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Interamerican Journal of Psychology

versão impressa ISSN 0034-9690

Interam. j. psychol. vol.43 no.3 Porto Alegre dez. 2009

 

 

A Psicologia Social no Brasil (1986 - 2006). Uma avaliação bibliométrica baseada no PsycINFO

 

Social Psychology in Brazil (1986 - 2006). A bibliometric assessment based on the PsycINFO

 

 

Rodolfo de Castro Ribas Jr.1; Clarice Moreira Portugal; Ludmilla Tassano Pitrowsky; Maicon Pereira da Cunha; Pamela Ramos Blanco; Roberto Nicolas Pimmingstorfer Gimena; Yuri Coutinho Vilarinho

Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil

 

 


RESUMO

O presente estudo foi conduzido com o objetivo de traçar um panorama das pesquisas brasileiras realizadas no campo da Psicologia Social. O PsycINFO foi utilizado para identificar, de forma sistemática, artigos na área. Registros de artigos focalizando a Psicologia Social publicados por autores filiados a instituições brasileiras entre 1996 e 2007 foram identificados e processados. Análises gráficas e de regressão revelaram que o número de artigos publicados anualmente em Psicologia Social cresceu sistematicamente, sobretudo na última década. Os assuntos mais investigados foram os seguintes: Criação de filhos, Matrimônio e Família, Comportamento Sexual - Orientação Sexual, Cultura e Etnologia, Processos Grupais e Interpessoais. Análises revelaram, entre outros aspectos, que o número médio de autores por artigo cresceu consistentemente de aproximadamente 1,5 em 1996 para 2,5 em 2006.

Palavras-chave: Psicologia social; Análise bibliométrica; Brasil.


ABSTRACT

The present study was accomplished to trace a portrait of the Brazilian researches in Social Psychology. The PsycINFO database was employed to methodically identify Brazilian social psychology articles. Records of articles focusing Social Psychology published by authors affiliated to Brazilian institutions between 1996 and 2007 were systematically identified and processed. Graphical and regression analyses indicated that the number of social psychology articles annually published increased steadily, especially in the last decade. The topics more investigated are as follows: Childrearing and Child Care, Marriage and Family, Sexual Behavior and Sexual Orientation, Culture and Ethnology, Group and Interpersonal Processes. Analyses indicated, among other aspects, that the mean from number of authors per articles increased consistently from about 1,5 in 1986 to 2,5 in 2006.

Keywords: Social psychology; Bibliometrics; Brazil.


 

 

A ciência pode ser entendida, em parte, como um sistema de produção de informação, sendo esta principalmente veiculada sob a forma de publicações. Com base nesse entendimento, estudos, normalmente denominados bibliométricos, vêm sendo realizados com o objetivo de inferir atividade de pesquisa científica a partir da análise de publicações e citações (e.g., Hood & Wilson, 2001; Spinak, 1998; White & McCain, 1989). Estudos bibliométricos têm sido freqüentemente utilizados com objetivo de inferir tendências (i.e., expansão, declínio) de atividade em determinadas áreas de investigação ou ainda para inferir a atividade científica em determinados países, áreas geográficas e instituições (e.g., Glänzel, 1996; Krauskopf, Pessot, & Vicuña, 1986; Leta & Meis, 1996). Em geral essas investigações têm sistematicamente revelado que, apesar de não serem livres de limitações, indicadores bibliométricos podem ser relativamente confiáveis e úteis para ajudar a compreender mudanças na ciência e guiar políticas de incentivo ao desenvolvimento científico (e.g., Gomes, Sanz, & Mendéz, 1990).

Pelo menos desde a década de 1930, análises bibliométricas têm sido utilizadas para avaliar tendências na Psicologia. Goodenough (1934), por exemplo, analisou três fontes de dados bibliográficos (o Psychological Index, um banco de dados que só incluía títulos de publicações; o Psychological Abstracts, o banco de dados bibliográficos da American Psychological Association [APA]; e registros de trabalhos apresentados em reuniões anuais da APA) para avaliar tendências na atividade de pesquisa psicológica entre 1894 a 1932. Goodenough (1934) identificou várias mudanças significativas e relatou, por exemplo, que a proporção de trabalhos publicados anualmente em determinadas áreas (e.g., Sensação e Percepção) decaiu sistematicamente entre 1894 a 1932, ao passo que a proporção de trabalhos publicados em outras áreas (e.g., Psicologia da Educação, Infância e Adolescência) cresceu consistentemente no mesmo período. Com base em suas análises, Goodenough (1934) concluiu que a psicologia norte-americana estava se afastando de suas tradições européias e da filosofia. Louttit (1957) utilizou metodologia semelhante à empregada por Goodenough (1934) e reportou resultados muito semelhantes.

