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Boletim de Psicologia

versão impressa ISSN 0006-5943

Bol. psicol vol.64 no.140 São Paulo jun. 2014

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Análise do conteúdo de sites que abordam o suicídio

 

Content analysis of websites discussing suicide

 

 

Tatiana Gonçalves Ribeiro do ValleI,*; Maria Julia KovácsII,*

IInstituto de Psicologia Universidade de São Paulo (USP) - SP - Brasil Escola Paulista de Medicina - UNIFESP - SP - Brasil
IIInstituto de Psicologia Universidade de São Paulo (USP) - SP - Brasil

 

 


RESUMO

A questão do suicídio é complexa e afeta pessoas de maneiras diversas. Atualmente a internet se apresenta como ferramenta na expressão de pensamentos e sentimentos considerados desagradáveis no mundo real. Este estudo analisou o conteúdo de sites relacionados ao tema do suicídio na internet. Foi realizada pesquisa com a palavra "suicide" na ferramenta de busca Google e os 100 primeiros resultados foram classificados em 10 categorias. Os sites suicide.com, suicide.org e save.org, considerados de ajuda para prevenção do suicídio, foram escolhidos para uma análise mais detalhada. Foi possível apreender as propostas dos autores e considerar as possíveis influências sobre os usuários.

Palavras-chave: Suicídio; internet; análise de conteúdo.


ABSTRACT

The problem of suicide is complex and affects people in different ways. The internet currently presents itself as a tool for the expression of thoughts and feelings considered unpleasant in the real world. This study analyzed the content of websites related to the theme of suicide on the internet. A survey was conducted with the word "suicide" using Google as a tool of search. The first 100 results were classified into 10 categories. The websites suicide.com, suicide.org e save.org, considered help for suicide prevention, were chosen for a more detailed analysis. It was possible to apprehend the authors' propositions and consider the possible influences on users.

Key words: Suicide; internet; content analysis.


 

 

Suicídio é um tema complexo que demanda estudos e reflexões constantes. O Portal de Saúde da Organização Mundial da Saúde apresenta os dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do SUS de 2001-2008. Ocorreram 73.261 mortes por suicídio neste período, o que corresponde a 22 suicídios por dia. No Brasil, país considerado como tendo índice baixo de suicídios, foram computados 4,5 por 100 mil habitantes. O número de suicídios é alto, porque o país é populoso (Portal de Saúde, 2012). É importante ressaltar que nestes números estão incluídas as notificações de suicídio, ficando de fora os acidentes, que podem ter tido intenção suicida. Estatísticas nem sempre traduzem a realidade da situação, muitos acidentes e mortes resultantes de comportamentos autodestrutivos não são computados como suicídio, uma forma de proteção à memória do falecido e à vergonha ou culpa da família.

No sentido estrito suicídio se refere à morte causada pela própria pessoa. Existem diversas maneiras de se chegar à morte, comportamentos ou situações, que a princípio não parecem ter intenções claramente suicidas, mas que podem ser assim classificados, quando vistos com mais exatidão (Cassorla, 1984). O suicídio numa visão estrita é a autoeliminação voluntária e intencional. Tomado mais amplamente, o suicídio inclui processos autodestrutivos inconscientes, lentos e crônicos (Kovács, 1992, 2013).

Cassorla (1984) afirma que a morte pode ser buscada de forma consciente ou inconsciente, incluindo pulsões de vida e de morte que interagem. As primeiras levam ao crescimento, desenvolvimento e reprodução. A pulsão de morte promove a busca de um estado inanimado. A vida é o resultado da interação entre essas pulsões. Em situações de conflito, a força da pulsão de morte pode se exacerbar e mecanismos autodestrutivos se manifestam, podendo envolver adoecimento, atos inconscientes ou conscientes de autoextermínio. Impulsos destrutivos precisam ser neutralizados e desviados para não se voltarem contra a pessoa. Frustrações externas podem causar aumento desses impulsos e, se a agressividade não for dirigida pelo instinto de vida, poderá se tornar insuportável.

De acordo com Cassorla, a pessoa com ideação suicida nem sempre busca a morte, uma vez que não sabe o que é, podendo estar atrás de outra vida, fantasia criada em sua mente, geralmente inconsciente, e, portanto, acessível apenas de forma indireta. Pode viver o conflito de desejar a morte e a vida ao mesmo tempo, e uma ajuda ou ameaça podem decidir a direção que o individuo irá tomar.

A ideação suicida é freqüente nos adolescentes, podendo ser vista como maneira de compreender e elaborar a questão da morte, mesmo que de forma vaga. Neste contexto, pensamentos sobre suicídio podem fazer parte do que se considera normal na adolescência. É fundamental então fazer a avaliação do estado emocional deste jovem.

Gutierrez (2006) afirma que o risco de suicídio é influenciado por diversos fatores e pode sofrer alterações drásticas de um momento para outro, de maneira que é praticamente impossível prever desdobramentos futuros. A ambivalência, frequentemente encontrada em indivíduos com ideação ou tentativa de suicídio, pode ser explicada pela interação entre fatores de risco e de proteção. Quando os fatores de risco são mais fortes, o indivíduo se encontra atraído pela morte e mais propenso ao suicídio. Se os fatores de proteção predominam, pode ocorrer maior atração pela vida e menor probabilidade de suicídio (Orbach, 1989, 1997, apud Gutierrez, 2006).

