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Estudos de Psicanálise

Print version ISSN 0100-3437

Estud. psicanal.  no.38 Belo Horizonte Dec. 2012

 

 

O desejo de servidão voluntária e a violência1 - O corpo do poder, o corpo social e o corpo do gozo

 

The desire of voluntary servitude and violence - The body of power, the social body and the body of enjoyment

 

 

Christian Hoffmann

Círculo Brasileiro de Psicanálise - Seção Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Levando em conta que o poder é tecido no corpo social, o autor se pergunta sobre que tipo de investimento o poder deve fazer no corpo para permitir o bom funcionamento da nossa sociedade neoliberal. Para responder a esta pergunta, ele desenvolve a noção de “corpo social” e de “desejo de servidão voluntária” apoiando-se no conceito psicanalítico de “corpo do gozo” para examinar como a violência é gerada em nossa sociedade.

Palavras-chave: Corpo social, Corpo do poder, Corpo do gozo, Luta pelo aborto, Violência, Erotização, Pornografia.


ABSTRACT

Having in mind that power is weaved through the social tissue, the author asks himself what kind of investment power has to do over the body to aloud that our neoliberal society works well. To answer this question he develops the concepts of ‘social corpus’ and of ‘desire for voluntary servitude’, using as support the psychoanalytical concept of ‘body of jouissance’ to examine how our society generates violence.

Keywords: Social corpus, Power’s body, Body of jouissance, Fighting over abortion, Violence, Erotizaton, Pornography.


 

 

I – O corpo do poder

O corpo entrou no ensino de Lacan em 1966 e na luta política em maio de 68. A luta pelo aborto, ao pôr em jogo o corpo contra o poder, aumentou o pânico do corpo social (médicos e políticos). Esse exemplo histórico permite sublinhar que a relação política entre o corpo e o poder é construída pela metáfora do corpo social. Por consequência, o investimento do corpo pelo poder é um efeito dessa fantasia (FOUCAULT, 2001b), protege-se o corpo social pelo tratamento dos corpos.

Coloca-se então a questão sobre o tipo de investimento do corpo pelo poder que é necessário ao bom funcionamento da nossa sociedade neoliberal. Para Foucault, o “corpo-poder” não é mais que um Leviatã superegoico, ele produz igualmente o desejo e o saber. Esse duplo investimento do corpo tem a força do poder. Por exemplo, à luta do corpo contra o poder de controle da sexualidade, o poder responde pela erotização do corpo e pela pornografia.

Em suma, a proteção do corpo do cidadão é uma maneira médica de proteger a unidade do corpo social. Se a ideia de laço social repousa sobre uma metáfora ou uma fantasia do corpo, então não é de surpreender que sua unidade se torne pertinente. Pode se pensar na questão da unidade do corpo social a partir da filosofia política que repousa sobre o amor do mestre e de seu aluno, o desejo de servidão voluntária. Em que, então, considerar a análise contemporânea do poder feita por Michel Foucault, aquela que tira o poder de sua redução ao interdito, reconhecendo a imbricação da relação de poder no laço social de tal modo que, da família ao Estado, passando pela sexualidade e pelo saber, não há espaço “fora do poder”. Em suma, o poder é tecido no corpo social (FOUCAULT, 2001c).

Essas duas concepções do poder repousam sobre a metáfora do “corpo social”. Eu vou, devido a isso, desenvolver essas noções de “corpo social” e de “desejo de servidão”, tentando examinar como a violência é gerada nesse “corpo social”, buscando apoio aqui na noção psicanalítica de “corpo do gozo”.

 

II – O corpo do gozo

Na mesma época, Lacan introduziu em seu ensino o gozo como relação do ser falante ao corpo (LACAN, 1971).

Passemos à questão agora de como isso goza? Lacan substituiu bem cedo o tema pelo Es freudiano. Esse “isso”, que não é o eu, é para Freud constituído por tudo o que o ser traz ao nascer e que constitui o gozo do vivente. Destaquemos ainda uma vez essa noção “do ser” sob a pluma tardia de Freud, notadamente no Esboço de Psicanálise (FREUD, 1938).

O “isso” nos leva diretamente ao corpo que se compraz, e isto posto, fora de toda consideração sobre o sexo. Esse gozo designado por Lacan como fundamental ou como mortal (JADIN; RITTER, 2009) se opõe ao gozo sexual, pelo fato de que ele não é contornado por um limite. Esse gozo toma o caminho em direção à morte (LACAN, 1991), se dirige contra o próprio corpo ou contra o corpo do outro. Sucintamente, gozar de um corpo, como diz Lacan, consiste mais frequentemente então em demoli-lo (LACAN, 2011).