Mais recentemente, Robins, Gosling e Craik (1999) conduziram uma análise bibliométrica nos registros do PsycINFO (a versão eletrônica da bases de dados bibliográficos da APA) com o objetivo de avaliar tendências de publicação em quatro grandes escolas da psicologia (psicanálise, behaviorismo, psicologia cognitiva e neurociência). Entre outros aspectos, Robins et al. (1999) analisaram artigos publicados em quatro conceituados periódicos em psicologia (American Psychologist, Annual Review of Psychology, Psychological Bulletin e Psychological Review) e verificaram que a percentagem de artigos vinculados ao behaviorismo decaiu de aproximadamente 10% em 1968 para 2,5% em 1997. No mesmo período a percentagem de artigos vinculados à psicologia cognitiva cresceu sistemática e consistentemente de aproximadamente 6% em 1968 para 18% em 1997. Esses resultados corroboraram uma avaliação anterior apresentada por Friman, Allen, Kerwin e Larzelere (1993).

Estudos bibliométricos têm ainda oferecido informações importantes sobre a psicologia social. Quiñones- Vidal, López García, Peñaranda Ortega e Tortosa Gil (2004), por exemplo, analisaram artigos publicados pelo Journal of Personality and Social Psychology entre 1965 e 2000 e verificaram, entre outros aspectos, que o tamanho dos artigos, o número de citações bibliográficas e a proporção de autores vinculados a instituições fora dos Estados Unidos cresceram sistematicamente no período analisado. De acordo com a avaliação de Quiñones-Vidal et al. (2004) esses achados indicam que cresce a internacionalização, a complexidade e a maturidade da Psicologia Social enquanto campo de investigação científica (ver também Over, 1982).

Utilizando uma abordagem bibliométrica, Salazar (1997) analisou artigos publicados entre 1967 e 1996 na Revista Interamericana de Psicología, uma publicação da Sociedade Interamericana de Psicologia (SIP), com o objetivo de avaliar o desenvolvimento de pesquisas transculturais na América Latina. De acordo com Salazar (1997), as áreas mais freqüentemente estudadas nos artigos analisados foram a Psicologia Social, a Psicologia do Desenvolvimento e a Psicometria. Mais recentemente, Borges (2004) analisou todos os artigos publicados pela Revista Interamericana de Psicología entre 1967 e 2004 e avaliou, entre outros aspectos, a distribuição de assuntos considerando os critérios de classificação do PsycINFO. Borges (2004) verificou que os três assuntos mais freqüentemente tratados nos artigos foram: Prevenção e tratamento de saúde e saúde mental, Processos sociais e problemas sociais e Psicologia do desenvolvimento. De fato, com freqüência, estudos e revisões têm ressaltado a importância dessas três áreas na psicologia latino-americana (e.g., Alarcón, 2004; Ardilla, 2004; Ozella, 1998; Quiñones- Vidal, Vera-Ferrandiz, Sánchez-Hernández, & Pedraja- Linares, 1991; Sosa & Valderrama-Iturbe, 2001).

Trabalhos recentes ofereceram informações acerca da Psicologia Social no Brasil. Spink e Spink (2005), por exemplo, abordaram questões como fragmentação, diversidade temática e pouco consenso acerca de pressupostos teóricos mais básicos em estudos brasileiros. Bock e Furtado (2005) apresentaram, entre outros aspectos, críticas a determinados modelos predominantes e à forte influência da psicologia norte-americana na psicologia brasileira. Molon (2001) apresentou uma avaliação da Psicologia Social no Brasil tal como ela vem sendo desenvolvida junto à Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO), examinando tendências predominantes e autores significativos. A avaliação de Molon (2001) foi, em parte, embasada na análise de artigos publicados no periódico Psicologia & Sociedade da ABRAPSO. Sá (2007) aponta que a psicologia social brasileira que é “caracteristicamente plural, crítica e avessa a fronteiras disciplinares rígidas” (p. 7) tendo recebido contribuições importantes da Europa e dos Estados Unidos.

