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Estudos de Psicanálise

versão impressa ISSN 0100-3437

Estud. psicanal.  no.37 Belo Horizonte jul. 2012

 

 

Um falso não todo1

 

A false not-all

 

 

Patricia Léon

Association de Psychanalyse Jacques Lacan

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

“Um falso não todo”: o texto agrega novas pretensões ao debate sobre a sexualidade feminina iniciado em 1925 em torno da questão da primazia do falo proposta por Freud e levada por Lacan para além da castração – a partir da elaboração de outro espaço, o do não todo fálico. Mas a questão fora encoberta por dois erros: o primeiro, um erro lógico, que apresenta uma falsa equivalência estrutural entre o pré-edipiano e o não todo fálico; o outro, erro “tópico”, situa de uma maneira errônea a devastação mãe-filha e, a partir desse ponto, conceitua uma dominância da mulher enquanto mãe e uma clivagem mãe-mulher que procede de um falso não todo equivalente à incompletude. Assim, a primeira parte deste trabalho resgata em Freud o que seria na realidade o pré-edípico e busca tratar o problema representado pela confusão entre o que seria uma condição inaugural que dá acesso a certas possibilidades de gozo e em que consiste o espaço do todo fálico e do acesso ao feminino visando desconstruir falsas suposições. A segunda parte se orienta a partir dos diálogos entre Wandla (14 anos) e sua mãe em O Despertar da Primavera de Wedekind. Este trabalho busca redefinir a fronteira entre o registro da devastação mãe-filha e o do não todo, propondo a leitura da devastação tal como um fechamento dentro da demanda, ilusória, de uma transmissão possível de uma essência do feminino (que poderia não passar pelo falo). A lógica do não todo contradiz esta falsa ideia, pois é a partir deste impossível a transmitir (apoiando-se sobre a função do falo) que a abertura em direção ao feminino pode acontecer. Mas se o “estrago da relação mãe-filha”, a devastação, é, ao contrário, pensada como uma prova que deve ser atravessada para que esta ilusão de constituir “um todo” seja superada, “acabamos dando consistência ao todo, isolando o acesso ao feminino no circuito fechado da relação mãe-filha”, o que encobre o real do fracasso, conduz a uma concepção de amor acobertando a impossibilidade da relação sexual e, procedendo de uma outra devastação, aquela que fecha para uma mulher a porta do encontro com um homem.

Palavras-chave: Devastação, Não todo fálico, Sexualidade feminina.


ABSTRACT

This paper gives a new impetus to the debate on feminine sexuality, which opened in 1925 around the primacy of the phallus as set out by Freud, and which Lacan takes to an area that is beyond the phallus-with the elaboration of another space, the phallic not-all. This debate has become stuck in two errors: the first, a logical error, sets out a false structural equivalence between the pre-oedipal and the phallic not-all; the other, a “topological” error, situates the mother/daughter ravage erroneously and thereby, conceptualizes a dominance of woman as mother and a splitting between mother and woman that proceeds from a “false not-all”, which is equivalent to incompleteness. The first part of the article goes back to the pre-oedipal in Freud, since it gives the girl the conditions for opening the space of the phallic not-all; the pre-oedipal, however, is not to be confused with the not-all. The second part takes its orientation from the dialogues between fourteen-year-old Wendla and her mother in Wedekind’s play Spring’s Awakening. Here, this paper redefines the border between the register of the mother/daughter ravage and that of the not-all; she proposes to read ravage as an enclosure within the illusory demand that the essence of femininity be transmitted (without the phallus) whereas the not-all is based on the premise that it is impossible for such a transmission to open up a way to the feminine; it relies on the limited function of the phallus. Yet if ravage is postulated, on the contrary, as a test that must be gone through, in order to get beyond this illusion, “one ends up by making the whole consist by isolating the access to the feminine in the closed circuit of the mother-daughter relation”; this covers over the real of the failure and leads to a conception of love that covers up the impossibility of the sexual relation, and proceeds from another ravage: the one that closes the door through which a woman could encounter a man.

Keywords: Ravage, Phallic not-all, Feminine sexuality.


 

 

Não é sem razão que a questão do feminino permanece sendo um terreno propício ao erro e, portanto, à pesquisa. O debate sobre a sexualidade feminina, iniciado em 1925 em resposta à elaboração freudiana da primazia do falo para ambos os sexos2, se depara, a partir do ensinamento de Lacan, com outras ressonâncias, outras maneiras de “repetir” os mal-entendidos que continuam circulando sem fazer muito barulho. Entretanto, compensa esforçar-se para dissipá-los ou, ao menos, extrair questões que irão nos permitir prosseguir na direção correta.

Este texto toma, desde o início, o drama de Wedekind, O despertar da primavera, como bússola inspiradora, mais precisamente os diálogos entre a jovem Wandla e sua mãe. Esta peça de teatro abordada por Freud e Lacan busca mostrar, por um lado, como é falso dizer que o pré-edipiano freudiano encontrara, finalmente, sua lisibilidade com o “não todo fálico”; e, por outro lado, como seria falso supor uma espécie de equivalência estrutural entre o pré-edipiano e o “não-todo-fálico”. Podemos tentar identificar a partir de quais ideias esta superposição pôde se consolidar.

Este texto possui duas partes. A primeira busca identificar o ponto que nos faz vacilar, ou até mesmo emperrar, a lógica do “não-todo-fálico” no universo do todo que ela pretende contrariar. Na segunda parte, a leitura de algumas passagens extraídas da peça de Wedekind, nos levará a identificar como a ideia do “todo” cobre “o impossível da escritura da relação sexual”, sobretudo por uma determinada maneira de conceituar a dominação da mulher enquanto mãe e assim como a clivagem mãe-mulher é resultante desta concepção.

Para introduzir a primeira parte é importante pensar que vias foram ou poderiam ser empregadas para negligenciar ou contrapor, seguindo os passos de Lacan, a virada essencial feita por ele próprio em seu seminário Mais, Ainda, indo além das fórmulas do desejo, lado masculino e lado feminino, formalizados em 1958 para corroborar a inscrição da diferença sexual nos seres falantes3. Ao mesmo tempo, é preciso dizer que em tais fórmulas, Lacan já atravessara uma concepção masculina do falo. Ao formalizar o desejo da mulher pelo matema, ele indica que seria pela via da falta fálica que a mulher se encontraria na maior proximidade com o inconsciente do Outro.

O passo dado por Lacan no seminário Mais, ainda permite traçar uma fronteira entre o registro do desejo no campo das identificações sexuais, registro que deixou Freud no enigma do feminino, o continente negro – “Was Will das Weib?”: o que quer uma mulher? – em outro espaço, um além do fálico, um “não todo” fálico.

Este passo dado por Lacan lhe permitiu indicar um gozo suplementar, que não pode se reduzir a um “pequeno algo a mais” do lado do desejo feminino. Não se trata de uma elaboração redobrando as fórmulas do desejo, e sim de outra lógica regida pela ex-sistência do gozo. O falo enquanto significante do gozo introduz a disparidade entre o gozo masculino e o gozo feminino: existe uma oposição de duas lógicas, uma do todo fálico e outra do não todo fálico. Com este passo a mais, o alcance das fórmulas do desejo é reduzido e a questão da castração encontra, assim, seus limites. De maneira precisa, a castração não seria mais obrigação. Para aquilo que é do feminino, trata-se de outra coisa. O outro gozo não exclui a referência ao falo, muito pelo contrário, ela é necessária, mas ela pode se situar somente em outra lógica, não conjunta.

