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Pesquisas e Práticas Psicossociais
versão On-line ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.13 no.1 São João del-Rei abr. 2018
RELATO HISTÓRICO
A política nacional de redução de danos: do paradigma da abstinência às ações de liberdade
The national harm reduction policy: from the paradigm of abstinence the actions of freedom
La política nacional de reducción de daños: de las acciones de libertad al paradigma de la abstinencia
Helenice Pereira LopesI; Aline Moreira GonçalvesII
IPsicóloga. Faculdade Ciências da Vida
IIPsicóloga (UFSJ). Mestra em Psicologia (UFMG). Docente da Faculdade Ciências da Vida
RESUMO
O uso de substâncias psicoativas sempre esteve presente em toda a sociedade e perpassa toda a evolução histórica do Brasil desde seu descobrimento até a contemporaneidade. O crescente aumento no cenário brasileiro do consumo de substâncias psicoativas exigiu do Sistema Único de Saúde (SUS) a criação de Políticas Públicas destinadas ao combate do uso abusivo dessas substâncias. Dentre elas, elaborou-se a Política Nacional de Redução de Danos, como estratégia no âmbito da saúde pública. Assim, a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), instituiu a Redução de Danos entre as ações a serem desenvolvidas com os usuários presentes em seus serviços. Entretanto, as ações de Redução de Danos ainda encontram alguns desafios a serem superados para sua efetivação na Rede de Atenção Psicossocial. No presente artigo, faz-se uma discussão sobre a criação da Política Nacional de Redução de Danos e a Rede de Atenção Psicossocial.
Palavras-chave: Política Nacional de Redução de Danos. Rede de Atenção Psicossocial. Substâncias psicoativas.
ABSTRACT
The use of psychoactive substances has always been present throughout society and crosses all the historical evolution of Brazil since its discovery until nowadays. The increase in the Brazilian scene of the consumption of psychoactive substances required the Unified Health System (SUS) the creation of public policies aimed at combating the misuse of these substances. Among them, elaborated the National Policy Harm Reduction as a strategy in the field of public health. Thus, the Psychosocial Care Network (Raps) established harm reduction among the actions to be developed with the users present in their services. However, Harm Reduction actions are still some challenges to be overcome for its effectiveness in Psychosocial Care Network. In this article, it is a discussion of the creation of the National Policy Harm Reduction and Psychosocial Care Network.
Keywords: National Harm Reduction Policy. Psychosocial Care Network. Psychoactive substances.
RESUMEN
El uso de sustancias psicoactivas ha estado siempre presente en toda la sociedad y cruza toda la evolución histórica de Brasil desde su descubrimiento hasta nuestros días. El aumento de la escena brasileña del consumo de sustancias psicoactivas requiere el Sistema Único de Salud (SUS), la creación de políticas públicas dirigidas a la lucha contra el mal uso de estas sustancias. Entre ellos, elaborado la Reducción de Daños política nacional como estrategia en el campo de la salud pública. Por lo tanto, la Red de Atención Psicosocial (Raps) estableció la reducción de daños entre las acciones a desarrollar con los usuarios presentes en sus servicios. Sin embargo, las acciones de reducción de daños son toda vía algunos retos que hay que superar para su eficacia en la Red de Atención Psicosocial. En este artículo, se trata de una discusión de la creación de la Reducción de Daños Política Nacional y la Red de Atención Psicosocial.
Palabras clave: Política Nacional de Reducción de Daños. Red de Atención psicosocial. Las sustancias psicoactivas.
Introdução
O uso de substâncias psicoativas está presente em toda sociedade há vários séculos e perpassa toda a evolução histórica do Brasil desde seu descobrimento até a contemporaneidade (Carneiro, 2014). Entretanto, ocorreu um significativo aumento no consumo de substâncias psicoativas no país, o que desencadeou problemas de importância para os campos jurídico, social e de saúde. Ao se tornar um problema de saúde pública, iniciou-se a criação de diversas políticas na tentativa de resolução dessa problemática. A princípio, em parceira com o poder judiciário, essas ações enfatizavam a redução da demanda com forte associação da droga e do usuário à criminalidade. Posteriormente, evoluiu-se para a criação de políticas voltadas para a atenção integral à saúde dos usuários, efetivando-se dentre outras a Política Nacional de Redução de Danos (Pacheco, 2013).
Inicialmente, as ações de Redução de Danos foram direcionadas para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DST/AIDS) por meio da distribuição de insumos para a utilização de substâncias psicoativas injetáveis, visando reduzir o compartilhamento de seringas entre os usuários. Porém, essas ações foram ampliadas, resultando na aprovação da "Portaria n° 1.028/GM de 1° de Julho de 2005, que regulamenta as ações de Redução de Danos sociais e à saúde"; associada ao consumo de substâncias psicoativas (Portaria nº 1.028, 2005; Passos & Souza, 2011). As ações propostas nessa portaria foram posteriormente incluídas como de responsabilidade dos profissionais de saúde inseridos na Rede de Atenção Psicossocial (Portaria nº 3.088, 2011).
