SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.21 número2Sobre o artigo de Beck: "a última fase da fenomenologia de Husserl" índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Revista da Abordagem Gestáltica

versão impressa ISSN 1809-6867

Rev. abordagem gestalt. vol.21 no.2 Goiânia dez. 2015

 

RESENHA

 

Elementos para uma compreensão diagnóstica em psicoterapia - o ciclo do contato e os modos de ser

 

 

Maria Paula Miranda ChaimI; Danilo Suassuna Martins CostaII

IGraduanda em Psicologia, 10º período, na Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail: mpchaim@gmail.com
IIDoutorando e Mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (2008), possui graduação em Psicologia pela mesma instituição. Especialização em Pós-Graduação em Psicologia Clínica pelo Instituto de Instituto de Treinamento e Pesquisa em Gestalt Terapia de Goiânia. E-mail: danilo@institutosuassuna.com

 

 

(ÊNIO BRITO PINTO, SUMMUS, 2015)

O livro recém-lançado em epígrafe - Elementos para uma compreensão diagnóstica em psicoterapia - o ciclo de contato e os modos de ser - é uma novidade nos estudos sobre o diagnóstico nas psicologias fenomenológicas, sendo fruto de muitos atendimentos terapêuticos em Gestalt-terapia e inúmeros estudos teóricos em psicologia do autor Ênio Brito Pinto. A publicação em questão proporciona uma compreensão diagnóstica com um olhar mais gestáltico sem negar, entretanto, a importância do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).

O principal objetivo da obra é possibilitar um pensar em estilos de personalidade e em modos de ser que não necessariamente patológicos. Para cumprir com o intento, o livro tem como referencial os modos de ser e estilos de personalidade baseados no ciclo de contato, proposto pelo autor Ribeiro (2005), o qual o elaborou de forma clara e didática, tornando-o, portanto, fundamental para a compreensão diagnóstica fenomenológica em Gestalt-terapia.

A importância de se apontar para discussões e teorizações sobre a compreensão diagnóstica na abordagem gestáltica, se dá pela necessidade de não caracterizar um diagnóstico apenas como psicopatológico, mas psicológico, onde é considerado a totalidade do campo e a individualidade por meio do olhar fenomenológico e holístico, visando facilitar o desenvolvimento de potencialidades do cliente, características marcantes da Gestalt-terapia.

Ao apresentar uma nova compreensão diagnóstica, observa-se que esta é uma das atividades mais complexas e importantes a serem desempenhadas pelos profissionais no processo terapêutico. Logo, este livro se torna um instrumento referencial capaz de nortear a atitude terapêutica diante da demanda do cliente.

Indiscutivelmente, a compreensão diagnóstica em psicoterapia é um dos temas de grande interesse na atualidade e, como tal, sujeito à influencia de modismos. O livro, então, cumpre um papel importante de esclarecer dúvidas conceituais e oferecer informações relevantes para estudantes, profissionais da saúde, docentes e pesquisadores interessados no assunto. Para tanto, está organizado em 5 capítulos, de modo que consegue oferecer uma visão ampla da compreensão diagnóstica em Gestalt-terapia, considerando tanto os aspectos intrapsíquicos quanto os relacionais e com ênfase nos aspectos relativos à intersubjetividade.

O primeiro capítulo faz uma breve retrospectiva dos fundamentos da compreensão diagnóstica, onde a tese central é alertar sobre a importância de não reduzir a singularidade existencial e a história do cliente em um rótulo, julgando existir um padrão de normalidade. A forma de diagnóstico sugerida é aquela que parte do vivido do cliente, possibilitando perceber o homem em sua trajetória com suas potencialidades e limitações. A importância de partir do vivido corrobora com a visão fenomenológica de que nada substitui o estar com, e o entre - terapeuta-cliente. Portanto, a compreensão do diagnóstico acontece por meio do contato com o cliente e não apenas com o entendimento da semiologia. Em síntese, este capítulo aponta para uma perspectiva onde o diagnóstico não se esgota no sintoma, mesmo que este exponha o modo característico de ser ou o estilo de personalidade do cliente.

O capítulo 2 propõe-se a apresentar esta relação entre a compreensão diagnóstica e o estilo de personalidade. Inicia-se apresentando a composição do estilo da personalidade, que é estrutura e processo. Onde a estrutura permite a previsibilidade e o autoconhecimento; e o processo transmite a ideia de que a personalidade inova e se renova, oferecendo sempre possibilidades de mudanças, ou seja, modifica os aspectos da estrutura da personalidade. No momento em que entende os dois eixos da personalidade, inicia-se uma compreensão diagnóstica, pois a estrutura oferece uma tipologia, que possibilita o psicoterapeuta a se atender às tendências psicopatológicas e paradoxalmente o processo delega a ideia de que nenhuma tipologia, mesmo sendo um processo de redução, pode ser um reducionismo, já que cada pessoa precisa ser compreendida de acordo com o seu estilo.

