SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número40Vínculos entre modernidade, ética e subjetivação no pensamento de FreudHolograma dinâmico recursivo para uma teoria topográfica da relação psicanalítica índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Estudos de Psicanálise

versão impressa ISSN 0100-3437

Estud. psicanal.  no.40 Belo Horizonte dez. 2013

 

 

O inapanhável objeto do savoir-faire na análise1

 

The elusory object of know-how in analysis

 

 

Erik Porge

Associação de Psicanálise Encore

Tradução: Elisa Rennó dos Mares Guia-Menendez e Mariana Valério Orlandi

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Além das regras técnicas, o savoir-faire (saber-fazer) provém de uma posição ética. O tato, assim como a disponibilidade, o constitui. Ele encontra sua expressão na regra da atenção igualmente em suspenso. Esta visa a impedir a compreensão precipitada e favorece a surpresa no discurso, sinais de uma passagem de inconsciente. Ela também indica que o savoir-faire se encontra ligado ao tempo e ao seu manejo, bem como à existência da lalíngua (lalangue). No entanto, o savoir-faire não deve se situar somente do lado do analista, mas também do analisante. A este cabe aprender como lidar com seu fantasma e seu sintoma. Além disso, o savoir-faire se refere sempre a uma subjetividade, seja ela do analista ou do analisante, na medida em que o inconsciente é um savoir-faire com a lalíngua?

Palavras-chave: Saber-fazer, Atenção, Lalangue.


ABSTRACT

Over and above technical rules, know-how derives from an ethical position. Tact and receptiveness are its constituent parts. It finds expression in the rule of equally suspended attention which guards against a hasty understanding of what is said, preferring surprises as signs of the unconscious. The rule indicates also that know-how is linked to the notion of time and its handling as well as to the existence of lalangue.?Know-how however is not only in the realm of the analyst. The analysand too must find how to do with his fantasies and symptom. Finally, is know-how always to be attributed to a subjectivity, be it that of the analyst's or the analysand's, insofar as the unconscious is know-how with lalangue?

Keywords: Know-how, Attention, Lalange.


 

 

Naquilo que concerne à psicanálise, o savoir-faire pode ser visto de maneira positiva ou negativa. O lado ruim: no sentido de uma manipulação indevida da transferência. O lado bom: no sentido de uma justa apreciação dos posicionamentos da transferência. Esse aspecto bifacetário do savoir-faire, no fundo, está correlacionado com o da transferência em si, que às vezes é um fator de resistência e também motor de um querer dizer. A dupla face da transferência nos mostra que ela nunca é pura nem purificável, pois está intricada com a sugestão. No entanto, é recomendável distingui-la. Mas tal distinção não é fácil e demanda a intervenção de outras coordenadas. Freud identificou muito bem tal armadilha em seu artigo A dinâmica da transferência e busca contorná-la: Buscamos preservar a independência última do paciente, utilizando a sugestão somente para fazê-lo realizar o trabalho psíquico, que o conduzirá necessariamente a melhorar de maneira durável a sua condição psíquica (FREUD, 1975).

A fronteira entre uma sugestão arbitrária, hipnotizante e uma sugestão a serviço do "trabalho psíquico" pode ser porosa, segundo o dito que os fins justificam os meios. Por isso, é preciso admitir a existência "de uma dimensão de sugestão em toda transferência" (PLON, 1989, p. 91). Nessa ocasião Michel Plon também cita Lacan:

Nas condições centrais, normais de uma análise, nas neuroses, a transferência é interpretada com o próprio instrumento da transferência e com base nela mesma. Portanto, ela poderá ser feita somente a partir de uma posição que lhe é atribuída na transferência, que o analista analise e intervenha na própria transferência. Para ser sincero haverá uma margem irredutível de sugestão, um elemento que será sempre suspeito, que não se atém ao que se passa por fora — não há como saber — e sim a aquilo que a própria teoria é capaz de produzir2 (LACAN, 1992, p. 210).

Se, de fato, a transferência pode ser interpretada somente com a própria transferência, existe um círculo vicioso da transferência e da sugestão. Daí então a necessidade, para encontrar uma saída, de fazer com que a transferência dependa de outra alavanca teórica (o ponto fixo de Arquimedes que Descartes relembra em sua segunda Meditação), que foi finalmente nomeado por Lacan, em 1964, o sujeito suposto saber.

É também por essa via que é possível abordar a questão do savoir-faire na análise. Um savoir-faire que não se relanceará nos equivocados sulcos da transferência e da sugestão e que não tomará a máscara de Janus.

 

Além e aquém do saber e do fazer associados

A associação destes dois verbos cria uma nova noção, suplementar à adição de cada um destes termos. A ordem não é indiferente, porém o savoir-faire (saber-fazer) não é inverso ao faire-savoir (fazer-saber), expressão que também tem sua pertinência, mas que concerne outro campo como o da psicose. E o savoir-faire não precisa de faire-savoir. No "savoir-faire" existe uma determinação do fazer pelo saber, mas ela não se esgota. Longe disso, o sentido do traço da união entre ambos é também um traço de separação. Mas se o saber determina o fazer, tal fato não diz de qual saber nem de qual fazer se trata, nem que o fazer se origina do saber. No que concerne ao resultado dessa associação de dois verbos, ele pode provir seja de um fazer sem muito saber, seja um saber sem muito fazer.

O exercício de um fazer pode produzir um saber, especialmente se o fazer possui valor de ato, levando em consideração que o gesto está associado a uma dimensão significante — por exemplo, no caso de César atravessando o Rubicão —, mesmo se durante o ato o sujeito não perceba o que está fazendo, pois ele está dividido pelo ato, ele o transforma, ele não é mais o mesmo antes e após o ato. A mudança de posição do sujeito modifica a sua relação com o saber. É o paradigma do ato analítico, o qual Lacan definiu como a passagem do analisante a analista. De maneira mais modesta, é também o efeito de qualquer ato falho, de todo engano,3 que produz uma entrepercepção (entr'apercevoir) de uma dimensão significante que até então o sujeito desconhecia.