A Rede de Atenção Psicossocial consiste em um conjunto de serviços de saúde direcionados ao atendimento de pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso abusivo de álcool e outras drogas. Ela está descrita no âmbito do Sistema Único de Saúde, regulamentada pela Portaria n° 3.088 de dezembro de 2011, e tem entre seus objetivos a redução dos danos provocados pelo consumo de álcool e outras drogas e a promoção de cuidado e de qualidade de vida aos usuários e seus familiares (Portaria nº 3.088, 2011).
Apesar de inseridas no campo da saúde pública brasileira, as ações preconizadas pela Política Nacional de Redução de Danos fazem parte de uma política pública relativamente nova perante as ações cotidianas dos profissionais de saúde, o que resulta na pouca utilização e dificuldade de reconhecimento como estratégia válida ao cuidado dos usuários de álcool e outras drogas (Morera, Padilha & Zeferino, 2015). Dessa forma, as estratégias de tratamento estimuladas pela Política de Redução de Danos acabam sendo muitas vezes percebidas como um incentivo à manutenção do uso e da dependência de substâncias psicoativas. Essas concepções circulam por toda sociedade pelos discursos sustentados pela justiça, pela mídia, por projetos religiosos ou como proposta sugerida por algumas comunidades terapêuticas de cessar com o uso de drogas e permanecer com sua associação à criminalidade, o que faz com que os estigmas e preconceitos direcionados aos usuários de álcool e outras drogas sejam mantidos cotidianamente (Portaria nº 3.088, 2011; Carneiro, 2014).
Durante um longo período, a legislação brasileira baseou suas políticas públicas em ações de caráter higienista, com determinações invasivas em relação ao usuário de substâncias psicoativas, preconizando a utilização das internações compulsórias e tratamentos obrigatórios que resultavam na interdição dos direitos dos usuários. No decorrer das revisões das leis brasileiras e das políticas de saúde mental, novas estratégias para o tratamento e melhoria da qualidade de vida desses usuários foram sendo criadas. Dentre se encontra a Política Nacional de Redução de Danos, que tem entre suas diretrizes o respeito à liberdade de escolha do usuário em permanecer com o uso de drogas e o direito à assistência pelos serviços sociais e de saúde (Flach, 2010).
As ações de Redução de Danos foram inseridas nos espaços institucionais que compõem a Rede de Atenção Psicossocial - conforme estipulado em suas diretrizes para o funcionamento em seu art. 2, que impõe o desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos, como ações possíveis de serem elaboradas para a atenção aos usuários de álcool e outras drogas e de pessoas em sofrimento mental (Portaria nº 3.088, 2011).
Ainda, segundo declara a Política do Ministério da Saúde para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas, a abstinência não pode ser o único objetivo de tratamento a ser alcançado, tornando-se necessário lidar com as diferentes possibilidades e escolhas do sujeito (Ministério da Saúde, 2003). A Política Nacional de Redução de Danos surge com uma dessas novas possibilidades de atenção ao usuário de álcool e outras drogas. Entretanto, ainda são discretamente utilizadas no campo da saúde pública no Brasil (Souza & Carvalho, 2012), desse modo, pesquisas, projetos e estudos que partem dessa premissa se tornam de extrema importância para a ampliação das possibilidades de um dos principais desafios atuais do país: o abuso de álcool e outras drogas.
Drogas: do surgimento à proibição
No Brasil, o surgimento das substâncias psicoativas pode ser apontado desde o descobrimento do país, no qual há relatos da utilização de plantas medicinais e psicoativas pelos indígenas. Também na era das navegações, com os escravos vindos da África, período no qual ocorreu a disseminação do uso da erva Cannabis Sativa (maconha), que veio a ser proibida nacionalmente a partir do ano de 1932. Em seguida, com a Revolução Industrial, o país passou a ser referência no plantio e no processamento de substâncias, como o café, a cana-de-açúcar e o tabaco, e com a evolução tecnológica ocorreu o aprimoramento da destilação do álcool, incluindo a cachaça dentre as drogas de maior significância para a economia e cultura brasileira até a atualidade (Carneiro, 2014).
Foi no século XIX que se iniciou a problematização do uso e do abuso de drogas, o que resultou na construção de tratados e de acordos em diversos países, os quais objetivavam a adoção de medidas de cunho repressivo e proibicionistas - sendo a "Lei Seca" a mais conhecida entre os anos de 1920 e 1933 e igualmente a "guerra contra as drogas" proposta pelo governo Nixon em 1970 -, disseminando esse ideário por todo o mundo. Com a proibição e com a ausência de regulamentação estatal, as drogas passaram a ser comercializadas por grupos criminosos que se apossaram do controle desse mercado. Assim, essas substâncias passam a ser classificadas em lícitas - cuja comercialização é regulamentada - e ilícitas - as que foram enquadradas dentre as drogas proibidas, o que resultou na divisão entre a aceitabilidade social do consumo de algumas drogas e na associação à criminalidade ao uso de outras (Machado & Boarini, 2013; Carneiro, 2014).