Um projeto da Organização Mundial de Saúde, denominado Estudo Multicêntrico de Intervenção no Comportamento Suicida (SUPRE-MISS), demonstrou a importância que o oferecimento de ajuda a uma pessoa que tenta suicídio pode ter em seu futuro. O projeto foi realizado no Brasil pelo grupo coordenado por Neury Botega, com resultados significativos na prevenção do suicídio (Zorzetto & Fioravanti, 2009).

Além do Brasil, o estudo ocorreu em quatro países: Índia, Irã, China e Sri Lanka. Pacientes que haviam tentado suicídio foram entrevistados e convidados a participar do estudo. Os participantes foram divididos em dois grupos, no primeiro foram avaliados e encaminhados a serviços apropriados na rede de saúde. As pessoas do segundo grupo receberam também informações sobre fatores, que podem levar a uma tentativa de suicídio, dados numéricos de suicídio na população e as chances de repetição deste fato. Cada integrante do segundo grupo recebeu uma sessão de aconselhamento seguida de uma chamada telefônica a intervalos de algumas semanas durante um ano e meio Em cada um desses contatos o profissional da equipe perguntava ao participante como este se sentia e estimulava a busca de ajuda médica. Este trabalho foi coordenado por Botega da Unicamp, que testou no Brasil a eficácia desta intervenção proposta pela Organização Mundial de Saúde.

Ao fim do estudo, no primeiro grupo, 2,2% havia morrido por suicídio, enquanto no segundo apenas 0,2%. Esta estratégia simples e praticamente sem custos mostrou-se eficaz, diminuindo em dez vezes a taxa de suicídio entre os que receberam as ligações telefônicas, criando laços entre as pessoas com ideação suicida e profissionais de saúde (Zorzetto & Fioravanti, 2009).

Processos de interação social têm passado por tantas mudanças nas últimas décadas, que frequentemente há sensação de se estar à deriva, uma vez que aquilo que era considerado "o nosso mundo" deixou de existir. Essa sensação não é nova, segundo Nicolaci-da-Costa (2002), pois processos de transformação, ocorridos em outras épocas, tiveram resultado análogo. Segundo a autora, com as transformações radicais na organização social, o que se vive na atualidade é caracterizado por fragmentos, descontinuidade, caos, insegurança, medo, perturbações da auto-organização e depressão. Tudo isso remete à perda de referenciais e medo.

Uma característica importante da atualidade é o surgimento de um mundo virtual com a internet, levando a processos de acelerada transformação social, que derruba fronteiras, altera a vida, as formas de comunicação e de adquirir conhecimento, como aponta a autora. O mundo virtual apresenta aspectos muito particulares, que o diferenciam das interações que ocorrem face a face. No ambiente virtual, as formas de se comunicar são mais restritas, o que pode ser interpretado de forma positiva ou negativa. Ambientes virtuais trazem a possibilidade de se estabelecer uma comunicação no anonimato, caracterizando-se como espaço lúdico de experimentação para seus usuários. Essa ausência de identificação permite às pessoas experimentarem papéis, dividirem fantasias, desejos e angústias mais facilmente, já que propicia ambiente seguro para a exposição, livre de constrangimentos e sanções sociais devido às características do contexto virtual (Dias & La Taille, 2006).

A rede é, para muitos, nova fonte de prazer e agradável espaço de vida, no qual é possível se relacionar com outras pessoas. Este prazer parece estar relacionado à emergência de um lugar em que ocorrem novas experiências de vida, não sendo apenas simples ferramenta disponível no mundo real. Os recursos da internet (comunicação em tempo real e à distância, anonimato, acesso fácil à informação, realização simultânea de diferentes atividades) podem gerar no indivíduo a sensação de ter acesso a tudo e capacidade de fazer qualquer coisa, ignorando os limites do mundo real. Há mudanças na forma de perceber o corpo pela invenção virtual. Os usuários desbravam um espaço ainda novo, sem limites claros, e por isto se expõem a situações de exagero e são lançados a novos desafios. Precisam transformar grande volume de informações dispersas em conhecimento pessoal e coerente, dividindo o tempo passado nos espaços real e virtual, além de construir novas defesas para a intimidade no mundo virtual (Leitão & Nicolaci-da-Costa, 2005).

É necessário considerar a importância desta poderosa ferramenta nos tempos atuais e sua possível relação com casos de suicídios de jovens. No Reino Unido, Biddle, Donovan, Hawton, Kapur e Gunnel (2008) realizaram uma pesquisa cujo objetivo era descobrir o que pessoas buscavam como informações sobre suicídio na internet. Foram utilizadas quatro ferramentas de busca conhecidas no Reino Unido: Google, Yahoo, MSN e ASK. Em cada uma delas foram considerados 12 termos amplos relacionados com o tema, escolhidos a partir de estudos com pessoas que tentaram suicídio. Foram usados os termos indicados pelas próprias ferramentas de busca ao se procurar por "suicide", e incluídos os 10 primeiros sites listados em cada resultado, perfazendo 480 no total.

O conteúdo dos sites foi analisado para que numa primeira divisão se chegasse a 14 categorias criadas pelos pesquisadores. Nos termos e categorias estabelecidos houve ênfase nos métodos de suicídio. Nos 240 sites encontrados, 45 foram categorizados como encorajamento, facilitação, ou promoção do suicídio, 44 com informações sobre suicídio de forma fatual, 20 com manifestação lúdica explícita ou encoberta. Doze sites apresentavam-se como locais de discussão em que seus participantes falavam de métodos de suicídio. Foram encontrados 62 sites focados em prevenção de suicídio, que ofereciam apoio e 59 sites proibiam ou desencorajavam o ato suicida (Biddle et al., 2008).

