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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versão On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.3 no.2 Juiz de fora dez. 2010

 

ARTIGOS

 

Análise da literatura sobre a comorbidade entre fobia social e depressão

 

Review of the literature on the comorbidity between social phobia and depression

 

 

Lívia Ferreira de Araújo1; Telmo Mota Ronzani; Lélio Moura Lourenço

Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, Brasil

 

 


RESUMO

A fobia social ou transtorno de ansiedade social é um transtorno psiquiátrico caracterizado pela cronicidade e associação a outras morbidades. As síndromes depressivas, em muitos estudos, são citadas como as comorbidades mais frequentes na fobia social. O presente trabalho teve como objetivo analisar os artigos indexados nas bases de dados Pubmed, Psycinfo e LILACS no período entre 2005 e 2009, que continham descritores relacionados à fobia social, à depressão e à comorbidade entre esses dois transtornos, bem como avaliar os indicadores bibliométricos da literatura científica em relação à referida comorbidade e discutir os aspectos qualitativos em relação à comorbidade entre essas duas patologias por meio de revisão bibliográfica. A amostra final foi constituída por 31 artigos, provenientes de diferentes países. Por intermédio dos resultados deste trabalho, foi possível constatar uma significativa associação entre a fobia social e a depressão, contribuindo para o estudo e prevenção dessas duas psicopatologias.

Palavras-chave: Fobia Social, Depressão, Comorbidade.


ABSTRACT

Social Phobia or social anxiety disorder is a psychiatric disorder characterized by chronicity and association with other morbidities. Depressive syndromes in many studies are cited as the most frequent comorbidities in social phobia. This study aimed to examine the articles indexed on the databases of Pubmed, Psycinfo, and LILACS in the period between 2005 and 2009, which contained descriptors related to social phobia, depression, and comorbidity between these two disorders, as well as to evaluate the bibliometric indicators of the scientific literature regarding such comorbidity between, and to discuss the qualitative aspects related to the comorbidity between these two pathologies by means of a bibliographic review. The final sample consisted of 31 articles from different countries. By means of the results of this work, it was possible to determine a significant association between social phobia and depression, contributing to the study and prevention of these two psychopathologies.

Key words: Social Phobia, Depression, Comorbidity.


 

 

O presente trabalho pretende contribuir para os estudos da fobia social e da depressão e tem como objetivos avaliar os indicadores bibliométricos da literatura científica e discutir os aspectos qualitativos em relação à comorbidade entre essas duas patologias por meio de revisão bibliográfica.

Interessa colocar que os indicadores bibliométricos podem ser avaliados a partir de uma pesquisa bibliométrica, que é um tipo de pesquisa cuja finalidade é "quantificar os processos de comunicação escrita e o emprego de indicadores bibliométricos para medir a produção científica" (Reveles & Takahashi, 2007 p. 246). O uso de tal modalidade se justifica em razão de possibilitar a análise e avaliação das fontes difusoras de trabalhos; a evolução cronológica da produção cientifica; a produtividade de autores e instituições; o crescimento de qualquer campo da ciência; e o impacto das publicações frente à comunidade científica internacional.

 

Fobia social

A fobia social - também conhecida como transtorno de ansiedade social - tem sido considerada um grave problema de saúde mental pela alta prevalência e características incapacitantes. Conforme os critérios diagnósticos do DSM-IV (APA, 1994), os indivíduos com fobia social manifestam uma ansiedade clinicamente significativa provocada pela exposição a certos tipos de situações sociais ou de desempenho.

Ela se caracteriza por medo/ansiedade excessivos diante das situações sociais (Nardi, 2000), acarretando prejuízos graves nos diferentes âmbitos da vida do indivíduo, como trabalho, escolaridade, atividades sociais etc. (D'el Rey & Pacini, 2005). Os indivíduos apresentam um padrão de comportamento inadequado, temendo agir ou mostrar sintomas de ansiedade que lhe sejam humilhantes e embaraçosos; consequentemente, evitam essas situações ou as suportam com intenso sofrimento. A ansiedade que surge em situações de interação social também é usualmente acompanhada por sintomas somáticos agudos, que incluem taquicardia, sudorese, tremor, rubor, distúrbios gastrintestinais e dor de cabeça.

Há dois subtipos de fobia social: o generalizado e o circunscrito (ou não-generalizado). O primeiro subtipo é o mais incapacitante. Os indivíduos sofrem de maior comprometimento e de ansiedade mais grave relacionada tanto a situações de desempenho quanto a situações que requerem interação. O segundo subtipo é restrito a uma ou duas situações, em geral ligada(s) ao desempenho - por exemplo: falar em público, escrever ou comer na frente de outras pessoas (Knijnik, Kruter, Cordioli, & Kapczinski, 2005). Apesar dessas classificações, em ambos os subtipos, a saúde geral do indivíduo fica comprometida.

Alguns estudos relatam que esse transtorno tipicamente inicia-se em uma fase intermediária da adolescência, segue um curso crônico e traz sofrimento e impacto negativo sobre a vida de seus portadores (Vilete, Coutinho, & Figueira, 2004; Nardi, 2000; D'el Rey, Pacini, & Chaviara, 2005). Para alguns autores, os fatores relacionados à etiologia da fobia social são múltiplos: fatores genéticos e biológicos se misturam aos fatores culturais, educacionais, econômicos e sociais (Ito, Roso, Tiwari, Kendall, & Asbahr, 2008). A identificação desse transtorno no seu início levaria a menor sofrimento e diminuiria a chance do aparecimento de comorbidades, tão frequentes na fobia social.