No Brasil, o modelo proibicionista - guerra contra as drogas - se caracterizou como estratégia que teve como prioridade a redução da oferta e estruturou-se por meio dos modelos morais e criminais que buscaram o enfrentamento às drogas, o encarceramento dos usuários e o modelo de tratamento da dependência das drogas como patologia de origem biológica. Nesse sentido, destaca-se o início da construção da legitimação da política antidrogas com a aprovação da Lei nº 6.368/76, que dispôs sobre as medidas de prevenção e de repressão ao tráfico ilícito e ao uso indevido de substâncias entorpecentes pela população; essas políticas proibicionistas têm suas características embasadas no medo, na repressão, na persuasão moral, na intolerância do consumo de drogas e no imperativo da abstinência como condição para o acesso aos programas de tratamento (Lei nº 6.368, 1976; Passos & Souza, 2011; Machado & Boarini, 2013).
A principal finalidade das políticas denominadas como guerra contra as drogas é a idealização de uma sociedade livre das substâncias psicoativas. Entretanto, de acordo com o contexto histórico mundial, as drogas sempre existiram e permanecerão existindo na sociedade, o que resultou nos questionamentos sobre a eficácia dessas políticas proibicionistas devido ao significativo aumento do consumo de substâncias psicoativas em nível mundial e a negligência nos cuidados às pessoas que não conseguiam ou não desejavam suspender o consumo das drogas (Machado & Boarini, 2013).
Diante desse contexto, com a finalidade de reivindicar os direitos aos cuidados desses usuários, inicia-se na década de 1980 movimentos sociais direcionados à obtenção de melhorias na qualidade de vida e da saúde dos usuários que não conseguiam ou não desejavam a abstinência, exigindo a construção de políticas públicas que objetivassem a atenção à saúde dessas pessoas. Isso fez com que a temática passasse a ser prioridade não somente do poder judiciário e policial, mas também de responsabilização no campo da saúde. O que exigiu do campo das políticas públicas e, mais especificamente do Sistema Único de Saúde (SUS), a partir de sua criação, no ano de 1988, a formação de diversas políticas destinadas a preconizar não só a ruptura do uso, mas a humanização dos serviços no cuidado do usuário. Para a efetivação dessas premissas citadas anteriormente, o Sistema Único de Saúde brasileiro inseriu oficialmente, no ano de 1994, a Política de Redução de Danos (RD) como política pública estratégica no âmbito da saúde pública (Pacheco, 2013; Machado & Boarini, 2013; Carneiro, 2014).
A política nacional de redução de danos: das ações de liberdade ao paradigma da abstinência
A origem das ações de Redução de Danos pode ser apontada na Inglaterra no ano de 1926, com a constituição do Relatório de Rolleston, quando um grupo de médicos elaborou estratégias, como a prescrição controlada de morfina e heroína, com o objetivo de reduzir os danos à saúde dos usuários, sendo considerado um marco para a história da Redução de Danos - esse marco não estabeleceu a abstinência de forma abrupta, mas sim o alívio dos sintomas e a administração controlada da droga (Domanico, 2006; Sodelli, 2010; Mota, 2012). Outro marco de igual importância foi a elaboração dos primeiros programas para a redução da disseminação de doenças infectocontagiosas por usuários de drogas injetáveis, que ocorreu na Holanda no ano de 1972. Com essa medida, ocorria a troca de seringas já usadas por seringas novas. Posteriormente, o governo elaborou em 1976 a Lei do Ópio, que regulamentou a diferenciação entre as drogas de risco aceitável e as drogas de risco inaceitável (Domanico, 2006).
Ainda na Holanda, na cidade de Amsterdã, na década de 1980 usuários de drogas iniciam o movimento social conhecido como Junkiebon (associação de usuários de drogas injetáveis) em busca de melhores condições de vida e de saúde a usuários de drogas injetáveis e a redução do nível de contaminação pelo vírus da AIDS e da Hepatite B por compartilhamento de seringas. Assim, a partir do desenvolvimento de movimentos como esses, ocorreu a ampliação do conceito da Redução de Danos, atentando alguns gestores da saúde pública e de organizações não governamentais para a problemática das doenças infectocontagiosas associadas ao consumo de substâncias psicoativas (Domanico, 2006; Machado & Boarini, 2013).
No Brasil, as primeiras ações em torno da prática de Redução de Danos ocorreram no ano de 1989, na cidade de Santos-SP, período no qual a cidade era considerada como a capital da AIDS. Essas primeiras ações de deram em prol da redução dos números de casos de contaminações do vírus pelo compartilhamento de seringas. Com efeito, a Secretaria de Saúde elaborou o Programa Municipal de AIDS, que passou a ser considerando o primeiro programa de Redução de Danos vinculados ao uso de drogas injetáveis do país (Domanico, 2006; Passos & Souza, 2011; Mota; 2012).
