos índices de estresse (48,19%), se comparada com uma amostra de quase 2.000 pessoas estudada por Lipp (1996), com índice de 32%. Os universitários de Psicologia e Biologia apresentaram os mais altos índices de estresse (70,37% e 66,67%, respectivamente), superando o encontrado na pesquisa de Peruzzo et al. (2008) com prévestibulandos (61,7%) e aproximandose da taxa de 71% de estresse em juízes do trabalho segundo Lipp e Tanganelli (2002) - a mais alta encontrada nas pesquisas nacionais entre policiais militares, jornalistas, enfermeiras e executivos, e também entre professores da pesquisa de Goulart Júnior e Lipp (2008).

O índice total de estresse da amostra equiparase ao de estudantes de Medicina (49,7%) estudados por Sâmia Mustafa Aguiar et al. (2009), semelhante ao encontrado em amostras internacionais, estando os estudantes de Psicologia e Biologia acima desses índices. A prevalência dos sintomas psicológicos em toda a amostra é semelhante à encontrada em outras pesquisas (Costa et al., 2007; Peruzzo et al., 2008), bem como da fase de resistência (Costa et al., 2007; Lipp e Tanganelli, 2002; Peruzzo et al., 2008).

A semelhança entre os sexos em relação ao estresse na amostra total contraria os achados em outras pesquisas sobre o assunto (Sâmia Mustafa Aguiar et al., 2009; Areias & Guimarães, 2004; Calais et al., 2003; Calais et al., 2007; Costa et al., 2007; ElGilany et al., 2008; Lipp et al., 1996; Souza & Menezes, 2005), nas quais as mulheres sempre aparecem mais estressadas que os homens. Isso pode ser um indicativo de que, sob a mesma condição (primeiro ano de curso superior), os estressores atinjam igualmente tanto homens quanto mulheres. Esse achado sustenta uma visão alternativa à de Seeman (1997), que aponta os hormônios femininos como facilitadores do estresse e estabelece uma maior influência de condições sociais sobre as biológicas na suscetibilidade ao estresse. Pelo fato de a média da idade ser de 19,31 anos, presumese que haja uma prevalência de solteiros, o que iguala homens e mulheres nas variáveis estudo e trabalho, descartando a "tripla jornada" feminina, que incluiria os afazeres com a casa e a família, além de estudos e trabalho, ampliando assim os estressores. No entanto, o estado civil não foi consultado, o que não permite maiores especulações sobre esse dado, sugerindose que seja investigado futuramente.

Os estudantes de Engenharia foram os menos estressados em relação aos dos outros cursos, o que levanta a hipótese de que talvez quem se interesse pela área de exatas seja menos sensível à autoobservação física e psicológica, apresentando menos sintomas de estresse do que os estudantes das áreas de humanas e biológicas. Também foram eles que apresentaram maior déficit nas habilidades de Enfrentamento e autoafirmação com risco (o fator que contempla o maior número de questões do Inventário de Habilidades Sociais), sugerindo que estas habilidades talvez não sejam imprescindíveis no contexto de vida de quem escolheu lidar mais com números e cálculos do que com pessoas e outros seres vivos como seu objeto de estudo. Também se pode aventar a hipótese de que esses estudantes tenham menos estressores ou mais recursos de enfrentamento, o que, infelizmente, não pôde ser esclarecido por esta pesquisa. Apenas se sabe que eles têm os mesmos déficits em manejo de tempo que os alunos dos outros cursos e um déficit maior em Habilidades sociais (fator 1), e mesmo assim são os menos estressados.