Estima-se que a prevalência do distúrbio de ansiedade social na população seja alta: de 5 a 13% da população geral apresentam sintomas de fobia social que resultam em diferentes graus de incapacidade e limitações sociais e ocupacionais (Book & Randall, 2002; Nardi, 2000).

Kessler et al. (2008), em conformidade com o National Comorbidity Survey (NCS), mencionam que a ampla maioria dos pacientes com fobia social sofre de outros quadros psiquiátricos: cerca de 80% dos pacientes apresentam alguma comorbidade. As mais comumente observadas são outros transtornos de ansiedade, depressão e transtornos por uso de substância. Segundo Barros Neto (2000), é elevada a comorbidade em fobia social, sendo os transtornos comórbidos, de um modo geral, secundários do ponto de vista cronológico.

 

Depressão

A depressão está frequentemente associada à incapacitação funcional e ao significativo comprometimento do indivíduo nos aspectos sociais e ocupacionais, sendo um transtorno psiquiátrico altamente prevalente na população em geral. Estima-se que de 15 a 30% dos adultos apresentam depressão clinicamente significativa em algum momento de suas vidas, sendo cerca de 8% com transtorno depressivo maior (Arantes, 2007).

Apesar dessa alta prevalência em populações clínicas, a depressão ainda é subdiagnosticada e, quando corretamente diagnosticada, é muitas vezes tratada de forma inadequada, o que compromete a evolução clínica dos pacientes (Teng, Humes, & Demetrio, 2005; Fleck et al., 2003).

Segundo o DSM-IV (APA, 1994), a depressão pode manifestar-se como episódio depressivo maior ou transtorno distímico. Apesar de o transtorno depressivo maior ser o principal diagnóstico do grupo da depressão, o transtorno distímico pode ser igualmente grave devido aos prejuízos psicológico, físico e funcional ao longo do tempo e ao risco de suicídio (Antonio, Moreno, & Roso, 2006).

Segundo Fleck et al. (2003), a prevalência de depressão é duas a três vezes mais frequente em mulheres do que em homens, e aproximadamente 80% dos indivíduos que receberam tratamento para um episódio depressivo terão um segundo episódio ao longo de suas vidas. Estando associada a outras comorbidades clínicas ou psiquiátricas, a presença de depressão pode piorar diversos fatores relacionados à saúde, bem como pode agravar sua evolução, a aderência aos tratamentos e a qualidade de vida de seus portadores (Teng et al., 2005).

 

Comorbidade: fobia social e depressão

Aplicado à psiquiatria, o termo comorbidade se refere à ocorrência conjunta de dois ou mais transtornos mentais entre si e/ou com (outras) condições médicas (gerais). Estudos diagnósticos, em populações clínicas e na população em geral, mostram que a comorbidade entre pacientes com quadros psiquiátricos é alta (Kessler et al.,2008). Segundo Stoppe Júnior e Cordás (2002), dentre as consequências da comorbidade destacam-se seu impacto sobre a eficácia do tratamento, o aumento do risco de cronicidade e a piora do desempenho social.

Atualmente, sabe-se que a depressão é uma comorbidade comum dos transtornos de ansiedade (D'el Rey & Freedner, 2006; Jatobá & Bastos, 2007), co-ocorrendo frequentemente com a fobia social. Síndromes depressivas ocorrem com frequências que variam de 17 a 70% entre os fóbicos sociais (Schneier et al., 1992 citado por Barros Neto, 2000). Em um estudo feito por Versiani and Nardi (1994), observou-se que 29,6% de uma amostra de 250 pacientes com fobia social primária apresentaram comorbidade com a depressão maior e 18,4% com a distimia.

O alto índice dessa comorbidade é notado quando os indivíduos afetados constituem parte substancial da população de fóbicos. Entretanto, mais estudos devem ser realizados para se estabelecer uma relação entre esses dois transtornos. Os pacientes deprimidos podem restringir suas atividades sociais por causa da perda de interesse, prazer, disposição ou devido aos sintomas ansiosos ou fóbicos. Em geral, os estudos apontam que o transtorno de ansiedade social precede a depressão, sendo um importante fator de risco. Essa associação leva à piora do impacto psicossocial de ambas as doenças, maior gravidade e pior prognóstico (Stein et al., 2001).

Devido ao agravamento do quadro clínico do paciente, provocado pela presença da comorbidade, faz-se necessário alertar para a importância de se estabelecer planos de tratamentos estratégicos. A correta identificação de quadros depressivos em pacientes ansiosos, e vice-versa, tem implicações importantes para o sucesso de tratamentos psicológicos e farmacológicos. Além do mais, a evidência de que a gravidade do transtorno depressivo está relacionada com a idade inicial em que se manifesta a ansiedade social pode levar o profissional de saúde a pensar em um trabalho preventivo (Stein et al., 2001).