Apesar dessa iniciativa, devido às leis de drogas repressoras vigentes naquele período, esse programa não foi bem-visto por diversos gestores públicos, sendo o método judicialmente interrompido, e as ideias sobre a Redução de Danos entendidas como incentivadoras do uso de substâncias psicoativas. Segundo Domanico, (2006), esses pensamentos ainda permanecem introjetados em diversas pessoas devido à incompreensão da proposta dessa política. Foi somente no ano de 1991, mesmo sem a liberação do governo, que a proposta foi retomada pela organização não governamental Instituto de Pesquisas em AIDS de Santos (Iepas) e pelo Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad). Realizou-se como estratégias de prevenção ao HIV entre os usuários de drogas injetáveis o Programa de Troca de Seringas para reduzir o compartilhamento e promover a higienização das seringas entre os usuários (Passos & Souza, 2011).
Entretanto, naquele mesmo ano, o índice de casos de usuários de drogas injetáveis contaminados pelo vírus do HIV permanecia em crescimento no país, o que resultou na elaboração do Projeto Drogas da PN-DST/AIDS, financiado pela Organização das Nações Unidas (ONU) por meio do Programa das Nações Unidas para o Controle Internacional de Drogas (UNDCP). A partir desse período, deu-se início a implantação de diversos Programas de Redução de Danos por vários estados do país. Em 1994 ocorre a articulação entre a Coordenação Nacional de Saúde Mental, o Conselho Federal de Entorpecentes (Confen) e as Secretárias do Ministério de Educação e do Desporto para a elaboração de um projeto que visava à construção de estratégias direcionadas as questões do álcool e das drogas, inserindo dentre elas a Redução de Danos (Mota, 2012).
A Associação Brasileira de Redutores de Danos (Aborda) foi criada no ano de 1997 com a organização dos movimentos sociais durante o 2º Congresso Brasileiro de Prevenção da AIDS, em Brasília, em prol da implementação e do fortalecimento da Redução de Danos como política pública. Porém, o significativo impulso para o desenvolvimento da Política Nacional de Redução de Danos ocorreu a partir do ano de 2003 com a instituição da Política do Ministério da Saúde para a Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas. Nesse momento, as ações de Redução de Danos deixaram de ser exclusivamente dos Programas de DST/AIDS e se tornaram uma estratégia norteada pelo Ministério da Saúde e da política de Saúde Mental (Ministério da Saúde, 2003; Passos & Souza, 2011; Mota, 2012).
Portanto, no ano de 2005, o Ministério da Saúde, em consideração às diretrizes da Política de Atenção Integral aos Usuários de Álcool e Outras Drogas, aprova a Portaria n° 1.028/GM de 1° de Julho, que regulamenta as ações que objetivam à Redução de Danos sociais e à saúde decorrentes do consumo de substâncias psicoativas que causem dependência. O conceito de Redução de Danos é então ampliado para estratégias preventivas ou redutoras das consequências negativas associadas ao uso de drogas, desenvolvida por estratégias de prevenção à saúde, sem necessariamente interferir na oferta ou no consumo, e sim orientada pelo respeito à liberdade de escolha e a responsabilidade do usuário (Portaria nº 1.028, 2005; Santa Catarina, 2010).
Em análise ao contexto da evolução histórica das políticas sobre drogas, percebe-se que estas são marcadas por conflitos que advêm de visões ambíguas. Existem as políticas que visam ao cuidado por meio do respeito ao direito de escolha do usuário e as políticas nas quais prevalece o paradigma da abstinência, pela imposição na descontinuidade imediata do uso. Estas que na maioria das vezes exercem de forma coercitiva o cessar do uso como única direção de tratamento possível (Santos & Miranda, 2016). O resultado dessa prevalência na clínica da abstinência é a submissão do campo da saúde ao poder jurídico, psiquiátrico e religioso. Imposições essas que tornam as ações que preconizam a ruptura do uso o principal mecanismo de tratamento utilizado pela Rede de Atenção Psicossocial, indo contra a abordagem da Saúde Pública, contra os avanços da Reforma Psiquiátrica e da Política Nacional de Redução de Danos (Passos & Souza, 2011).
A Política Nacional de Redução de Danos vai de encontro ao embate em torno do paradigma da abstinência, exclusivamente contra os dispositivos disciplinares direcionados ao usuário de drogas como prisões, manicômios e também às comunidades terapêuticas e fazendas terapêuticas que trazem como elemento a disciplina e a moral religiosa. A Política Nacional de Redução de Danos, desse modo, determina ações como uma estratégia de saúde pública que controlem possíveis consequências negativas associadas ao consumo de substâncias psicoativas sem necessariamente interferir na oferta ou no consumo. Agem de acordo com o respeito à liberdade de escolha, visando à inclusão social e à cidadania para os usuários e para seus familiares, em seus contextos de vida, com um modo de atuar clínico e de efeitos terapêuticos eficazes (Portaria nº 1.028, 2005; Passos & Souza, 2011).