Lacan exprime claramente: “Esse negócio da relação sexual, se há um ponto desde onde isto se poderia esclarecer, é justamente do lado das damas, na medida em que é da elaboração do não todo que se trata de romper o caminho. É meu verdadeiro tema deste ano, por trás desse Mais, Ainda4, e é um dos sentidos do meu título. Talvez que assim eu chegue a fazer aparecer algo novo sobre a sexualidade feminina” (LACAN, 1985, p.78-79).

Esse outro gozo é uma maneira de abordar o gozo próprio da mulher, mas também de compreender de outra maneira o infinito que se abre através da assunção do “não existe relação sexual”: “Há um gozo, já que nos atemos ao gozo, gozo do corpo, que é, se posso me exprimir assim [...] para além do Falo. [...] Há um gozo dela, desse ela que não existe e não significa nada [A mulher]. Há um gozo dela sobre o qual talvez ela mesma não saiba nada a não ser que o experimenta – isto ela sabe. Ela sabe disso, certamente, quando isso acontece. Isso não acontece a elas todas” (LACAN, 1985, p.100).

 

A famosa frigidez

Se a mulher nada sabe sobre este outro gozo, trata-se de um gozo que ela experimenta e do qual ela não fala. Como abordá-lo além dos testemunhos de êxtase dos místicos em que Lacan encontra algumas referências? De maneira um pouco surpreendente, Lacan evoca a frigidez como uma das possíveis manifestações desse outro gozo: “Se simplesmente ela o experimentava, ela não sabia nada dele, o que permitiria muitas dúvidas para o lado da famosa frigidez” (LACAN, 1985, p.101).

A pretendida frigidez, para retomar o tom irônico de Lacan, seria reinterpretada a partir da perspectiva desse outro gozo, desta clínica do não todo. Não somente na ordem da defesa, mas como outra maneira de compreender um além do falo, cifra de uma transigência que dá acesso à outra sensibilidade, à outra forma de ausência, não somente como uma insensibilidade restringida.

De fato, nos lembramos que em seu texto “Diretrizes para um Congresso sobre a sexualidade feminina” (LACAN, 1998, p.734), Lacan já havia lançado outra interpretação sobre frigidez, a de uma defesa ligada à castração simbólica: a mulher petrificada em uma identificação imaginária ao falo se encontra na impossibilidade de ter acesso à mascarada, aquela que pela presença do Outro da transferência pode finalmente se libertar, permitindo assim uma ascensão do papel sexual. Ou seja, graças à transferência é possível deixar de se identificar imaginariamente ao falo, abrindo assim uma via de acesso à mascarada. Podemos ver a qual ponto especificamente feminino não é possível fazer uma equivalência ao masculino. Se o tratamento pode alçar a frigidez, seria enquanto “desvendamento do Outro interessado na transferência que pode modificar uma defesa comandada simbolicamente” (LACAN, 1998, p.741)

Esta versão entra em contradição com aquela da frigidez como uma manifestação da existência de outra “maneira de gozar” sobre a qual seria impossível falar, por ser impossível fixá-la em um limite. Lacan supera ou introduz outra maneira de pensar a frigidez em seu seminário Mais, Ainda. Talvez não se trate de uma substituição e sim de dois tipos de frigidez que devem ser diferenciadas: uma se trata de uma defesa, de um abaixo da mascarada. A outra seria um além, “manifestação” do “gozo suplementar”. Esse duplo registro, não necessariamente exclusivo, pode nos dar uma direção para delimitarmos do que se trata este outro gozo, a se diferenciar de todo gozo primário, pré-verbal, pré-genital.

 

Do irredutível de uma transmissão

Sem dúvida e apesar da ambiguidade e da dificuldade em descrever este outro gozo e de abordá-lo enquanto gozo próprio a mulher, é preciso considerar os traços deixados pelo Outro sexo até restituir o surgimento desta noção em psicanálise. É surpreendente que, em seu texto “Diretrizes para um Congresso sobre a sexualidade feminina”, Lacan (1998) localize em dois momentos os desvios deste debate no centro da questão da divisão mulher-mãe. Pensamos que a maneira pela qual tratamos tal divisão serve também para ilustrar aquilo que fazemos do limite e do atravessamento. De que tratamos quando falamos de universo do todo fálico e do não todo fálico com relação à diferenciação entre mãe e mulher?

Não é impensável que o desdobramento entre mulher e mãe, desdobramento realmente legítimo, possa, dentro da psicanálise, acabar mascarando ou abolindo o mais-além que estava destinado a ser alcançado, a revelar-se. Se pensarmos a ultrapassagem de um todo fálico por um lado e pelo outro, como fazer para não cair na armadilha de fazer desses dois termos, mulher e mãe, a diferenciação factícia de duas incompletudes que acabariam entrando em acordo com uma visão positivista da castração? Como compreender aquilo do feminino que não se deixa totalizar em um desejo da mãe, aquilo que dele escapa, ou aquilo que delineia um além do simbólico no gozo da mãe? A mãe, enquanto Outro primordial, pode se passar ou não por mensageira junto ao seu bebê deste mais-além do fálico? O desejo feminino, enquanto tal, representa a ausência da mãe? É disso que se trata? Aquilo que transborda, excede, se ausenta por um lado, separa ou descompleta necessariamente o outro? Lacan remarca que a psicanálise se perdeu dentro deste debate.

Digamos que, de início, trata-se de demarcar se esse impossível de se representar, de inscrever a relação sexual, pode encontrar sua porta de entrada, sua maneira de ser transmitido à criança no filet du féminin, dando lugar a emergência deste Outro, ao nunca diferente, Outro que continua sendo Outro, ou se, no recobrimento deste impossível das metamorfoses, das mentiras e dos silêncios que sempre fazem obstáculo a todo acesso ao real. Se o real é antinômico a toda veracidade, devemos evitar formalizar uma síntese da ordem de duas incompletudes nesta clivagem mãe – mulher obstruindo o impossível de ser representado nesta clivagem. Assim, Lacan (1998) denuncia “uma promoção conceitual da sexualidade feminina” através de uma teoria que se orienta progressivamente em direção às frustrações vindas da mãe: “Uma noção de carência afetiva, ligando sem intermediação às falhas reais dos cuidados maternos os distúrbios do desenvolvimento, é reforçada por uma dialética de fantasias das quais o corpo materno é o campo imaginário” (LACAN, 1998, p.734).

Mas também convém se perguntar, nos sugere Lacan, “... se a mediação fálica drena tudo o que pode se manifestar de pulsional na mulher, notadamente toda a corrente do instinto materno. Por que não dizer aqui que o fato de que tudo o que é analisável é sexual não implica que tudo o que é sexual seja acessível à análise?”(LACAN, 1998, p.739).

