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Boletim de Psicologia

versão impressa ISSN 0006-5943

Bol. psicol vol.66 no.144 São Paulo jan. 2016

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

 

Qualidade de vida de usuários de parques públicos1

 

Life quality of public parks users

 

 

Juliana Martinez PieroneI; Marília Martins VizzottoI; Maria Geralda Viana HelenoII,*; Cecília Aparecida Vaiano FarhatI; Antonio de Pádua SerafimII

IUniversidade Metodista de São Paulo - SP - Brasil
IIUniversidade Metodista de São Paulo e Faculdade de Medicina da USP - São Paulo - Brasil

 

 


RESUMO

Os objetivos deste estudo foram caracterizar uma amostra de freqüentadores de um parque público, avaliar qualidade de vida e comparar os resultados. Estudou-se uma amostra aleatória de 201 indivíduos do sexo feminino e masculino, em três faixas etárias, adolescentes, adultos e idosos. A pesquisa foi realizada num parque público e para a coleta de dados foram utilizados o WHOQOL - Bref, a Escala de Avaliação Socioeconômica - ABIPEME e um questionário para caracterização da população. As pessoas freqüentam o parque pela acessibilidade, beleza, segurança, limpeza, música, bem-estar e para fazerem amigos. Os idosos freqüentam o parque para prevenirem doenças ou para evitar o agravamento de doença estabelecida, o adulto para prevenir doenças e o jovem pelo prazer de estar no parque. Os resultados indicaram que possuir boa qualidade de vida não está relacionado apenas à condição econômica do indivíduo, mas inclui vários fatores como maior nível de escolaridade, oportunidades sociais e de lazer.

Palavras-chave: Parques públicos; qualidade de vida; promoção de saúde; prevenção de doenças.


ABSTRACT

The objective of this study was to describe a sample of regular visitors to a public park, evaluate their quality of life, and compare the results. Participated a random sample of 201 individuals of both genders, and three age groups: adolescents, adults, and elders. The research took place at a public park. The instruments used were the WHOQOL-Bref, and the Socioeconomic Evaluation Scale-ABIPEME, and a questionnaire for participants description. The reasons why people visit the park are its convenience, beauty, security, and cleanliness; there they listen to music, take care of their well-being, and make friends. The elders visit the park to prevent diseases or to prevent the aggravation of a disease they suffer from; adults to prevent diseases; and adolescents for the pleasure of being at the park. The results indicated that achieving a good quality of life is related not only to an individual's economic position, but also to other elements, such as a high level of education, social acquaintances and leisure hours.

Key words: Public parks; quality of life; health promotion, disease prevention.


 

 

INTRODUÇÃO

Nas grandes metrópoles torna-se cada vez mais difícil um estilo de vida saudável, dadas as contingências do trabalho, as dificuldades nos meios de transporte, a falta de lazer, entre outros itens, como o acesso à saúde pública. Considerando que ainda não se alcançou um patamar de excelência no que se refere à promoção da saúde e ao bem-estar, entende-se que, em sociedades como a brasileira, o aproveitamento dos aparelhos já disponíveis socialmente e sua otimização a favor da população podem ser um meio de alcance. Locais como parques podem ser oportunizados para a realização de atividades que geram bem-estar e saúde. A utilização desses espaços públicos pode levar à melhora da qualidade de vida, prevenção de doenças, redução de comportamento anti-social (Reis, 2001), bem como pode tornar-se fonte de lazer e de sobrevivência ecológica. As abordagens ecológicas indicam a importância da relação do indivíduo com o meio ambiente e consideram a influência e os efeitos benéficos, de um sobre o outro (Arantes, Silva Filho & Mauad, 2016; Lourenço, Moreira, Silva et al., 2012; Silva, Petroski & Reis, 2009; Szeremeta & Zannin, 2013).