As ações de Redução de Danos que são definidas de acordo com a Portaria n° 1.028/GM de 1° de julho de 2005 determinam que as medidas de atenção integral à saúde dos usuários devem ter como objetivos principais ações voltadas para a informação do usuário e de seus familiares, a educação e aconselhamentos permanentes, além da assistência social e à saúde dos envolvidos. Envolve ainda a disponibilidade de insumos de proteção à saúde e a prevenção ao HIV/AIDS. São ações que incluem o estímulo à adoção de comportamentos mais seguros no consumo de substâncias que causem dependência. Focando em orientações sobre os cuidados nas práticas sexuais, o desestímulo ao compartilhamento de instrumentos utilizados para o consumo de produtos, as orientações sobre intoxicações agudas, prevenção das DSTs/AIDS e a divulgação dos serviços públicos na área de assistência social e de saúde e de seus direitos (Portaria nº 1.028, 2005).
A Política Nacional de Redução de Danos determina a expansão das estratégias de ações de Redução de Danos para além dos espaços institucionais, que devem ser desenvolvidas em todas as áreas de interesse público nas quais ocorram ou possa ocorrer o consumo de substâncias psicoativas, ou para os locais nos quais se reportem os usuários (Portaria nº 1.028, 2005). Assim, são criados os chamados "redutores de danos" e os integrantes são geralmente pessoas da própria comunidade. Podem ser usuários e/ou ex-usuários de drogas, ou indivíduos que fazem parte da rede de relações sociais e de saúde dos usuários, bem como lideranças comunitárias, profissionais de nível médio e universitário e demais pessoas. Por meio dos redutores, a comunicação e o contato com a população específica acontece de maneira facilitada. É preciso que sejam pessoas que tenham como compromisso principal a promoção da saúde e da cidadania de usuários de álcool e de outras drogas (Santa Catarina, 2010).
Na mesma direção, a Portaria n° 3.088 de dezembro de 2011, que institui a Rede de Atenção Psicossocial (Raps), inclui as ações de Redução de Danos entre suas estratégias, o que torna a responsabilidade pelas aplicações de suas ações não somente da comunidade e pessoas próximas, mas de todos os profissionais que compõe a Rede de Atenção Psicossocial. Nesse sentido, inclui aplicar diversas ações de cuidados e de atenção aos usuários e a seus familiares que respeitem seus direitos e não vise à abstinência como recurso único de tratamento (Portaria nº 3.088, 2011).
A política nacional de redução de danos e seus desafios
A legislação brasileira sobre drogas aceitou progressivamente as estratégias de Redução de Danos como válidas aos cuidados dos usuários de álcool e outras drogas, como apresentado em sua evolução histórica. Assim, um marco importante foi à aprovação da Lei Federal n° 10.216 de 2001, que legitimou a Reforma Psiquiátrica Brasileira, caracterizada pelo movimento social no fim da década de 1970 e início de 1980, que prioriza os direitos e a atenção às pessoas com sofrimento mental e os usuários de álcool e outras drogas atribuídas como de responsabilização da saúde pública, mais especificamente da saúde mental (Oliveira & Dias, 2010; Machado & Boarini, 2013).
A efetivação dessa lei resultou no direcionamento do cuidado da pessoa com sofrimento mental e do usuário de álcool e outras drogas. As redes extra-hospitalares, em consonância com as diretrizes da nova política de desinstitucionalização, foi aprovada pela portaria GM nº 336/2002, que estabeleceu os Centros de Atenção Psicossocial (Caps) como serviços estratégicos para a organização da rede de cuidado às pessoas com sofrimento mental e decorrente do uso abusivo de álcool e outras drogas. Desse modo, posteriormente, constituiu-se a Rede de Atenção Psicossocial pela Portaria nº 3.088/2011, que articulou diferentes componentes para atenção a esses usuários, na qual as estratégias de Redução de Danos ganharam visibilidade dentre suas diretrizes (Portaria nº 336, 2002; Oliveira & Dias, 2010; Portaria nº 3.088, 2011; Machado & Boarini, 2013).
Entretanto, a Redução de Danos já havia sido aceita como uma Política do Ministério da Saúde para Atenção Integral a Usuários de Álcool e outras drogas desde o ano de 2005, com a aprovação da Portaria n°1.028 de 1° de julho, que regularizou suas ações e se opôs às propostas do modelo proibicionista. Nesse sentido, a Política Nacional de Redução de danos buscou o rompimento das práticas repressivas, nas quais a abstinência era o único objetivo a ser alcançado e, dessa forma, incluiu a compreensão dos direitos e o respeito à liberdade e à singularidade dos usuários de álcool e outras drogas (Portaria nº 1.028, 2005; Mota, 2012).