O tratamento para os transtornos depressivos e fóbicos sociais "puros" está bem estabelecido e pode ser consultado em diversos manuais e livros, além de estar bem documentado por muitos estudos (Beck, Rush, Shaw, & Emery, 1997; Souza, 1999; Almeida & Lotufo Neto, 2003; Fleck et al., 2003; D'el Rey & Pacini, 2005; Knijnik et al., 2005; Knijnik, Kapczinski, Chachamovich, Margis, & Eizirik, 2004; Ito et al., 2008; Powell, Abreu, Oliveira, & Sudak, 2008). Contudo, nos casos em que a comorbidade se apresenta, podem surgir algumas dificuldades. Stoppe Júnior e Cordás (2002) sugerem que, no caso da comorbidade já existente, o tratamento específico para os sintomas fóbicos é fundamental para o sucesso do tratamento da depressão e que, nesses pacientes com comorbidade, ambos os sintomas devem ser monitorados e considerados alvo do tratamento. Se o tratamento for realizado focando as patologias de forma separada, deve-se estabelecer um plano sequencial de ação. Já os tratamentos mais amplamente relatados para essa comorbidade são a psicoterapia cognitivo-comportamental e o uso de psicofármacos.

 

Metodologia

A pesquisa bibliográfica foi realizada mediante a busca eletrônica de artigos indexados nas bases de dados Pubmed, Psycinfo e LILACS, procurando identificar publicações, entre 2005 e 2009, que avaliaram a associação entre a fobia social e a depressão. Foram selecionados estudos dos últimos cinco anos por se considerar uma fonte de literatura científica mais atual sobre o tema.

Primeiramente, objetivou-se verificar a incidência de artigos em periódicos indexados na base de dados Pubmed sobre os temas fobia social e depressão e a comorbidade entre essas duas patologias. Para esta pesquisa, foram empregados os termos indexados no Medical Subject Heading Terms (MeSH) desenvolvido pelo U.S. National Library of Medicine's, sendo utilizado como método de controle de vocabulário tanto para resumos presentes na base Medline quanto para os presentes unicamente na Pubmed, recuperando as informações que usam terminologias diferentes para os mesmos conceitos. O termo fobia social não foi encontrado nessa base em um primeiro momento. Dessa maneira, a terminologia phobic disorders, que faz referência aos transtornos fóbicos, foi utilizada como estratégia inicial de busca. O termo foi introduzido na base em 1981, definido como "transtornos de ansiedade em que a característica essencial é o medo persistente e irracional de um objeto específico, atividade ou situação que o indivíduo se sente compelido a evitar". A partir de então, foi possível chegar ao descritor referente à fobia social (social phobia). No que diz se respeito à depressão, foi aplicado o termo depressive disorder. Também introduzido na base em 1981, é definido como "um transtorno afetivo que se manifesta tanto por um humor disfórico ou perda de interesse ou prazer nas atividades habituais". Já o termo comorbidity foi inserido na base em 1990, definido como "a presença de doenças adicionais ou co-existentes que podem afetar a habilidade dos indivíduos de funcionar e de sobreviver".

Para a pesquisa na base de dados Psycinfo, foram empregados os termos indexados no Thesaurus of Psychological Index Terms utilizado como método de controle de vocabulário por essa base. A Psycinfo é uma das mais importantes bases de dados na área da Psicologia, sendo desenvolvida e mantida pela American Psychological Association. O termo fobia social foi indexado na base como social phobia em 1985, definido como "extrema apreensão ou medo de interação social ou situações sociais em geral". A terminologia utilizada referente à depressão foi major depression, definida como "transtorno afetivo marcado por humor disfórico, inatividade, falta de interesse, insônia, sentimentos de inutilidade, diminuição da capacidade de pensar e pensamentos de suicídio". Esse termo foi introduzido na base em 1988 e é utilizado a partir de então para populações clínicas em substituição ao termo depressive disorder. Para comorbidade, foi utilizado o descritor comorbidity. Inserido na base em 1991, é definido como a "coexistência de dois ou mais transtornos mentais e/ou físicos".

A revisão no sistema LILACS foi realizada usando os descritores fobia social e depressão, conforme sugere o Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Essa base de dados foi escolhida por registrar a literatura técnico-científica produzida por autores latino-americanos, o que na maioria das vezes não é abarcado pelas outras bases mencionadas. Com a finalidade de limitar a pesquisa aos resumos que apresentavam ao mesmo tempo cada um dos termos, os resultados foram cruzados entre si utilizando o operador lógico aditivo em inglês AND ("e" em português).

As publicações foram selecionadas a partir de uma leitura prévia dos resumos, que seguiu os seguintes critérios de inclusão: 1) veículo de publicação - periódicos indexados, órgãos de maior divulgação e de fácil acesso para os pesquisadores; 2) ano de publicação - artigos publicados entre 2005 e 2009, totalizando, portanto, um período de cinco anos; 3) idioma de publicação - estudos publicados em inglês, português ou espanhol; 4) modalidade de produção científica - estudos teóricos/revisões, estudos empíricos/pesquisas, relato de experiência; e 5) referências pertinentes ao tema - tendo como enfoque norteador o estudo da comorbidade entre fobia social e depressão.