Esse gozo mortal do vivente se articula no inconsciente com a pulsão de morte e seu jogo de repetição. E é pelo intermédio da linguagem, na medida em que o inconsciente é constituído pelos traços das experiências de gozos infantis, que a busca do gozo vai se articular ao traço significante, que veicula, como todo traço, a significação da perda.

Essa ancoragem do gozo mortal no inconsciente pela produção linguageira da significação da perda de gozo introduz o gozo sexual.

O gozo sexual é chamado gozo fálico por Lacan porque o gozo mortal se sexualiza pelo falo. O falo deve ser entendido, desde a Grécia antiga, como o significante do desejo que introduz a significação da perda e, por consequência, o limite na busca de gozo.

O que diz bem o filósofo das Luzes, Julien Offroy de La Méttrie, em Arte de gozar [L'Art de jouir]: “Se eu perdi meus dias na volúpia, ah, dê-me-os, grandes deuses, para perdê-los ainda novamente! (LA MÉTTRIE, 2011).

O corpo falante e gozante, enquanto construído a partir do discurso que organiza o laço social, nos convida agora a perguntarmos sobre como isso goza no social?

Tomemos a questão da violência e da pornografia (ANDRÉ, 2001) e tentemos compreender por que hoje há uma potente montagem desses dois fenômenos no social.

Ninguém contestará que nosso laço social é marcado por uma exigência de gozo que pressiona a um sempre mais de sexo em detrimento de uma sexualidade, sinônimo de erotismo. Essa ausência de Eros no gozo abre o campo à pulsão de morte pela dessexualização do laço social.

A vontade de gozo se opõe ao desejo e ao efeito curativo [à l'habillage] pelo significante fálico da pulsão que limita o gozo pela sua sexualização. Podemos assim distinguir o gozo sexual de um outro gozo, mais primário, que é aquele do vivente, em que o corpo goza dentro de um autismo que abre acesso à “raiva destrutiva”, como indicava Freud (1930) no seu Mal-estar na civilização [Malaise dans la civilisation], evocando a inquietante “agressão e destruição não erotizada”.

A pulsão de morte se apropria do terreno desengajado por um laço social que se arranjou sob a palmatória da vontade de gozo no ritmo das leis do mercado e do sempre mais de consumo de objetos que passam muito rapidamente do “up” ao “down” do mercado, o que só faz atiçar ainda mais a exigência de gozo.

A pornografia e a violência formam a base de um sempre mais de gozo de um corpo dessexualizado pela ausência de investimento libidinal no laço [social].

Essa raiva gozadora da violência que engloba a pornografia encontra seu mestre em um supereu social exigente de um gozo a qualquer preço, até a morte.

Sucintamente, enquanto o político não promove um laço social em torno de alguns valores como a singularidade, a reciprocidade e a comunalidade (ROSANVALLON, 2011), que formam o tecido do político e da interioridade cidadã do sujeito, então, a violência dessexualizada, quer dizer, sem limites, encontra seu gozo nesta desertificação.

Um dos traços facilmente identificáveis hoje em nosso laço social é o desinvestimento libidinal no trabalho. Ele coloca a burguesia dos assalariados em grande dificuldade e, uma grande parte da juventude, em um mau investimento do saber (HOFFMANN; BIRMAN, 2011). Sem esquecer as derivas políticas ligadas a esse enfraquecimento da classe média dos docentes, dos psicanalistas e de outros cidadãos.

A psicanálise não é uma ética do gozo que prometeria um novo desejo criativo na cultura, ao sujeito que se agarra a seu corpo desenvolvendo novas estratégias de gozos, como apelaria em seus votos Michel Foucault. Nós podemos de certa maneira constatar o fracasso do projeto de Foucault que não soube evitar a dobra identitária em torno das novas formas de gozos, de modo breve, a construção de egos. Do contrário, a psicanálise pode ajudar um sujeito a se desembaraçar de um peso de gozo, de onde vem a ideia de Lacan que em cada analisando existe um aluno de Aristóteles.

O que não é sem ressonância política, pelo fato de que o que se pode esperar do efeito de uma análise sobre um sujeito que exerce um poder é o contrário de Alcebíades, quer dizer, que ele goze menos do poder, e que ele possa assim consagrar seu desejo à coisa pública.