Porém, mesmo após a legitimação da Redução de Danos como Política sobre Drogas, ainda é possível apontar diversos obstáculos que dificultam a sua consolidação, a disseminação de seus princípios e a sua aplicação na saúde pública. Entre os desafios que a Política Nacional de Redução de Danos encontra, a não aceitabilidade de suas premissas como ação válida para o tratamento de álcool e outras drogas é a que mais se destaca. Uma possível explicação para esse posicionamento advém da construção histórica de que os cuidados em saúde desses usuários sempre oscilaram entre os cuidados de caráter religioso ou entre os modelos médicos, quase sempre mantendo um posicionamento excludente e segregador (Passos, 2010; Machado & Boarini, 2013).
Entende-se que tais modelos não são necessariamente efetivos e resolutivos. Além de colidirem com a Lei da Reforma Psiquiátrica Brasileira, por não priorizarem necessariamente o tratamento, indo de encontro a um imaginário social segundo o qual algumas classes de pessoas como - os pobres, os loucos, os negros e os usuários de drogas - são vistas como pessoas que descumprem determinadas normas sociais e que, portanto, devem permanecer isoladas do restante da sociedade. Nesse caso, a questão do julgamento moral ainda parece ser o principal critério de avaliação do sujeito.
Um segundo obstáculo e de grande influência diante das representações sociais construídas sobre a Política Nacional de Redução de Danos são os discursos - demonizantes - a respeito do consumo de drogas que circulam no país. Muitas vezes sustentados pela mídia, com expressões do tipo droga é um caminho sem volta, ou ainda, crack: cadeia ou caixão (Nunes, Santos, Fischer & Güntzel, 2010; Araújo & Silva, 2014; Calgaro, Budó & Freiras, 2015), esses discursos acabam por reafirmar a psiquiatrização e a judicialização do uso de substâncias ilícitas, distorcendo e limitando as possibilidades de cuidados a esses usuários.
Destaca-se ainda, a recusa à validade da cientificidade da Redução de Danos como estratégia de cuidado aos usuários por uma parte considerável da população (Bisognin & Dutra, 2016). Essa ocorrência se dá devido à carga de valores morais e à ausência de esclarecimento quando se trata da temática de álcool e de outras drogas, já que a validação e a comprovação científica da estratégia de Redução de Danos são apresentadas por experiências nacionais, internacionais e por dados do Ministério da Saúde, sendo essencial a divulgação das informações sobre a efetividade das estratégias na perspectiva da Redução de Danos, com o objetivo do fortalecimento e da ampliação das ações entre os atores envolvidos (Jorge & Corradi-Webster, 2012; Machado & Boarini, 2013; Morera et al., 2015).
As estratégias de Redução de Danos buscam uma atenção integral ao usuário de álcool e outras drogas e a manutenção de seus direitos como cidadão. Portanto, faz-se necessário um trabalho intersetorial para a garantia dessa atenção. Porém, a articulação intersetorial tem sido percebida como um desafio comum a ser enfrentada entre os atores da Rede de Atenção Psicossocial, essa prática se pauta nas articulações entre os sujeitos e os setores sociais diversos para o enfrentamento de problemas, para a construção de políticas públicas e de possibilidades de ações em rede (Machado, 2009; Jorge & Corradi-Webster, 2012).
Dessa forma, para que as estratégias da Política Nacional de Redução de Danos sejam compreendidas e efetivamente praticadas, é de grande importância o entendimento do trabalho em rede. O conceito de redes, então, pode ser compreendido como o conjunto de atores, que incluem os profissionais, as instituições, os grupos comunitários, os usuários de serviços e seus familiares, que se comunicarão e agirão de maneira articulada a fim de garantir a integralidade das ações e de desenvolverem soluções para determinadas necessidades (Machado, 2009; Kinker, 2014).
Mas, segundo Siqueira (2014), existe certa limitação nessas articulações e o que tem prevalecido é a criação de protocolos e de ideias sem a consideração necessária da realidade vivenciada pelos usuários, e do diálogo entre os atores e essa população. Assim, para a superação desse desafio, torna-se necessário uma aproximação adequada aos sujeitos em questão, a fim de se construir projetos apropriados a suas singularidades, sendo essa articulação essencial para a efetivação das ações das equipes da Rede de Atenção Psicossocial.
Ao se enfatizar a Rede de Atenção Psicossocial, entende-se que são construídos diferentes sentidos e desafios sobre a temática do álcool e outras drogas e a efetivação de suas políticas. Essas diversidades podem ser justificadas por uma dificuldade de sustentabilidade financeira, com uma irregularidade de manutenção de recursos; de uma sustentabilidade política, que tenha o apoio da gestão pública e da população; e de uma sustentabilidade técnica, associada a uma ausência de manutenção de qualificação e uma formação permanente para que se consigam padrões técnicos de excelência (Delgado, 2013).