Como resultados da busca, inicialmente por não possuírem o resumo disponível. Após a leitura prévia dos resumos, oito foram descartados por estarem em duplicidade e 48, apesar de conterem os descritores-chave, não tinham relação direta com a comorbidade entre fobia social e depressão. Seguindo os critérios adotados, também foram excluídos um comentário, uma dissertação, dois capítulos de livro e uma publicação em obtiveram-se 96 referências catalogadas no período de 2005 a 2009, sendo que quatro foram excluídas japonês. Da aplicação dos critérios de elegibilidade, resultaram 31 artigos. Esses artigos foram analisados sistematicamente por se adequarem ao delineamento e serem relevantes para os objetivos do presente estudo. A Figura 1 traz um fluxograma que resume a estratégia adotada para identificação e inclusão dos estudos.

Durante a leitura dos artigos, foram consideradas as informações contidas nos textos, sua significância estatística, sua consistência e os dados apresentados pelos autores. Os dados coletados foram organizados em uma planilha do software Excel, visando a facilitar a identificação e a análise dos aspectos relevantes para este estudo.

No que concerne aos indicadores específicos da temática em análise neste estudo, interessa mencionar que a enumeração dos mesmos foi fundamental para a identificação e a avaliação de como a comorbidade entre os transtornos fobia social e depressão tem sido tratada pelas publicações científicas.

 

Resultados e discussões

Indicadores bibliométricos

Os artigos foram publicados em seis países: 18 nos Estados Unidos, cinco na Holanda, cinco no Reino Unido, um na Alemanha, um na Suíça e um no Brasil. Dos 31 artigos analisados, 30 foram publicados em inglês e um em português.

O periódico Journal of Anxiety Disorders apresentou cinco publicações, seguido pelos periódicos Journal of Affective Disorders e Depression and Anxiety com quatro publicações cada, pelo Behaviour Research and Therapy com três publicações e pelo Behavior Therapy com dois artigos publicados.

Os demais publicaram um único artigo sobre o tema.

Foram indexados oito artigos em 2009, seis em 2008, oito em 2007, quatro em 2006 e em 2005 a frequência foi de cinco indexações. Verifica-se que a produção dos últimos três anos foi maior em relação aos anos anteriores, indicando um relativo aumento das publicações na área.

Nesse período, 15 autores publicaram dois trabalhos (Stein, M.B.; Höfler, M.; Lieb, R.; Wittchen, H.U.; Dalrymple, K.L.; Zimmerman, M.; Gibb, B.E.; Coles, M.E.; Gilboa-Schechtman, E.; Marom, S.; Hermesh, H.; Ranta, K.; Kaltiala-Heino, R.; Pelkonen, M.; Marttunen, M.) e apenas um autor (Heimberg, R.G.) publicou três: os demais autores publicaram um único trabalho. Quanto à frequência de autoria dos artigos, apenas um foi de autoria única, nove foram trabalhados em dupla, oito em trio e 13 tiveram quatro ou mais autores. Nota-se que a repetição de um número significativo de autores pode denotar a presença de grupos de pesquisa que estudam os temas relacionados à fobia social e aos transtornos depressivos, apontando, assim, bons indicadores da evolução dessa área.

A Tabela 1 sumariza os resultados relativos aos indicadores bibliométricos analisados no estudo aqui reportado.

 

Temas abordados

Temática das introduções

Alguns estudos abordaram o tema fobia socialcomo um dos mais prevalentes transtornos ansiosos, sendo ela caracterizada como um transtorno mental muitas vezes incapacitante, normalmente com início precoce e curso prolongado (Tillfors, El-Khouri, Stein, & Trost, 2009; Marom, Gilboa-Schechtman, Aderka, Weizman, & Hermesh, 2009; Graystone, Garner & Baldwin, 2009; Graver & White, 2007; D'el Rey & Freedner, 2006). A fobia social foi definida como um medo acentuado e persistente de uma ou mais situa ções sociais ou de desempenho. Os indivíduos afetados foram caracterizados por apresentarem medo de avaliação negativa por outros, desenvolvimento de sintomas de ansiedade na temida situação social ou de desempenho e, consequentemente, por evitarem essas situações (Ranta, Kaltiala-Heino, Rantanen, & Marttunen, 2009b; Dalrymple & Zimmerman 2007). Quanto à sua especificidade, a fobia social foi apresentada em dois subtipos básicos: o circunscrito e o generalizado (McTeague et al., 2009).

A comorbidade entre a fobia social e outros transtornos psiquiátricos também foi um tema frequente nas introduções. A fobia social é tipicamente comórbida com outros transtornos do eixo I, como a depressão, outros transtornos de ansiedade e o uso de substâncias (Mennin, Holaway, Fresco, Moore, & Heimberg, 2007; Bassiony, 2005).

O transtorno de ansiedade social e a depressão frequentemente coexistem, sendo esse o tema principal da maioria dos estudos. Dados apontam que os sintomas depressivos são subsequentes ao aparecimento da fobia social (Beesdo et al., 2007; Höfler, Lieb, & Wittchen, 2007; Moitra, Herbert, & Forman, 2008). Pacientes com essa comorbidade relatam níveis mais elevados de sofrimento, maior número de comportamentos de esquiva, maior prejuízo no funcionamento social e profissional e maior risco de suicídio (Joormann, Inderbitzen-Nolan, & Schapman, 2005), ou seja, demonstram maior severidade dos sintomas e comprometimento funcional em comparação com pacientes com apenas um dos distúrbios (Dalrymple & Zimmerman, 2008). Além desses sintomas tais indivíduos podem apresentar distorções cognitivas (Voncken, Bögels, & Peeters, 2007), sofrimento emocional, ruminação/preocupação (Kashdan & Roberts, 2007), maior negatividade (Gilboa-Schechtman, Presburger, Matom, & Hermesh, 2005), autocrítica, baixa confiança, solidão e tristeza (Grant & Beck, 2006).