O fazer pode também encontrar sua origem no saber. É o caso do discurso universitário e de toda formação dita profissional, em que se coloca em prática um saber constituído. A partir desse ponto de vista, o savoir-faire analítico é uma deglutição de um saber aprendido em e através de uma análise pessoal. Trata-se, então, de uma concepção livresca do saber, produzindo interpretações prontas para serem usadas (prêtes-à-porter). Ele se opõe a um saber proveniente de um agir.

Mas a dimensão do ato deve ser transmitida através de um saber que confere a sua dimensão significante ao fazer e lhe permite ser reconhecido como tal. Não saberíamos, então, estabelecer uma demarcação clara entre essas duas origens possíveis de um savoir-faire. É preciso se desvencilhar de uma posição binária entre saber e fazer, que é demasiadamente generalizada. É o que fez Lacan quando, ao escrever a fórmula do sujeito suposto saber, diferencia e articula o saber textual, lógico e topológico (o oito interior) e um saber referencial, "latente", saber suposto, assim como o sujeito, nos significantes deste, aonde o "não sabido se ordena como estrutura do saber" (LACAN, 2003, p. 248-250).

Tal como Freud nos lembra, devemos abordar cada "novo caso como se nada houvéssemos adquirido de suas primeiras decifrações" (LACAN, 2003, p. 249). Em outro momento, mas nessa mesma direção, ele anuncia que é "indispensável que o analista seja ao menos dois. O analista, para que os efeitos possam surtir é o analista quem, estes efeitos, os teoriza" (LACAN, 1974).

Permanecendo em uma oposição entre saber e fazer, não saberíamos encontrar a verdade do savoir-faire; ao mesmo tempo a noção contém uma originalidade e um valor que não devem ser perdidos de vista. Possivelmente o laço entre o saber e o fazer não consiste em um laço de dois termos, e é preciso ao menos poder atá-los com um terceiro termo. Propomos introduzir neste ponto os termos de gozo e lalíngua (lalangue).

No savoir-faire, o saber e o fazer não podem ser isolados como duas entidades ou dois elementos conjuntos que, de alguma maneira, complementariam um ao outro. Existe uma alienação, seja um fazer que, por um lado, exclui o saber e um saber que, por outro lado, exclui o fazer. Uma parcela do fazer excede o saber, ou o antecipa, quando esse fazer produz um saber. Ao mesmo tempo, o fazer pode se mostrar falho com relação ao saber. A transferência ao analista depende do significante terceiro, mediador, "sujeito suposto saber", mas isso pode reforçar a repreensão da falta de savoir-faire. Mesmo se um savoir-faire é emprestado ao analista, não é o que encontramos no princípio da transferência. Não saberíamos estender de maneira natural a fórmula do sujeito suposto saber em uma fórmula de um sujeito suposto saber fazer.

 

O lado do ato e do fracasso (ratage)

O fato de evocar um savoir-faire em uma análise — e que ao fazê-lo a noção de ato é convocada — implica um possível fracasso. O possível seria, segundo Lacan, um cessar de se escrever. Sabemos que, desde Aristóteles e sua contribuição à controvérsia dos futuros contingentes, que o que há de necessário é o possível. É possível que seja A ou B que vença a batalha naval amanhã, mas é necessário que seja ou um ou outro. As alternâncias ou pontuações, do cessar de se escrever e do não cessar de se escrever (assim como Lacan define o necessário [LACAN, 1982, p. 132) talvez sejam aquilo que separa a ação do sujeito suposto saber, como figura necessária, da do savoir-faire, como figura do possível da transferência.

Contrariamente à definição que busca que o savoir-faire seja identificado como habilidade, a busca de obter sucesso naquilo que fazemos em uma análise, o savoir-faire se aproxima do risco, de uma possível falha, a aproximação e o fracasso, dimensões ligadas ao ato analítico. Nesse sentido, o savoir-faire é exatamente o contrário da aplicação prática de uma regra teórica universal. Ele não enaltece o saber e não equivale a nenhuma habilidade técnica que seja, mesmo se tratando de algo bem-vindo.

É também o caso de outros domínios e não somente da análise, por exemplo, na arte. Fabricar um quadro não é pintar (COLLINS, 2012).

Em Propos sur la peiture du moine Citrouille-Amère (Anotações sobre a pintura do monge abóbora-amarga), Shih T'ao exemplifica aquilo que ele chama de "um traço único do pincel", familiar à caligrafia e à pintura, que vai bem além de regras técnicas de execução. Ele representa um verdadeiro ascetismo:

Aonde se encontra a regra? Ela reside em um só traço do pincel. Em um só traço do pincel encontra-se o principio de todas as coisas, a raiz de Dez Mil Fenômenos, isto é revelado aos Espíritos, mas escondido dos homens, e o século o ignora. (...) A regra do traço único do pincel é a ausência de regra que produz a regra, e assim a regra obtida abrange o universal. (T'AO, 1984, cap. I).

[...]

É na união entre o pincel e a tinta que se produz o ato de pintura: "A tinta deve umedecer o pincel com a alma, o pincel deve utilizar a tinta com o espírito. (...) Realizar a união entre o pincel e a tinta, é resolver a distinção de yin e yun e se comprometer a ordenar o caos" (T'AO, 1984 cap. V, VII).

Em seu livro sobre um dos maiores pintores chineses, Chu Ta (1626-1705), amigo de Shih T'ao, Le génie du trait (O gênio do traço), François Cheng escreve:

Que se trate de caligrafia ou de pintura, na China, o gênio criador se resume sempre a este gesto único: traçar o traço. (...) Recordemos que para os chineses o traço não consiste em uma finalidade em si. Da mesma forma com que ele não seria percebido como uma simples linha. Ele é, ao contrário, uma entidade viva, implicada em uma estrutura global que pretende tratar do universo em toda sua toda a integralidade (CHENG, 1986, p. 36-39).