A partir dessa questão, o caminho está aberto para pensar o limite de onde parte Lacan, para pensar o além do falo. Notemos que, se ele utiliza a palavra “instinto”, que ele recusa o tempo todo – ele sempre fala de pulsão –, seria para nos aproximar da maneira pela qual ele vai implicar o gozo nesta secção entre libido e a natureza, para dar peso ao irredutível de uma transmissão sobre a qual ele não cessa de insistir. O limite imposto pelo falo designa a impossibilidade da escritura da relação sexual; tal limite inclui, assim, a unidade mãe – bebê, a entrada da criança na vivacidade enquanto objeto primordial, mas também que o senso não é somente suplência ao real do sexual, ele designa também um além – o sexual é inacessível ao senso (BRUNO, 2007). Esta inacessibilidade da análise do real do sexo pelo senso não impede uma abertura, outra maneira de impor limites.

 

Um antagonismo pouco elucidado

Uma vez trabalhada essa fronteira, que permite traçar um inventário da confusão entre aquilo que provém do desenvolvimento e aquilo que é da ordem da estrutura, Lacan se pergunta sobre o lugar que a questão do gozo feminino tivera nesse debate. E ele conclui que esse lugar se reduz ao antagonismo pouco elucidado entre o gozo clitoriano e a satisfação vaginal. O mistério continua, assim, redobrado de opacidade por aquilo que ele nomeou de “invioladas trevas do orgasmo vaginal” (LACAN, 1998, p.737). O gozo propriamente feminino encontra assim a sua pré-historia na psicanálise neste antagonismo trivial. As analistas mulheres como Josine Müller, Lou Andréas-Salomé, Karen Horney, Hélène Deutsch quiseram insistir, mesmo se o fizeram de maneira um pouco restrita (uma certa maneira de ousar que encobre a timidez dessa iniciativa), sobre o fato de que ali existia um outro gozo, um gozo específico da mulher. Valor alusivo, sem dúvida, mas que não deve ser negligenciado, sob o qual devemos reconhecer não somente o papel devastador, mas, também sob outro plano, um papel que contribuiu em certo sentido para assinalar o caminho que restava e que ainda resta a ser percorrido sobre esta questão.

Sobre este trivial antagonismo, Lacan contrapõe a fórmula “A mulher não existe” para designar todo um campo que se abre para o gozo, acrescentando uma dimensão ao lugar do Outro: o Outro não é somente este lugar onde a verdade balbucia, ele merece representar aquilo com que a mulher necessariamente possui relação: o gozo do Outro está fora da linguagem, fora do simbólico. “A mulher tem relação com S(A barrado), e já é nisso que ela se duplica, que ela não é toda, pois, por outro lado, ela pode ter relação com Φ” (LACAN, 1985, p.109).

Retomemos então a nossa questão partindo de uma constante: se esta equivalência estrutural entre o pré-edipiano e o não todo tem o seu direito, é porque ela se apoia, em parte, na premissa de um gozo primário, aparentado a um tempo cronológico e não estrutural, gozo que re-envia ao tempo arcaico de um corpo a corpo mítico com a mãe. Esta falsa equivalência entre o pré-edipiano e o não todo fálico alimenta-se da polêmica em torno do amor mãe-filha e de uma possível transmissão de uma a outra essência da feminilidade. A continuidade entre “a devastação” e “o não todo” faz equivaler a dimensão não fálica do não todo ao encontro do Outro gozo. Este último pode invadir o sujeito enquanto gozador superegoico mortífero, ela pode manifestar-se na injunção do gozo do supereu, mas no não todo fálico o apagamento do limite não pode se reduzir progressivamente na obscuridade deste gozo.

A maneira pela qual iremos acompanhar a peça de Wedekind, sobre a qual Lacan fizera um comentário em 19745, irá permitir apenas a leitura de pontos de obstinação em que esta lógica do todo se confina. No prefácio de O despertar da primavera Lacan diz que Wedekind antecipa amplamente Freud pela ilustração do que seria o inconsciente. Ele também dirá que esta peça ilustra como o irrisório encontro do real faz objeção “à ideia do todo”, do Um, a esta realidade psíquica sustentada pelo gozo dito fálico, gozo fora do corpo, localizado, sintonizado ao significante com o qual o inconsciente nos entretém. A mulher do fato de que não existe A mulher, mas as mulheres, não é toda sujeito do inconsciente. A mulher, não pode se escrever sem barrar o “A”.

Vejamos a maneira pela qual Lacan introduz neste prefácio tal lógica, de que a própria mulher faz objeção à ideia de um todo.

Que o que Freud identificou daquilo que ele chama de sexualidade, faça furo no real, é que toca naquilo do que ninguém se sai bem, não nos preocupemos mais. [...]

Eu indiquei a ligação de tudo isso com o mistério da linguagem e com o fato de que seja propondo o enigma que se encontra o sentido do sentido.

O sentido do sentido é o que se liga ao gozo do menino como proibido. Certamente este nome não seria para interditar a relação dita sexual, mas para petrificá-lo na não relação que ele equivale no real.

Assim faz função de real, daquilo que se produz efetivamente, o fantasma da realidade ordinária. Para qual se desliza na linguagem aquilo que ele veicula: a ideia do todo, o que, portanto, faz objeção ao mais irrisório encontro do real (LACAN, 2001, p.562).

 

O pré-edipiano

A elaboração freudiana sobre “o que querem as mulheres” possui uma história. Pouco a pouco foram impostos os limites de suas primeiras generalizações com relação ao complexo de Édipo na menina e seus destinos. Ele chega a reformular sua posição através deste suplemento de liberdade e não pela teoria construída. Somente a clínica autoriza. “É a mãe delas que elas amaram de início e não o pai, tudo deve ser revisto”, diz Freud em 1931; ou ainda “Não podemos compreender a mulher se não levarmos em consideração esta fase de apego pré-edipiano à mãe” (FREUD, 1986, p.160).

As vias já indicadas por Freud – o constante da bissexualidade humana, a sexualidade infantil polimorfa, a primazia do falo – exigem outra organização face à descoberta da incidência deste período na vida da mulher. Em suma, Freud é obrigado a se interrogar de outra maneira sobre aquilo que seria do feminino nas mulheres. Além das questões de representações explícitas: às mulheres o feminino, aos homens a “masculinidade”, às mulheres a passividade, aos homens a atividade. A forte ligação da menina com a mãe dissolve a equivalência entre o Édipo da menina e o Édipo do menino. A “desaparição dessa grande ligação com a mãe” na pequena menina destinada a ceder o lugar ao pai e a permitir a este abrir o caminho em direção à escolha de objeto definitivo, o homem, não é equivalente para a menina àquilo que é, para o menino, o amor pela mãe. As relações libidinosas da pequena menina por sua mãe são ricas em conteúdo e em complexidade. Freud nos conta que: “Nunca é fácil revelar a existência da formulação desses desejos sexuais precoces; o que se exprime de maneira mais clara é o desejo de fazer um filho à mãe, corresponde a colocar no mundo uma criança para ela. [...] O interessante destas investigações reside nos surpreendentes trouvailles de detalhes que elas nos trazem. É assim que, por exemplo, descobrimos que a angústia de ser morta ou envenenada – que pode formar mais tarde o núcleo de uma paranoia – é relacionada com a mãe desta época pré-edipiana” (FREUD, 1986, p.161).