Esse tipo de comorbidade tem consequências importantes para diagnóstico, tratamento e prognóstico dos transtornos ansiosos. Considerando isso, dois artigos abarcam tipos de tratamento e sua respectiva significância para esse grupo. A terapia cognitivo-comportamental e os tratamentos farmacológicos são as formas de tratamento predominantes (Dempsey, Randall, Thomas, Book, & Carrigan, 2009; Smits, Minhajuddin, & Jarret, 2009).

Dois trabalhos examinaram o tema da comorbidade entre fobia social e depressão e suas implicações entre os adolescentes (Ranta, Kaltiala-Heino, Rantanen, & Marttunen, 2009; Johnson, Inderbitzen, & Schapman, 2005) e um examinou essa relação em uma população de idosos (Cairne, Corna, Veldhuizen, Herrmann, & Streiner, 2008), diferenciando-se, assim, daqueles que não abordaram o universo estudado como temática principal. Esses trabalhos apontam a importância de se estudarem tais populações apesar de esses distúrbios serem conhecidos por co-ocorrerem em adultos jovens.

Alguns modelos teóricos que tentam explicar a ansiedade social, a depressão, bem como a comorbidade entre esses dois transtornos foram destacados em cinco trabalhos. O "modelo tripartido" da ansiedade e da depressão postula que certos grupos de sintomas seriam relativamente únicos à ansiedade - por exemplo, hipervigilância - e à depressão - por exemplo, a anedonia -, assim como alguns sintomas seriam compartilhados por ambos os transtornos - como um desconforto geral ou um fator de influência negativa. Esse modelo foi enfatizado por Hughes et al. (2006) e por Gibb, Coles and Heimberg (2005). O desenvolvimento de modelos para a comorbidade é proposto por Starr and Davila (2008) a partir da diferenciação das relações interpessoais que ligam os sintomas da ansiedade social e da depressão. O modelo estrutural para explicação da ansiedade social é destacado por Brown and Stopa (2008), que fazem referência ao aparecimento de estilos adaptativos em três aspectos diferentes do traço de ansiedade social: medo da avaliação negativa, ansiedade nas interações sociais e medo de escrutínio público. O modelo cognitivo de Beck dos transtornos emocionais se faz presente em um dos trabalhos: Dozois and Frewen (2006) enfatizam que, para a compreensão abrangente dos fundamentos cognitivos do humor e dos transtornos de ansiedade, é necessária a identificação dos processos cognitivos que são compartilhados entre essas psicopatologias, já que é muito provável que os indivíduos com esses transtornos apresentem um número de características cognitivas em comum.

Por fim, dois trabalhos se diferenciaram por correlacionarem a dependência alcoólica (Olgiati et al., 2007) e os distúrbios do sono, particularmente a insônia (Buckner, Bernert, Cromer, Joiner, & Schmidt, 2008) com os sintomas da fobia social e da depressão. O primeiro destaca que, de acordo com a hipótese de automedicação, os indivíduos com depressão e transtornos de ansiedade social usam o álcool para controlar os sintomas e, posteriormente, tornam-se dependentes. E o segundo oferece uma possível explicação para o comprometimento do sono experimentado por indivíduos ansiosos. O fato de a ansiedade e de a depressão serem geralmente comórbidas pode fazer com que os indivíduos que apresentam essa condição sejam mais vulneráveis à insônia. A Tabela 2 agrupa os principais temas abordados nas introduções dos artigos supracitados.

Populações estudadas

Com relação às populações estudadas, foram investigados: indivíduos com transtorno de ansiedade social, depressão e comorbidade (Smits et al., 2009; Voncken et al., 2007; Gilboa-Schechtman et al., 2005); aqueles com fobia social como diagnóstico primário (Marom et al., 2009; McTeague et al., 2009; Moitra let a., 2008; Hughes et al., 2006; D'el Rey & Freedner, 2006; Bassiony, 2005); pacientes com transtorno depressivo maior (Dalrymple & Zimmerman, 2008); pacientes com transtorno por uso de álcool (Olgiati et al., 2007) mais o diagnóstico de fobia social (Dempsey et al., 2009); e pacientes psiquiátricos (Dalrymple & Zimmerman, 2007).

Cinco estudos tiveram como público-alvo os adolescentes (Ranta et al., 2009a, 2009b; Starr & Davila, 2008; Johnson et al., 2005), sendo que Tillfors et al. (2009) investigaram apenas adolescentes do sexo masculino. Os estudos com adolescentes são justificados na medida em que o início do transtorno fóbico-social tende a se apresentar numa idade mais precoce, frequentemente na infância, com pico na adolescência, seguindo um curso crônico e contínuo.