A importância dos modelos de comportamentos preventivos vem sendo apontada desde 1960 (Caplan, 1964). Além disso, fatores como o aumento da longevidade e a disponibilidade de tempo das pessoas levaram a uma maior necessidade de construção de espaços livres (Silva, 2002). Em países mais desenvolvidos os cidadãos com maior consciência ambiental, passaram a reivindicar o direito de possuírem ambientes mais equilibrados e à qualidade de vida (Duarte, 2002). Isso impulsionou as autoridades municipais para a construção e manutenção de áreas verdes. Atualmente os parques vêm sendo considerados ambientes promotores de saúde, que pode ser alcançada também, quando o equilíbrio ecológico é mantido em uma relação harmônica entre o homem e o meio ambiente, acrescida das forças sociais, físicas e biológicas (Reis, 2001; Ribeiro, 1998). De modo que o conceito de saúde se afasta efetivamente da visão de ausência de doenças. Há, portanto, uma ampliação na compreensão de saúde; uma tendência em aproximar, por exemplo, o conceito de promoção de saúde ao de desenvolvimento sustentável (Buss, 2003), ou ao conceito de equidade (Muchinsky, 2004), seja no acesso aos bens e serviços oferecidos pela comunidade ou na distribuição de rendas. Também tem sido considerado, que a promoção de saúde se torna possível com a criação de ambientes favoráveis (Czeresnia, 2003).

Além da promoção de saúde e da prevenção das doenças, outro conceito em construção é o de Qualidade de vida, que possui várias definições constituídas à base de uma diversidade de fatores objetivos (externos) e subjetivos (internos do ser humano). São valores culturais e religiosos, situação socioeconômica, faixa etária, gênero, entre outros (Elzirik, 2001; Jakobsson, Hallbreg & Westergren, 2004; Strey, 1998). O conceito mais aceito é o da própria Organização Mundial de Saúde (OMS), que entende Qualidade de vida como a autopercepção do indivíduo no contexto da cultura e nos sistemas de valores em que ele vive. Trata-se de conceito subjetivo, multidimensional, que inclui elementos de avaliação tanto positivos como negativos. O termo qualidade de vida inclui aspectos relacionados à capacidade funcional, ao comportamento afetivo e emocional, às interações sociais, ao trabalho e à situação econômica, considerando a visão e a avaliação subjetiva dos indivíduos (WHO, 1986). Considerando essa proposta conceitual, a OMS (Whoqol Group, 1994) criou uma escala de medida genérica, amplamente utilizada, inclusive em estudos que relacionam qualidade de vida com diversas variáveis, como a velhice (Borges & Martins, 2001; Lourenço et al., 2016); Xavier, Ferraz, Marc, Escosteguy & Moriguchi, 2003;, doenças crônicas (Borges & Martins, 2001; Rabelo & Martins, 2002); condições de trabalho e saúde do trabalhador (Borges & Martins, 2001). Esse instrumento foi denominado Questionário de Qualidade de Vida (WHOQOL), que poder ser utilizado na sua forma completa (WHOQOL) ou na forma breve (WHOQOL-Bref), dependendo da população a ser estudada Alves Filho, Mazzali & Santos, 2004; Chopra, Couper & Herrman, 2004; Flanagan, 1982; Hinterseher et al., 2004; (Michelone & Santos, 2004; Bittencourt, Pereira et al., 2006).

Tendo em vista o exposto acima se torna importante a realização de pesquisas que envolvem tanto a qualidade de vida como a utilização de espaços públicos, principalmente parques. Assim, os objetivos deste estudo foram: a) avaliar a qualidade de vida de frequentadores de um parque público; b) investigar as variáveis socioeconômico-culturais desses freqüentadores para compará-las com a qualidade de vida.

 

MÉTODO

Participantes

A amostra foi composta por 201 sujeitos, sendo 105 (52,2%) do sexo feminino e 96 (47,8%) do masculino, freqüentadores de um parque público, nos períodos matutino, vespertino e noturno. O total de sujeitos e as idades foram definidos por meio da técnica de amostragem não probabilística para o preenchimento de cotas, contemplando adolescentes, adultos e idosos. A distribuição da amostra por faixas etárias e gênero pode ser observada na Tabela 1, em que as idades foram divididas em três faixas: 13 a 19 anos, 20 a 59 e 60 a 81.

Pode-se observar que as três faixas etárias tiveram aproximadamente a mesma porcentagem de participantes, com uma freqüência um pouco maior de adultos, que foi a faixa com maior amplitude de idades. A divisão entre os gêneros nas três faixas foi aproximadamente igual, exceto no grupo de 20 a 59 anos, em que houve uma porcentagem um pouco maior de mulheres.