Em função das grandes mudanças políticas e familiares, Shu Ta se fechará em um mutismo absoluto, mas ele mostrará ter uma extraordinária energia criativa. François Cheng percebe que para ele o traço representa a "voz de dentro", ele "dá a palavra à suas imagens" (CHENG, 1986, p. 39).

Du tait (de taire) au trai il y a l'r. (Do silêncio ao traço, existe o r).

Essa experiência é preciosa para abordarmos aquilo que Lacan chama de "lituraterra", "a rasura de traço algum que seja anterior" (LACAN, 2003, p. 21), a mesma do traço unário. Ele modifica aquilo que havia apresentado em seu seminário A identificação (LACAN, 24 jan. 1962) formulando os três tempos no advento do significante: o do traço (do não), o da sua desmarcação, e o da anulação da desmarcação. Isso gera o advento do significante "não": não há traço no não. Em Lituraterra, Lacan conta somente dois tempos, mas ele fala de uma rasura de traço algum que seja anterior para apontar esse momento inapanhável "da metade sem par em que o sujeito subsiste", e é a caligrafia que o presentifica:

O escoamento é o remate do traço primário e daquilo que o apaga. Eu lhe disse: é pela conjunção deles que ele se faz sujeito, mas por aí se marcam dois tempos. É preciso, pois, que se distinga nisso a rasura. Rasura de traço algum que seja anterior, é isso que do litoral faz terra. Litura pura é o litoral. Produzi-la é reproduzir essa metade ímpar com que o sujeito subsiste. Esta é a façanha da caligrafia. Experimentem fazer essa barra horizontal que é traçada da esquerda para a direita, para figurar com um traço o um unário como caractere, e vocês levarão muito tempo para descobrir com que apoio ela se empreende, com que suspensão ela se detém. A bem da verdade, é sem chances para um ocidental. É preciso um embalo que só consegue quem se desliga de seja lá o que for que faça traço (raye).

Entre centro e ausência, entre saber e gozo, há litoral que só vira literal quando, essa virada, vocês podem tomá-la, a mesma, a todo instante. É somente a partir daí que podem tomar-se pelo agente que a sustenta. (LACAN, 2003, p. 21)

Vemos que o savoir-faire não se reduz a uma habilidade técnica e que um savoir-faire em diferentes domínios pode produzir efeitos análogos, e nesse ponto, uma virada entre saber e gozo.

Não é exatamente do que se trata o savoir-faire? Saber fazer uma curva entre saber e gozo? Não seria o gozo o terceiro termo que faria traço entre saber e fazer? O único traço de pincel como o traço unário?

 

O savoir-faire pode ser ensinado?

O savoir-faire é transmissível como na arte ou no artesanato? Mais precisamente, quais seriam os elementos do savoir-faire que poderiam constituir objeto de uma transmissão? E como?

Não me parece contestável o fato de que o savoir-faire possa ser ensinado durante uma análise, assim como tudo o que se encontra ao redor dela, supervisões, apresentações de paciente, cartéis, passe... É o que então tornaria o savoir-faire indispensável, mas limitado, pois a transmissão de um savoir-faire analítico não é a transmissão da psicanálise, concebida como um saber sobre a passagem da posição de analisante à posição de analista. É nesse sentido que o savoir-faire pode se converter em uma sugestão e, então, reduzir a psicanálise a uma espécie de psicoterapia.

Ao publicar A interpretação dos sonhos, Freud esperava, entretempos, produzir um "manual" de interpretação, um guia de savoir-faire das interpretações dos sonhos, que poderia ser utilizado por qualquer pessoa. É por isso que ele buscará da forma mais abrangente possível contribuições de outros analistas, as quais foram incluídas ou não em sua obra, em uma história complicada (MARINELLI; MEYER, 2009). Porém, rapidamente ele se dará conta de que um manual não poderia substituir uma análise pessoal, com um terceiro. Todavia, foi preciso esperar 1918 para que Hermann Nunberg recomendasse de antemão a análise pessoal para exercer a psicanálise, e 1925 para que a IPA tornasse tal recomendação obrigatória, o que inscreveria o vínculo entre a análise pessoal e a aquisição de um savoir-faire. Ao mesmo tempo que Freud se sentia livre com relação às regras enunciadas, ele declara que a psicanálise não pode ser ensinada em livros (FREUD, 1974). Nos dias de hoje, a necessidade de uma análise pessoal para exercer a psicanálise é um consenso, embora as razões não sejam sempre as mesmas.

Não seria questão de reduzir a análise do analista nem suas conexões, supervisões, ao aprendizado de um savoir-faire. Conceber as coisas dessa forma consistiria em permanecer em um modelo de análise enquanto formação profissional. Mesmo sendo difícil para cada um poder dizer em que a análise pessoal contribui para o aprendizado do savoir-faire, ela será útil ao analisando se ele se tornar analista.

Essa foi uma questão colocada durante um colóquio organizado em novembro de 2011 pela EPFCL4: "Enquanto alguém que pratica a psicanálise, o que você obteve do analista que Lacan foi para você?"5 Tentando responder a essa questão, comecei ressaltando a dificuldade:

Quais pontos eu irei distinguir em Lacan, irei ler em sua prática para afirmar que eles tiveram tal ou tal efeito na minha prática? Seria eu capaz de representar aquilo que opera na minha prática? E simultaneamente relatar alguma coisa precisa de minha análise com Lacan? Assim mesmo, quando eu conseguir estabelecer esta relação de elementos, permanece somente o conjunto de traços que "recebi" com outros traços próprios que farão com que tais traços não possuam mais o mesmo valor e não serão mais identificáveis enquanto recebidos, ao menos que eu não me dê conta.6 O recebido é um re-sabido daquilo que não me dou conta (PORGE, 2012, p. 41).