Os pesquisadores consideraram que os sites mostravam a facilidade em se obter informações técnicas a respeito de métodos de suicídio. Embora os sites dedicados aos métodos de suicídio fossem os mais frequentemente encontrados, houve também aqueles com o propósito de prevenção. As considerações finais do estudo de Biddle et al. indicaram alta prevalência de suicídio entre jovens e a intensa busca de várias mídias nesta população, principalmente da internet. Adolescentes se tornam assim o grupo mais vulnerável às informações, que circulam neste meio.

Barnes, Ikeda e Kresnow (2001) estudaram comportamentos de busca de ajuda presentes em adolescentes e jovens adultos anteriores a tentativas de suicídio, que poderiam resultar em morte. Os estudos envolvendo a busca de ajuda de profissionais de saúde mostram que até 69% daqueles que cometeram suicídio tiveram contato com psiquiatras ou clínicos no mês anterior à morte. Os pesquisadores observaram que, comparando sujeitos-controle e pacientes, estes últimos eram significativamente menos propensos a procurar ajuda profissional. Cabe ressaltar que, entre os que buscaram ajuda, discutiram sobre suicídio com o profissional consultado. Adolescentes com ideação ou tentativa de suicídio também procuraram família e amigos para conversar.

Outros estudos são referência para pesquisadores sobre conteúdo de sites de suicídio. Segundo Alao (2006) e Mehlum (2001), a internet pode ajudar pessoas a buscarem métodos mais eficientes, rápidos e indolores para cometer suicídio. Por outro lado, há sites com informações, esclarecimentos e relação de instituições que oferecem atendimento a pessoas com ideação ou tentativa de suicídio e a seus familiares. Pessoas podem buscar também as salas de bate papo e fóruns diminuindo a percepção de solidão, sentindo-se assim acolhidos.

Baker e Fortune (2001) realizaram um estudo qualitativo sobre como jovens se engajam em comportamentos autodestrutivos e suicídio e procuraram websites sobre estes temas, para obter uma compreensão mais profunda sobre a questão. Os autores entrevistaram jovens que buscam sites sobre suicídio. Utilizando análise de discurso identificaram três formas de escrita dos participantes sobre os sites, que eram considerados como espaços em que encontravam empatia, compreensão, acolhimento e ajuda para lidar com o distress psicológico e social. Sentiam-se valorizados e compreendidos, pertencendo a uma comunidade e com possibilidade de resolver problemas. Profissionais de saúde têm que considerar este poder de ajuda da internet e não, só seu impacto negativo.

No Brasil, Gomes, Batista, Carneiro e Cardoso (2014) realizaram estudo, replicando a pesquisa de Biddle et al. (2008) sobre conteúdos relacionados ao suicídio na internet, utilizando sites de busca e chegando a seus conteúdos principais. Os autores observaram que não há sites que facilitam ou encorajam o ato no Brasil, no entanto nosso país é o primeiro no ranking da América Latina na busca de páginas sobre suicídio. A maior busca está centrada em chats, salas de bate papo e fóruns e a menor, naqueles que trazem informação sobre o tema. Constataram também que em nosso país há mais sites religiosos, em comparação a outros países. Estes sites desencorajam o ato suicida e apoiam pessoas sem esperança. Estes autores reiteram a importância de pesquisas envolvendo análise de conteúdo de sites sobre suicídio, uma vez que uma grande parte dos usuários entre 15-24 anos busca informações e compartilhamento na internet. Esta questão é de grande prioridade, já que o suicídio tem apresentado um aumento significativo nesta faixa etária.

Gomes et al. utilizaram as seguintes palavras-chave para analisar os sites: suicídio, métodos de suicídio, métodos eficientes para o suicídio, modos de cometer suicídio, como se matar, métodos fáceis de suicídio, melhores métodos de suicídio, suicídio indolor. Foram também incluídos também os sites: de conteúdo religioso, mantidos por profissionais de saúde e psicólogos, suicídio assistido, sites com depoimentos de quem tentou suicídio e notícias sobre o tema.

Os pesquisadores brasileiros utilizaram três ferramentas de busca www.google.com.br, www. cade.com.br (Yahoo.com.br) e www.bing.com.br (Microsoft). Os sites foram assim categorizados: acadêmicos; com temas de atualidade em relação ao suicídio; com conteúdo religioso; com temas "elegantes" (com música ou poemas); mantidos por profissionais de saúde ou psicólogos; para prevenção ou apoio; notícias sobre suicídio individual ou em grupo; salas de bate papo; com piadas e humor; descrição de métodos, religiosos. Os autores perceberam uma maior incidência de sites religiosos no Brasil nos quais se reitera que só Deus pode influenciar a vida da pessoa. Também havia presença significativa de sites coordenados por profissionais de saúde, incluindo dados epidemiológicos e fatores de risco.

O objetivo do presente artigo, baseado em pesquisa de iniciação científica, é realizar análise de conteúdo de sites sobre suicídio. Foram escolhidos três sites para uma análise mais detalhada sobre seu conteúdo: Suicide.com, Suicide.org e Save.org, considerados de ajuda para prevenção do suicídio, por incluírem telefone e instituições para ajuda de pessoas com ideação ou tentativa de suicídio, além de recomendarem a comunicação a respeito.