Local

A amostra foi proveniente de um parque público, localizado na cidade de São Bernardo do Campo, Estado de São Paulo, com uma área de 25 mil m2 contendo três áreas de playground. A primeira é para crianças de até cinco anos de idade, com piso emborrachado, brinquedos de material resistente, ficando próximo ao fraldário, sanitários e posto de atendimento médico. A segunda é destinada a crianças com deficiência física, também com piso emborrachado, com brinquedos do tipo módulo integrado. A terceira, com piso do tipo pedrisco, contém brinquedos como gangorra, escorregador e balanços. Além desta parte destinada às crianças, há uma pista para caminhada ou corrida, que permite percursos circulares de até 650 metros. Ao longo deste trecho estão distribuídos equipamentos como barras fixas, pranchas de abdominais, aparelhos para alongamento e tablado de madeira para atividades orientadas. O parque possui um sistema de segurança composto por 16 câmeras digital em diferentes pontos, além da presença da Guarda Civil Municipal. Também possui, um sistema de som com 120 caixas acústicas. O local fica aberto ao público das 6 às 22 horas.

Instrumentos

Foram utilizados os seguintes instrumentos:

a) WHOQOL - Quality of Life Bref da Organização Mundial de Saúde (OMS), para medida da Qualidade de Vida. É composto por 26 questões para avaliar a Qualidade de vida global (QVB), divididas em quatro domínios, sendo eles: físico (dom 1), psicológico (dom 2), relações sociais (dom 3) e meio ambientes (dom 4) (Whoqol Group, 1994).

b) Escala de Avaliação Sócio-econômica da Associação Brasileira de Institutos de Pesquisa de Mercado - ABIPEME (s/d) para determinar a classe social, que foi uma variável controlada nesta pesquisa.

c) Questionário para Caracterização da Amostra freqüentadora do parque, que incluiu gênero, escolaridade, freqüência de uso do parque, motivo de escolha daquele local e motivo da freqüência.Este questionário foi criado especialmente para o presente estudo.

Procedimento

Os dados foram coletados no referido parque público nos períodos matutino e noturno, durante um período de cinco meses, por uma equipe previamente treinada. Após as observações e coleta inicial, realizou-se um estudo piloto para definir melhor a amostra, a ordem das perguntas a serem feitas e a forma de abordagem dos sujeitos. Em função da opção por uma técnica estatística de preenchimento de cotas, definiu-se a amostra dividida em dois grupos (homens e mulheres) e subdividida em três subgrupos: jovens, adultos e idosos para cada um dos dois grupos, sendo cada subgrupo composto por 30 a 45 pessoas. Durante a coleta de dados, a equipe de entrevistadores permanecia na entrada do parque, logo após as catracas. Assim que entrava um usuário do parque, ele era abordado pelo entrevistador, que o informava sobre o propósito da pesquisa e, no caso do sujeito concordar em participar, era explicado o termo do "Consentimento Livre Esclarecido" e solicitado que ele o assinasse.

À medida que as cotas eram preenchidas, observava-se, se os freqüentadores que entravam no parque estavam enquadrados nas cotas que não haviam sido preenchidas. Se estivesse, ele era convidado a participar, para completar as cotas definidas antecipadamente. Tomou-se o cuidado de não realizar coletas de dados em dias atípicos, como feriados e finais de semana, visto que as características dos freqüentadores e os motivos pelos quais estariam freqüentando o parque poderiam ser alterados de modo significativo.

 

RESULTADOS

É importante destacar que antes das análises estatísticas foi realizado o teste de Levene para verificar a homogeneidade da amostra, o que indicou sua adequação para o tratamento estatístico. Por se tratar de um estudo quantitativo, a análise dos dados foi realizada com a utilização do Software Estatístico SPSS - Statistical Package for the Social Science, versão 14.0 para Windows. Foram utilizadas medidas estatísticas descritivas das variáveis quantitativas para descrever a amostra. As variáveis sociodemográficas, a qualidade de vida global e os quatro domínios, que compõem a qualidade de vida, foram analisados pela Análise de Variância, que verifica a existência de diferenças entre as médias dos grupos, e o teste Post Hoc de Tukey, quepermite verificar quais os grupos que mostram diferenças significativas entre si. As variáveis qualitativas foram analisadas pelo Teste de Qui-Quadrado.

1) CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS

A distribuição por idade e sexo foi apresentada na descrição da amostra, na Tabela 1 e as freqüências das demais características estão descritas na Tabela 2.

Quanto à escolaridade a maioria (50,2%) dos participantes tinha o ensino médio, seguidos do (16,9%) o ensino fundamental, (31,4%) do ensino superior e (1,5%) de pós-graduação. Em relação ao nível socioeconômico 35 sujeitos (17,4%) pertenciam à classe B, 90 (44,8%) à classe C, 63 (31,3%) à classe D e 13 (6,5%) à classe E. Em relação à atuação profissional as respostas dos usuários do parque mostraram os seguintes resultados. 33,8% eram prestadores de serviços; 34,2% aposentados; 16% estudantes; 10% "do lar"; 3% relataram ser funcionários públicos e 1,5% que estavam desempregados ou não trabalhavam. Quanto à freqüência ao parque, 74 (36,8%) iam ao parque de uma a duas vezes por semana, 46 (22,9%) de três a quatro vezes e 81 (40,3%) cinco ou mais vezes por semana.

2) MOTIVOS DE ESCOLHA DO PARQUE

De acordo com as respostas dadas pelos freqüentadores, o motivo da escolha do parque foi por sua localização e acessibilidade (48,70%); pelo ambiente físico (27,80%), pois os freqüentadores admiravam a beleza do parque, o sistema de segurança, a limpeza e a agradabilidade da música. Em seguida pela condição subjetiva (23,50%), pois afirmaram que o local trazia bem-estar, era um local agradável, interessante, tranquilo e podiam fazer amigos. O acesso adequado e fácil, conforto, as imagens atraentes, oferta de atividades sociais, contribuem para tornar o parque um ambiente desejável e valorizado pela comunidade como um local atrativo.

3) CORRELAÇÕES ENTRE OS DOMÍNIOS E A QUALIDADE DE VIDA GLOBAL

A Tabela 3 apresenta as correlações entre os domínios do WHOQOL e o resultado de Qualidade de Vida Global.

 

 

A análise das correlações de Pearson entre os domínios Físico (domínio 1), Psicológico (domínio 2), Relações Sociais (domínio 3), Meio Ambientes (domínio 4) e Qualidade de Vida Global, mostrou que todos os domínios se correlacionam positiva e significativamente com o domínio global. A correlação com o domínio Relações Sociais foi o mais baixo (0,229) e as demais variaram de 0,432 a 0,481.

4) COMPARAÇÃO ENTRE OS MOTIVOS DE FREQUÊNCIA AO PARQUE E A QUALIDADE DE VIDA GLOBAL

Os principais motivos indicados pelos freqüentadores do parque foram agrupados em três indicadores, cujas freqüências são apresentadas a seguir: 1) sentirem prazer em ir ao parque, 91 pessoas (45,3%); 2) prevenir doenças, 53 (26,4%); 3) prevenir agravamento da doença, 33 (16,4%) e outros motivos, 24 (11,9%). Os motivos são diferentes e revelam conteúdos importantes. O primeiro indicador se refere a um grupo de pessoas que vão ao parque pelo prazer que sentem em estar naquele lugar. O segundo mostra outro grupo, que considera o parque como um local próprio para a prática de atividades físicas, que levam ao adiamento do aparecimento de doenças. E o terceiro, consiste em um grupo de indivíduos já doentes e que consideram as atividades desenvolvidas no parque como meio de evitar complicações das doenças estabelecidas ou, ainda, aqueles que já possuem doenças e buscam nas atividades realizadas a reabilitação.

Assim, os motivos para ir ao parque foram agrupados em quatro categorias, relacionadas na Tabela 4, que mostra as médias e os desvios padrão dos pontos da Qualidade de Vida Global para cada categoria de motivos.

 

 

As médias da Qualidade de Vida Global foram comparadas por meio da Análise de Variância e o teste Post Hoc de Tukey entre as categorias de motivos de freqüência ao parque. Somente foram encontradas diferenças estatisticamente significantes (p = 0,033) das médias entre o motivo prazer de estar no parque (15,91) e o motivo já ter doença estabelecida (14,42).

5) COMPARAÇÃO ENTRE AS CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS E A QUALIDADE DE VIDA GLOBAL (QVG) E DOMÍNIOS DA QUALIDADE DE VIDA.

Os resultados da comparação entre as faixas etárias, o nível de ensino e a Classe socioeconômica na qualidade de vida total e nos domínios da qualidade de vida é mostrada na Tabela 4. Em relação à faixa etária foram encontradas diferenças entre as médias dos jovens e dos adultos, com o jovem mostrando uma média maior (p=0,024). Já no domínio 2 (psicológico), os idosos obtiveram uma média maior em relação aos jovens (p=0,03). Na comparação do domínio 4 (meio ambiente), o idoso está melhor que o jovem (p=0,002) e melhor que o adulto (p=0,007).

Quanto à escolaridade, os resultados não mostraram diferenças estatisticamente significantes (p<0,05). nos domínios Físico, Psicológico, Relações Sociais e Qualidade de Vida Global. A diferença única estatisticamente significativa (p=0,004) foi no domínio 4 - Meio Ambiente, indicando que as pessoas com nível superior possuem melhores condições quanto aos recursos financeiros, cuidados de saúde, entre outros.

Em relação à classe socioeconômica o teste Tukey não apontou diferença significativa entre as classes para a Qualidade de Vida Global. A diferença estatisticamente significativa ocorreu entre as classes B e E no domínio 4 - Meio Ambiente (p=0,033), que está associado a itens como segurança, recursos financeiros, ambiente físico e transporte. Isto quer dizer que a classe B está melhor do que a E no que se refere ao domínio 4.

6) ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE AS CARACTERÍSTICAS SOCIODEMOGRÁFICAS

A Tabela 5 mostra as freqüências percentuais dos motivos para ida ao parque por faixa etária.

 

 

O teste Qui-Quadrado usado para avaliar relação entre faixa-etária e motivo de freqüência ao parque apontou diferença significativa (p < 0,001). Os idosos (> 60 anos), na maioria dos casos (71,5%), freqüentam o parque por motivos relacionados à prevenção de doenças (34,9%) ou doença já estabelecida (36,6%). No caso dos adultos (de 20 a 59 anos) está relacionada à prevenção de doenças (37,7%) e ao prazer de estar no parque (40,3%). Para os jovens (< 19 anos) é visto como um local de encontro social, a maioria (75,4%) associa sua freqüência ao prazer de estar no parque.

Quanto à escolaridade dos freqüentadores, exceto os com pós-graduação, realizou-se o teste estatístico Qui-Quadrado, para avaliar se havia diferença significativa em relação à classe-econômica dos freqüentadores e sua escolaridade. A hipótese foi confirmada, pois, o teste apontou uma diferença significativa (p < 0,001) entre estas variáveis. Os resultados apontaram que as pessoas da classe B e C possuíam ensino superior já as da classe D e E possuíam ensino fundamental, os dados sugerem que quanto maior a classe econômica do freqüentador maior era o seu grau de escolaridade.

O teste Qui-Quadrado também foi estatisticamente significante (p < 0,0001) para a relação entre o período de freqüência e a faixa etária dos usuários do parque. Assim, os dados mostraram que os jovens (70,7%) preferem ir ao parque no período da tarde, enquanto os adultos (51,2%) no período da noite e os idosos (44,4%) no período da manhã.

 

DISCUSSÃO

Os usuários do parque público mostraram uma percepção muito positiva em relação à utilização do parque no que se refere tanto à prática de atividade física quanto pelas relações sociais que eles estabelecem. No presente estudo observou-se que, de fato, o parque é um local que gera saúde (Szeremeta & Zanin, 2013) e contempla algumas de suas dimensões (Ribeiro, 1998), quando trata da evolução dos conceitos de saúde e doença. Vários autores (Duarte, 2002, Lourenço et al., 2016; Reis, 2001; Silva, 2002; Silva et al., 2012) mostraram a importância de ambientes saudáveis na promoção de saúde e prevenção das doenças.

A amostra estudada também mostrou que a beleza, a acessibilidade, as atividades desenvolvidas, a sensação de bem-estar tornam o parque um lugar desejável e valorizado. Estes dados corroboram os encontrados por Reis (2001); Silva, Petroski e Reis, (2009) em seus estudos sobre determinantes ambientais para a realização de atividades físicas nos parques urbanos de Curitiba.

A análise das correlações entre os domínios e a Qualidade de Vida Global (QVG) mostrou que todos os domínios se correlacionam positiva e significativamente com o resultado global. Cabe ressaltar que, assim como mostraram os dados de Pereira et al. (2006) a correlação é de baixa magnitude. Os domínios explicam de forma limitada a QVG, mas suas alterações podem modificar a QVG.

Quanto às relações entre QVG e os motivos da freqüência ao parque os resultados mostraram que o motivo prazer de estar no local relaciona-se à QVG, quando comparado com as pessoas que possuíam doenças estabelecidas ou se preocupavam em preveni-las. Os indivíduos que vão ao parque por prazer apresentam melhor QVG que os indivíduos já doentes. A análise dos dados parece sugerir que quanto maior é a percepção de doença ou preocupação em preveni-la menor é a QVG sentida pela pessoa. E quanto maior for a percepção de bem-estar e saúde, maior é a percepção de QVG. Isto leva à discussão de que antes da prevenção das doenças (Caplan, 1964) o conceito de promoção da saúde pode fazer parte do repertório de saúde destes freqüentadores (Buss, 2003; Czeresnia, 2003). O conceito de promoção de saúde é visto como uma dimensão subjetiva de bem-estar assim como uma dimensão objetiva com aspectos de intervenção e planejamento como propõe Muchinsky (2004).

O parque, quando não está associado apenas à prática de atividade física, como meio de prevenção de doenças ou, principalmente, para não permitir que o estado de doença se agrave, mas ao lazer e à diversão torna-se um ambiente para a promoção de saúde. Estes dados estão relacionados à concepção de Buss (2003), quando assinala que promover a saúde é, entre outros aspectos, articular recursos públicos com saberes acadêmicos e populares para atuar sobre os fatores determinantes da saúde e da doença.

Quanto à qualidade de vida e aos domínios em relação à faixa etária observou-se que no domínio psicológico (2) o idoso está melhor que o jovem. Neste domínio são analisados os sentimentos positivos e negativos, pensamento, aprendizagem, memória, concentração e autoestima. No domínio Meio Ambiente (4) o idoso está melhor que o jovem e o adulto, que engloba. itens como segurança física e proteção, ambiente familiar, recursos financeiros, cuidados de saúde, oportunidades de recreação e lazer.

Estes resultados positivos dos idosos parecem estar relacionados à boa condição financeira, pois 60% deles pertenciam às classes B e C e, quanto à escolaridade, 40% possuíam ensino médio e 30% superior. Eles também são ativos fisicamente e socialmente, não apresentam problemas de mobilidade, possuem horas de lazer e recreação, como é o caso de suas atividades no parque, contam com o apoio social e estão em situação econômica favorável. Esses dados são corroborados pelas pesquisas de Jakobsson et al. (2004) e Vagetti et al. (2013), que mostraram a relação entre QVG e todos os aspectos de sua vida. Flanagan (1982) constatou também, que as principais dimensões que apresentam alta correlação com QVG são: recursos econômicos, trabalho, saúde, recreação e educação. Estes resultados coincidem com os achados de Xavier et al. (2003). Eles concluíram que a qualidade de vida positiva está provavelmente relacionada à associação de vários fatores, independente da presença ou não de doenças físicas. A associação de fatores positivos, como a maior escolaridade, a situação financeira favorável, oportunidades sociais e de lazer parecem ter influído para que os idosos do presente estudo apresentassem melhor situação nos domínios psicológico e de meio ambiente, quando comparados aos jovens e adultos. Embora não tenham apresentado melhor QVG que os adultos e jovens.