Os estudantes universitários foram investigados em seis artigos (Brown & Stopa, 2008; Buckner et al., 2008; Mennin et al., 2007; Graver & White, 2007; Kashdan & Roberts, 2007; Grant & Beck, 2006), ao passo que cinco artigos estudaram adultos/adultos jovens (Graystone et al., 2009; Beesdo et al., 2007; Höfler et al., 2007; Gibb et al., 2005; Joormann et al., 2005) e um artigo investigou uma população de idosos (Cairney et al., 2008). A maior parte dos estudos epidemiológicos e clínicos está voltada para as populações de adultos/adultos jovens, uma vez que os transtornos de ansiedade e depressão são conhecidos por co-ocorrerem nessa população específica. Dessa maneira, ênfase é dada para o estudo de Cairney et al. (2008) na medida em que tais autores procuram investigar a incidência desses transtornos numa população de pessoas com 55 anos ou mais, sugerindo que a comorbidade entre a depressão e a ansiedade social também é predominante nesse grupo.

Com relação à prevalência nos gêneros, Dozois and Frewen (2006) investigaram um grupo constituído por pessoas apenas do sexo feminino, partindo do pressuposto de que existem maior prevalência e incidência de fobia social em mulheres. Já no estudo de Bassiony (2005), 90% da amostra foram compostos por indivíduos do sexo masculino. Nesse caso, a escolha dessa população foi justificada por aspectos culturais - cultura saudita -, e não necessariamente pela relação prevalência/gênero.

Instrumentos utilizados

As escalas para depressão e fobia social foram empregadas na maioria dos estudos. Os instrumentos que avaliam os sintomas de ansiedade mais utilizados foram:

• Escala Liebowitz de Ansiedade Social - LSAS (Dempsey et al., 2009; Marom et al., 2009; Graystone et al., 2009; Moitra et al., 2008; Olgiati et al., 2007; Beesdo et al., 2007; Hughes et al., 2006; Bassiony, 2005; Gilboa-Schechtman et al., 2005; Gibb et al., 2005). Essa escala tem como objetivo avaliar o leque de interações sociais e situações de desempenho que os indivíduos com fobia social temem ou evitam.

• Escala de Ansiedade e Interação Social - SIAS (Buckner et al., 2008; Graver & White, 2007; Kashdan & Roberts, 2007; Hughes et al., 2006; Grant & Beck, 2006; Gibb et al., 2005). O objetivo principal dessa escala é avaliar o medo nas situações de interação social.

• Inventário de Ansiedade de Beck - BAI (Brown & Stopa, 2008; Dozois & Frewen, 2006), cujo objetivo é avaliar a presença de sintomas ansiosos.

• Inventário de Ansiedade e Fobia social - SPAI (Moitra et al., 2008; Grant & Beck, 2006). Esse instrumento é utilizado para rastreamento de casos de fobia social, quantificação da gravidade de sintomas e avaliação da eficácia terapêutica.

• Inventário de Fobia Social - SPIN (Ranta et al., 2009a, 2009b). Esse inventário avalia três critérios que definem o quadro clínico da fobia social, ou seja, o medo, a evitação das situações e os sintomas somáticos. Dentre os instrumentos para avaliar os sintomas depressivos, os mais utilizados foram:

• Inventário de Depressão de Beck - BDI (Dempsey et al., 2009; Smits et al., 2009; Ranta et al., 2009a; McTeague et al., 2009; Brown & Stopa, 2008; Moitra et al., 2008; Buckner et al., 2008; Graver & White, 2007; Kashdan & Roberts, 2007; Hughes et al., 2006; Dozois & Frewen, 2006; Grant & Beck, 2006; Gibb et al., 2005; Gilboa-Schechtman et al., 2005; Joormann et al., 2005). Trata-se de uma escala para avaliar a intensidade dos sintomas depressivos.

• Escala Hamilton para Depressão - HRSD (Smits et al., 2009; Olgiati et al., 2007; Hughes et al., 2006; Gibb et al., 2005). Essa é uma escala que auxilia no diagnóstico da depressão.

A Entrevista Clínica Estruturada para o DSM-IV (SCID) também foi um importante instrumento utilizado em alguns trabalhos (Dalrymple & Zimmerman 2007; Graver & White, 2007; Dozois & Frewen, 2006; D'el Rey & Freedner, 2006; Bassiony, 2005; Gilboa-Schechtman et al., 2005; Joormann et al., 2005). Esse instrumento tem sido largamente utilizado em vários estudos, mostrando-se útil para o aprimoramento e a confiabilidade do diagnóstico psiquiátrico.

Todos os artigos analisados foram classificados como relato de pesquisa: a maioria com delineamento do tipo experimental ou quase experimental.

 

Principais resultados dos estudos

A comorbidade entre fobia social e a depressão é bem documentada, embora a relação entre esses dois transtornos ainda seja objeto de investigação.