Colocados tais limites, retive, entretanto, certos traços que poderiam entrar no quadro daquilo que definiria um savoir-faire. Que fique entendido que não é porque retivemos que os dominamos, e existe uma distância entre aquilo que se representa de um savoir-faire e aquele que o opera. Vejamos, resumidos, três desses traços.

Um valor do savoir-faire que a análise me ensinou é a do tato. Freud já havia mencionado em "A psicanálise dita selvagem": "Na psicanálise, essas regras estritas viriam substituir uma inapanhável qualidade que exige um dom especial: o "tato médico" (FREUD, 1974, p. 41).

Rudolph Loewenstein é um dos poucos a ter escrito um artigo inteiro consagrado ao tato na análise. Ele nos alerta especialmente contra duas preocupações que, por mais legítimas que sejam, podem prejudicar o processo de análise: uma curiosidade muito grande em conhecer os pequenos detalhes da história do paciente e um zelo terapêutico que o torna impaciente. Ele também teve o mérito de acrescentar:

Uma grande parte das intervenções dos analistas, entre elas, as que pecam contra o tato psicológico, possuem uma base em comum. É a transgressão da terapêutica analítica a um estado da psicoterapia mais primitiva, aquela que age sobre os pacientes através de bons conselhos, pelo chamado à vontade e pela persuasão (LOEWENSTEIN, 1930-1931).

Lacan, que fora analisante de Loewenstein, reconhecia também o valor dessa qualidade, atribuindo-lhe a seguinte definição: não se apoiar muito nos significantes que fazem mal, manejá-los com discernimento em sua literalidade.

A análise também me ensinou o valor de um savoir-faire com as relações interior-exterior, sem abolir a distinção entre privado-público, mas introduzindo nessa relação uma terceira dimensão, uma dimensão analisante passando ao público. Com Lacan, uma exterioridade se mostrava convidativa no próprio consultório do analista. Ela poderia ocorrer mesmo sem ele, mas ele poderia também — com seu estilo inimitável, mas que ensinava através das surpresas que ele provocava — modelá-la, ou seja, demonstrar um savoir-faire avec (saber-fazer com): isso acontecia no encontro com outros analisantes no consultório do analista, por um trabalho comum com eles nas instituições, pela participação nos seminários e, sobretudo, nas apresentações de paciente de Lacan e de outros analistas. Poderíamos dizer que isso introduzia uma dimensão de passe na própria análise e instaurava, assim, o analista como passador de um discurso, o que é uma maneira de conceber que o analista seja ao menos dois.

Finalmente, mas a lista não é exaustiva, se existe uma coisa que a análise pode ensinar e que alimenta um savoir-faire, é a disponibilidade do analista, disponibilidade à demanda de escutar e à própria escuta, que ao encontro do valor da paciência, frequentemente subestimado.

Essa disponibilidade não é um dom, ela é uma disposição, ou seja, uma posição do analista, que separa, diferencia, discerne (o dizer).7 A dis-posição do analista responde a uma su-posição em que o objeto é o objeto que prepara a sua de-su-posição do saber no final da análise. Por vezes, ela permite pro-posições que são atos.

A disponibilidade do analista encontra sua expressão na regra fundamental enunciada por Freud, a da atenção igualmente em suspenso, a gleichschwebende Aufmerksamkeit.8 Nessa expressão, o gleich implica uma continuidade (a atenção) enquanto o schwebend se aproxima mais de uma descontinuidade (o suspenso). É na verdade uma regra de in-atenção, tal como entendeu Theodor Reik em Le psychologue surpris. Relaxando a sua atenção, desviando-a de um ponto fixo, esperado, voluntário, colocando-se em estado de inatenção, o analista se torna receptivo ao Einfall, à ideia súbita, à surpresa que é característica do inconsciente. "Este processo de relaxamento momentâneo da atenção e do desvio de interesse em outras direções com o retorno consecutivo do objeto prepara a surpresa" (REIK, 1976, p. 75-78). A regra visa impedir que possamos compreender muito rápido os dizeres do analisante e colocá-los em pequenas caixas interpretativas já prontas; a regra favorece a receptividade da surpresa do discurso, inclusive as que vêm do analista, como em caso de lapso auditivo (Verhören) que revela o dizer no que foi ouvido (CLAVURIER, 2003).

Muito mais que uma regra técnica, trata-se, podemos ver, de uma posição ética fundada no aparecimento repentino descontínuo, ao imprevisto, sem que esperemos, das formações do inconsciente. Elas aparecem repentinamente e desaparecem logo que aparecem, na estrutura temporal da escansão, da batida de uma abertura (LACAN, 1979, p. 33).

A regra da atenção igualmente em suspenso se aproxima da regra à qual Descartes se submeteu, de colocar em suspenso os saberes constituídos e de onde surgiu o cogito enquanto uma espécie de Einfall, muito mais como um julgamento dedutivo; é o que o torna vizinho do sujeito do inconsciente, permitindo ser retomado por Lacan.

A atenção igualmente em suspenso dos saberes constituídos é, então, um fundamento do savoir-faire. Neste sentido o savoir-faire não se trata de uma soma de saberes de experiência. Ele visa o contrário, ir contra as armadilhas da compreensão ligada à experiência. O savoir-faire se revela nessa direção tal como um savoir-ne-pas-faire (saber-não-fazer), uma suspensão do savoir-faire. A atenção igualmente em suspenso tem uma função de corte, logo, de pontuação, que dará sentido ao discurso. Ela é a colocação em ato do silêncio, e ela é da mesma ordem da pontuação na sessão.

Ressaltamos que François Jullien aproximou a disponibilidade freudiana àquela que constitui a base da sabedoria chinesa, para quem a disponibilidade é "uma disposição sem posição adotada", que leva a um desprendimento progressivo. "O "conhecimento" chinês é não tanto buscar ter uma ideia do que se torna disponível à "(cf. Xunzi, chap. "Jiebi")" (JULLIEN, 2012, p. 36-42). A distância entre a psicanálise e a sabedoria, chinesa ou não, continua preservada, mas a reconciliação com esse ponto merece nossa atenção... suspensa.