Deve-se ressaltar, entretanto, que nenhum desses trabalhos ofereceu uma avaliação mais sistemática e indicadores quantitativos acerca do desenvolvimento da Psicologia Social no Brasil e de sua visibilidade no exterior. De fato, uma sistemática e exaustiva análise de literatura disponível revelou que esse tipo de informação simplesmente não está disponível. O presente estudo foi conduzido exatamente com o objetivo de preencher essa lacuna na literatura, contribuindo para uma melhor compreensão da Psicologia Social no Brasil.

Tendo em vista a ausência, quase que total, de indicadores sobre a psicologia social no Brasil, optou-se por apresentar no presente trabalho um panorama mais geral acerca das pesquisas realizadas por pesquisadores brasileiros no âmbito da Psicologia Social e discutir algumas tendências históricas na realização dessas pesquisas.

Tendo em vista a ênfase na Psicologia Social desenvolvida por psicólogos brasileiros, cinco objetivos específicos foram considerados no presente trabalho: (a) avaliar a evolução das publicações ao longo das últimas décadas, (b) identificar áreas mais freqüentemente estudadas, (c) identificar periódicos que mais publicaram artigos, (d) avaliar a distribuição das publicações conforme o idioma e (e) avaliar tendências na evolução do número de autores por trabalho (i.e. co-autoria).

 

Método

Seleção de Literatura

Seguindo tendências já amplamente consagradas em outras áreas de investigação, os periódicos vêm se tornando a principal forma de comunicação de resultados de pesquisa psicológica no Brasil. A importância dos periódicos brasileiros em psicologia pode ser examinada, por exemplo, no trabalho de Yamamoto et al. (2002). Estes autores realizaram um estudo que avaliou a qualificação dos veículos científicos de publicação utilizados pelos pesquisadores brasileiros em psicologia, bem como mecanismos para viabilizar a manutenção dos periódicos com melhor avaliação e estabelecer parâmetros para o incremento da qualidade.

Dessa forma, o presente estudo bibliométrico analisou artigos publicados em periódicos e foi conduzido sobre os registros do PsycINFO, base de dados bibliográficos da APA. Registros de todos os artigos indexados pelo PsycINFO que apresentaram pelo menos um autor vinculado a uma instituição brasileira e um assunto principal vinculado à psicologia social foram analisados. Mesmo não sendo livre de limitações, o PsycINFO possui uma expressiva cobertura de literatura psicológica mundial, indexando artigos publicados em periódicos com publicação regular e que contêm títulos, resumos e palavras chave em inglês. Em janeiro de 2008, a cobertura dessa base de dados bibliográficos abrangia aproximadamente 2400 periódicos de 53 países, incluindo 46 periódicos publicados nas Américas Central e do Sul (Argentina, 5; Brasil, 24; Chile, 3; Colômbia, 4; México, 7; Peru, 1; Uruguai, 1; Venezuela, 1).

Ainda acerca da escolha da base de dados para este trabalho, deve-se asseverar que, mesmo reconhecendo um importante desenvolvimento recente das bases de dados nacionais (e.g., Index Psi Periódicos, criado em 1998) e regionais (e.g., LILACS - Literatura Latino- Americana e do Caribe em Ciências da Saúde, esta não dedicada a psicologia), é possível afirmar que, com mais de 80 anos de existência, o PsycINFO é hoje a principal ferramenta de busca de literatura em psicologia no mundo, com mais 2,6 milhões de registros em 2007. Dessa forma, pode-se afirmar que um periódico ganha visibilidade internacional quando é indexado nessa base de dados. Uma ampla descrição da história e dimensão do PsycINFO é apresentada por Benjamin e VandenBos (2006).

Procedimento

Para a identificação de artigos foi realizada uma busca sistemática no PsycINFO. O procedimento foi similar ao empregado por Robins et al. (1999). Os seguintes critérios foram utilizados na identificação de artigos: (a) presença da expressão “Brasil” ou “Brazil” no campo de afiliação institucional dos autores e (b) código de classificação de assunto (CC, Classification Code) 29 (Social Processes and Social Issues) ou 30 (Social Psychology). A busca foi restrita a artigos, excluindo, por exemplo, livros, capítulos de livros e teses. Dessa forma, registros de todos os artigos com pelo menos um autor vinculado a uma instituição brasileira e que, de acordo com a classificação atribuída pelo PsycINFO, focalizaram prioritariamente Questões e Processos Sociais ou Psicologia Social foram sistematicamente identificados e obtidos. Considerando que os registros do PsycINFO não são completos para artigos com mais de 4 autores publicados antes de 1986 (APA, 2008), a presente análise compreendeu o período de 1986 a 2006. Os registros dos artigos identificados foram extraídos e importados para uma base de dados construída especialmente para o presente estudo.

Deve-se salientar que o procedimento utilizado, baseado no PsycINFO, certamente não identificou todos os artigos publicados em psicologia social por autores vinculados a instituições brasileiras. Por outro lado, deve-se também reconhecer que nenhuma outra base de dados bibliográficos permitiria identificar de forma tão ampla e sistemática a produção brasileira em psicologia social em nível nacional e internacional. Considerando todos esses aspectos, pode-se afirmar que o presente trabalho foi baseado em uma amostra de artigos que foram publicados em conceituados periódicos com visibilidade internacional. Por isso, a presente análise não enfoca valores absolutos, e sim valores relativos, com foco nas variações ao longo do tempo.

Finalmente, deve-se observar que, com o objetivo de avaliar a adequação do procedimento utilizado para a seleção de literatura, aproximadamente 12% dos artigos identificados (n = 68) foram selecionados aleatoriamente e lidos na íntegra e de forma independente por pelo menos dois dos autores deste. Esse tamanho de amostra permitiu garantir um grau de confiança estatística de 95%, mesmo considerando tamanhos de efeito modestos (0,3). Verificou-se que mais de 98% dos artigos identificados se adequavam perfeitamente ao foco do estudo não havendo discrepância relevante entre as revisões independentes. Isso equivale dizer que os artigos focalizaram de forma substantiva temas em psicologia social (e.g., representações sociais, atitudes, crenças, interação social) e tinham pelo menos um autor vinculado a uma instituição brasileira.

 

Resultados

A Tabela 1 apresenta os periódicos brasileiros indexados em dezembro de 2007, bem como o ano em que essa indexação se iniciou (APA, 2008). Vale observar que a cobertura de periódicos realizada pelo PsycINFO pode mudar de ano para ano, na medida em que novos periódicos passam a ser indexados, enquanto que outros deixam de ser indexados por descontinuidade ou falta de regularidade na publicação. Por exemplo, o periódico Arquivos Brasileiros de Psicologia, um dos mais antigos periódicos brasileiros em psicologia, interrompeu temporariamente suas atividades e deixou de enviar informações para o PycINFO desde 2001 (Lynn Willis2, comunicação pessoal, 11 de dezembro de 2007). A ausência de periódicos como Arquivos Brasileiros de Psicologia e Psicologia & Sociedade na lista de periódicos indexados será ainda discutida na conclusão deste trabalho. Como se pode observar na Tabela 1, 16 dos 24 periódicos cobertos pelo PsycINFO (67%), surgiram ou começaram a ser indexados na década de 1990. Um maior número de periódicos indexados pode ser associado a um aumento na publicação de artigos em psicologia social no Brasil e a uma maior visibilidade desses artigos.

 

 

Ao todo foram identificadas no PsycINFO 556 entradas de artigos com autores filiados a instituições brasileiras, classificados nas áreas de Questões e Processos Sociais e Psicologia Social e publicados entre 1986 a 2006. Segunda a classificação do PsycINFO, Questões e Processos Sociais foram o assunto central de 78,5% dos artigos, enquanto que 22,4% envolveram primordialmente tópicos da Psicologia Social. Vale aqui salientar que a classificação utilizada pelo PsycINFO é exaustiva, mas não é mutuamente excludente. Ou seja, um mesmo trabalho pode receber mais de um código de classificação. Por exemplo: o trabalho de Guareschi et al. (2003) sobre a produção de sentidos de meninos e meninas moradores de uma favela recebeu uma dupla classificação (desenvolvimento psicossocial e estrutura e organização social).

Foi observado um substancial aumento do número de artigos indexados anualmente em psicologia social com autores vinculados a instituições brasileiras, especialmente a partir da década de 1990. Como se pode examinar na Figura 1, o número de artigos indexados anualmente no início da referida década era inferior a 10, enquanto no ano de 2005, aproximadamente 100 artigos foram indexados. Uma análise de regressão corroborou o que se observa na Figura 1, indicando que as publicações em psicologia social envolvendo pesquisadores brasileiros cresceram significativamente entre 1986 em 2006, beta = 3,62; r2 = 0,60; F (1, 19) = 28,7; p < 0.001. Esse crescimento pode, em parte, ser explicado por um aumento de atividades de pesquisa, que pode ser inferida, por exemplo, pelo surgimento de novos periódicos brasileiros ou pelo início da indexação desses periódicos pelo PsycINFO (ver Tabela 1).

 

 

A Tabela 2 apresenta a distribuição dos artigos identificados, considerando subáreas do PsycINFO. As subáreas mais freqüentemente estudadas (pelo menos 2% do total de artigos) em dois períodos: 1986- 1995 e 1996-2006 são apresentadas na Tabela 2. Verificou- se que as seis subáreas mais estudadas entre 1986 e 2006 foram: Criação de filhos – Cuidados com crianças, Matrimônio e Família, Cultura e Etnologia, Comportamento Sexual – Orientação Sexual, Processos Grupais e Interpessoais, e Percepção Social e Cognição Social. A prevalência de temas ligados à família e a relações conjugais não é uma surpresa. Pode-se ponderar, por exemplo, que vários grupos de trabalho da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP) vêm estudando esses tópicos (e.g., Casal e Família: Estudos psicossociais e psicoterapia, Família e Comunidade). Considerando os percentuais apresentados na Tabela 2, pode-se ainda ponderar que foram observadas algumas mudanças nas áreas mais freqüentemente estudadas nos períodos examinados. Por exemplo, Criação de filhos – Cuidados com crianças, e Matrimônio e Família foram temas freqüentemente estudados nos dois períodos. Por outro lado, no período de 1996-2006 foi percebida uma redução expressiva na proporção de pesquisas focalizando Cognição Social e um importante aumento de pesquisas focalizando Comportamento Sexual – Orientação Sexual. Essas mudanças na publicação provavelmente refletem mudanças de interesse entre pesquisadores brasileiros. Estudos posteriores serão realizados para compreender esses achados.

A Tabela 3 apresenta os periódicos nacionais que mais publicaram artigos relacionados com a Psicologia Social entre 1986 e 2006, com autores filiados a instituições brasileiras. Os cinco periódicos nacionais que mais publicaram artigos concernentes à Psicologia Social com autores brasileiros foram: Psicologia: Teoria e Pesquisa; Psicologia: Reflexão e Crítica; Estudos de Psicologia (Natal), PSICO; Psicologia em Estudo. No que se refere a periódicos nacionais, os resultados obtidos já eram esperados. Praticamente todos os periódicos com mais artigos receberam avaliação Nacional A pela Comissão Editorial da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia ([CAPES-ANPEPP]; Yamamoto et al., 2002).

 

 

A Tabela 3 também apresenta os periódicos internacionais que mais publicaram artigos concernentes à Psicologia Social entre 1986 e 2006, com autores filiados a instituições brasileiras. Um fato que chamou a atenção foi o aparecimento de uma revista da área de Enfermagem (Revista Latino-Americana de Enfermagem) entre os periódicos internacionais que mais publicaram artigos de pesquisadores brasileiros em psicologia social.