Quando se considera a QVG em relação à faixa etária, os dados mostraram que o jovem apresenta melhor qualidade de vida global que o adulto. Estes jovens, que passeiam no parque e que convivem em grupo, vivem situações agradáveis e apresentam percepção positiva da qualidade de vida global (Duarte, 2002; Elzirik, 2001). Alguns fatores que podem ter contribuído para o relato de qualidade de vida menor nos adultos são: as preocupações com a saúde física, a crença na doença e necessidade de preveni-la, que denigre a sua representação de saúde mental. Assim levantou-se a hipótese de que a percepção de menor QVG poderia ser compreendida pelas responsabilidades próprias da idade como família e trabalho, exigências essas que o adulto precisa suportar (Muchinsky, 2004). O fato positivo é que o parque é um local agradável, no qual as pessoas podem cuidar da saúde. As pessoas na idade adulta precisam tomar medidas preventivas e de manutenção de saúde e de prevenção de doenças degenerativas. Para isso eles precisam ter um vínculo com a comunidade e buscar ajuda nela; praticar exercícios, manter uma atividade física regular, preocupação que está centrada na prevenção primária (Caplan, 1964). Os programas, que pretendem melhorar a qualidade de vida das pessoas, devem dar atenção ao significado do adoecer e da saúde, considerar a subjetividade do sujeito, além das estratégias de promoção e prevenção de doenças. Sendo assim, parece que os resultados deste estudo indicam que o parque pode ser considerado como um local de promoção de saúde e prevenção de doenças (Czeresnia, 2003).

Os domínios e a qualidade de vida global mostraram uma diferença estatisticamente significante em relação à escolaridade (p=0,004) no domínio 4 - Meio Ambiente. As pessoas com maior nível de escolaridade possuem melhores condições em função dos recursos financeiros, cuidados com a saúde, oportunidades de informações, lazer e segurança física. Quanto à condição econômica, o teste estatístico Tuckey não apontou diferenças estatísticas significativas na qualidade de vida global. Assim, os resultados sugerem que possuir boa qualidade de vida global não está necessariamente relacionada à condição socioeconômica do indivíduo. Possuir boa situação financeira assegura melhor condição, apenas no domínio 4 - meio ambiente (Muchinsky, 2004).

Quanto à diferença entre os gêneros, foi constatado, por meio do teste t para amostras independentes, que ela não foi significativa entre os gêneros, na freqüência ao parque; no motivo da ida ao parque; em relação a gênero e escolaridade, gênero e classe econômica, assim como gênero e qualidade de vida. Todas estas hipóteses foram rejeitadas (Strey, 1998).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os participantes desta pesquisa mostraram uma percepção muito positiva em relação à utilização do parque pela sua beleza, acessibilidade, atividades desenvolvidas e como um ambiente saudável e de lazer, que promove saúde e previne doenças. O parque é frequentado por idosos, adultos e jovens. Consideram que é um local que pode ajudá-los a evitar complicações de doenças, a praticar atividades físicas para se manterem saudáveis e pelo prazer que sentem no parque.

Observou-se que, quanto maior for a percepção de doença ou preocupação em preveni-la, menor é a QVG sentida pela pessoa. E, quanto maior for a percepção de bem-estar e saúde, maior é a percepção de QVG. Portanto, a promoção da saúde se torna fundamental para a melhora da qualidade de vida e o parque público tem essa função, ele promove a saúde.

Concluiu-se que existe uma dinâmica positiva entre o homem e a natureza. A sobrevivência ecológica, que inclui a preservação da natureza em harmonia com o homem é um dos importantes fatores que proporciona qualidade de vida.

Cabe, finalmente, recomendar uma agenda de pesquisa que inclua os estudos sobre a importância dos parques e sua influência na qualidade de vida. Principalmente para ter subsídios que nortearão a exigência de políticas públicas para preservação, criação e manutenção de áreas verdes que promovam a saúde e previnam doenças. Entende-se aqui a saúde como bem-estar físico, bem-estar psicológico e sustentabilidade social.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido em 16/04/15
Revisto em 03/07/16
Aceito em 05/07/16

 

 

* Endereço para correspondência: Maria Geralda: Av. Gilda, 173, Vila Gilda, Santo André - SP. CEP: 09190-510. Telefone: 4426- 3153. E-mail: geraldavianaheleno@gmail.com
1 Pesquisa financiada pelo CNPq - PIBIC. Agradecimentos: Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo. Secretaria de Planejamento e Tecnologia da Informação e Serviços Urbanos.

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