A referência à atenção igualmente suspensa nos permite afirmar que o savoir-faire se apoia essencialmente no manejo do tempo assim como no manejo do dizer. Os dois estão relacionados (LACAN, 1977).9 Não basta que uma intervenção na análise seja exata, justa. Ela deve ocorrer no bom momento e ser colocada de uma boa maneira. Sabemos que Freud nos lembra o provérbio dizendo que o leão salta somente uma vez (FREUD, 1975, p. 234); todavia, não se trata de todas as interpretações, trata-se daquelas que são "violentas" na questão da fixação de um termo na análise (o que Freud fizera com o Homem dos lobos).

Mesmo sem se tomar por um leão, o analista sabe que o efeito de uma intervenção de sua parte depende de sua posição na transferência e do tempo lógico em que ele se situa. O termo suspenso nos leva diretamente ao tempo lógico, pois é após duas escansões suspensivas que a asserção de uma certeza pode ser enunciada. Ela é então antecipada na pressa, no momento de concluir que está articulado ao instante de ver e ao tempo por compreender (ao qual podemos assimilar a perlaboração freudiana).

Se a compreensão daquilo que é dito em análise deve ser colocada em suspenso, é porque, assim como no tempo lógico, ela se funda em uma não compreensão, que encontrará o seu término somente na antecipação, na pressa do momento de concluir. Ela acontece no après-coup do momento de concluir.

Não basta pronunciar a palavra kairos para saber captar o bom momento da interpretação. Existem vários kairos no tempo lógico. O leão salta várias vezes, de maneira diferente, segundo os tempos lógicos e a topologia que correspondem a ele, o que Lacan identificou à garrafa de Klein (LACAN, 1965). Na relação do sujeito ao Outro, em que a garrafa de Klein oferece uma costura possível, o espaço se encontra em duas dimensões, e o tempo, em três. A sincronia do momento de ver é a da linguagem como sistema; a diacronia do tempo para compreender é a da progressão circular da demanda em torno daquilo que produz um furo, progressão onde o sentido se inverte em um momento; enfim, o momento de concluir em torno do furo é aquele de uma identificação que não se encontra fundada numa identidade em si, mas o contrário, numa incomensurabilidade ao um.

O suspenso que determina o tempo da interversão da análise opera também, necessariamente, em sua maneira de dizer. Ele não deve dizer muito, nem de uma maneira qualquer; a interpretação deve ser ágil.

Em nenhum caso uma intervenção analítica deve ser teórica, sugestiva, ou seja, imperativa, ele deve ser equivocada. A interpretação analítica não é feita para ser compreendida; ela é feita para produzir ondas. Então devemos buscar ser discretos e nos lembrar que é melhor calar-se; basta somente escolher (LACAN, 1976, p. 35).

Além do senso, a interpretação nos remete à distinção do dito e do dizer. "Eu não te faço dizê-lo. Não reside aí um mínimo de intervenção interpretativa?" (LACAN, 2003, p. 492).

Após a introdução do termo lalíngua em novembro de 1971,10 Lacan cerne ainda mais a maneira pela qual os analistas podem intervir. Lalíngua tece as palavras e os sintomas, ela é composta do "integral dos equívocos que uma história deixa persistir" de uma língua entre outras assim que de uma parte de gozo fálico (LACAN, 11 jun. 1974). Lalíngua inclui a dita língua materna com uma parcela estritamente individual. É por essa razão que "a interpretação deve sempre — da parte do analista — levar em conta que naquilo que é dito, existe o sonoro, e que este sonoro deve consonar com aquilo que dele é de inconsciente" (LACAN, 1976, p. 50).

De outra maneira, é em função da lalíngua que em Les non-dupes errent Lacan situa novamente a atenção igualmente em suspenso:

[…] colocarmo-nos neste estado dito pudicamente de atenção flutuante que faz com que justamente quando o parceiro, lá, o analisante, ele mesmo emite um pensamento, nós podemos ter um outro, o que é um feliz azar de onde se produz um flash; é justamente lá onde a interpretação pode se produzir; quer dizer que, devido ao fato de termos uma atenção flutuante, nós escutamos o que ele diz muitas vezes do fato de uma espécie de equívoco, quer dizer, de uma equivalência material. Nós percebemos o que ele disse — percebemos, pois somos submetidos a isso — que isto que ele disse poderia ser escutado de forma completamente atravessada. E é justamente o escutando de forma completamente atravessada que permitimos que ele perceba de onde vêm seus pensamentos, sua semiótica, de onde ela emerge: ela emerge de nada além do que a ex-istência (ek-sistence) da lalíngua. Lalingua ex-iste, ex-iste em outros lugares além dos quais ele acredita ser seu mundo (LACAN, 11 jun. 1974)

 

Savoir-faire do analisante, savoir-faire com a lalíngua

Chegando neste ponto, devemos nos perguntar se não deformamos nossa aproximação do savoir-faire privilegiando a parte do analista e desse fato favorecendo uma linha muito próxima de uma habilidade deste último em passar sua "direção" da cura para o progresso da análise, a fim de obter aquilo que Freud chama de "a convicção certa da existência do inconsciente" (FREUD, 1975, p. 264) e para "realizar o trabalho psíquico que irá conduzir [o paciente] necessariamente a melhorar de maneira durável sua condição psíquica" (FREUD, 1975, p. 58).

O savoir-faire também não deve se situar do lado do analisante ? E, além disso, não seria de situá-lo do lado de uma subjetividade, seja ela do analisante ou seja ela do analista?

O que temos que aprender com o analisante de seu próprio savoir-faire é, na verdade, o que Lacan evoca inúmeras vezes. Por exemplo, em suas conferências nos Estados Unidos:

[...] é com meus analisantes que aprendo tudo, que aprendo o que é a psicanálise. Eu empresto a eles minhas intervenções, e não meus ensinamentos, exceto se eu sei que eles sabem perfeitamente o que isto quer dizer (LACAN, 1976, p. 34).

Em seu seminário sobre os problemas cruciais da psicanálise, ele é ainda mais preciso:

Trazer o paciente a seu fantasma original, não é fazê-lo aprender: é aprender dele como fazer. O objeto a e sua relação, em um caso determinado, à divisão do sujeito é o paciente que sabe fazer e nós estamos no lugar dos resultados na medida em que os favorecemos (LACAN, 19 maio 1965).

Se existe um savoir-faire do analista, ele consiste em favorecer o resultado, que é o analista, resultado do savoir-faire do analisando.

Passando do fantasma ao sintoma, Lacan considera em seguida o fim da análise como um savoir-faire do analisante, um "saber fazer com o seu sintoma", um "saber lidar com ele, saber manipulá-lo", "algo que corresponde ao que o homem faz com a sua imagem" (LACAN, 2004, p. 49-50). "Manipulá-lo": ainda é preciso tato.

É um savoir-faire com o seu sintoma que encontra o limite de uma identificação ao sintoma, que se pode definir como o limite que encontra a análise do sintoma, seja ele um limite às substituições que dão suporte ao sintoma como metáfora. É um limite aos confins do simbólico e do real; ele chega até a análise do sintoma e faz borda no real do traço unário, quer dizer, no "mesmo", nisso que ocupa o mesmo lugar, que se sobrepõe, segundo o fecho duplo (la double boucle) deste. Lá se efetua, entre gozo e saber, uma transformação de litoral a litoral com um depósito, uma precipitação da letra do sintoma (PORGE, 2010, p. 118-119, 128-129, 133, 154).

A virada nesse passe é o próprio lugar do savoir-faire. E lá ele tem algo a fazer com a lalíngua:

Lalíngua é o que permite o querer (anseio), consideramos que não é por acaso que assim seja o quer de querer, terceira pessoa do indicativo, que o não (non) negativo e o nome (nom) nominativo também não são por acaso; nem que deles (d'eux) (d apostrofo antes deste eles [eux] que designa aqueles dos quais se fala) seja feito da mesma maneira que o numero dois (deux), também não é por acaso e muito menos arbitrário, como diz Saussure. O que se deve conceber aí é o depósito, o aluvião, a petrificação que se marca a partir do manejo por um grupo de sua experiência inconsciente (LACAN, 1974, p. 189).

Existe uma questão importante, que curiosamente não perguntamos nunca, que é esta do significado deste "não é por acaso", que Lacan repete também em um outro texto.11 Ele não volta a uma etimologia comum. Então o quê? Se não é por acaso, é porque há uma razão. Qual razão? A réson, esta que ressoa, segundo as palavras de Francis Ponge, revisitado por Lacan que vai até questionar: "Isto que ressoa é a origem da re (res) com a qual fazemos a realidade?" (LACAN, 2011, p. 93). Um eco, uma ressonância primitiva, uma unidade que seria fixada e multiplicada em várias palavras. Um eco12 teria enviado uma ressonância comum (comme une) a várias palavras, a vários sons. Trata-se de um processo que nos faz pensar naquele de Jean-Pierre Brisset (que inspira Marcel Duchamp). Em A ciência de Deus ou a criação do homem, ele escreve que "a origem de cada língua está nesta língua mesma e define assim "a grande Lei ou chave do discurso":

Existem no discurso inúmeras Leis, desconhecidas até agora, entre as quais a mais importante é a que um som ou uma cadeia de sons idêntica, inteligível e clara, possa exprimir coisas diferentes, por uma modificação na maneira de escrever ou de compreender esses nomes ou palavras. Todas as ideias enunciadas com sons semelhantes têm uma mesma origem e se relacionam todas, dentro de seu princípio, a um mesmo objeto.
São eles os seguintes sons:
Les dents, la bouche (os dentes, a boca)
Les dents la bouchent. (os dentes a entopem)
L'aidant la bouche. (ajudando a boca)
L'aide en la bouche. (a ajuda na boca)
Laides en la bouche. (feios na boca)
Laid dans la bouche. (feio na boca)
Lait dans la bouche. (leite na boca)
L'est dam le à bouche. (é a barragem à boca)
Les dents-là bouche (os dentes la na boca)13
BRISSET, 2001, p. 702)

A mudança para a ciência-ficção aparece quando Brisset afirma que a origem do discurso é feita apenas da criação do homem e que "pela análise das palavras iremos então escutar falar dos ancestrais que vivem em nós e por quem vivemos", estes ancestrais sendo os sapos e as rãs que coaxam, o coá, coá transformando-se no quoi? quoi? (o quê? O quê?) humano.

Como nota Michel Foucault, "estamos no oposto do processo que consiste em procurar uma mesma raiz para várias palavras: trata-se, por uma unidade atual, de ver proliferar os estados anteriores que vieram cristalizar-se nela". "A pesquisa de sua origem, segundo Brisset, não cinge a língua: ela a decompõe e a multiplica por ela mesma". É um princípio de proliferação.

Uma palavra é o paradoxo, o milagre, o maravilhoso azar de um mesmo som que, por razões diferentes, por pessoas diferentes, vivendo coisas diferentes, é retido ao longo de uma história. É a série improvável do dado que, sete vezes seguidas, cai do mesmo lado. Pouco importa quem fala, e, quando fala, por que fala, e utilizando qual vocabulário: os mesmos barulhos, invariavelmente, retidos (FOUCAULT, 2001, p. 604-606).

A ex-istência (ek-sistence) dessa lalíngua faz borda com o delírio. Este pode encontrar seu suporte mas também uma forma de limite se nos referimos a Schreber, que quer tornar as vozes dos pássaros milagrosos como um sentimento autêntico fazendo-os entrar no painel da homofonia, ou ainda a Louis Wolfson, que se serve também da lalíngua (o entrelínguas) para tentar, e conseguir relativamente, fazer barragem às suas vozes.