No livro é exposto uma das tipologias utilizadas por alguns Gestalt-terapeutas, o eneagrama, abordagem que descreve tipos de personalidade. Atualmente uma das tipologias mais usadas é o DSM. Diante desta realidade, o autor defende a ideia de que a compreensão diagnóstica em psicoterapia tem como objetivo obter o padrão para ajudar o cliente a flexibilizá-lo, descristalizando-o e reduzindo-o ao mínimo indispensável para que tenha acesso mais franco a seus recursos criativos, sem, entretanto, rotulá-lo. Para que esta postura adotada na psicoterapia seja compreendida por outros profissionais, o autor apresenta uma correlação entre o Ciclo do Contato e o DSM.

O capítulo 3 explicita inicialmente o Ciclo do Contato, conceito essencial para estabelecer a relação com DSM, como proposto no capítulo anterior. Assim a perspectiva do Ciclo do Contato surge como instrumento importante, à serviço da relação dialógica, utilizado para compreensão diagnóstica, em seu fundamento, estrutura bem como no processo em que se configura o sofrimento, por vezes, denunciado pelo cliente.

O autor apresente o Ciclo do Contato composto por oito etapas, a saber: sensação, conscientização, mobilização, ação, interação, contato final, fechamento e retirada. Além da originalidade na quantidade das etapas, existe também alteração do termo "bloqueios de contato" para "descontinuação", uma vez que acredita que o contato não deixa de existir e, portanto, não fica bloqueado. Na "descontinuação", as fases afirmadas pelo autor são: dessensibilização, deflexão, introjeção, projeção, proflexão, retroflexão, egotismo e confluência.

Nota-se que o mesmo não considera a etapa da fluidez / fixação, e isto é decorrente ao fato de que para ele o ser vivo está sempre aberto ao contato, mesmo quando sua fluidez está muito reduzida. Ainda nesta linha de pensamento, o capítulo apresenta que é preciso compreender o indivíduo a partir de sua própria experiência, ou seja, da sua forma de se relacionar consigo e com o outro.

Assim, a "descontinuação" descrita no ciclo de contato como base para uma forma predominante de ser, um estilo de personalidade, sem deixar de considerá-lo como um ato, momentâneo; um estado, uma alternativa ao estilo de personalidade; uma estrutura, ou estilo de personalidade, ou seja, uma forma de organização e de ação, um jeito de estar no mundo. Por isso quando um psicoterapeuta busca compreender a personalidade do cliente, o foco não está em determinar uma classificação em patologias ou transtornos, mas sem em compreender como é a forma, o estilo e as relações predominante de forma

de contato. Em sendo a estrutura da personalidade algo plástico, flexível, em constante reorganização e atualização, com elementos novos e antigos, o que permite diferentes mudanças ao longo da vida, é sugerido pelo autor que o psicoterapeuta vise antes à saúde, que a doença. Isto pois, assevera que o que precisa ser modificado é o que porventura haja de cristalizado, e não o estilo particular de cada ser.

O capítulo 4 traz mais informações sobre a relação entre o ciclo do contato e o DSM, onde a finalidade é apresentar as descontinuações e suas similaridades no DSM. Para cumprir com seu intento, ao descrever cada estilo de personalidade, o autor apresenta em qual etapa do ciclo está manifestado a descontinuação e ainda expõe suas características mais marcantes em relação à cognição, sexualidade, linguagem, emoção, divindade, vocações profissionais, socialização, sabedoria e adesão à terapia. Além de possibilitar conhecer cada forma de manifestação, apresentam-se ainda as principais condutas profissionais a cada estilo de personalidade.

Seguindo em direção ao final do livro, o Capítulo 5, conclui-se que é possível ampliar o diálogo entre psiquiatras e psicólogos por meio da Gestalt-terapia e do DSM, sempre evidenciando a importância de compreender o ser humano para além de uma possível patologia, como uma totalidade de sentido. É importante ressaltar que na visão da Gestalt-terapia, quando se diz em compreensão diagnóstica, não se tem como objetivo identificar doenças, mas sim compreender a forma de viver e relacionar do cliente, para que assim, o trabalho terapêutico, consiga apontar possíveis prognósticos.

Encerro esta resenha agradecendo a oportunidade de ter contato com uma obra tão rara, moderna e importante no campo das profissões da saúde. Recomendo a leitura do livro, por considerar que o mesmo está composto de informações relevantes, atuais e principalmente sobre um tema de grande valia na atualidade.

 

 

Recebido em 30.08.2015
Aceito em 12.12.2015

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons