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Estudos de Psicanálise

versão impressa ISSN 0100-3437versão On-line ISSN 2175-3482

Estud. psicanal.  n.28 Belo Horizonte set. 2005

 

AUTORES CONVIDADOS

 

Considerações sobre uma escuta que nunca é desavisada: sobre a relação entre as concepções psicanalíticas acerca da feminilidade e o fazer clínico do analista

 

 

Angela Moreira UtchitelI

Universidade Estácio de Sá

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Seguindo as concepções psicanalíticas sobre a feminilidade, este artigo tenta evidenciar a intrínseca relação entre as concepções que marcam o pensamento freudiano, o anglo-saxão e o lacaniano em relação a esta temática e o fazer clínico do analista.

Palavras-chave: Feminilidade, Psicanálise, Freud, Klein, Lacan.


ABSTRACT

Following the psychoanalytics conceptions about femininity, this article tries to evidence the intrinsic relation between the conceptions that mark the freudian’s, the anglo-saxon’s and the lacanian’s thought, in relation to this thematic and the tecnical work of the psychoanalyst.

Keywords: Feminnity, Psychoanalysis, Freud, Klein, Lacan.


 

 

O plano aparentemente disperso e plural do universo conceitual da psicanálise costuma ser avaliado não só em função das divergências que teriam brotado da leitura da última teoria pulsional de Freud, realizada por seus sucessores, como também em função dos interesses clínicos despertados e acionados por patologias distintas da neurose. Sem desconsiderarmos o valor dessas questões, temos aqui uma proposta de outra ordem: tentaremos demonstrar que as divergências teórico-clínicas observadas ao longo da história da psicanálise em seu desenvolvimento podem também ser lidas e entendidas tomando-se como parâmetro a concepção de feminilidade presente em cada uma das principais escolas de pensamento em nosso campo.

Além disto, é nosso objetivo salientar que as diferentes concepções sobre a feminilidade forjadas no interior de cada uma das três grandes escolas de pensamento em nosso campo , a freudiana, a anglo-saxã e a lacaniana ,, mantêm uma estreita relação com a direção do tratamento a ser tomada pelo analista em seu ofício. Em função disto, o que este artigo visa enfatizar é que as concepções acerca da feminilidade, que atravessaram a história teórico-clínica da psicanálise, mantêm uma estreita relação não só com o plano de escuta de que se serve o analista em sua prática, mas com aquilo que vai ser por ele privilegiado como o horizonte da análise , não somente com analisandas mulheres, como poderíamos imaginar num primeiro momento, mas com todos os sujeitos. Para atingir nosso propósito, procederemos, de um lado, a um breve recorte das diferentes concepções de feminilidade que permearam a história da psicanálise em seu desenvolvimento; de outro, demonstraremos a íntima relação entre tais concepções e o fazer do analista.

 

As diferentes concepções psicanalíticas acerca da feminilidade

Não é exagero considerar a histeria e, mais precisamente, o sofrimento das mulheres histéricas na virada do século XIX para o século XX como um dos motores do nascimento da psicanálise. Se quiséssemos, ainda que genericamente, situar as razões deste entrelaçamento entre histeria e psicanálise, bastaria lembrarmos que a histeria foi secularmente associada a um distúrbio na esfera da fisiologia sexual das mulheres, o que acabou por torná-la um alvo precioso para elucidar as relações entabuladas entre o sexual e o psíquico. O fato de que a primeira aproximação teórico-clínica de Freud sobre os distúrbios histéricos se deu a partir do que pôde observar , e nos narrar , tendo por base o atendimento a quatro mulheres1 vem confirmar esta impressão, trazendo já à tona as indagações freudianas sobre aquilo que, no terreno do exercício da sexualidade feminina, se mostrava afeito às mais diversas manifestações, como conversões, esquivas e inibição.

Sabemos, por outro lado, que Freud precisou percorrer um longo caminho elaborativo para chegar, já na década de trinta, a nos legar suas considerações mais refinadas sobre como se daria o percurso da menina em via de tornar-se mulher. Se tentássemos, sumariamente, sublinhar os marcos desse caminho, destacaríamos, por exemplo, que foi somente a partir do atendimento a Dora que pode estender sua concepção sobre o sexual, fazendo-o dizer respeito a algo que estaria muito além do sexo. Deste modo, aliando o que ouviu de Dora às reflexões tecidas nos "Três Ensaios", nas "Teorias Sexuais Infantis", e mesmo no atendimento ao menino Hans, pôde, já em torno de 1915, trazer à consideração de seus contemporâneos a idéia de que não possuir um pênis, ou seja, não nascer dotada de um membro viril seria, para a menina, a causa dos maiores infortúnios e dos maiores lamentos femininos. A noção de que o complexo de castração responderia pelos avatares no exercício da sexualidade passou, então, a ordenar a perspectiva freudiana sobre a feminilidade, culminando com a idéia de que esta seria atingida através da possibilidade de as mulheres trocarem seu desejo de um pênis pelo desejo de um filho, movidas, em última instância, por um poderoso sentimento: a inveja do pênis.

Em função disto, é lícito sublinhar que a feminilidade, em Freud, pode ser tomada como uma réplica simbólica da masculinidade, tendo em vista que o substituto do pênis invejado, o filho, seria alcançado pelas vias do endereçamento ao outro do amor, o que faria com que o substituto simbólico do pênis invejado pudesse ser encontrado numa criança real. Resumindo, o que caracterizaria a feminilidade, aos olhos de Freud, seria a posse simbólica do atributo fálico alcançada através da maternidade.

Vale, então, observar que aquilo que costura ou que alinhava a abordagem freudiana da sexualidade se ancora no registro dos efeitos inconscientes produzidos no psiquismo pela diferença anatômica entre os sexos; essa diferença se traduziria psiquicamente pela oposição castrado/não castrado regida pelo falicismo que caracterizaria a dialética do complexo edípico. Em conseqüência, o complexo de castração se inscreveria, então, como o elemento pivô no destino na sexualidade feminina, produzindo dois principais efeitos no percurso edípico da menina: de um lado, responderia pela troca de órgão, fazendo a menina reconhecer que seu clitóris não é um pênis; de outro, propiciaria a troca de objeto , da mãe para o pai , necessária em seu destino rumo à feminilidade. Retomar esses elementos tem o objetivo de mapear o quadro conceitual de que se serve Freud para nos falar de sexualidade e, mais especificamente, de feminilidade , questão que nos importa aqui, mais especificamente, ressaltar.

É exatamente este quadro que vai se modificar consideravelmente a partir da década de vinte, uma vez que começam a vir à luz as primeiras críticas à perspectiva falocêntrica da sexualidade proposta por Freud. Subjacente a tais críticas, a contestação da ignorância da vagina pela menina é proclamada. Vale ressaltar que tal contestação tinha como pivô uma das trocas vislumbradas por Freud como necessárias ao caminho da menina rumo à feminilidade, e que diria respeito à troca de órgão do clitóris para a vagina. Mas, se a porta de entrada para uma nova concepção psicanalítica da feminilidade originou-se a partir da contestação da ignorância da vagina pelas meninaS2, logo a perspectiva de que uma feminilidade primária orientaria os investimentos edípicos infantis mais precoces tomou vulto. A abordagem kleiniana da sexualidade se inscreve neste contexto, alterando o quadro referencial e conceitual da sexualidade.

Assim, ao entenderem o Édipo como uma experiência vivida pelo infans no próprio transcurso das fases consideradas por Freud como prégenitais, os kleinianos não só operam com o princípio de que as relações objetais emergem precocemente, mas entendem-nas movidas por tendências heterossexuais inatas que buscam objetos de satisfação. Deste modo, aquilo que Freud considerou como um ordenador da sexualidade infantil , o falo , ganhou, entre os anglo-saxões de orientação kleiniana, o estatuto de um objeto parcial buscado precocemente pela menina; no rastro desta idéia, o complexo de castração perde seu peso, ganhando força as frustrações inevitavelmente originadas pelo desmame e pelas privações vividas pela criança em seus anseios de gratificação oral. Em conseqüência, na ótica de Klein, não se tratará mais para a menina em via de tornar-se mulher de ter que lidar como uma "castração consumada", mas de se defender das angústias acionadas por seu sadismo em face das inevitáveis frustrações a que se achará exposta3. Em conseqüência, a feminilidade, no pensamento de Melanie Klein, vai ser entendida como resultando das defesas utilizadas pela mulher em nome da neutralização das inevitáveis angústias geradas pela inveja arcaica dirigida à mãe e pelo sadismo precoce dirigido aos objetos por esta contidos , incluindo-se aí o pênis do pai ,, defesas que levariam a mulher a lidar tanto com a maternidade e com o filho quanto com o parceiro no coito, norteada pelas fantasias infantis. Entendida sob esta ótica, a feminilidade no pensamento kleiniano acaba dizendo respeito a um sentimento filial, que faz da mulher um ser votado primordialmente a seu objeto materno; sentimento filial que se opõe, claramente, neste aspecto, ao que foi indicado, ainda que sutilmente, por Freud: o sentimento maternal da mulher feminina4.

Foi no início da década de cinqüenta que uma nova abordagem acerca da feminilidade começou a ganhar relevância no cenário teórico-clínico psicanalítico a partir da entrada em cena do pensamento de Jacques Lacan. Nesse pensamento ressurge, então, o privilégio à perspectiva falocêntrica freudiana; com ela, a noção de castração será considerada em seu vigor e radicalidade. Além disto, entretanto, o pensamento de Lacan destaca a importância do Outro , que pode ser aproximado do outro materno kleiniano , que ocuparia um lugar-chave na estruturação fantasística, nos tempos do Édipo e na própria constituição do objeto causa do desejo, deixando seu rastro na posição a ser adotada por qualquer sujeito no exercício da sexualidade.

Ainda em meados da década de cinqüenta, Lacan veio destacar não só as diferentes categorias ou modalidades de falta de objeto que, na constituição do sujeito, dariam acesso tanto à constituição dos objetos da realidade para a criança quanto à instauração da mãe como Outro da demanda, mas que também responderiam pelo acesso ao simbólico , registro indispensável à operação da castração. Observe-se, no entanto, que, instituindo o falo como o significante da falta e do desejo, Lacan resgata Freud, mas também resgata Klein, ao trazer para a boca de cena uma nova categoria conceitual , o desejo da mãe , que vai servir de pano de fundo à operação central inerente ao complexo edípico: a inscrição da lei, através da ressignificação do desejo da mãe pela produção da metáfora paterna. Entretanto, se a essa época o objetivo central de Lacan é o de demonstrar o valor significante do falo na constituição da dialética desejante de todo e qualquer sujeito , valendo-se, para tanto, do desejo da mãe em sua relação com a dialética da demanda ,, nem por isto a maternidade se coloca, em sua perspectiva, como o equivalente da feminilidade. Bem ao contrário, indica de que modo o desejo de ter o falo, mesmo norteando os circuitos da sexualidade feminina, não responde integralmente pelo que entra em jogo para que a posição feminina possa ser alcançada. Se no primeiro momento de seu ensino, ou seja, ainda nos anos cinqüenta, é a impossibilidade do simbólico em atestar à mulher uma identidade feminina pela via do significante que é ressaltada, no período seguinte, correspondente aos anos setenta, é o gozo, resultante da posição sexuada derivada da subjetivação não-toda da lógica fálica que preside a castração, que vai servir de parâmetro para que nos fale de posição feminina.

 

A feminilidade e o "fazer do analista" entre os freudianos: a clínica do Édipo

O que vamos aqui estar chamando de uma "clínica do Édipo" corresponde ao tipo de fazer clínico que, durante o período compreendido especialmente entre 1917 e 1930, caracterizou a prática dos analistas mais próximos de Freud. Um olhar sobre a casuística publicada neste período5 demonstra como o saber teórico-clínico dos analistas avançou, tendo como bússola exatamente os impasses da menina em seu desenvolvimento edípico. Mais do que isto, o fazer clínico se desdobrou, particularmente nesse período de pouco mais de uma década, articulado aos embaraços gerados, nos analistas, pelos efeitos produzidos pelo complexo de castração na vida de suas pacientes e pelo lamento, muitas vezes manifestado por elas, de não terem nascido homens. Foram esses elementos que fizeram do Édipo feminino, entre os freudianos, um herdeiro direto da inveja do pênis, e da maternidade, o sinônimo da feminilidade atingida, uma vez que, nela, um substituto simbólico do órgão tão ansiado seria, então, conquistado.

Nesse período, o que era expresso na transferência , o amor ou o ódio , era interpretado em estreita relação aos sentimentos edípicos. Em conseqüência, o sexo do analista pesava e tinha valor na direção do tratamento, e mesmo no sucesso do projeto terapêutico da análise. A este respeito, o relato freudiano do caso da jovem homossexual, em 1920, pode ser tomado como lapidar, uma vez que é um caso capaz de recorrentemente suscitar uma indagação: que razão teria levado Freud a enviar essa paciente para uma analista mulher? A alegação de Freud, ao longo do texto, é a de que a transferência da jovem para com ele tinha algumas peculiaridades, parecendo mesmo, em alguns momentos, não existir nenhuma transferência ou nada similar a ela. Lembremos, entretanto, que no desenrolar do caso alguns sonhos da jovem servem a Freud para indicar um impasse no campo transferencial, pois, a seus olhos, eles revelavam o propósito inconsciente da jovem em enganá-lo. Se hoje até podemos pensar que "se deixar por ela enganar" seria uma alternativa analiticamente válida, naquela época parecia não sê-lo. O repúdio manifestado pela jovem em relação aos homens fez com que Freud, como homem, julgasse ter esbarrado num impasse transferencial intransponível, o que o levou a considerar conveniente retirar-se de cena e encaminhar a jovem para uma analista mulher.

Se o critério de enviar um paciente a um analista de sexo oposto, ao se deparar com impasses transferenciais, não chegou a se constituir numa prática corrente entre os analistas da época , embora praticada por alguns6 e pelo próprio Freud, como vimos ,, entender a posição edípica a partir dos dados transferenciais o era. Deste modo, a feminilidade se articula, nessa clínica, ao Édipo positivo, e é este elemento que principalmente orienta o fazer clínico dos analistas7.

Embora, já em 1920, Freud tivesse publicado sua última e mais definitiva revisão da teoria pulsional e, em 1923, trazido à luz o novo modelo que passaria a reger sua concepção do aparelho psíquico, as análises empreendidas até 1930 se desdobram, quase que exclusivamente, em torno das questões referidas ao complexo de castração. Apoiados principalmente nas mais precoces elaborações de Freud sobre a histeria , uma histeria que faria as mulheres se distanciarem dos homens, esquivando-se ao sexo, ou com que só encontrassem prazeres eróticos em zonas do corpo investidas pela libido na mais tenra infância, o que daria ao erotismo por elas vivido um caráter auto-erótico ,, os analistas freudianos, sem se darem conta talvez, foram os primeiros a destacar o campo das relações objetais como bússola maior para avaliar o desenvolvimento psíquico de seus pacientes. Não foi à toa que Abraham, em 1924, produziu sua clássica teoria do desenvolvimento da libido, teoria em que, aos objetivos pulsionais, corresponderiam não só objetos de satisfação, mas a forma de amar esses objetos. Se estas questões não são sem conseqüência, vamos a elas...

 

A feminilidade e o fazer do analista entre os anglo-saxões: a clínica das angústias precoces

Acabamos de ver de que modo as perspectivas supostas em jogo no caminho da menina rumo à feminilidade, e desvendadas pelo que se dava a ouvir principalmente na histeria, reverberaram na clínica, acabando por orientar a escuta dos analistas freudianos. Nossa proposta agora é a de demonstrar como a introdução de novos paradigmas conceituais na abordagem da sexualidade , a afânise e o sadismo , acabou fazendo da mãe uma figura tão primordial em relação ao desenvolvimento do psiquismo que ela acabou por determinar o tipo de fazer clínico que viria, grosso modo, a caracterizar a prática dos anglo-saxões. Assim, se no que chamamos anteriormente de uma clínica do Édipo foi o período fálico do desenvolvimento libidinal que ganhou relevância, tanto através da noção de inveja do pênis quanto do conceito de castração , o que fez com que, aos olhos dos analistas freudianos, os períodos pré-genitais da libido fossem entendidos apenas como responsáveis por fixações no curso desta última, capazes de emperrar ou dificultar a identificação sexual resultante do Édipo e as escolhas objetais dela decorrentes ,, o que vamos começar a demonstrar é de que modo reverberou na clínica dos anglo-saxões a modificação substancial por eles emprestada a esses referenciais.

No que diz respeito à transferência e a seu uso no dispositivo clínico, por exemplo, em função do privilégio concedido pelos kleinianos ao precoce funcionamento fantasístico do psiquismo8, qualquer expressão no setting passa a ser entendida como uma manifestação de conteúdos mentais. Vale, entretanto, fazer aqui uma observação: sabemos que o pensamento kleiniano fez escola e que isto, entretanto, não o impediu de sofrer dissidências, fazendo com que o caminho aberto por Klein, mesmo se mostrando clínica e teoricamente produtivo, sofresse algumas modificações. Nesta esteira, alguns de seus herdeiros acabaram inaugurando uma corrente própria de pensamento; entendemos ter sido este o caso de Winnicott. Se, para este, pareceu inaceitável a proposição kleiniana de que o ego infantil seria capaz, logo de saída, de defensivamente lidar com os primeiros desconfortos, nem por isto desprezou o que foi por Klein proposto em relação ao sadismo9 e, muito menos, em relação ao que estaria em jogo na posição depressiva. Em função disto, Winnicott também não desprezou os efeitos transferenciais produzidos, no analista, pela expressão da "realidade interna" do paciente no setting analítico.

O resultado dessas duas posições , a de Klein e a de Winnicott , na referência à transferência é que, para a primeira, a mãe funciona como fundo, servindo ao analista para interpretar o que está em jogo nos movimentos pulsionais de seus pacientes; para o segundo, diferentemente, a mãe funciona como figura, sustentando não a interpretação, mas o lugar do analista em sua função de recuperar o que impediu ou entravou a saúde psíquica de seu paciente.

Ainda que ao mencionarmos tais aspectos pareçamos nos distanciar do foco principal de nosso olhar aqui , a relação entre as concepções de feminilidade e o fazer clínico do analista ,, isto se deve ao fato de que, em Klein, a idéia de castração centrada no desmame ganhou peso e relevância, sendo entendidos, então, os estágios mais precoces do desenvolvimento libidinal como fundamentais ao exercício da sexualidade adulta10. Diante desta perspectiva teórica, para o analista se colocariam duas alternativas a delinear o horizonte da análise: de um lado, uma dimensão "reparadora", presente no pensamento kleiniano mais clássico, e referida, no que diz respeito às mulheres, à possibilidade de devolver fantasisticamente à mãe, através da experiência da maternidade, aquilo que um dia lhe foi roubado; de outro, uma dimensão "restauradora", presente em Winnicott e em alguns de seus herdeiros11, que tem por objetivo recuperar determinadas formas de funcionamento psíquico não utilizadas em função de angústias muito precocemente vividas.

Ainda que a clínica dos kleinianos mais clássicos e a dos herdeiros de Winnicott em muito se diferencie, vale aqui destacar o que lhes serve de solo comum: a idéia de que os destinos da sexualidade adulta, ou de seu exercício, seriam tributários de vivências arcaicas originadas da relação com o outro materno. Se a qualidade da relação entabulada com a mãe pesa mais para os winnicottianos do que para os kleinianos , fazendo do modelo clínico dos primeiros um modelo mais ambientalista, em contraposição a um modelo mais mentalista dos segundos ,, ainda assim permanece, entre eles, um elo comum que os distingue da abordagem freudiana da sexualidade e da feminilidade. É esse ponto que deve ser observado aqui como fundamental à nossa argumentação: há subjacente às duas perspectivas uma clínica orientada pela idéia de que haveria angústias precocemente vividas pela menina, no contexto de um Édipo também precoce em que pesam sobremaneira as relações entabuladas com o outro materno. Dito de uma outra maneira: para o universo anglo-saxão, as vicissitudes da sexualidade têm sua origem nas relações arcaicas com o objeto materno.

 

A feminilidade e o fazer do analista entre os lacanianos: a clínica do real

Acabamos de destacar quanto predominava, na perspectiva anglo-saxã da sexualidade, a idéia de que a adoção de uma posição heterossexual na idade adulta seria o endosso ou o aval de uma heterossexualidade na origem, que correria os riscos de ser "desviada" pela angústia e pelos mecanismos defensivos do ego. Além disto, vimos também que a ênfase freudiana na subjetivação do sexo próprio , uma ênfase que percorreu inúmeros textos da década de vinte e que se pautava na primazia do falo a reger a ordenação da sexualidade ,, foi radicalmente redimensionada na abordagem dos anglo-saxões, que passaram a creditar às fantasias precoces o efeito de agenciar os percalços e as angústias derivadas, no caso das mulheres, do anseio feminino de se apropriar do que era, então, considerado seu natural objeto de investimento libidinal: o pênis. A castração, com isto, deixou de ser tomada como um fator determinante na assunção da sexualidade e na escolha sexual derivada do Édipo, passando a ocupar seu lugar, no cenário teóricoclínico dos anglo-saxões, tanto a noção de sadismo , e com ele a noção castradora do infans na sua relação e no uso dos primeiros objetos , quanto a de afânise, articulada, genericamente, ao medo fantasístico do desaparecimento em face do poder de retaliação do outro. Podemos, com isto, destacar que os anglo-saxões acabaram trazendo para o primeiro plano de suas considerações um aspecto pouco privilegiado por Freud: o peso das primeiras relações do infans com o objeto materno. Ainda que se objete que esse outro materno estava, sim, presente em Freud, especialmente através da noção de "ação específica" e de primeiro sedutor em sua função de erogeneizador do corpo, vale destacar que esse era também um outro que se enevoava em face do autoerotismo predominante nas chamadas fases pré-genitais.

Retomar estas questões, neste momento, tem um objetivo: mapear o plano de referências que, em nossa ótica, balizará Lacan em sua abordagem da sexualidade, tendo em vista que, se de um lado, é a perspectiva falocêntrica freudiana que será privilegiada , e, com ela, a noção de castração ,, de outro, há também ênfase na dimensão desejante do Outro materno , dimensão que objetaliza a posição da criança na referência à mãe, e que faz desta última a detentora de uma potência para dar ou recusar o que lhe é demandado. Deste modo, a ocupação, pela criança, da falta de que a mãe se vê portadora, abre-lhe as portas para colocar-se, frente a esta, como objeto de seu suposto gozo. Por outro lado, suportar-se nessa posição de objeto tenderá a se tornar insustentável para a criança, situação da qual deverá ser libertada pela entrada em cena do pai interditor. Observe-se, nesse cenário, a concepção de um Édipo que se inicia precocemente, de vez que, de saída, a relação da criança com a mãe, longe de estabelecer-se como dual, se constrói na dialética intermediada pelo falo , significante da falta e do desejo.

Entendemos ser em função dessa dupla ancoragem que a feminilidade não será definida por Lacan nem em função da maternidade, nem em função da escolha objetal, mas como dependente da modalidade de gozo derivada da subjetivação da lei da castração. Na verdade, em lugar do termo feminilidade, Lacan preferirá usar a expressão "posição feminina", uma posição que pode, até, ser ocupada pelos homens , ao menos por alguns12.

Sabemos, entretanto, que essas afirmativas de Lacan acerca da posição feminina derivam de um longo percurso elaborativo sobre a temática da sexualidade, percurso que se inicia na década de cinqüenta e que, ao longo de mais de vinte anos, desliza de uma ênfase no simbólico para o privilégio concedido ao real. Fazer esta marcação aqui tem importância, na medida em que tanto a categoria de "desejo da mãe" quanto a noção de "metáfora paterna" , cruciais na formalização do percurso edípico por ele empreendida , derivam da primeira etapa de seu ensino13. Foi somente a partir da década de setenta, ou no final dos anos sessenta, que o real e o gozo se impuseram no cenário teórico-clínico lacaniano como novos paradigmas conceituais, cruciais à teorização e à prática clínica de seus discípulos. Vale ressaltar, contudo, que o segundo momento do ensino de Lacan não apaga o primeiro, evidenciando-se tal fato na simples constatação de que, em sua ótica, a sexualização da diferença anatômica se produz como derivada da interdição pelo pai , em sua função de privador, tanto da mãe como da criança ,, do gozo absoluto ou gozo do Outro.

Se, em linhas gerais, é até possível inscrever Lacan como herdeiro tanto de Freud quanto de Klein, fica difícil, no entanto, aproximar sua práxis , e a de seus discípulos , de qualquer práxis ou técnica analítica antes empregada em nosso campo. Assim, se a clínica lacaniana não se assemelha à clínica de Freud e dos freudianos, em relação à clínica de Klein e de seus descendentes anglo-saxões pode-se dizer que ela acaba por tomar grande distância. As razões de tal distância não são difíceis de serem discernidas, uma vez que o modelo teórico proposto por Klein especialmente, apesar de sua riqueza, não comportava elementos que a Lacan pareciam fundamentais; dentre eles, a dimensão invocante da fala em seu registro simbólico e o fato de o investimento libidinal ser tributário do recobrimento imaginário de uma falta constituinte, falta real. Seria então essa falta que reverberaria tanto na dimensão imaginária da experiência do sujeito quanto no seu posicionamento subjetivo em face do simbólico. Se esses elementos se situam como cruciais no pensamento lacaniano, eles tiram definitivamente de cena da prática, neste campo, qualquer ênfase nos mecanismos defensivos do ego e qualquer idéia de que o objeto, um dia roubado, possa ser devolvido ao primeiro Outro. Aqui, com Lacan, é acima de tudo com um Outro castrado que o sujeito tem que se confrontar.

Por outro lado, ao afirmarmos que a clínica lacaniana também não se assemelha à clínica freudiana, levamos em conta, para tanto, as sucessivas ênfases que Lacan foi imprimindo a seu ensino. Assim, se até podemos considerar que a clínica lacaniana teve como ponto de partida a escuta emprestada por Freud a seus pacientes, a operatividade dessa escuta logo deixou de se movimentar, como o era em Freud, em busca do sentido. Diferentemente de Freud, foi o não-sentido, em seu parentesco com o real, que passou a orientar cada vez mais a clínica dos lacanianos. Não-sentido que, articulado ao irrepresentável, faz com que não mais seja com o impasse da castração que uma análise esbarra em seus confins, mas com o que, para além da castração, se põe como causa do desejo: o objeto enquanto pura falta14.

Um manejo transferencial que toma distância das vias imaginárias para privilegiar o simbólico e, em função disto, propiciar a travessia do real da fantasia é aqui a marca maior de um fazer clínico, que encontra na perspectiva de apenas interpretar na transferência seu traço distintivo em relação às demais escolas.

Sobre a importância da posição ocupada pela mulher e pela questão da feminilidade na construção do saber teórico-clínico psicanalítico, vale pensar ainda que aquilo a que Lacan pôde chegar em suas elaborações sobre a posição feminina traz em seu bojo uma estreita relação da mulher com o real, especialmente em relação à posição a ser por ela adotada na parelha sexual , a de semblante de objeto da fantasia do homem15.

 

Considerações finais: sobre a relação entre o sofrimento e a escuta

Mencionamos, já de saída, no título que demos a este artigo, a relação que percebemos entre a escuta emprestada pelo analista aos lamentos e sofrimentos do sujeito-analisando e a concepção psicanalítica sobre a feminilidade que o orienta em termos teóricos. Ainda que se possa genericamente ponderar que, ao lado da criança e do louco, a mulher se constituiu em apenas um dos pilares da construção do saber teórico-clínico psicanalítico, nossa intenção foi aqui a de demarcar e salientar a importância desse pilar.

Acompanhando a História da Psicanálise , referendada aqui pela casuística publicada que nos serviu de guia ,, o que se observa, sem grande esforço, é que a forma de os analistas abordarem o sofrimento de suas analisandas sempre esteve intimamente conectada com o modo com que concebiam a origem de seus sofrimentos, articulados, por sua vez, à dificuldade em atingir o que seria da ordem da feminilidade ou da posição feminina. Talvez não pudesse mesmo ser diferente; afinal, fica difícil imaginar a produtividade de uma intervenção clínica que não esteja ancorada em um referencial teórico e conceitual. Entretanto, se formos levantando o que esteve em jogo, enquanto sofrimento, para as mulheres que procuraram ajuda psicanalítica ao longo dos últimos cem anos, verificaremos que o que as mulheres diziam a seus analistas não era muito diferente entre si, embora a forma de os analistas ouvirem e intervirem em relação a essas falas o fosse. Considerar, então, que nossa escuta nunca é desavisada toma aqui o seu sentido.

Em função disto, talvez possamos pensar que acreditar num modelo teórico e, conseqüentemente, nas concepções forjadas no interior de sua grade conceitual coincide com o ponto em que esse modelo pode se mostrar operativo do ponto de vista clínico, parecendo não haver outra saída possível para que a clínica possa ser exercida. Assim, qualquer tentação de poder prescindir da teoria ou de fazer a teoria à sua própria medida não deixa de ser problemática para um analista, pois acabaria sendo com a sua própria intuição sentimentalista e obscura que ele, enfim, interviria junto a seu analisando16.

Deste modo, se os manejos transferenciais tributários dos três modelos teóricos que examinamos como regendo a orientação clínica em nosso campo e sustentando a escuta dos analistas manifestam a distinção existente entre eles na própria referência ao que seria da ordem da feminilidade, talvez não nos reste mesmo outra alternativa senão a de entender essa diferença como derivada daquilo que é inerente ao campo da psicanálise, cuja transmissão tem como via preferencial aquilo que é a mola de nossa própria atividade como clínicos: a transferência.

 

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I Psicanalista. Doutora em Psicologia Clínica pela PUC-Rio. Professora dos cursos de Graduação
em Psicologia e Especialização em Psicoterapia Psicanalítica da Universidade Estácio de Sá. Coordenadora do SPA do Campus Nova Friburgo desta mesma Universidade.
1 Ver, a este respeito, Estudos sobre a histeria (Freud & Breuer, 1893).
2 A este respeito, ver especialmente Muller (1925) e Horney (1922, 1925 e 1933).
3 Sobre este ponto, ver Klein (1932).
4 Vale lembrar, sobre isto, que Freud (1933) considerou que "um casamento não se torna seguro se a esposa não conseguir tornar seu marido também seu filho, e agir com relação a ele como uma mãe" (p.164).
5 A este respeito, ver Ophuijsen (1917), Stacke (1921), Anna Freud (1922), Deutsch (1925), Lampl De Groot (1927) e Brunswick (1928).
6 Ophuijsen (1917), por exemplo, relata o caso de uma paciente cuja análise sofreu uma precoce interrupção, em função de questões transferenciais. Em 1927, Lampl de Groot relata seu atendimento a esta mesma paciente, servindo-lhe o fato desta jovem ter sido analisada anteriormente por um analista homem para avaliar o plano em que se encontrava o desenvolvimento edípico da moça.
7 Para Lampl de Groot (1927), sua paciente, apesar de seus esforços, teria ficado longe do que entendia como uma posição feminina, objetivo maior de sua empreitada como analista.
8 A este respeito, ver, por exemplo, Isaacs (1943) e Heimann (1943).
9 Tomado especialmente em sua vertente de ‘uso’ do objeto, que se expressaria nas fantasias onipotentes de controle do mesmo, implicando, assim, na possibilidade de sua ‘destruição’, e que faria da noção de ‘mãe suficientemente boa’ (dentre outras coisas, uma mãe capaz de ‘sobreviver’ aos ataques sádicos do infans) o pivô de uma adequada constituição do self.
10 O caso relatado por Joan Rivière (1929) ilustra claramente esta perspectiva. Também o artigo de Jones (1927) se constrói a partir desta perspectiva. Ao lado destes, remetemos o leitor para própria Klein (1932).
11 Sobre este ponto, ver Khan (1971), que parte de Winnicott (1971)
12 Ver, a este respeito, Lacan (1972).
13 A este respeito, ver Seminário 4 (1956-57) e Seminário 5 (1957-58).
14 Uma ilustração deste ponto pode ser lida em Rabinovich (1988).
15 Para Lacan (1972), o homem se relaciona em seu gozo não como uma mulher, mas com o a, objeto de sua fantasia (p.108); ao abordar uma mulher, um homem abordaria, então, a causa de seu desejo.
16 Ver, sobre isto, André de Souza (2000).

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