Vemos nesse mesmo texto como Freud leva em consideração esta época pré-edipiana se apoiando naquilo que ele havia deduzido dos estados fictícios de organização pré-genital. Mas ele não retorna ao fato de que seria somente em um movimento de retroação com relação ao complexo de castração em sua relação com o complexo de Édipo que tais estados tomam seu valor de relação de objeto.

O que sinaliza o afastamento da mãe e da filha, sob forma de hostilidade, encontra sua raiz no complexo de castração. A pequena menina responsabiliza sua mãe pela sua falta de pênis. Para ela a sua castração é uma infelicidade individual. É somente depois, em um segundo tempo, que a privação da mãe, que sua castração irá permitir inserir a falta no simbólico da lei. Seu amor fora endereçado à mãe fálica; com a descoberta de que a mãe é castrada, torna-se possível deixá-la enquanto objeto de amor, de forma que os motivos da hostilidade, acumulados desde muito tempo, assumam o controle.

Assim, segundo Freud, se o destino da feminilidade se realiza somente no encontro com o homem, é importante insistir no fato de que a identificação com a mãe está no centro da ligação pré-edipiana da filha com a mãe, e que Freud não cessa de ressaltar esse ponto como decisivo para o futuro da mulher. “A identificação na mulher, permite reconhecer duas vertentes: o pré-edipiano que repousa na terna ligação à mãe e a toma como modelo, e aquela que mais tardiamente, oriunda do complexo de Édipo, procura eliminar a mãe e a substituir pelo pai. As duas contam bastante para o futuro, estamos certamente no direito de dizer que nenhuma das duas vertentes não é superada de maneira suficiente durante o desenvolvimento. Mas é a fase da tenra ligação pré-edipiana que é decisiva para o futuro da mulher; é nela que se preparam as aquisições das qualidades com as quais ela irá mais tarde satisfazer seu papel na função sexual e cumprirá suas inestimáveis realizações sociais. É também nesta identificação que ela adquire o interesse pelo homem; que faz de sua ligação edipiana com sua mãe um estado muito amoroso. Mas em seguida não é, com muita frequência, que o filho obtém aquilo que ele havia procurado para si mesmo. Temos a impressão de que o amor do homem e o amor da mulher são separados por uma diferença de fase psicológica” (FREUD, 1986, p.180) Nesta formulação de Freud, muito pouco citada, vemos que somos enormemente habituados a falar da mãe e do pré-edipiano para acentuar seu efeito devastador. A maneira pela qual a identificação com a mãe é evocada, como condição de partida do desejo, é que dá abertura, em um certo sentido, às vias que conduzem ao gozo.

Sob essas perspectivas, como ler a questão da potência maternal?

 

O Versagung

Bem no início de seu ensinamento, Lacan afirma que a importância da ligação do humano com a mãe supre uma insuficiência vital: a ferida introduzida pelo efeito da prematuração específica do humano. O desmame já seria um recobrimento da angústia primordial que liga a criança à vida. Lacan diz que o que reencontramos enquanto traço da resolução do complexo do desmame é a estrutura da imago materna e que, se for preciso definir a forma mais abstrata em que encontramos essa estrutura, deveríamos caracterizá-la desta forma “uma assimilação perfeita da totalidade do ser. Sob essa fórmula de aspecto um pouco filosófico, reconheceremos as seguintes nostalgias da humanidade: miragem metafísica da harmonia universal, (...), utopia social de uma tutela totalitária, todas saídas da obsessão do paraíso...” (LACAN, 1997, p.30).

Por que esse paraíso perdido, imemorial, continua a nos acompanhar sob este fundo de nostalgia de um gozo todo que, em suma, encontraria no gozo feminino seu direito de retorno? Será que esse direito de retorno de que falamos, ou o que dizemos de uma palavra que será impregnada de toda a profundeza do silêncio, não se trataria simplesmente de uma condição de partida que dá abertura a uma disjunção incomensurável?

Em seu livro La fobie, le vivant et le féminin, Isabelle Morin (2006), a partir da leitura do livro de Catherine Millot, Abîmes ordinaires, introduz a questão da relação entre o acesso ao gozo feminino, o consentimento ao feminino e “a condição de um certo abandono da defesa que permite ao sujeito evocar e suportar o eco da relação originária com a mãe. Trata-se da relação do bebê, não separado do Outro, antes do trauma da experiência de insatisfação primordial” (MORIN, 2006, p.317). A autora mostra como Catherine Millot aborda as experiências de êxtase deste gozo mítico ao qual ela não pode ter acesso, a não ser após um momento de abandono, de solidão racial que alivia a angústia primitiva que é a defesa. A conformação do fantasma como deleção da mãe ilustra “como a defesa contra o feminino se inicia em uma desvalorização do gozo vivido com a mãe que precede a resolução edipiana, para valorizar o gozo fálico. Esta recusa do feminino se situa no momento da sexuação, e a análise deve conduzir à resolução desta recusa, para introduzir o feminino propriamente dito, este relacionado ao gozo suplementar” (MORIN, 2006, p.322).

Esta dupla fonte de “abaixo da defesa” e de um “além do falo”, que havíamos destacado precedentemente com relação à questão da frigidez, pode ser novamente introduzida seguindo a ideia de recusa. Mas não no sentido de uma resolução que deve ser obtida, e sim de uma condição necessária que se abre em direção ao desejo e as vias, aos modos de gozo, à sua ilimitada indiferenciação.

 

A condição da recusa

Outra linha divisória entre o pré-edipiano e o não todo fálico se dá a partir desta maneira de compreender a recusa. A recusa enquanto condição de partida e de abertura para as identificações nos permite pensar como o sujeito, frente ao encontro com a coisa materna, consente em recusá-la ou em se deixar sugar por ela, se subtrair ou se abrir à vontade do gozo do Outro. Tal escolha será a base das condições de gozo do sujeito.

Lacan em seu seminário A Transferência nos incita a retornar à utilização do termo de Versagung na obra de Freud, com o intuito de revisar o seu uso em psicanálise a partir de sua tradução para “frustração”. A palavra original, Versagung, possui uma conotação que vai bem mais além de toda frustração concebível. A mãe insere a criança na demanda articulada, a demanda é demanda de satisfações de necessidades e como tal ela encontra a recusa, o Versagung (“die Versagung”), que vai dar lugar às primeiras identificações. Mas a demanda é também demanda de amor. A mãe, através da alternância de sua presença e de sua ausência, é o primeiro Outro, aquele por quem a criança capta a disparidade própria do simbólico e com isso o real além da mãe. De que maneira, senão através daquilo que é da sua feminilidade, ela pode se oferecer como Outro irredutível permitindo à criança emancipar-se? O Versagung é para a criança este operador que introduz a evasão do todo simbólico. A identificação é, ao mesmo tempo, causa e efeito do desejo, o desejo é impensável sem esta condição, sem esta possibilidade de recusa. Se, de fato, a criança não possuía a possibilidade de se recusar essa servitude ao Outro, a articulação que faz laço de seu desejo ao desejo do Outro seria profundamente devastada, mortificada. Graças a esta condição de recusa, o desejo, em sua dependência estrutural ao desejo do Outro, não perde sua radicalidade.

Em 1912, em seu texto “Sobre os tipos de entrada na neurose”, Freud (1998) examina os fatores que desencadeiam a neurose. A questão não se instala nas diferentes formas de adoecimento, e sim nos fatores que o desencadeiam. Nas quatro configurações descritas por Freud, o conflito se situa entre a libido e a satisfação. Freud remarca que o desencadeamento da neurose está ligado a alguns elementos: ao fato de que as coisas não são pensadas de acordo com as aspirações do sujeito, é a recusa pela qual o sujeito é introduzido no conflito, e a certa incapacidade de se adaptar às exigências da realidade. Não seria então a Versagung que faz adoecer, e sim a abstinência, pois, para ela, o sujeito se interdita de superar, de dialetizar a Versagung.

Podemos dizer que a mãe porta a transmissão desta Versagung primordial e é neste ponto que se articula sua posição estrutural de Outro primordial. A Versagung deve então ser lida como possibilidade de uma recusa que toca a estrutura própria da palavra. Trata-se da instauração de um espaço reservado ao centro da promessa. A Versagung implica o fracasso da promessa e a falta de uma promessa na qual tudo já estava renunciado. Trata-se de um dizer privado, o de-dito6, que inclui bem a promessa induzida pela linguagem na realização do desejo e da decepção concomitante quanto à pulsão. A relevância do pré-edipiano toma seu valor aí, a partir desta condição de recusa que dá as condições de início das defesas e das identificações.

No seminário O inverso da psicanálise (LACAN, 1992), podemos ler a maneira pela qual esta condição de recusa aporta um estatuto particular à mãe, dá acesso a um campo de exploração a partir da questão da repetição. O que nos permite compreender e diferenciar essa expansão que não inclui o seu limite, incomensurável, que se abre para o não todo pré-edipiano:

Não se trata apenas de falar das interdições, mas simplesmente de uma dominância da mulher na condição de mãe, e mãe que diz, mãe a quem se demanda, mãe que ordena e que institui ao mesmo tempo a dependência do homezinho.

A mulher permite ao gozo ousar a máscara da repetição. Ela aqui se apresenta como o que é, como instituição da mascarada. Ela ensina seu pequeno a se exibir. Ela conduz ao mais-de-gozar porque mergulha suas raízes, ela, a mulher, como a flor, no gozo mesmo. Os meios do gozo são abertos pelo seguinte princípio – que ele tenha renunciado ao gozo fechado e alheio, à mãe (LACAN, 1992, p.73-74).

Se a mulher, como a flor, mergulha suas raízes do gozo, vemos de que se trata, são as imersões ilimitadas do gozo, do universo diversificado.

A questão é complexa e merece um estudo que realmente ultrapasse os jargões precedentes. Lacan fala aqui da divisão entre mãe-mulher colocando ao que concerne o gozo da mulher. Por um lado, “a máscara” (a palavra não é gratuita) da repetição permite a fixação do limite remarcando assim a irrupção do gozo. Por outro lado, o gozo de ousar, aberto às mil maneiras de manifestação e que define o particularmente feminino, não teria limite.

***

Nesta segunda parte, como anunciamos previamente, iremos nos orientar a partir do texto de Wedekind (1974), O despertar da primavera.

“Por que você me fez um vestido tão longo, mãe?” Com esta frase, por este reproche a jovem Wendla dirige-se à sua mãe, começa o drama de Wedekind, O despertar da primavera.

Em sua intervenção sobre esta obra na Sociedade das Quartas-Feiras em Viena, em 1907, Freud destaca o mérito desta peça de teatro: “Nós não podemos deixar de pensar que Wedekind tenha um profundo entendimento sobre a sexualidade. Para se convencer basta ver como seu texto explicita diálogos de caráter sexual implícitos” (FREUD, 1907).

A peça conta a história de alguns adolescentes, meninos e meninas, tocados pela sexualidade e pelo emaranhamento desta à vida e ao chamado da morte. Esses adolescentes estão cientes de um saber sobre eles próprios, doloroso... que eles entraram em um impasse: o amor, o sexo, a verdade, Deus ou o ateísmo? Como sair disso?

Para resumir a história, algo na verdade impossível; Melchior e Moritz são dois amigos. Moritz “escolhera” a morte, Thanatos, seguindo o passo de Eros, a sequência de eventos face aos quais ele não poderá se distanciar, o que o impeliu a tomar essa decisão.

Segundo os dizeres de Lacan, Moritz consegue se excetuar desta lógica do todo, a qual é qualificada de menina por Melchior, mesmo se é no além, no mundo dos mortos que ele encontra seu lugar.

Melchior encontrara através do Homem mascarado a maneira de se reconciliar com a vida. O homem mascarado, a quem o autor dedica a peça (sutilidade, mas que fala de Wedekind, para advertir o lugar deste Homem mascarado na trama do drama), se revela a Melchior no momento em que este hesita entre a vida e a morte. Ele convida Melchior, digamos assim, para fazer parte das coisas, naturalmente o que não é possível sem um atravessamento: aceitar “a aposta da transferência”, sair da reclusão a qual a castração se reduz somente a duplicação do todo simbólico, realizado na fascinação pela morte7.

Em seu todo, poderíamos dizer, para retomar a palavra de Lacan, a peça ilustra bem aquilo que falha, é para cada um! E essa falha não acontece sem o despertar dos sonhos, sem a mediação do fantasma, ou seja, sem a parte que retorna ao saber inconsciente, cada um deve achar uma solução. Em face dessa aspiração, o que não corresponde nem a uma bipartição de natureza dada pela autonomia, em face desta aspiração a ser definida, a encontrar-se homem ou mulher, a desejar em homem ou em mulher, cada um deverá inventar sua solução.

Mas, havíamos dito, o saber inconsciente não diz tudo. Sobretudo ele não diz nada do sexo feminino, pois o feminino escapara ao significante. O sujeito, homem ou mulher, dispõe apenas do falo para se orientar em relação ao real do gozo.

Naquilo ao que concerne Wendla, a personagem principal, ela encontra Melchior, engravida dele e morre durante uma tentativa de aborto. Conjunção infeliz desta errância de Eros com a sexualidade e a reprodução.

Talvez seja importante entender a tonalidade de Freud ao falar sobre a peça para justificarmos a escolha de ler o texto explícito de diálogos, e particularmente os diálogos entre a jovem Wendla e sua mãe, na maneira pela qual o inconsciente, pela lógica de Um, trata o impensável da relação sexual. Freud diz que: “Eu considero uma notação muito refinada da parte de Wedekind, que mostra em Melchior e Wendla uma aspiração ao amor objetal sem escolha de objeto, pois eles não são minimamente apaixonados um pelo outro. O fato de que os pais de Wendla, a masoquista, não batem nela prova igualmente que Wedekind não se deixa enganar pelos habituais clichês, senão ele a teria apresentado como uma menina que apanha em sua infância. Ela reclama do contrário, de não ter sido suficientemente punida. É verdade que, de maneira geral, os que apanharam de maneira severa na infância não se tornam masoquistas” (FREUD, 1907, p.103).

Esta alusão feita por Freud ao masoquismo de Wendla não deixa de nos evocar as fórmulas mais tarde lançadas por ele sobre a superposição entre masoquismo e posição feminina. De maneira radical, ele introduz a noção de masoquismo feminino. Mas notemos a passagem, pois não nos ateremos a este ponto, que esta superposição não designa o ser feminino e sim um lugar de objeto no casal sexual. Trata-se de uma “posição característica da feminilidade, que significa ser castrado, submeter-se ao coito, ou dar a luz”. Na peça de Wedekind, vemos enunciar-se claramente o laço entre o fantasma masoquista com o desejo edipiano. Esse desejo, Freud o formaliza sob a fórmula “apanhar do pai” , que é substituído por “ser amado” no senso genital. Wendla não apanha de seu pai, mas ela o fantasia. Freud remarca este fato. Wendla insiste em saber como sua amiga Martha apanha: com o quê? Quando? Ela chega a propor a sua amiga substituí-la para poder apanhar. Mas o sentido dos diálogos mostra bem que aquilo que acontece através deste fantasma é uma interrogação sobre o casal sexual e sobre em que consiste a particularidade de um posicionamento feminino de um casal. O caminho traçado nos diálogos da peça com relação ao “masoquismo de Wendla” pode ser resumido da seguinte maneira: Martha, uma das meninas do grupo, conta que apanha de seu pai, a partir disso elas supõem e colocam em questionamento o gozo dos pais ao baterem em seus filhos, para enfim chegarem à questão: “Você sabe se você, você terá filhos? Você quer?”

A sutileza com a qual o diálogo mostra o deslizar, a substituição no inconsciente da posição de apanhar do pai por aquela de formular a aspiração feminina de ser amada por um homem. Vale a pena fazermos uma parada aqui.

 

Ato I, cena 3.

Wendla: – Com o que te batem, Martha?
Martha: – Vejamos. Oh, qualquer coisa […]. Penso que com tudo aquilo com que eles encontrem seu prazer, com o que não assopre palavra. Se um dia eu tiver filhos, irei deixá-los crescer como uma erva danada em nosso jardim de flores. […]
Wendla: – Você sabe se você os terá?
Martha: – Se você os tivesse, Wendla, o que você preferia, meninos ou meninas?
Wendla: – Os meninos, os meninos.
Martha: – Eu também. Preferia vinte meninos a três filhas. […] Se eu não fosse uma menina até então, certamente não gostaria de me tornar uma agora.
Wendla: – Eu acredito em você, Martha, uma questão de gosto! Tenho alegria todos os dias por ser uma menina. […] Mesmo assim eu gostaria de ter apenas meninos! […]
Deve ser mil vezes mais exaltante ser amada por um homem do que por uma menina!(WEDEKIND, 1974, p. 55).

Wendla ilustra bem aquilo que ela procura através de seu esforço em imaginarizar a posição feminina através da máscara do masoquista – é simplesmente esta substituição de “apanhar” por “ser amada”, aquela que não possuiu outra função que não seja a de fazer suplência ao “não existe relação sexual”, para formular segundo Lacan.

Esse diálogo coloca em cena a questão de o que é ser uma mulher para um homem em um casal sexual, graças à mediação do fantasma masoquista que permite se aproximar e fazer ressurgir tal questão no inconsciente. Questão que se atém ao fato de que não existe, no inconsciente, escritura possível da relação sexual.

Outro exemplo de Wedekind, pela oposição mulher-filha, nos é apresentado por outra figura de mulher, em outra peça de sua autoria, Lulu. Trata-se da mulher fatal, a mulher que encarna o “saber sobre Eros”, “a tirania feminina”, aquela em que a única política existente é o erotismo... Destino transfigurador onde o extremo se realiza a cada vez, em cada encontro com a morte do homem, o que, por outro lado, dá uma razão a mais para argumentar a não existência de A mulher. Mesmo este personagem de quem Wedekind se serve pra exprimir a potência alegre ou desastrosa de Eros não faz nada além de apresentar a perspectiva daquilo que é da ordem da realização do fantasma erótico: matar o homem. Lulu em sua feminidade extrema também não é A mulher; sua questão se junta à questão de Wendla, mas pela via do erotismo: o que é uma mulher em um casal sexual? A mascarada indexa alguma coisa de especificamente feminino.

Wedekind apresenta esta mulher como grande dançarina, por quem diríamos que os outros não existem: “Ela se embriaga de sua própria beleza, pela qual podemos dizer que ela morre de amor”9. Mas, sobretudo, no momento em que um dos homens se pergunta o que ela tem, como podemos fixar o seu ser mulher? A resposta que nos é dada é a seguinte: “Ela já aprendeu desde criança a trocar a sua vestimenta” (WEDEKIND, 1983, p.78).

Lulu pergunta a um homem:
O que você acha de mim?
O homem: – Não seria melhor que eu não dissesse nada?
Lulu: – Eu falava do meu vestido.
O homem: – Sua costureira sabe mais sobre você, que não me é permitido o saber.
Lulu: – Como eu me olho no espelho, eu gostaria de ter sido um homem, meu homem.
O homem: – Você inveja de seu homem a felicidade que você oferece a ele.

Lulu e Wendla são duas maneiras de nos introduzir, a partir da função da mascarada feminina, a nossa questão. Retomemos então os diálogos de O despertar da primavera através de alguns cortes, esperando que sua limpidez e sua simplicidade nos ajudem a avançar a questão da não equivalência estrutural entre o pré-edipano e o não todo fálico.

 

Corte 1. O reproche à mãe e a dependência da demanda (Ato I, cena 1)

Wendla: Por que você me fez um vestido tão longo, mãe? [...]
Se eu soubesse que você me faria um vestido tão longo, eu teria preferido não ter feito quatorze anos.
Em todo caso o meu vestido de menina fica melhor em mim do que esta camisola de noite. Deixe-me vesti-lo ainda mais uma vez, mãe! Ainda mais um verão (WEDEKIND, 1974, p.14).

O laço entre mãe e filha não é coincidentemente assim revelado nessas linhas que iniciam o drama de Wedekind. Reproche e demanda se articulam nesse diálogo em torno de uma história de vestido. O vestido é, iremos lê-lo desta maneira, uma espécie de símbolo que permite elucidar o impasse do laço entre mãe e filha neste ponto tão delicado que concerne à transmissão da feminilidade.

Digamos que, apesar dela, a filha espera da mãe um vestido que a vestiria de um anseio fálico, mas, se é o vestido escolhido pela mãe e, sobretudo, se a mãe utiliza este vestido para fantasiar, ao seu bom modo, sobre a promessa de que asseguraria a transmissão da “boa” feminilidade à sua filha, este vestido será muito... muito alguma coisa... muito longo para nossa jovem Wendla... ou não suficientemente, não suficientemente alguma coisa: colorido, fino, moderno... Em todo caso, ele não serve e melhor assim! Nesta demanda de vestir o vestido que indexaria a singularidade da mulher, “o vestido-reproche” ou “o vestido-aspiração”, já apareceria como um espaço que cria fronteira, separação, face ao estrago de incondicionalidade de seu amor, do recobrimento ou da superposição da feminidade de cada uma.