A justificativa principal para o estudo é o acesso recorrente a sites focados no tema do suicídio como forma de buscar ajuda e que pode ter influência na maneira como agirão no futuro os jovens; principais usuários da internet e redes sociais, constituindo também a faixa etária em que o suicídio tem tido aumento significativo. É importante verificar a abordagem destes sites de suicídio e questionar a sua influência sobre seus usuários.

 

MÉTODO

Foi utilizada abordagem qualitativa para a análise dos sites. A partir de busca pela palavra "suicide" no Google foram selecionados 100 sites. Optou-se pela pesquisa em língua inglesa devido ao maior número de resultados.

Nos cinco meses seguintes estes sites foram divididos em 10 categorias, tendo como base o estudo de Biddle et al., citado na introdução deste artigo. Para caracterizar estas categorias foram utilizados os títulos dos sites e seus principais objetivos.

As categorias dos sites desenvolvidas neste projeto foram: a) Sites pró suicídio: incitar, encorajar e facilitar a ação suicida, mostrando métodos ou fotos; b) Contra o suicídio: com posicionamento explicito contrário ao ato. c) Informações gerais: dados estatísticos, sintomas; d) Informações de ajuda, suporte e prevenção: com palavras de apoio àqueles que apresentam pensamento suicida ou que perderam alguém por suicídio. Apresentam também números de telefones, e-mail e locais onde estas pessoas podem procurar ajuda ou apoio; e) Informações acadêmicas subdivididas em: saúde/ medicina, artigos diversos; f) Fóruns; g) Blogs; h) Biografias, músicas, bandas, filmes, livros; i) Notícias: artigos de revistas ou jornais sobre casos de suicídio na mídia; j) Religiosos: com enfoque explícito de várias religiões.

É importante ressaltar que os sites foram categorizados com base nas informações apresentadas em suas páginas iniciais.

 

RESULTADOS

O número de sites em cada categoria foi: a) Pró suicídio- 0; b) Contra o suicídio - 0; c) Informações gerais - 15; d) Informações de ajuda, suporte e prevenção - 28; e) Informações acadêmicas - 15; f) Fóruns - 1; g) Blogs - 1; h) Outros - 29; i) Notícias - 10; j) Religiosos - 1.

A partir desta categorização foi feita análise mais aprofundada de três sites categorizados como sendo de ajuda. Entendeu-se como sites de ajuda aqueles contrários ao suicídio, que oferecem locais para acolhimento e suporte, linhas telefônicas para acolhimento e suporte e a possibilidade conversar a respeito. Esta é uma organização preliminar, porque a análise mais aprofundada sobre os sites escolhidos permitirá um questionamento sobre se, de fato, são de ajuda ao jovem com ideação ou tentativa de suicídio. Também foram escolhidos por apresentar grande quantidade de conteúdo a investigar. Eles são os seguintes: "Suicide.com" (suicide.com), "Suicide.org (www.suicide.org) e "Save. org" (www.save.org).

 

I) SUICIDE.COM

Sobre a autora

O site é coordenado por uma mulher que enfrenta "depressão suicida crônica e potencialmente fatal". Insatisfeita com a terapia medicamentosa desenvolveu seus próprios métodos de tratamento e nos últimos 17 anos tem trabalhado para seu aprimoramento. Está elaborando seu primeiro livro sobre depressão suicida. Mostra-se determinada a dedicar sua vida compartilhando seus métodos para melhorar e individualizar tratamentos para depressão suicida. Aponta que seus métodos podem melhorar o humor e temperamento das pessoas em geral. Ressalta em sua página de apresentação que não é médica ou terapeuta licenciada, por esta razão não pode oferecer aconselhamento pessoal por e-mail.

Posicionamento frente ao suicídio

O site tem o propósito de ajudar pessoas que passam por situação semelhante à da autora. Aponta que sua intenção é ajudar os visitantes a encontrarem maneiras de sobreviver ou encontrar saídas para depressão e pensamentos suicidas. Apresenta um texto que busca convencer o visitante de que é possível continuar a viver. A autora afirma que passou 15 anos escolhendo continuar a viver. Portanto, não existe opção para morte por suicídio, segundo seu ponto de vista.

Na página "Suicídio não é justificável", o visitante se depara com um grande sinal de "Pare", piscando, tendo com a frase "Pare agora mesmo" e abaixo "Suicídio não é justificável". Questiona, se o visitante tentou todos os tratamentos possíveis, podendo haver alguns que ele desconhece. Oferece exemplos a partir de sua experiência.

Lista situações em que o suicídio pode parecer justificável, como por exemplo, quando há depressão clínica. É muito frequente a associação direta entre depressão e suicídio, possivelmente porque a autora passou pela experiência da depressão o que a levou a pensamentos suicidas.

Em outra página discute o direito de cometer suicídio, afirmando que ter direito não significa que é a coisa certa a fazer. Recomenda que pessoas com ideação suicida adiem quaisquer decisões ou atos contra a vida. Aponta como exceção os doentes terminais.

Considerações sobre causas e indicações de tratamento para o suicídio

São feitas afirmações a respeito das causas do suicídio. Pensamentos suicidas podem indicar problemas de saúde física, portanto o visitante não deve pôr fim à sua vida, e sim "consertá-la". A seção apresenta links vinculados a livros relacionados ao assunto.

Na página em que relata sua experiência pessoal com o suicídio, a autora afirma que para muitas pessoas o suicídio está relacionado a problemas químicos e não psicológicos. Refere-se à "depressão endógena", indicando suplementos para mudanças na química cerebral. Compara o corpo humano "defeituoso" de uma pessoa com ideação suicida a um piano desafinado.