Existem ainda relatos de um conhecimento limitado por parte de alguns profissionais da área da saúde sobre a Política Nacional de Redução de Danos e sobre seus fundamentos (Souza & Carvalho, 2012). Assim, a ausência de formação de recursos humanos direcionada ao trabalho em Redução de Danos tem sido outra importante limitação perante a implementação das estratégias, e essa ausência de esclarecimento resulta na permanência de muitos profissionais no ideário de que a utilização das estratégias de Redução de Danos seja incentivadora à permanência do uso de drogas (Jorge & Corradi-Webster, 2012). Com base nessa ideia, Siqueira (2014, p. 84) traz uma importante ressalva sobre a improcedência dessa informação ao afirmar que
A população mais vulnerável de usuários de drogas não precisa de estímulo para usar drogas (já tem em sobra esta disposição), precisa, isso sim, de estímulo para se cuidar e se entender como cidadão de direitos. Estimular esta mudança é a proposta fundamental da Redução de Danos.
Negar a aplicação da Redução de Danos sobre o critério de serem estratégias estimuladoras ao uso não é uma justificativa plausível. A Política Nacional de Redução de Danos não é uma defensora do uso de drogas, pois como objetivo principal a defesa dos direitos humanos do usuário, a fim de se promover o cuidado sem desrespeitar as suas escolhas, negando a abstinência de forma impositiva como única maneira de cuidado possível.
No entanto, vale ressaltar que a proposta da Redução de Danos não é totalmente oposta à abstinência, aceita que ela pode ser uma alternativa de reduzir as consequências do uso de drogas para alguns indivíduos, mas destaca, sobretudo, que cabe somente ao usuário essa escolha e não deve ser imposta pelos profissionais da saúde em um projeto terapêutico. Assim, os profissionais de saúde têm o importante papel de auxiliar o usuário para melhorar as condições de vida de forma individual, além de desenvolver no usuário a compreensão da abstinência ou da manutenção do uso como direito de escolha dele (Tisott, Hildebrandt, Leite, Martins & Cosentino, 2015).
Para tal, faz-se necessário a ampliação do olhar diante do fenômeno do uso de drogas para um conceito de cidadania, ou seja, como direito de escolha do usuário. Cabe aos atores da Rede assumir tais desafios e se unirem para o direcionamento de uma atenção psicossocial ao usuário, de forma a se atentar para Redução de Danos a partir de um novo posicionamento, livre do estigma e do preconceito, no qual o uso das substâncias possa ser entendido não de maneira banal, mas como um modo de existir e de construir a realidade do sujeito, em que é indispensável reconhecer sua legitimidade, respeitar seus direitos, promover sua autonomia e corresponsabilidade pelos resultados tanto positivos quanto negativos de seu processo terapêutico (Passos, 2010; Tisott et al., 2015).
Atenção psicossocial direcionada aos cuidados dos usuários de álcool e outras drogas: algumas considerações
A Rede de Atenção Psicossocial foi constituída no âmbito do Sistema Único de Saúde com o objetivo de operacionalizar as mudanças no modelo de atenção às pessoas com transtorno mental e decorrente do uso abusivo de álcool e outras drogas - concretizando, dessa forma, ideias de inserção e de reabilitação social de maneira integrada à família e à comunidade, não somente aos serviços e aos profissionais de saúde. Assim, as redes são importantes instrumentos de ação para as equipes de saúde, sobretudo por facilitarem o trabalho e o cuidado em saúde mental (Portaria nº 3.088, 2011; Barreiros, 2014).
Sendo assim, as articulações entre as redes são ações indispensáveis para um cuidado integral ao usuário de álcool e outras drogas, que devem ser percebidos não apenas como pessoas que fazem uso de substâncias psicoativas, mas, sobretudo, é necessário atentar para suas relações, suas condições de vida, seus valores e suas crenças. Assim, o uso de drogas não pode ser entendido como única adversidade da existência do sujeito, sendo necessário o envolvimento de diferentes formas de instituições para responder às diversas necessidades de construção e produções de sentido para o usuário, o que justifica a necessidade de uma atenção psicossocial (Kinker, 2014).
A atenção psicossocial busca quebrar o reducionismo biomédico, não sendo um campo científico restrito a saberes e práticas - psi - originadas da psiquiatria e psicologia, mas sim da junção de diferentes ciências, como as sociais, humanas e políticas e outros modos de produção do conhecimento, como a filosofia e a arte. Assim, a atenção psicossocial objetiva uma movimentação e um diálogo com os atores que estão em cena, sendo constituída no cotidiano por meio da interação entre os diferentes profissionais de saúde, familiares e usuários dos serviços para a produção de saúde (Clemente, Lavrador & Romanholi, 2013; Godoy, 2014).