Essa função de limite ou de borda da lalíngua não é sem relação com a função da letra como Lacan a faz evoluir, especialmente no que faz mudança no litoral, entre saber e gozo, literalmente (LACAN, 2003, p. 16). Precisamente, na passagem citada acima, Lacan fala de "depósito" e de "petrificação" em relação à lalíngua.

O termo "depósito" já aparecia no L'étourdit (LACAN, 2003, p. 490). Ele se relaciona com a "precipitação" da letra, que também aparece na La troisième: "Não há letra sem a lalíngua [...]. Como é que a lalíngua pode se precipitar na letra? Isto continua como questão" (LACAN, 1974, p. 194).

Talvez a resposta se encontre na Conferência de Genebra sobre o sintoma: Lacan recorre à metáfora do coador (já presente em Kant) que peneira o escoamento da água da lalíngua, depositando os detritos, os pedaços de significantes aos quais a linguagem se amarra, o coador causando as precipitações de letras, de traços unários na lalíngua. A passagem de uma língua a outra, o passe, seria variações do coador da letra, que por seus buracos deixa passar o Um, o S1, o traço unário incarnado na lalíngua e que continua indeciso entre fonema, palavra, frase ou em todo o pensamento, este Um que o pedaço de barbante de um nó borromeu suporta (LACAN, 1982, p. 131).

No final de seu Seminário Mais, ainda, Lacan já avançava que:

A linguagem sem duvida é feita da lalíngua. É uma elocubração de saber sobre a lalíngua. Mas o inconsciente é um saber, um savoir-faire com a lalíngua. E isto que sabemos fazer com a lalíngua ultrapassa de muito o que podemos nos dar conta a título de linguagem (LACAN, 1982, p. 127).

Desse ponto de vista, podemos dizer que Louis Wolfson procede a uma tentativa de domar a lalíngua e que ele tem sucesso ao identificá-la a seu sintoma (WOLFSON, 1970).

"Isto que sabemos fazer com a lalíngua" pertence tanto ao analisante quanto ao analista, e mesmo mais ao analisante que ao analista, pois é ele quem fala. O analista pode querer se dar conta a título da linguagem, mas ele será sempre ultrapassado pela lalíngua do analisante. E se ele mesmo fala, ele torna-se novamente analisante. Um analisante que pode eventualmente produzir do analista... para o analisante.

O savoir-faire é atado ao parlêtre, esse que fala sem ser, pois seu ser só se retém à palavra. A análise permite ao analista aprender algo de um savoir-faire do analisando, do savoir-faire com a lalíngua que ele (o analista) escuta e age (o analisante).

O savoir-faire é possível, mas esse possível se mostra necessário; seu objeto é esquivo, ele é um fio com o qual se delimita o objeto.

Longe de ser herdeiro da experiência, o savoir-faire vai contra a experiência, ele é antes de qualquer coisa um saber-não-fazer e um não saber fazer ligado à experiência. Ele é uma suspensão do saber e do fazer, momento de sua escansão. Ele é um saber des-fazer (o que é chamado de análise). Desfazer a submissão ao sentido. Ele é o que de mais íntimo da prática toca ao mais real do inconsciente como o impossível a dizer nos dizeres que falam dele.

 

Referências

BRISSET, J.-P. La science de Dieu ou la création de l'homme (1900). In: ______. Œuvres complètes. Direção de M. Décimo. Dijon: Les presses du réel, 2001. p. 702.         [ Links ]

BRISSET, J.-P. Repris dans Les origines humaines (1913). In: ______. Œuvres complètes. Direção de M. Décimo. Dijon: Les Presses du Réel, 2001.         [ Links ]

CHENG, F. Le génie du trait. Paris: Phébus, 1986.         [ Links ]

CLAVURIER, V. Psychopathologie de la vie quotidienne et savoir-faire (hören) de l'analyste. In: Essaim, n. 11. Toulouse: Erès, printemps 2003.         [ Links ]

COLLINS, W. La robe noire. Paris: Éd. du Masque, 2012.         [ Links ]

FOUCAULT, M. "7 propos sur le 7e ange" (1970). In: DÉCIMO, M. Jean-Pierre Brisset, prince des penseurs, inventeur, grammairien et prophète. Dijon: Les Presses du Réel, 2001. p. 604-606.         [ Links ]

FREUD, S. A dinâmica da transferência (1912). In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Direção-geral da tradução de Jayme Salomão. Rio de Janeiro, Imago, 1974, v. XII.         [ Links ]

FREUD, S. Análise terminável e interminável (1937). In: Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Direção-geral da tradução de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1975, v. XXIII.         [ Links ]

JULLIEN, F. Cinq concepts proposés à la psychanalyse. Paris: Grasset, 2012. p. 36 e p. 42.         [ Links ]

LACAN, J. Conférence à Genève sur le symptôme. In: Le bloc-notes de la psychanalyse, n. 5. Genève, 1985.         [ Links ]

LACAN, J. Conférences et entretiens dans les universités nord-américaines. Scilicet 6/7. Paris: Le Seuil, 1976.         [ Links ]

LACAN, J. Je parle aux murs. Paris: Le Seuil, 2011.         [ Links ]

LACAN, J. L'identification, 1961-1962. Seminário inédito.         [ Links ]

LACAN, J. L'insu que sait de l'une-bévue s'aile à mourre. L'Unebévue, Paris, n. 21, Ecole Lacanienne de Psychanalyse, 2004.         [ Links ]

LACAN, J. La troisième, Lettres de l'École Freudienne. Boletim interno da École Freudienne de Paris, n. 16, nov. 1974.         [ Links ]

LACAN, J. Le moment de conclure (1977). Inédito: "Le dire a affaire avec le temps".         [ Links ]

LACAN, J. Seminario Les non-dupes errent (1974). Inédito.         [ Links ]