Para combater o que chama de "depressão suicida grave" indica o tratamento denominado "Programas de Suplemento Nutricional Baseados em Medicamentos" (Medically-Based Nutritional Supplement Programs), que tratam as causas bioquímicas da depressão e dos pensamentos suicidas. Aponta outras opções, como antidepressivos, sempre complementados com os suplementos mencionados.

Relata que prometeu a seu pai que usaria remédios à base de fluoxetina, se os suplementos não funcionassem e esta promessa foi muito importante para sua sobrevivência, pois, muitas vezes, era o que impediu o suicídio. A partir de sua experiência, sugere que o visitante faça também uma promessa a si mesmo e a outros, de que tentará vários tipos de tratamento antes de cometer o ato suicida.

Afirma que o uso de suplementos químicos pode ajudar a amenizar a dor, mas não há pílula milagrosa, a combinação de fármacos é eficiente. Para continuar viva tomou nutrientes concentrados, vitaminas, minerais, aminoácidos e ácidos graxos. Refere que não é agradável tomar todas essas pílulas. A vantagem é a diminuição da ideação suicida, da depressão e da irritabilidade. Sem as pílulas, seu comportamento se tornava imprevisível. Tomando os suplementos observava que a vida valia à pena, tornava-se mais significativa, sabia melhor o que esperar de seus sentimentos e comportamento e como modificá-los.

Além dos medicamentos, o site indica outras fontes de ajuda, como linhas de telefone, aconselhamento (online ou offline) e apoio à família. A página ainda propõe que a pessoa se comunique, mantenha relacionamentos e não fique sozinha, busque conhecimentos, procure ajuda médica, tratamentos, entre outros conselhos.

Considerações gerais

Observa-se que a posição da autora, muitas vezes, é apresentada não apenas como uma opção para o visitante, mas como a melhor delas. Frases como "Suicídio não é justificável" são uma demonstração desta afirmação.

É notável também o destaque que é dado a tratamentos medicamentosos e às causas fisiológicas do suicídio, provavelmente porque se baseia principalmente na experiência de depressão da autora, frequentemente associada a pensamentos suicidas. O aspecto emocional fundamental nos quadros de depressão e tendências suicidas não é considerado. Quando a autora se refere a emoções é sempre como consequência do funcionamento químico do cérebro. A questão é: quais os possíveis efeitos desta abordagem para aqueles que buscam ajuda no site para lidar com a ideação suicida?

A autora fala de depressões desencadeadas por perdas pessoais e as formas de tratamento indicadas se resumem a combinações de suplementos e/ou vitaminas, sem levar em conta as questões emocionais. Cita a dosagem dos suplementos que tomou, levando ao questionamento a respeito da influência que esta informação pode ter para as pessoas que visitam o site.

A indicação de medicamentos com detalhes sobre dosagem é questão polêmica, já que a autora não é médica. Indica um site em que pessoas podem descobrir a melhor combinação de remédios para seu tratamento. Baseia-se em sua experiência para dar indicações a pessoas desconhecidas e se coloca como modelo, negligenciando o fato de que experiências vividas e sofrimento são diferentes. Neste sentido, suas falas, que tinham como intenção ajudar, podem se tornar prejudiciais para alguns visitantes.

É notável a característica de convencimento que o site assume. A autora pede, quase ordena, que a pessoa não cometa o ato suicida e usa argumentos aparentemente empáticos, escrevendo "você não faria isso", "como você se sentiria", entre outros. Fala também em "opção" e "escolha", passando a ideia de que seria possível se livrar de pensamentos suicidas com força de vontade.

No entanto, é importante ressaltar que a autora afirma que não é médica ou profissional de saúde mental. O site oferece indicações de outros tipos de ajuda, como linhas telefônicas, e sugere que se converse com pessoas a respeito da ideação suicida. São estes aspectos que foram considerados ao classificar o site como sendo de ajuda. Em algumas páginas, porém, pode-se questionar, se a intenção do site não seria convencer o leitor que há algo "certo" a se fazer e, neste sentido, se torna perigoso, transformando a questão do suicídio em problema que pode ser resolvido rapidamente.

 

II) SUICIDE.ORG

Sobre o autor

Este site é coordenado por uma equipe multiprofissional, sem um autor específico. No entanto, ao longo das páginas o nome do fundador aparece com freqüência. Afirma ser sobrevivente de suicídio e de homicídio, assim como outros membros da equipe.

Sobre o site

Suicide.org é uma organização sem fins lucrativos, com propósitos informativos e educativos, sem intenção de diagnosticar ou tratar o indivíduo com ideação ou tentativa de suicídio. Outra informação importante, Suicide.org se apresenta como o maior e mais visitado site sobre suicídio.

Posicionamento frente ao suicídio

O autor afirma, diversas vezes, que suicídio não é solução para situações difíceis e que nunca se deve agir a partir de pensamentos suicidas. Pede que o leitor se comprometa a continuar vivo, por ele mesmo e pelas pessoas que ama, indicando que procure ajuda em momento de perigo.

Apresenta "mitos" sobre o suicídio e procura desmenti-los trazendo "fatos". Tais "fatos" são colocados pelo autor sem nenhuma referência à fonte da informação.

Considerações sobre causas e indicações de tratamento para o suicídio

Apresenta números de telefone para prevenção do suicídio para aqueles que não se encontram em perigo imediato, mas precisam conversar com alguém a respeito de seus sentimentos suicidas.