Em função desse achado, foi realizada uma análise mais específica para verificar se efetivamente esta revista vinha publicando artigos na área de psicologia social. Assim, todos os artigos identificados e publicados na Revista Latino-Americana de Enfermagem foram lidos na íntegra. Verificou-se que essa revista tem efetivamente publicado um número considerável de artigos vinculados a esta área da psicologia. Entre os temas estudados nessa revista pode-se mencionar: percepções sociais sobre a gravidez na adolescência, representações sociais acerca do aleitamento materno, representações sociais acerca do cuidado materno segundo trabalhadoras de creches, crenças acerca do uso tabaco (e.g. Sousa, 2000; Sousa & Hortense, 2006, Stuchi & Carvalho, 2003).

Os artigos identificados foram classificados de acordo com o idioma em que foram escritos. Verificou-se que 58% (n = 310) dos artigos foram escritos em português, 28% (n = 150) em inglês, e 10% (n = 54) em espanhol. Os demais artigos (7%) foram escritos em outros idiomas (e.g., francês). A relativamente alta percentagem de artigos publicados em inglês e espanhol já era esperada. Borges (2004), por exemplo, avaliou artigos publicados na Revista Interamericana de Psicologia e concluiu que autores brasileiros têm escrito cada vez mais artigos em idiomas diferentes do português para que seus trabalhos tenham maior alcance nas Américas.

A colaboração (co-autoria) entre pesquisadores na produção de artigos também foi alvo de análise neste estudo. Com base nos dados fornecidos pelo PsycINFO, inicialmente foi computado o número de autores para cada artigo. Na seqüência foi calculado o número médio de autores por artigo para cada ano, de 1986 a 2006. A Figura 2 apresenta a média de autores por artigo ao longo dos anos. O número médio de autores por artigo em 1986 girava em torno de 1,5, enquanto que no ano de 2006, a média de autores aumentou para aproximadamente 2,5. Segundo dados fornecidos por Quiñones- Vidal et al. (2004), os artigos publicados pelo Journal of Personality and Social Psychology entre 1990 e 2000 apresentaram, em média, 2,3 autores por artigo. Isso equivale dizer que o índice de co-autoria observado no presente estudo é muito semelhante com o que vem sendo reportado em outros estudos envolvendo a psicologia social no Brasil. Uma análise de regressão revelou ainda que o número médio de autores por artigo cresceu significativamente entre 1986 em 2006, beta = 0,71; r2 = 0,59; F (1, 19) = 27,1; p < 0.001. Atualmente estamos rumando para uma média de três autores por artigo. O crescimento significativo na colaboração de autores nos últimos vinte anos segue uma tendência mundial, observada, por exemplo, por Quiñones-Vidal et al. (2004).

 

 

 

Finalmente, foram identificados pelo menos 44 artigos referentes a pesquisas transculturais que envolveram participantes de dois ou mais países. Verificou- se que a soma de todos os artigos envolvendo participantes brasileiros e europeus (n = 22) foi ligeiramente inferior ao total de artigos que se referiam a pesquisas envolvendo participantes brasileiros e norteamericanos (n = 24). Esses resultados corroboram estudos anteriores e fornecem indicadores sobre o grau de colaboração entre pesquisadores brasileiros, europeus e norte-americanos.

 

Conclusões

Considera-se que o presente estudo produziu informação básica, porém fundamental. Espera-se que esses resultados fomentem discussões sobre a Psicologia Social no Brasil. Os cinco problemas específicos identificados na introdução foram examinados satisfatoriamente. Inicialmente verificou-se que diferentes indicadores sugerem um consistente crescimento na publicação de artigos em Psicologia Social nas últimas décadas. Esse crescimento se mostrou expressivo especialmente a partir de 1997. Considerando o espaço editorial e a complexidade do problema, discussões acerca do crescimento de publicações (e.g., a relação entre crescimento e investimento, número de periódicos, número de pesquisadores) serão conduzidas em estudos posteriores.

As análises possibilitaram identificar tópicos mais freqüentemente estudados entre 1986 e 2006 (e.g., Criação de filhos – Cuidados com crianças, Matrimônio e Família, Cultura e Etnologia, Comportamento Sexual – Orientação Sexual, Processos Grupais e Interpessoais, e Percepção Social e Cognição Social). Levantamentos sistemáticos, conduzidos antes do presente estudo, revelaram que esse tipo de avaliação ainda não havia sido realizado de forma sistemática. As análises detectaram ainda uma redução na proporção de publicações sobre alguns temas (e.g., Cognição Social) e um aumento de publicações sobre outros (e.g., Comportamento Sexual – Orientação Sexual). Essas mudanças na publicação, que podem ser atribuídas a mudanças de interesse de pesquisa por parte de pesquisadores brasileiros, serão objeto de estudos posteriores. De resto, o que ficou registrado é que o campo vem sofrendo mudanças perceptíveis ao logo das últimas décadas.

O estudo possibilitou identificar os periódicos nacionais e internacionais que mais publicaram artigos relacionados com a Psicologia Social entre 1986 e 2006, com autores filiados a instituições brasileiras. Confirmando expectativas, os periódicos nacionais que mais publicaram artigos concernentes à Psicologia Social (e.g., Psicologia: Teoria e Pesquisa; Psicologia: Reflexão e Crítica; Estudos de Psicologia (Natal), PSICO; Psicologia em Estudo) estão entre os mais bem avaliados pela CAPES-ANPEPP. Entretanto, uma revista de enfermagem (Revista Latino-Americana de Enfermagem) também foi identificada como uma importante fonte de publicações no âmbito da Psicologia Social no Brasil. Esse achado sugere que tópicos da psicologia social vêm sendo investigados de forma substantiva por profissionais de outras áreas no Brasil.

O presente estudo revelou ainda outra questão. Quando o levantamento de dados foi conduzido, verificou- se que uma série de periódicos prestigiados no Brasil (e.g., Arquivos Brasileiros de Psicologia, Psicologia & Sociedade) não eram indexados pelo PsycINFO. Considerando que a cobertura dessa base de dados não é restritiva, e que todos os periódicos acadêmicos em psicologia com publicação regular e resumos, títulos e palavras chave em inglês podem ser indexados pelo PsycINFO, a não indexação pode ter vários motivos, inclusive decisão dos editores de não solicitar indexação. De toda forma, essa questão extrapola os objetivos do presente estudo. Uma pesquisa junto a editores de periódicos nacionais poderá fornecer maiores esclarecimento.

O presente estudo revelou ainda uma importante mudança no comportamento dos pesquisadores brasileiros em Psicologia Social: de acordo com as avaliações apresentadas, o número de autores por trabalho tem crescido consistentemente. Adicionalmente, verificou-se que uma parte substancial dos artigos identificados foi escrita em idiomas diferentes do portu-guês. Esse resultado, consistente com estudos anteriores, aponta para uma crescente internacionalização das pesquisas em psicologia social.

Conforme já foi assinalado anteriormente, o presente estudo foi conduzido sobre os registros do PsycINFO. Portanto, o procedimento utilizado na identificação de literatura certamente não capturou todos os artigos publicados em psicologia social por autores vinculados a instituições brasileiras. De fato, considera- se que o estudo focalizou uma amostra de artigos que foram publicados em periódicos conceituados com visibilidade internacional. Por essa razão, deve-se mais uma vez salientar que a presente análise não focalizou valores absolutos, e sim valores relativos, com foco nas variações ao longo do tempo. Entende-se que novos estudos podem focalizar outras bases de dados bibliográficos como o Index-Psi Periódicos Científicos.

Os autores entendem que indicadores, ainda que provisórios ou iniciais, são melhores que a ausência de indicadores e por isso entendem que o presente estudo contribui para um melhor entendimento da psicologia social no Brasil. Espera-se ainda que o presente trabalho estimule discussões em diversos níveis sobre esse tema.

 

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Received 21/08/2006
Accepted 15/03/2009

 

 

Rodolfo de Castro Ribas Jr. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Clarice Moreira Portugal. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Ludmilla Tassano Pitrowsky. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Maicon Pereira da Cunha. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Pamela Ramos Blanco. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Roberto Nicolas Pimmingstorfer Gimena. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.
Yuri Coutinho Vilarinho. Universidade Federal do Rio de janeiro, Brasil.

1 Endereço para correspondência: Av. Pasteur, 250, Pavilhão Nilton Campos, Urca, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, CEP 22290-240. E-mail: rribas@ufrj.br
2 PsycINFO Manager.