Em um estudo realizado por D'el Rey e Freedner (2006) com 63 pacientes, diagnosticados com fobia social, que procuraram tratamento no Centro de Pesquisas e Tratamento de Transtornos de Ansiedade - São Paulo-SP, Brasil, 35% também preencheram em algum momento de suas vidas os critérios diagnósticos do DSM-IV para depressão maior. Nesse estudo, a hipótese foi de que os pacientes com fobia social generalizada apresentariam mais comorbidade com a depressão do que os pacientes com a forma circunscrita. Entretanto, esses dois subgrupos não diferiram em termos de comorbidade com a depressão. Para os autores, os pacientes com fobia social estão mais severamente incapacitados em termos de funcionamento pessoal no dia a dia, por isso provavelmente em maior risco para desenvolverem quadros depressivos. Noventa e cinco dos pacientes tiveram seu primeiro episódio depressivo após o início da fobia social e apenas um paciente (5%) teve seu primeiro episódio depressivo ocorrendo conjuntamente com o início da fobia social. O trabalho de Bassiony (2005) apresentou resultados semelhantes: 41% dos pacientes com transtorno de ansiedade social apresentaram comorbidade com depressão; destes, 92,5% relataram que a fobia social começou mais cedo do que os primeiros episódios depressivos. Estudos como os de Beesdo et al. (2007) e de Höfler et al. (2007) também identificam a fobia social como um importante fator preditor ou de risco para o desenvolvimento de depressão subsequente.

Ao se discutirem os subtipos da fobia social - generalizada e circunscrita - Hughes et al. (2006) destacam que o subtipo generalizado pode, sim, ser mais estreitamente relacionado com os transtornos do humor enquanto que o subtipo circunscrito pode ser mais estreitamente relacionado com outros transtornos de ansiedade (particularmente transtorno de pânico ou fobias específicas). Segundo eles, os indivíduos com o subtipo generalizado de fobia social são mais propensos a terem um transtorno de humor durante a vida. Contudo, os resultados desse estudo sugerem que não se pode diferenciar claramente os sintomas de ansiedade e depressão em indivíduos com fobia social. Já McTeague et al. (2009) reforçam o fato de os pacientes com fobia social generalizada serem caracterizados pela cronicidade da doença e pela elevada sensibilidade para uma ampla gama de conteúdos de medo. Assim, nesse estudo, os indivíduos que apresentaram fobia social generalizada em comorbidade com a depressão relataram ansiedade social mais prolongada em diversas situações sociais.

Apesar de alguns estudos sugerirem que não é possível diferenciar de forma clara os sintomas de ansiedade e depressão, outros apostam na identificação desses sintomas e na investigação de como a estrutura cognitiva se desenvolve ao longo do tempo, para uma melhor compreensão do diagnóstico de comorbidade, podendo, assim, ajudar a evitar que indivíduos com transtornos de ansiedade social se tornem vulneráveis à sintomatologia depressiva.

Para Gibb et al. (2005), ao se centrar sobre os sintomas específicos de cada transtorno e por meio de medidas validadas, é possível discriminar entre os dois distúrbios quando se apresentam em condições comórbidas. Mennin et al. (2007) indicam que ambos os transtornos compartilham elementos emocionais e que estes podem ser responsáveis pelos elevados níveis de comorbidade. Segundo Brown e Stopa (2008) e Voncken et al. (2007), fóbicos sociais com altos e baixos sintomas depressivos, em comparação com indivíduos deprimidos, apresentam interpretações mais negativas das situações sociais e julgamento dessas situações como ameaçadoras.

O estudo de Dozois and Frewen (2006) destaca que a depressão e a fobia social mostram maior inter-relação entre conteúdos interpessoais negativos: a fobia social tem sido associada com crenças negativas sobre a autoestima e a capacidade de desempenho no domínio interpessoal. No entanto, a cognição na fobia social também pode assumir um perfil típico da depressão caracterizado por pensamentos sobre inconveniência social, rejeição e incompetência. Os pensamentos negativos sobre autoestima no domínio interpessoal podem levar à ansiedade excessiva sobre o desempenho em situações sociais para alguns indivíduos e aos pensamentos de inutilidade e humor disfórico extremo para outros. Assim, os conteúdos interpessoais negativos podem mediar o aparecimento de sintomas depressivos em indivíduos socialmente ansiosos. O comportamento evitativo em eventos sociais, devido ao medo de passar vergonha ou humilhação, pode levar alguns indivíduos a uma vida social mais restrita e, consequentemente, possibilitar o desenvolvimento de sintomas depressivos (Moitra et al., 2008). Gilboa-Schechtman et al. (2005) também apresentam dados de que a combinação entre ansiedade social e depressão pode fazer com que os indivíduos sejam mais propensos a atribuírem significado negativo aos estímulos do meio.

Grant and Beck (2006) apontam, ainda, que estímulos depressivos podem ser relevantes para as preocupações associadas com a ansiedade social, como a baixa confiança, a solidão e a tristeza. E que a ansiedade social está associada a um viés atencional para estímulos ameaçadores, bem como a ruminação está relacionada com o desenvolvimento e a manutenção de ambos os transtornos. Esses dados são corroborados por Kashdan and Roberts (2007).

Além dessas sintomatologias, importância também deve ser dada às variáveis do ambiente social e familiar. No estudo de Johnson et al. (2005), o grupo de pacientes deprimidos e comórbidos avaliaram suas mães como sendo excessivamente preocupadas com as opiniões dos outros e ambos os pais de envergonharem-se das dificuldades dos jovens. O grupo composto por indivíduos socialmente ansiosos percebeu maior vergonha dos pais e preocupação exagerada com a opinião dos outros, bem como maior restrição social. Starr and Davila (2008) também procuraram relacionar essas variáveis com ambos os transtornos e descobriram que a ansiedade social está mais fortemente relacionada com competências sociais, confiança e comunicação entre as amizades, enquanto que os sintomas depressivos estão mais fortemente relacionados com baixa confiança, conflitos e maior alienação social. Principalmente entre os adolescentes, tanto a depressão quanto a fobia social estão intimamente associadas à vitimização de pares (Ranta et al., 2009a).