O autor afirma que as pessoas que já tentaram suicídio e sobreviveram se sentiram melhor, felizes por continuarem vivendo. As emoções relacionadas a pensamentos suicidas se modificaram, sentiram-se melhor, por isso abrem esperança para outras pessoas. Afirma que o sofrimento pode obscurecer o julgamento das pessoas e o suicídio é considerado como forma de acabar com esse sofrimento. Não se deve confundir término da dor com término da vida. O argumento que apresenta é o de que, se o visitante tem tendências suicidas, muito provavelmente sofre de distúrbios como depressão, bipolaridade, esquizofrenia e, desse modo, apresenta desequilíbrio químico no cérebro, por isso não consegue pensar racionalmente. O visitante não tem controle sobre este fato, mas não deve ser visto como fraco por esse motivo. Precisa de tratamento, o desequilíbrio pode acontecer por vários motivos. Ocorre com freqüência por isso é importante reiterar que não acontece só com ele.

Indica a procura de um médico que possa prescrever medicação, se necessário. Em seguida aconselha a busca de terapeutas, para avaliação, e com os quais o leitor poderá falar sobre seus sentimentos. A terapia é apresentada, não como diagnóstico, mas como tratamento a longo prazo, que pode ajudar na melhora dos sintomas.

O autor apresenta os "Sinais de Alerta para o Suicídio". Aconselha ação imediata, caso os sinais se façam presentes. A fonte em que o autor se baseou não é citada. É importante ressaltar que a definição destes sinais não está clara.

Na página "Causas do Suicídio", doenças mentais não tratadas (como depressão, distúrbio bipolar, esquizofrenia) são apontadas como causa da maioria dos suicídios. Há maior enfoque para a depressão, segundo o autor, causada por fatores genéticos, que levam à morte por suicídio, sem que haja manifestação de sintomas ou sinais perceptíveis.

Há uma série de páginas dedicadas à relação entre suicídio e diferentes fatores como distúrbios mentais, experiências traumáticas e fatores sociais. Estas páginas têm basicamente o mesmo formato. Há sempre a indicação para busca de ajuda ao se perceber sintomas psicológicos em pessoas conhecidas.

É ressaltada a questão do estigma associado ao suicídio, explicando como doença mental, alvo de estigma, acaba provocando pensamentos suicidas e faz com que pessoas que precisam, não busquem ajuda, tentando viver com a doença e o sofrimento.

Considerações gerais

O site aborda vários temas relacionados ao suicídio, seus distúrbios, o que pode ser de ajuda para quem o procura. No entanto, o tom imperativo é preponderante. Há indicação para que o visitante não cometa suicídio, com o argumento de que "esta não é a saída". A morte por suicídio provoca sofrimento nas pessoas próximas e impede a vivência de boas experiências. É importante refletir, se tais argumentos poderiam funcionar como ameaça àqueles com ideação suicida, resultando num último recurso, se outros não forem efetivos.

Outro ponto importante é que muitas afirmações são feitas e tomadas como verdadeiras, sem que a fonte dos dados seja mencionada. O problema é que apresenta causas para diferentes distúrbios podendo levar ao auto diagnóstico, passível de erro. A automedicação é contraindicada, com ênfase para que se procure um psiquiatra.

Estas indicações de médicos sugerem a busca de ajuda emocional e não somente tentativas de "reequilibrar" a química cerebral. O compromisso do autor aparece várias vezes no texto, como forma de garantia para os visitantes, para que estes se comprometam a não cometer suicídio.

Um ponto negativo do site é a generalização sobre o tema. Afirmações como "não faz a dor ir embora", ou "nunca é a saída" demonstram que o assunto se apresenta por apenas um ângulo para o autor, e as especificidades de cada caso não são abordadas. Afirma que a falta de tratamento ou outros problemas poderão levar a pensamentos suicidas, o que denota também um determinismo, que não é necessariamente verdadeiro.

 

III) SAVE.ORG

Sobre o autor

O site apresenta os profissionais envolvidos: médicos clínicos, psiquiatras, advogados, senadores, congressistas, entre outros.

Sobre o site

"SAVE" é uma sigla, que significa "Suicide Awareness Voice of Education", e em inglês "save" significa também salvar, uma interessante associação. Como o nome pode indicar, foi criado com a intenção de trazer informação e educar o grande público sobre suicídio e distúrbios mentais associados a ele. A partir da apresentação destes dados espera-se a prevenção do suicídio. Na página inicial há esclarecimentos sobre informações do site que refletem opiniões de seus integrantes e não devem ser usadas como substituição do tratamento à doença mental.

A organização não tem fins lucrativos e cresceu a partir de um grupo de voluntários, sobreviventes do suicídio, Atualmente, SAVE é uma das líderes norte-americanas na prevenção do suicídio, também como membro co-fundador do "National Council for Suicide Prevention". É importante ressaltar que este site se refere a uma instituição que atua no mundo real, além do virtual, especificamente, nos Estados Unidos e que, em algumas de suas páginas, é possível encontrar detalhes dos programas realizados.

Posicionamento frente ao suicídio

A visão geral é que pensamentos e tendências sobre suicídio são condições temporárias e têm possibilidade de serem alteradas. São indicados números de telefone de associações, que podem ajudar indivíduos com intenções suicidas ou depressão, propondo que a pessoa procure ajuda profissional. É feita uma ligação clara, como em outros sites, entre o suicídio e alterações químicas cerebrais.