 

III – O desejo de servidão voluntária

Eu vou tentar mostrar que o ideal no caso platônico é um impasse no governo de si e dos outros, para retomar o título dos últimos seminários de Michel Foucault. O que não impede de aderir à ideia, que Foucault desenvolve em seus seminários sobre o governo, de que a filosofia encontra “seu real” na política; esse real que ela encontra ali [na política] é, aqui, aquele da servidão voluntária do homem que continua a querer se deixar guiar pelo Ideal platônico do Filósofo-Rei. A explicação filosófica desde Kant até Foucault (FOUCAULT, 2008), ao tornar a “preguiça” e a “covardia” responsáveis desse estado de dependência ao Mestre-governante, não são para nós mais do que o sintoma desse Logos. Com certeza, é preciso continuar a se colocar a questão de como sair dessa servidão voluntária. Mas, parece bem difícil hoje de poder pensar “forçar alguém a ser livre” (BROWN, 2009, p. 73), quer dizer, a pensar por si mesmo, como fazia Rousseau. E, eu não tenho certeza, como indica a tese de Foucault, que a parrêsia, o dizer verdadeiro, que o filósofo (platônico) poderia soprar à alma do Príncipe, é um remédio, já que deixa intacta a questão do governo por um Chefe ideal. Para Nietzsche, o erro residia igualmente na crença no ideal, o que ele interpreta, por outro lado, também como uma “covardia”.

O que diz Lacan? Ele invoca em Maio de 68 a dissolução do saber no mercado e anuncia que “o vencedor desconhecido de amanhã é desde hoje quem comanda” (LACAN, 2009, p. 187). A política da atualidade lhe dá razão. O desejo de saber, que é o motor da psicanálise, não desapareceu, por isso. É talvez o desejo de saber que nos dá a coragem de compreender que a democracia é o nome de uma mutação da humanidade em sua relação com seus fins, em que a verdade não é mais inscrita no céu das Ideias (NANCY, 2009). Um humanismo da diversidade é hoje desejado e, certamente, pensável com o último Lacan. Em suma, Sapere aude! Tenha a coragem de te servir de teu próprio entendimento, como pregava a moeda do Iluminismo.

É preciso agora responder à questão da servidão como sintoma . Nós reconhecemos facilmente a servidão na busca do eu em direção ao Ideal, que se prolonga até na constituição de uma massa em torno de seu líder. Freud compara a massa à hipnose que produz uma confusão entre o Ideal do eu e o objeto, a ser entendido aqui como o outro. Na hipnose, assim como no amor, o objeto vem no lugar do Ideal do eu, o qual representa um ideal não atingido pelo eu. E a consequência é que o objeto absorve o eu e a consciência do sujeito, provocando a submissão a este ser, tornado idealmente superpoderoso (o termo é de Freud). Acontece o mesmo para a constituição libidinal da massa, que faz a soma dos sujeitos, os quais colocaram um só e mesmo objeto, um outro, no lugar do seu Ideal do eu. Esta identificação ao Um permite a identificação aos outros e constitui a unidade da massa.

Podemos agora responder à questão, postulada desde Kant e do Iluminismo, desta submissão voluntária a este ser superior, como designa Freud, a quem os homens delegam o governo de si e dos outros?

Quando o governante se torna um Mestre, ele toma o lugar de um pai. Isso é introduzido pelo Ideal platônico do Filósofo-Rei, e é o que se torna objeto da crítica de Aristóteles. Aristóteles quer a separação dos poderes. A degradação dos governos está, para ele, ligada à concentração de poderes e a uma política elaborada sobre o modelo da família. Hannah Arendt e Lévi-Strauss, subsequentemente a Aristóteles, preferem igualmente construir uma filosofia política a partir da Cidade. Para Arendt (1995) , o desastre da política resulta do fato de sua construção a partir da família. Por consequência, a substituição de um pai no lugar do Ideal do Eu em nossas sociedades não nos surpreende.

Esse Ideal do Outro é ocupado o mais frequentemente pela figura de um pai ideal. Essa figura é aquela de uma potência paterna que se supõe deter o falo, e que serve de escudo aos sujeitos contra a castração. Daí nossa interpretação da “preguiça” e da “covardia”, supostas por Kant como explicação da servidão, como um sintoma do ser humano. Portanto, o sujeito encontrará aí a oportunidade de gozar repetidamente da perda de sua autonomia (SAFOUAN, 2009).