Na atenção psicossocial, o sujeito é percebido em sua existência para que ocorra o resgate da sua autonomia e de sua cidadania, além da efetivação de um cuidado em saúde relacionado à manutenção dos direitos humanos e de suas premissas ético-políticas que são fundamentais para nortear a produção do cuidado em saúde mental, álcool e outras drogas. Entretanto, torna-se imprescindível a realização de um trabalho da Rede de Atenção Psicossocial que direcione as práticas democráticas condizentes com a perspectiva de cuidado e da redução dos riscos à saúde, considerando as singularidades de cada caso em questão. Embasada nesse ideário, a redução de danos como estratégia busca reconhecer os usuários em suas singularidades e respeitar as suas diversidades para que eles sejam percebidos além do uso e da dependência de uma ou mais substâncias, isto é, por meio de um olhar que busque sua integralidade (Ministério da Saúde, 2003; Amarante, 2011; Clemente et al., 2013; Conselho Federal de Psicologia, 2013; Godoy, 2014).
Os profissionais inseridos na Rede de Atenção Psicossocial devem ter seu trabalho baseado em uma perspectiva interdisciplinar. A interdisciplinaridade nesse campo permite que os objetivos do tratamento sejam traçados de maneira conjunta com a utilização de conceitos comuns, guiados pela lógica da clínica ampliada, de maneira a não colocar em destaque a doença ou o uso de substâncias, mas, sobretudo, de considerar o sujeito em seu contexto e em suas variações para que seja possível a construção de um projeto terapêutico elaborado por meio de propostas direcionadas às suas necessidades (Ministério da Saúde, 2008; Godoy, 2014).
O Projeto Terapêutico é uma estratégia de organização dos processos de trabalho nos serviços de saúde. Baseia-se na ideia de expansão da compreensão e da experiência do adoecer para além dos processos biológicos e orgânicos, sendo fundamental a construção de um plano de ação voltado para as singularidades e para as integralidades do sujeito (Kinoshita, 2014). Esse projeto deve ser construído em conjunto, entre o profissional e o usuário, considerando as diversas possibilidades do serviço e do sujeito como ator em seu processo terapêutico.
Ao se pensar nos cuidados aos usuários de álcool e outras drogas e na construção de seus projetos terapêuticos, torna-se necessário percebê-lo para além do consumo da substância. O consumo abusivo não deve ser a problemática principal, atentando-se para os danos que ela envolve, baseados não somente em critérios físicos, mas também em considerar os critérios de perda de valores, de experiências e de sua posição social. Dessa forma, eliminar o uso da droga não necessariamente resultará no enriquecimento da existência do usuário, ou o colocará em uma posição social em que tenha autonomia (Kinker, 2014).
Nesse contexto, a Redução de Danos pode ser entendida como uma estratégia válida, de acordo com a sua lógica de cuidado, na qual existe uma flexibilidade para a elaboração do projeto terapêutico, sendo possível articular as redes para a efetivação desse cuidado, sendo que o sujeito é percebido em sua totalidade e não de maneira fragmentada, ou com o rótulo exclusivo de usuário de drogas, mas que necessita de diferentes saberes e especialidades de cuidado que utilizem práticas alicerçadas na superação da exclusão e do estigma dos usuários, e que objetivem o fortalecimento dos cuidados voltados à subjetividade, à corresponsabilidade e à manutenção dos direitos (Santos, 2010; Büchele & Dimenstein, 2014).
Considerações finais
As Políticas Públicas sobre drogas foram elaboradas em meio a conflitos entre leis de ordem proibicionistas e as que objetivam a manutenção dos direitos à liberdade e escolhas dos usuários de álcool e outras drogas. Dentre a elaboração dessas políticas que prezam pelo direito à liberdade, a Política Nacional de Redução de Danos surge como uma estratégia de cuidado aos usuários que não conseguem ou que não desejam suspender o uso das substâncias psicoativas. Assim, suas estratégias foram incluídas entre as ações possíveis a serem utilizadas pelos profissionais da Rede de Atenção Psicossocial com o objetivo de se expandir as possibilidades de cuidado para além de ações de cunho repressivo e que objetivavam a abstinência como uma única forma de tratamento.
Entretanto, mesmo que a Redução de Danos tenha sido determinada entre as diretrizes técnicas para as ações dos profissionais em atuação na Rede de Atenção Psicossocial, diversos desafios podem ser apontados como entraves para a efetivação dessas ações de extrema importância para proporcionar um cuidado integral ao usuário de álcool e outras drogas. Desse modo, faz-se necessária a elaboração de um número maior de estudos sobre a temática, em conjunto com uma maior divulgação dessas diretrizes, para que tais conhecimentos não permaneçam apenas entre estudiosos sobre o tema, mas que alcancem os atores da Rede de Atenção Psicossocial que têm a responsabilidade ética e técnica de executá-las, para que a lógica da abstinência não prevaleça como única forma de tratamento, mas que seja possível a construção de um novo olhar perante o usuário para que ele seja percebido para além do uso, mas como ser humano digno de direitos e com diversas possibilidades de cuidado e existência.
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