Apesar de bem disseminadas pela literatura da área as relações entre déficit em habilidades sociais e estresse (Ayres, 1996; Furtado et al., 2003; Lipp & Rocha, 1994; Maciel, 1996), a presente pesquisa não corrobora essas relações. Foi observado que tanto as mulheres com baixas habilidades quanto as com altas habilidades, em sua maioria, apresentavam estresse. Os homens mostraram o contrário, ou seja, a maioria dos que têm baixas habilidades, assim como a maioria dos que têm altas habilidades, não apresentam estresse. Mas a maioria dos participantes, tanto com estresse quanto sem estresse, possui baixas habilidades sociais. O déficit em habilidades sociais, para a amostra pesquisada, não parece constituir um fator estressor.

Um dos dados desta pesquisa diz respeito à variável Administração de tempo. A maioria dos sujeitos não administra o tempo eficazmente, e isso se relaciona com a presença de estresse, confirmando as pesquisas de Longman e Atkinson, 1988; Macan, 1994; Macan et al., 1990; Walter e Siebert, 1981. Esse dado foi observado especialmente nos alunos do curso de Biologia. A administração ineficaz do tempo também se correlacionou ao déficit de habilidades sociais. Ou seja, a falha no gerenciamento do tempo constituise como um fator estressor para esta amostra, bem como se associa a uma escassez em habilidades sociais.

Podese dizer, de acordo com os dados desta pesquisa, que um indivíduo que tenha bom repertório de habilidades sociais é eficaz no manejo de tempo e assim evita o estresse. Por outro lado, uma pessoa que não seja habilidosa socialmente não consegue administrar seu tempo satisfatoriamente, o que pode produzir estresse.

 

Conclusão

A avaliação desta amostra de universitários calouros permitiu a constatação da incidência de estresse, déficit em habilidades sociais e ineficaz administração de tempo, indicando o comprometimento de sua saúde. A prevalência do estresse na fase de resistência implica grande gasto de energia, desgaste do organismo e sensação de cansaço, afetando a qualidade de vida e facilitando o desenvolvimento de doenças.

A ampla diferença encontrada nos alunos de Engenharia em relação ao baixo nível de estresse e grande déficit do fator Enfrentamento e autoafirmação com risco (Habilidades sociais) deve ser elucidada a partir de novos estudos com essa população, a fim de melhor identificar seus estressores e o enfrentamento destes, assim como podem ser feitos novos estudos com os alunos de Psicologia e Biologia, por apresentarem tão alto nível de estresse no momento do presente estudo. Os dados obtidos fazem necessária uma intervenção junto a esses jovens, com o intuito de desenvolver estratégias de manejo de tempo, aquisição de habilidades sociais e manejo de estresse, neutralizando assim o impacto dos déficits relacionados a esses fatores em sua saúde.

A nítida relação entre habilidades sociais e administração de tempo e desta última com o estresse mostrou uma relação indireta entre déficit em habilidades sociais e presença de estresse. Para a maioria dos participantes, o destacado fator estressor foi a dificuldade em gerenciar o tempo. Isso pode ser justificado pela característica central desses estudantes, que demanda adaptação - eles estão em uma fase da vida repleta de novas e crescentes atribuições e responsabilidades, que devem ser planejadas e executadas satisfatoriamente, sem a orientação e o auxílio direto dos pais, ou seja, com o despontar da independência. No entanto, devese ter cautela na interpretação dos resultados do ADT adaptado para este trabalho.

Salienta-se que o cálculo proporcional do instrumento ADT pode levar a erros no resultado final. Portanto, sugerese que novos trabalhos sejam feitos com o instrumento integral ou que sejam utilizados critérios psicométricos para alterar o instrumento. Propõese também, além de melhor adaptação do instrumento ADT (não cálculo proporcional), a investigação da relação do estado civil dos participantes com as variáveis aqui apresentadas.

 

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Endereços para correspondência:
Carla Fernanda Sousa Pellegrini
pellegrini.fe@gmail.com

Sandra Leal Calais
mscalais@terra.com.br

Manoel Henrique Salgado
henri@feb.unesp.br

Submetido em: 12/07/2012
Revisto em: 05/02/2013
Aceito em: 07/02/2013