 

IV – A passagem ao ato

Resta a difícil questão da passagem ao ato. O que faz com que um sujeito passe ao ato no laço social?

A passagem ao ato evoca mais frequentemente as situações em que o sujeito coloca a sua vida ou a dos outros em perigo, como o suicídio, o homicídio e a agressão. Nesses casos, um limite é ultrapassado, ou seja, aquele do interdito de dispor de sua vida ou da vida de seus semelhantes. Vê-se muito bem que a transgressão desse limite afeta o conjunto do corpo social, ao passo que o interdito do homicídio funda o laço social. É suficiente lembrar com Claude Lévi-Strauss que “em toda a parte em que a regra se manifesta, sabemos com certeza que estamos no âmbito da cultura” (LÉVI-STRAUSS, 1949). É o interdito do homicídio que limita a rivalidade e a agressividade que se produzem daquilo que Lacan chamou, desde seu Estado do Espelho, de servidão imaginária, pela interposição da imagem do próprio corpo na relação social. Donde a tensão mortífera que se produz no corpo social, portanto, como indica Moustapha Safouan, “É a seu ser mesmo, o meu o qual ele me despossui, que eu quero” (SAFOUAN, 1993) [C'est à son être même, le mien dont il me dépossède, que j'en veux]. A solução para essa loucura inerente ao eu está no título dessa obra de Moustapha Safouan, A palavra ou a morte. Ele faz aí a demonstração de que as leis que tornam a vida social possível são as mesmas que governam a palavra.

O que torna a dizer, com Freud, que o pensamento será a metáfora do ato pulsional. O simbólico faz mais do que simplesmente metaforizar o real do gozo primário do corpo a corpo, ele transforma esse gozo em pulsão. É esta sexualização do gozo mortífero pela pulsão, por consequência, por sua articulação à realidade sexual do inconsciente que o humaniza no laço social.

A passagem ao ato é uma regressão desse trabalho de subjetivação por um retorno em direção ao real do gozo mortífero, e ela assinala assim uma impossibilidade do trabalho de subjetivação ao querer o gozo imediato. Assim, podemos definir a passagem ao ato como uma vontade de realização imediata do gozo. É uma solução à impossibilidade do trabalho da subjetividade, e, por consequência, do trabalho de pensar. O que torna possível esse trabalho de pensar?

Para responder a essa questão, é preciso revisitar os textos de Freud sobre a pulsão (FREUD, 1968) e sobre a denegação4. É interessante encontrar sob a pluma de Freud uma gênese da oposição entre o objetivo e o subjetivo, em seu famoso texto sobre a denegação que Jean Hyppolite (1966) apresentou a Lacan como revelador da gênese do pensamento. Nessa gênese freudiana do pensamento “era uma vez um eu (entendamos aqui um sujeito) para o qual não havia ainda nada de estranho” (IDEM, p. 389). A distinção do estranho e de si se faz pela expulsão do estranho para fora do “eu-prazer original”; fonte de desprazer, o que se acha fora dele era previamente idêntico. Ele retorna ao tema de se escolher entre as moções pulsionais: “isso deve estar em mim ou então fora de mim” (FREUD, 2001, p. 137). A outra escolha do julgamento da existência consiste em distinguir um “tem” [il y a] primitivo as representações que permitem re-encontrar o objeto através do teste de realidade. Para Freud, é uma questão de fora e de dentro “o não-real, o simplesmente representado, o subjetivo, está somente dentro; o outro, ou real, está presente ‘do lado de fora’, também” (IDEM, p. 137). A condição desta distinção entre o subjetivo e o objetivo é a perda de objeto que em outro momento traria a satisfação. O teste de realidade só pode ser feito sobre o fundo desta perda de gozo. Pode-se reconhecer a construção psíquica do limite para o sujeito entre o fora e o dentro a partir desta gênese do julgamento e, por consequência, do pensamento . A noção de “limite” toma assim um sentido psíquico enquanto resultante de uma perda primordial a partir da qual aumenta a lacuna, pelo teste de realidade, entre o gozo buscado e o gozo encontrado. Donde surge o julgamento pelo sujeito de um “não é isso!” (LACAN, 1975), expressão em que se reconhece a significação do que Freud, e depois Lacan, designou por castração.