O site possui uma página dedicada ao que denomina fatos sobre suicídio, que são dados numéricos apresentados pela Organização Mundial da Saúde e o Centro para Controle e Prevenção de Doenças (Centers for Disease Control and Prevention - CDC). Alguns fatos são apresentados sem fonte específica. Outra página traz os equívocos freqüentes a respeito do suicídio, acrescidos de explicações. Mostra informações e dados sobre suicídio e comportamentos autodestrutivos sem referência a autores especializados no tema.

Considerações sobre causas e indicações de tratamento para o suicídio

O site se propõe a ajudar na prevenção, com foco nos sinais de alerta e sintomas do suicídio, com dados específicos para crianças, adultos e idosos. As informações são apresentadas em forma de lista, direta e objetivamente, incluindo sintomas da depressão.

Possui páginas com indicações para que pessoas com ideação suicida consigam ajuda para si e para que familiares ou amigos desta pessoa possam se orientar sobre como cuidar dela. Ao final se indica que procurem médicos e linhas de telefone para auxílio.

Ao se referir às causas do suicídio, não há menção a fatores predisponentes. Não tratar depressão ou distúrbio bipolar pode resultar em suicídio. Enfatizam a noção de que a ocorrência de doenças mentais se deve somente ao adoecimento do cérebro.

O site parece realmente mais focado em prevenção e busca de ajuda para aqueles que estão sofrendo ou já sofreram com o suicídio. São dadas indicações de como agir, quando conhecidos têm ideação suicida e é fornecida a informação de que, segundo o "Journal of the American Medical Association", 90% dos suicídios ocorre durante ou após um episódio depressivo. Este é o primeiro momento no site em que a relação entre suicídio e depressão aparece fundamentada em dados estatísticos e nas fontes citadas.

Nesta página há também links para as páginas com sintomas do suicídio e de depressão, para que a pessoa saiba como ajudar um conhecido que esteja com ideação suicida. É importante haver abertura para realmente ajudar, uma vez que o estigma relacionado a doenças mentais é um dos fatores que impedem os indivíduos de buscarem cuidados. Esses trechos se referem a situações de perigo imediato. Nos outros casos, é preciso reconhecer o sofrimento do amigo e oferecer auxílio na busca de ajuda, mesmo que possa parecer invasivo.

Os sinais de suicídio e depressão são apresentados em forma de lista e divididos por faixa etária. Há esclarecimento de que nem todas as pessoas que sofrem de depressão terão todos os sinais indicados, mas se houver quatro ou mais sintomas por duas semanas, um profissional de saúde deve ser consultado imediatamente. A lista apresenta indicadores emocionais (estou triste, nervoso) e indicadores físicos (dores de cabeça, no pescoço). Os autores deixam claro que a lista deve ser usada como ferramenta de comunicação com os profissionais a serem consultados. Também há indicação de que alguns medicamentos podem causar sintomas semelhantes à depressão.

O site possui várias páginas focadas na prevenção do suicídio, com divisão por faixa etária, com ênfase em crianças e jovens. Diferentemente do que é encontrado nos outros sites analisados, há a sugestão de diferentes tratamentos terapêuticos, não só medicamentosos.

Considerações gerais

O site apresenta a visão geral de que pensamentos suicidas são condições temporárias e que podem ser alteradas. Não se observa o tom imperativo ou condenação clara do ato suicida. O objetivo é ajudar na prevenção e educação a respeito do suicídio, sem partir de julgamento prévio.

São enfatizadas as causas fisiológicas do suicídio, desequilíbrio ou doença cerebral, sem considerar aspectos subjetivos. Apesar de haver menção a doenças cerebrais, há destaque para a depressão como fator crucial que pode levar ao ato suicida. Não se afirma que determinados fatores inevitavelmente provocam o ato suicida, mas há relação constante com o desequilíbrio cerebral.

Muitas páginas são dedicadas a listas de sintomas de suicídio e depressão, separados por faixa etária, que se propõem a ajudar na prevenção. O site não tem intenção que o leitor faça seu próprio diagnóstico e há indicação de que sempre se deve procurar um médico.

As listas de sintomas são apresentadas, de forma genérica, sem explicitação de fontes, o que poderia levar ao questionamento sobre sua confiabilidade. O site apresenta uma variedade de profissionais da área da saúde que constituem sua equipe, então se acredita que os autores tenham autoridade sobre o que afirmam. O aspecto mais importante deste site é que se trata de organização que existe fisicamente, há informações sobre programas que podem influenciar a vida de pessoas além do mundo virtual.

 

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foram investigados três sites, com quantidade significativa de material para análise. Este estudo teve com base os estudos de Biddle et al. (2008) na Inglaterra e Gomes et al. (2014) no Brasil.

Um ponto importante é a autoria de cada site. Suicide.com foi criado por uma pessoa que teve experiência com o suicídio, sem ser profissional da saúde. É um site leigo, motivado por experiências pessoais. Suicide.org tem como autor principal uma pessoa que teve experiência com suicídio, e apresenta uma equipe de profissionais de saúde, que ajudam a formular seu conteúdo. SAVE.org foi criado e escrito por uma equipe de profissionais de saúde, o que pode dar impressão de que seja mais sério e confiável. Por outro lado, as páginas deste site não apresentam a identificação dos profissionais. Há uma impessoalidade e é preciso questionar o que afetaria os leitores: ter autores com quem podem se identificar, informações profissionais ou ambos.