Graver and White (2007) investigaram a neuropsicologia da fobia social com e sem comorbidade com a depressão e descobriram que passar por situações que envolvam potencial social e avaliação pessoal (por exemplo: exames ou apresentações) pode gerar um impacto significativo sobre o funcionamento neuropsicológico dos indivíduos com fobia social. Assim, indivíduos fóbicos sociais, com e sem comorbidade com a depressão, podem apresentar dificuldades cognitivas relacionadas ao estresse gerado em tais situações.

Dado que a fobia social tem se apresentado como uma condição altamente comórbida, Ranta et al. (2009b) estudaram uma população de adolescentes e observaram que a comorbidade com a fobia social em indivíduos de 15 a 17 anos é significativamente elevada, sendo outros transtornos de ansiedade (41%) e transtornos depressivos (41%) as comorbidades mais frequentes. Também para essa população, Tillfors et al. (2009) sugerem que adolescentes com fobia social generalizada (por exemplo: medo em interações sociais) apresentam maior probabilidade de desenvolver comorbidade com sintomas depressivos e alertam para que esses sintomas sejam tratados precocemente. Entre os adultos com 55 anos ou mais, a fobia social também foi um distúrbio comum em comorbidade com depressão. Esses resultados sugerem que a depressão e a ansiedade comórbidas também são predominantes na vida adulta (Cairney et al., 2008).

Dos artigos que abordaram o tratamento para ansiedade social, depressão e comorbidade, foi constatado que os pacientes com transtorno de ansiedade social comórbido com o transtorno depressivo correm o risco de maior sofrimento e prejuízos do que as pessoas com transtorno de ansiedade social simples. Graystone et al. (2009) enfatizam a necessidade de avaliação abrangente e de tratamento da depressão secundária em pacientes com transtornos de ansiedade primária. No trabalho de Joormann et al. (2005), os resultados mostraram que o efeito da comorbidade não prejudicou o tratamento da fobia social apesar de o grupo comórbido ter apresentado sintomas mais elevados de depressão ao final do tratamento em comparação com o grupo que apresentava apenas fobia social. Os estudos apontam que o tratamento voltado para um dos transtornos pode causar mudanças significativas no outro (Dempsey et al., 2009) e que a terapia cognitivocomportamental, individual ou de grupo, é eficaz na redução tanto da ansiedade social quanto da depressão (Marom et al., 2009; Smits et al., 2009).

Ainda em relação aos aspectos do tratamento, alguns estudos destacam que pacientes com transtorno depressivo maior podem não desejar tratamento para o transtorno de ansiedade social comórbido (Dalrymple & Zimmerman, 2007, 2008).

Os estudos que correlacionaram os distúrbios do sono (Buckner et al., 2008) e a dependência alcoólica (Olgiati et al., 2007) com os sintomas de ansiedade social e depressão, sugerindo que estes podem desempenhar um papel vital na comorbidade, indicam a necessidade de tratamentos específicos para reduzir os sintomas residuais de depressão e ansiedade nesses indivíduos.

 

Considerações finais

A fobia social vem sendo, nos últimos anos, reconhecida como um transtorno altamente incapacitante. Sua principal característica é um medo persistente e excessivo de ser criticado e julgado em situações sociais ou de desempenho. O medo dessas situações e a ansiedade provocada quando tem de ser enfrentados são tão intensos que levam o indivíduo a não desejar e a evitar atividades em público e situações em que tais possibilidades possam surgir. Assim, no presente estudo, foi destacado como têm sido discutidas a comorbidade entre fobia social e depressão e a consequente exploração dessa temática por parte de artigos científicos dos últimos cinco anos.

Essa comorbidade tornou-se objeto de investigação de muitos trabalhos epidemiológicos e clínicos, indicando que esses transtornos coocorrem com grande frequência na população em geral. Muitos desses estudos trabalham com a hipótese de que o transtorno de ansiedade social antecede os transtornos depressivos, constituindo um preditor importante não só para a depressão, mas também para a sua gravidade.

A existência de comorbidade traz consequências para o diagnóstico, tratamento e prognóstico desses transtornos. Quando os sintomas depressivos estão presentes, os sintomas do transtorno de ansiedade social são, em geral, mais graves e de pior prognóstico. Assim, a correta identificação de quadros depressivos em fóbicos sociais tem implicações importantes para o sucesso dos tratamentos.

A relevância deste trabalho está em tentar esclarecer a ocorrência da comorbidade entre depressão e ansiedade social. Contudo, muitas questões ainda permanecem sem resposta, revelando a necessidade de mais trabalhos nessa área, principalmente no Brasil, pois, como foi possível notar, a maior parte da literatura científica encontrada é proveniente de outros países, com prevalência de artigos norte-americanos.

 

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Recebido em: 17/06/10
Aceito em: 26/07/10

 

 

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