LACAN, J. Lituraterra. In: ______. Outros escritos. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 15-25.         [ Links ]

LACAN, J. O seminário, livro 11: Os quatros conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1979.         [ Links ]

LACAN, J. O seminário, livro 20: mais, ainda (1975). Rio de Janeiro: Zahar, 1982.         [ Links ]

LACAN, J. O seminário, livro 8: a transferência (1960-1961). Rio de Janeiro: Zahar, 1992. (Aula de 1º mar. 1961).         [ Links ]

LACAN, J. Problèmes cruciaux pour la psychanalyse, 1965. Seminário inédito.         [ Links ]

LACAN, J. Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da Escola. In: ______. Outros escritos. Tradução de Vera Rbeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 2003. p. 248-264.         [ Links ]

LACAN, J. O Seminário RSI (1974). Inédito.         [ Links ]

LOEWENSTEIN, R. Remarques sur le tact dans la technique psychanalytique. In: Revue française de psychanalyse, 1930-1931, republicado em Figures de la psychanalyse, n. 15. Toulouse: Erès, 2007.         [ Links ]

MARINELLI, L. et MEYER, A. Rêver avec Freud. L'histoire collective de L'interprétation du revê. Paris: Aubier, 2009.         [ Links ]

PLON, M. "Au-delà" et "en deçà" de la suggestion. Frénésie, n. 8. Paris: Éd. Frénésie, automne 1989.         [ Links ]

PORGE, E. Jacques Lacan, psychanalyste et passeur de discours. In: Revue de psychanalyse, n. 11, Paris, École de Psychanalyse des Forums du Champ Lacanien, mai 2012.         [ Links ]

PORGE, E. Lettres du symptôme. Versions de l'identification. Toulouse: Erès, 2010. p. 118-119, 128-129, 133, 154.         [ Links ]

PORGE, E. Voix de l'écho. Toulouse: Erès, 2012.         [ Links ]

REIK, T. Le psychologue surpris. Paris: Denoël, 1976. p. 75-78.         [ Links ]

T'AO, Shih. Propos sur la peinture du moine Citrouille-Amère. Trad. Pierre Ryckmans. Paris: Hermann, 1984, chap. I.         [ Links ]

WOLFSON, L. Le schizo et les langues. Paris: Gallimard, 1970.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
1, Rue Mizon
75015 - Paris/França
Tel. (33)1 43 22 14 44
E-mail: erikporge@hotmail.fr

Recebido: 12/09/2013
Aprovado: 20/09/2013

 

 

SOBRE O AUTOR

Erik Porge
Psicanalista em Paris. Foi membro da EFP (Ecole Freudienne de Psychanalyse) até a sua dissolução. Membro da Associação de Psicanálise Encore. Foi responsável por um CMP (Centro Médico Psicológico) para crianças e adolescentes. Autor de vários livros, traduzidos em outros países, dirige a revista Essaim.

 

 

1 Título original: L'insaisissable objet du savoir-faire dans l'analyse. In: Essaim. Erès, 2013/1, n. 30, p. 9-23.
2 Em 1 de março de 1961, p. 210. Ele recoloca a questão em seu seminário L'insu que sait de l'une-bévue s'aile à mourre, em 17 maio 1977 (LACAN, 2004, p. 124).
3 Termo em francês bévue, que significa engano cometido por ignorância. (N.T.).
4 Ecole de Psychanalyse des Foruns du Champ Lacanien.
5 Publicado em: Champ Lacanien, Revue de Psychanalyse, Paris, n. 11, maio 2012, École de Psychanalyse des Foruns du Champ Lacanien.
6 Termo em francês insu significa "sem se dar conta". (N.T.).
7 Em francês dis. (N.T.).
8 Para esta tradução e seu comentário, cf. PORGE, E. Des fondements de la clinique psychanalytique. Toulouse: Erès, 2008, chap. V.
9 Le moment de conclure, 15 nov. 1977. Inédito: Le dire a affaire avec le temps.
10 LACAN, J. Séminaire Le savoir du psychanalyste (O saber do psicanalista). Esse seminário foi feito na capela de Sainte-Anne, no mesmo ano mas em alternância com o Seminário …Ou pire, que aconteceu na Faculdade de Direito do Panthéon. Jacques-Alain Miller achou melhor publicar, no Seuil, em 2011, uma parte do Savoir du psychanalyste, à parte, sob o título Je parle aux murs (Eu falo aos muros) e de incluir o outro no Seminário …Ou pire, o que mistura as pistas de leitura para os dois seminários. C.f; editorial no site de Essaim. Por um estudo das questões levantadas sobre o termo "lalangue", cf. Dominique Simonney, "Lalangue en questions", Essaim, n. 29, outono 2012. Esse número se intitula precisamente Ce qu'on doit à lalangue (O que devemos à lalingua) e contém vários outros artigos sobre o tema, de Jean-Pierre Cléro, Frédéric Pellion, Simone Wiener, Mary McLoughlin, Paul Henry, Paul Alérini.
11 LACAN, J. Conférence à Genève sur le symptôme (Conferência à Genebra sobre o sintoma), Le bloc-notes de la psychanalyse, n. 5, Genève, 1985, p. 12: "Ce n'est pas du tout au hasard que dans lalangue quelle qu'elle soit dont quelqu'un a reçu la première empreinte, un mot est équivoque. Ce n'est certainement pas par hasard qu'en français le mot ne se prononce d'une façon équivoque avec le mot nœud. Ce n'est pas du tout par hasard que le mot pas, qui en français redouble la négation contrairement à bien d'autres langues désigne aussi un pas".
12 Cf. PORGE, E. Voix de l'écho. Toulouse: Erès, 2012.
13 BRISSET, J.-P. La science de Dieu ou la création de l'homme (1900), dans Œuvres complètes, sous la direction de M. Décimo, Dijon, Les Presses du Réel, 2001, p. 702. Repris dans Les origines humaines (1913), dans Œuvres complètes, op. cit., p. 1130.