Outro aspecto relacionado é a maneira como os tratamentos são apresentados. Em Suicide. org e SAVE.org há constante indicação para que o leitor procure um profissional de saúde. Em Suicide.com a autora indica medicamentos e fornece links, que procuram ajudar o usuário a criar sua combinação para o tratamento, implicando numa forma de automedicação, apesar de deixar claro que não tem formação médica. Cabe questionar a proximidade entre a experiência da autora e daqueles que têm acesso ao site e como este fator pode influenciar na decisão do indivíduo de combinar remédios, em vez de procurar ajuda médica.

Os três sites descartam a possibilidade de experiências singulares e fora da "norma" estabelecida pelos criadores dos sites. O suicídio é visto como resultante de uma reação química cerebral, que pode ser revertida ou transformada. Embora possa haver alterações fisiológicas nos distúrbios emocionais, é fundamental que aspectos subjetivos sejam trabalhados e discutidos. A questão da subjetividade não é considerada nos sites analisados.

Este modo de pensar o fenômeno do suicídio pode ser reflexo da maneira como o tema é abordado na área da saúde. Os autores que tiveram experiências pessoais com o suicídio e os profissionais que lidam com o assunto parecem ter a mesma maneira de enxergar a questão. É possível questionar, se o discurso dos sites analisados está limitado à cultura norte-americana ou é válido também para o Brasil? Este projeto de análise dos conteúdos de sites sobre o suicídio deveria considerar como este é visto em outros países para uma maior compreensão da questão.

Também é importante pensar o quanto sites como os estudados, e instituições físicas que compartilham seus pontos de vista, estão colaborando para a manutenção de um posicionamento específico sobre o suicídio, que pode ser limitador para aqueles que estão sofrendo ou ajudando pessoas em sofrimento. Observa-se a reprodução de um discurso que dá pouco destaque aos aspectos subjetivos da questão, considerando que todas as pessoas com ideação ou tentativa de suicídio seguem um padrão.

Foi observada a ênfase dada à depressão, nos três sites, foco de várias páginas. Em Suicide. org e SAVE.org este enfoque parece baseado na visão prevalente sobre o suicídio ligado a quadros depressivos, em Suicide.com a experiência da autora com a depressão tem o mesmo enfoque. Os sites apresentam listas de sintomas de depressão. É importante questionar o papel e a influência destas listas para os leitores, uma vez que podem conduzir ao autodiagnóstico ou, em alguns casos, em classificação de patologia. No geral estes sintomas são arrolados sem fonte específica e sua influência precisa ser problematizada.

Suicide.com apresenta argumentos religiosos contra o ato suicida. Os motivos religiosos são utilizados como forma de intimidação ou ameaça. Suicide.org, também inclui um tom de ameaça nas suas páginas. O argumento é o de que o suicídio causa dor em outras pessoas, implicando numa tentativa de controlar o ato suicida pela sua consequência. SAVE.org aponta o sofrimento da família ou de conhecidos como argumento contra o ato suicida, mas não de forma explícita. O posicionamento a favor da prevenção e do tratamento não inclui convencimento ou ameaça. Buscam compreender as necessidades das pessoas.

Suicide.com e Suicide.org apresentam discurso claramente oposto ao ato suicida, considerando que esta nunca é opção. Ao realizar a classificação se considerou, que os sites se propunham a ajudar os visitantes, sem apresentar posição definitiva sobre o assunto. Esta visão inicial mudou após a análise do conteúdo, mostrando a clara posição dos autores contra o suicídio.

Os sites mostram possibilidades de se conseguir ajuda, e este fato não pode ser desconsiderado. Houve manifestação de gratidão para a autora de Suicide.com.

O SAVE.org traz informações sobre suas práticas no mundo real, com programas de treinamento profissional. É possível perceber que sites como este têm efeitos sobre as pessoas. O site Suicide.com pode afetar o indivíduo a partir de identificações com a autora e o SAVE.org traz informações e esclarecimentos de maneira formal.

A questão mais importante é o tipo de ajuda fornecido pelos sites. A partir das páginas visitadas, percebeu-se que pouca atenção é dada às características pessoais e subjetivas em relação ao suicídio. A terapia indicada, muitas vezes, se resume a buscar médicos que possam receitar medicamentos. Como esta visão é compartilhada, em algum nível, pelos três sites, cabe questionar, se este fato está relacionado aos seus autores ou reflete a forma como o suicídio é visto na atualidade.

É essencial que profissionais de saúde mental, que cuidam de pessoas com ideação ou tentativa de suicídio, tenham mais conhecimento sobre sites envolvendo a questão do suicídio. Não podem ficar alheios a esta questão, principalmente se houver menção pelos pacientes ou familiares sobre seu acesso a sites e, quando informações podem levar a um incentivo do suicídio, seja por indicações ali encontradas ou pelo fato de a pessoa não se sentir compreendida. Como foi visto, pelos sites analisados são considerados os temas de forma genérica e o ato suicida pode ter configurações singulares e próprias. E os sites analisados, chamados de ajuda, tentam prioritariamente só considerar a opção de evitar o suicídio, sem se dedicar ao sofrimento que está na base da ideação ou tentativa de suicídio.

Para se entender melhor esta e outras questões levantadas, seria necessário que outros sites fossem investigados e, possivelmente, pessoas com experiência nesta área fossem ouvidas, para que pudessem ser considerados os aspectos subjetivos do suicídio.

 

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Recebido em 02/07/13
Revisto em 11/08/14
Aceito em 15/8/14

 

 

* Endereço para correspondência: Av. Prof. Mello Moraes, 1721. São Paulo-SP. CEP: 05508-030. Telefone: (11) 3091-4185. E-mail: mjkoarag@usp.br; tatigrvalle@yahoo.com.br

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