E nesse sentido que não é sem razão que vemos aparecer sob a obra de Wedekind, nesse fundo de reproche endereçado por Wendla à sua mãe, a palavra que é tão familiar para os lacanianos: ainda! “Mãe, deixe-me o vestir [meu vestido], o antigo, não esse que você acabou de dar-me, o meu vestido de menina, ainda mais uma vez, ainda mais um verão somente” (WEDEKIND, 1974, p.17).

Poderíamos sem dúvida dizer muitas coisas sobre essa passagem de ser menina a tornar-se mulher marcada por esta mudança, por este tempo de suspensão que Wendla introduz e ao qual sua mãe consente, como se fizesse amenamente o tornar-se mulher de sua filha que se deixará, enfim, ser apropriada:

A mãe: Sei somente dizer. Guardarei-te bem como você é, minha criança [...] Vai; vai e guarde seu vestido de penitência no armário! E em nome do céu coloque novamente o seu vestido de menina. Na ocasião, eu irei acrescentar na barra uma bainha, da largura de uma mão (WEDEKIND, 1974, p.17-18).

Revelar sob este fundo de reproche e de demanda a palavra “ainda” não é supérfluo. “... Ainda”, nos diz Lacan, “é o nome próprio desta falha de onde, no Outro, parte a demanda do amor” (LACAN, 1985, p.13). “Ainda”, é a palavra que se impõe para frear esse caminho onde a recusa e os dons da mãe se inscrevem no inconsciente da criança, fazendo, por um lado, espelhar a feminilidade, e por outro lado, se confrontar no lugar de um insondável enigma, a sombra de uma obscura ameaça. Mas se é verdade que o amor demanda o amor, este amor entre mãe e filha pode ser prisioneiro da ilusão de uma transmissão possível da feminilidade, da essência da feminilidade. É este limiar entre o insondável da demanda e a impossibilidade de representar a feminilidade que pode estar sem cessar sobre o ponto de ser atravessado. É neste limiar que o poeta nos interpela.

Lacan nos diz que se a mulher se interessar como tal pela castração ela irá, do mesmo modo, ingressar nos problemas do homem. “Claro que, para ela também, existe a constituição do objeto a do desejo. [...] Ela então também quer o objeto, e mesmo um objeto enquanto um objeto que ela não possui. É exatamente o que Freud nos explica, sua reivindicação do pênis continuará essencialmente ligada a sua relação com a mãe até o final, ou seja, à demanda. É na dependência da demanda que o objeto a se constitui para a mulher” (LACAN, 2004, p.233).

A mulher enquanto ser falante também deve passar pelo assujeitamento de suas necessidades à demanda. É a mãe quem introduz a criança à demanda articulada, nós o havíamos dito anteriormente, ela é este Outro primordial que faz a passagem da satisfação das necessidades para a demanda articulada. A questão é então introduzida no por que e no como se dá essa correlação entre o transbordamento na demanda endereçada à mãe e a inexistência de A mulher. É necessário rebater um sob o outro? E convergir os dois destinos em direção a somente um caminho, não importa a qual preço? Convertê-los em um curto-circuito, e seria a isto que daríamos o nome de devastação? Mas, sobretudo, como mostrar a não dependência dos dois registros para falar sobre o topos do feminino?

 

A devastação

Talvez seja possível formular o próprio da devastação como a assimilação da mãe e da filha em uma demanda insondável de transmissão da feminilidade.

Em 1972, em “O aturdito”, Lacan (2003) o define desta maneira: “... a elucubração freudiana do complexo de Édipo, que faz da mulher peixe na água, pela castração ser nela ponto de partida (Freud dixit), contrasta dolorosamente com a realidade de devastação que constitui, na mulher, em sua maioria, a relação com a mãe, de quem, como mulher, ela realmente parece esperar mais substância que do pai – o que não combina com ele ser segundo, nessa devastação”10 (LACAN, 2003, p. 465). É então na espera, na demanda que está a “subsistência”, e a palavra não é gratuita, existem ressonâncias filosóficas bastante precisas, que a devastação toma sua consistência, estrago insondável, sem limite para uma mulher.

Sem dúvida continua sendo importante de se aplicar, de se retardar nesta decalagem, a única capaz de tornar legível a não equivalência, a não continuidade entre a devastação e o não todo. Uma grave confusão faz com que para alguns psicanalistas prevaleça uma conotação do “não todo” buscando identificá-lo com a devastação.11 Trata-se de um erro de lógica que cria laço entre os dois termos a partir de uma ideia de um não todo, pretendida equivalência ao incompleto, e como oposto ao universal, ao Um. Assim, de acordo com essa leitura, a mulher entra na devastação porque ela é não toda. Se não existe um “patrimônio do feminino”, assim que o autor diz segundo seus próprios termos, por que estabelecer, com o fato de que a mulher não é totalmente submetida à castração, que existe “um ao-lado” ou “um além do falo” (de novo esses termos) uma continuidade que faz da devastação a prova necessária à assunção da feminilidade?

Nossa hipótese, ao contrário, argumenta que a devastação é ilusão, é a submissão a este dever de transmissão e não ilusão trincada dessa possibilidade, de que não é necessário para uma mulher atravessar a devastação no sentido em que falamos de travessia do fantasma. De fato, uma mulher não é incompleta, “ela não possui interior a ser mascarado.” Seu trabalho de tecelagem e de trançar é somente a aproximação ao próprio do feminino alcançado exatamente nesta invenção sempre não anônima do adereço, não o adereço do falso-semblante, alegoria enganadora, armadilha da aparência, mas exatamente a mulher-exterioridade, “cópia de si mesma”: ikélon é a palavra que designa em grego o fato de que a mulher é uma semblancia, mas “a semblancia de uma cópia sem modelo” (LORAUX, 1990, p.85-87). Ao invés de se encravar nessa confusão, ao invés de buscar combater a lacuna dando consistência à devastação como uma falsa continuidade, mesmo que por uma espécie de temporalidade, o trabalho analítico deve traçar a fronteira, a separação, a decalagem entre a devastação e o não todo. Neste fechamento na demanda de uma transmissão da impossibilidade de transmitir alguma “essência da feminilidade” e a abertura em direção ao feminino por uma mulher.

Isso quer dizer que não se trata de negar a devastação, e sabemos a que ponto as mães podem surpreender... A imaginação é curta... então há devastação! Pode haver um gozo da mãe com relação a sua filha que toma o seu acesso à feminilidade como refém, que impede, que barra, que rouba, para dizer em simples palavras, o espaço de sua intimidade.

Ora, existem consequências clínicas importantes que provêm da maneira pela qual nós nos orientamos com relação a essa questão. Se a devastação se inscreve como uma prova que deve ser atravessada, se a orientação do processo analítico vai em direção ao sentido de ultrapassagem da devastação, acabaremos dando consistência ao todo, isolando a feminilidade. Ou pior ainda, o acesso ao feminino no circuito fechado da relação mãe-filha. De acordo com essa lógica, uma mulher é antes de qualquer coisa filha de sua mãe. E mais, seu ser mulher não poderia existir se não fosse por oposição imaginária ao falo enraizado na gratidão ou no ódio pela mãe, seja enfim alguma coisa da ordem do ser mulher contra a sua mãe. A consistência então dada à devastação cobre o impasse e a contradição. O real da falha dessa transmissão da feminidade abre-se para o feminino no sentido de que se trata de transmitir o fato de que “na transmissão existe o intransmissível” (PORGE, 2005, p.208-209). Este intransmissível exige a referência ao falo, não querer contornar o falo na aspiração de ter acesso a um feminino puro.

O que Lacan indica com o não todo fálico é, na verdade, um espaço diversificado que, apoiando-se no fálico, se abre para uma outra lógica, que não se reabsorve no universal, que não faz parte do todo, nem para completar, nem para descompletar. A clínica da devastação seria então a clínica da maneira pela qual o falo é contornado pela aspiração de mascarar a impossibilidade de suportar esse intransmissível da feminilidade. A função limitada do falo pode ser transmitida pela mãe somente se ela mesma, através da invenção da sua feminilidade, deixa para a criança a possibilidade de se confrontar com a castração, a sua própria castração. É também a maneira de passar do todo ao não todo, pela vizinhança com outras experiências de vida, com um gozo suplementar que não está submetido à castração. O não todo implica esta dupla dimensão, por um lado, um apoio sob o falo do fato de que a mulher é sujeito falante, por outro lado, este acesso a um gozo outro não submetido à castração.

Se a mulher entra na devastação, não é porque ela não está toda inscrita na função fálica. É porque ela se engana, dando a ilusão de uma “possível transmissão da feminilidade em se passando pelo falo”. A mulher, confrontada a sua solidão, não deve ser nada mais do que tecelã do seu próprio vestido.

 

Corte 2. Nós devemos amar um homem com toda a força de seu coração (Ato II, cena 2)

Wendla: – Mãe… não fique brava, mãezinha, não fique brava! A quem neste mundo colocar esta questão que não seja você? Diga-me, diga-me, como tudo isso acontece? Por favor, mãe querida, diga-me! Diga-me! Tenho tanta vergonha de mim.
A mãe: – Wendla, eu não posso. Não posso tomar isso sobre mim.
Wendla: – Rápido, mãe, não posso mais esperar.
A mãe: – Para ter um filho... temos com um homem... O homem com quem sejamos casadas... devemos o amar... o amar eu te digo como podemos amar um homem... devemos amá-lo com toda a forca de todo seu coração, como... não o podemos dizer (WEDEKIND, 1974, p.47-48).

A maneira de responder da mãe, sua maneira de assumir a responsabilidade de informar Wendla sobre o sexual pode ser entendida como deslocamento necessário que impede a via de emancipação da filha à deferência da toda potência materna. E do fato de que a mãe “autorize” o amor por um homem e nesse amor a coragem necessária ao desejo de separar-se dela. É certamente melhor do que dizer à sua filha: nenhum desejo poderá ser mais forte do que o meu amor por você.

Mas, neste intervalo de normalidade, também é possível ler a maneira pela qual o ser da mulher é orientado pela mãe a encontrar no amor a sua maior realização, nessa perspectiva aberta pela mãe, nessa conjunção, nessa promessa de uma aspiração ao amor como ideal supremo: “Devemos amá-lo... amar o homem com toda a força de seu coração.”

Reencontramos o amor e também a perda do amor como laço supremo da inscrição da castração para uma mulher. Desde que ela entenda o amor por um homem como um destino, como o seu “verdadeiro destino de mulher”, este amor não seria também para ela devastação? Lacan utiliza esses termos. Mas é importante ressaltar a maneira pela qual a peça mostra o amor enquanto recobrimento do impossível da relação sexual. Não teria aqui um novo espaço a ser apoiado, um distanciamento a ser preservado a fim de que a queda do ideal, como o seu reverso de depreciação, não feche a porta ao real do encontro contingente do amor? Lacan fala do novo amor.

Se emancipar da castração não implicaria para uma mulher se abrir para uma outra realidade que não seja de encontrar uma substituição para a sua “substância de mulher” na religião do homem? Religião do homem que não deve ser confundida com a posição de uma mulher que consente em ser o objeto causa do desejo de um homem, a ser o seu sintoma, seu lugar de exílio e de abrigo do impossível da relação sexual.

Vemos nessas linhas de Wedekind como a mãe, ao invés de assumir sem saber as coisas sexuais, o impossível de transmitir o gozo sexual, re-envia sua filha ao amor por um homem enquanto identificação ao seu ser mulher. Lembremos que o comentário de Freud sobre essa peça também compartilha um pouco desse sentido: “Eu considero por uma observação bastante fina da parte do autor que mostra em Melchior e Wendla uma aspiração ao amor objetal sem escolha de objeto, pois não é sem razão que eles estão apaixonados um pelo outro.”

Além disso, sabemos que a parte que regressa à mulher, ser o falo de um homem enquanto ela não o possui, aquilo que falta ao Outro, ser mulher em função de sua relação com a castração, uma falta fálica, é uma configuração de estrutura do desejo feminino. Ser o falo designa o lugar da mulher na relação sexual, enquanto objeto de desejo, mas isso não impede de se perguntar: seu ser de mulher deve ser reduzido a ser a encarnação do falo?

Poderíamos dizer que a lógica do não todo não se orientaria por esse efeito de superposição entre a devastação com a mãe e a devastação com o homem. Em contrapartida, na clínica do todo fálico, fundada sobre o ideal e a exceção, as coisas se passam como se uma das “devastações” enveloparia a outra, como se uma fosse matriz da outra, como se a história com a mãe pudesse se interpretar em filigrana na história com o homem.

 

Corte 3. Você não me disse tudo (Ato III, cena 4)

Wendla: – Ô mãe, por que você não me disse tudo!
A mãe: – Você não vai morrer, minha criança! Você não tem hidropisia. Você tem uma criança minha filha! Você tem uma criança! Oh! Me fazer isso, a mim!
Wendla: – Mas eu não te fiz nada!
A mãe: – Oh! você não irá negar, e mais, Wendla! Eu sei tudo… Wendla, Wendla, o que você fez?
Wendla: – Eu não sei mais, Deus sabe o quê! Nós estávamos deitados no feno... eu nunca amei nesse mundo nenhum outro ser que não seja você, você mãe. Ô mãe, por que você não me disse tudo (WEDEKIND, 1974, p.86).

Este “dizer tudo”, atrás do grito, censura, chamado a mãe, quer colocar novamente no lugar a conformidade entre o saber e os “fatos”, a ideia de um todo possível. O impossível se reduz a um espaço onde o dizível e o indizível fazem parte de um só todo, a linguagem se confunde com a pulsão de morte.

Esse chamado se rebate enfim sobre o único amor pela mãe: “Eu não amei neste mundo nenhum outro ser que não seja você, você mãe.” Esta ideia de todo abole a distância introduzida pelo real não sabido, que é o real do sexo.

 

Referências

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Endereço para correspondência
30, rue Lecourbe
75015 – Paris/França
Tel.: (33)147345797
E-mail: patricia.leon@wanadoo.fr

RECEBIDO EM: 15/02/2012
APROVADO EM: 15/04/2012

 

 

Sobre a Autora

Patrícia Léon
Psicanalista em Paris. Membro da APJL (Association de Psychanalyse Jacques Lacan), atua no serviço de psiquiatria adulto do EPS-Erasme, França.