A castração deve ser compreendida aqui como uma perda de gozo. A gênese do pensamento e do sujeito ao mesmo tempo em que produz um pensamento e um julgamento, supõe esta perda de gozo e a existência de representações. Sabemos que a ausência de representação no momento da confrontação do sujeito com uma janela de sua realidade sinaliza a psicose.

 

IV – Conclusão

Michel Foucault respondeu a Gilles Deleuze, em um debate sobre Os intelectuais e o poder, que o jogo do desejo (de servidão voluntária), do poder e do interesse é ainda pouco conhecido (FOUCAULT, 2001a). Podemos concluir sobre essa questão que o interesse de servidão voluntária se encontra em um ganho de gozo que assegura a coesão do corpo social, que o mestre encarna em seu corpo, através de uma especularização que o coloca na cabeça desse corpo. Eugène Enriquez cita o exemplo de Juan Perón que dizia à massa: “Vocês são quinhentos mil, comigo nós somos um milhão” (ENRIQUEZ, 2012).

O assujeitamento ao mestre e ao seu gozo mergulha os sujeitos no sono da razão, o que engendra monstros, como sabia Goya. O sujeito encontra um modo de fazer aí a economia do trabalho de pensar por si, com o benefício objetivo de não se ter de considerar [a si mesmo] como sendo um problema para si. Lembremos que é graças à tomada de consciência que o homem se torna um problema para si mesmo, de modo que a tragédia e a democracia vieram à luz desde Atenas.

Em nosso mundo contemporâneo, a excitação pulsional permanente, armada pela hiper potência dos meios (armas, webcams, mídias de massa, robôs financeiros), em que a pulsão de morte participa sempre do banquete, em detrimento da razão, quer dizer, à impotência de seus fins, favorece as passagens ao ato de todos os gêneros (STIEGLER, 2012).

Esta ausência de transformação das pulsões em investimentos sociais, pelo desinvestimento da razão em todos os seus estados, abandona o trabalho de socialização, que é uma “tarefa sem fim”, como dizia Winnicott.

A juventude abandonada de Auguste Aichhorn se tornou hoje uma juventude dessocializada [désocialisée] que pode facilmente se achar patologicamente fanatizada quando o mestre, além do mais o religioso, a isso se mistura.

 

Referências

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Endereço para correspondência
E-mail: hoffmann.ch@wanadoo.fr

RECEBIDO: 03/08/2012
APROVADO: 08/08/2012

 

 

Sobre o Autor

Christian Hoffmann
Psicanalista. Professor de psicopatologia clínica na Univ. Sorbonne Paris Cité; vice-diretor da École Doctorale de Recherches en Psychanalyse, Univ. Paris Diderot; pesquisador do CRPMS (Centre de Recherches en Psychanalyse, Médecine et Sociéte. Email: hoffmann.ch@wanadoo.fr

 

 

1 Tradução de Marília Etienne Arreguy; professora adjunta à UFF; associada ao Fórum do Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro. E-mail: mariliaetienne@id.uff.br; Revisão da Tradução: Nelson da Silva Jr.; professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da USP; e-mail: nesj@terra.com.br. * Todas as traduções dos autores citados foram feitas de modo livre.
2 Psicanalista. Professor de psicopatologia clínica na Univ. Sorbonne Paris Cité; vice-diretor da École Doctorale de Recherches en Psychanalyse, Univ. Paris Diderot; pesquisador do CRPMS (Centre de Recherches en Psychanalyse, Médecine et Sociéte. Email: hoffmann.ch@wanadoo.fr
3 REVAULT, M. d’Allones retoma os termos “desejo de liberdade” e “desejo de servidão” a propósito da servidão voluntária, in Pourquoi nous n’aimons pas la démocratie. Paris: Seuil, 2010, p.68.
4 FREUD, S. La negation. In Résultats, idées, problèmes, t. 2. Paris: PUF, 1985. Cf. Meu comentário desse texto in Hoffmann, C. Introduction à Freud. Le refoulement de la verité. Paris: Hachette Littératures, 2001.
5 O eu-prazer e o eu-realidade, os dois princípios do funcionamento psíquico, “impulsionam uma tal gênese de operações psíquicas primitivas de introjeção e de projeção pelas quais se constitui o limite de um eu que comporta um interior e um exterior”, in Laplanche, J. et Pontalis. J. B.. Vocabulaire de la psychanalyse. Paris: PUF, 1973, p.259.