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Estudos de Psicanálise

versão impressa ISSN 0100-3437

Estud. psicanal.  no.45 Belo Horizonte jul. 2016

 

 

Quando o Édipo não é o destino: pensando o fenômeno transexual como possibilidade identificatória e de existência psíquica1

 

When Oedipus isn’t destiny: rethinking the transsexual phenomenon as an identificatory possibility and of psychical existence

 

 

Rodrigo Zanon de Melo

I Círculo Brasileiro de Psicanálise - Seção Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O artigo tem como objetivo explorar o fenômeno transexual sob a perspectiva identitária, pensando a transexualidade como possível forma de “existência psíquica” nos casos em que não ocorre a possibilidade da vivência edipiana. Subvertendo assim o modelo clássico psicanalítico de identificação edípica para um modelo identificatório pré-edípico pela identidade de gênero. Na primeira parte abordamos o fenômeno transexual, explorando a produção teórica do psicanalista Robert Stoller. Em seguida analisamos um fragmento de caso clínico que nos permitiu pensar, diante de uma sintomatologia característica da clínica dos estados limite, a transexualidade, aparecendo como forma de existir psiquicamente. Um espaço de possibilidade, trabalhando assim o fenômeno transexual fora do registro patológico.

Palavras-chave: Transexualidade, Existência psíquica, Identificação, Vivência pré-edípica, identidade de gênero


ABSTRACT

This paper purposes to explore the transsexual phenomenon through an identitary perspective. Transsexuality is thought as a possible way for a ‘psychical existence’ in instances where there is no possibilty of an oedipic experience. So the classical psychoanalytical model of an oedipic identification is subverted to a preedipical identificatory one through gender identity. First there is a short presentation on transsexuality, were the theme will be shown through the theorical construction of Robert Stoller. Then we’ll present a short piece from a case where, viewed through borderline clinics, transsexuality appears as a way of psychically living. Thus the transexual phenomenon will be labored outer a pathologic registry.

Keywords: Transsexuality, Ppsychical existence, Identification, Preedipic experience, Gender identity.


 

Alguém poderia se perguntar
o que significa afinal ‘abrir possibilidades’,
mas provavelmente não seria alguém
que tenha percebido a vida no mundo social como ‘impossível’,
ininteligível, irrealizável, irreal e ilegítima.

JUDITH BUTLER

 

Transexualidade: uma breve introdução

A transexualidade é um fenômeno múltiplo que interroga as noções de identidade sexual, normalidade e patologia. Nos transexuais, o sentimento de identidade sexual não concorda com sua realidade anatômica: existe a sensação (ou, mais precisamente, a convicção inabalável) de habitar um corpo que não lhes é próprio, fruto da incompatibilidade entre sua anatomia e o que sentem ser. Sobre o fenômeno transexual podemos pensar que:

O transexualismo não é um estilo ou uma preferência. Não é tampouco um ato de sexo. É uma convicção apaixonada, para toda a vida, inabalável, e nenhum legítimo transexual pode ser convencido do contrário (MORRIS apud SOLOMON, 2012, p. 694).

No presente artigo utilizamos o termo “transexualidade”, reiterando a abordagem despatologizadora proposta pelo trabalho. A palavra “transexualismo”, em razão do sufixo “ismo”, sugere uma conotação patológica ao fenômeno transexual. Porém, a palavra será mantida no original quando retirada de citações ou pensamentos de outros autores.

Nossa análise se fez sobre a transexualidade masculina (quando o sexo, corpo biológico de origem é masculino, porém sua identidade de gênero é feminina), fenômeno que nos proporcionou explorar a questão identificatória pré-edípica, colocando em xeque o modelo clássico de identificação em psicanálise. Esse modelo se caracterizaria como o resultado da passagem pelo Édipo tanto para o menino quanto para a menina:

O período edipiano constitui o momento organizador tanto da formação da identidade quanto da bissexualidade psíquica. Esta última é central nos destinos edípicos, pois os libera de toda e qualquer forma de determinismo biológico (FREUD, 1923). À medida que a diferença dos sexos se afirma, a bissexualidade se virtualiza: persistir na reivindicação bissexual equivale a recusar a diferença dos sexos. Passado o período edipiano, o sujeito acederá, na maioria dos casos, a uma identidade “monossexual” em harmonia com o seu sexo anatômico (CECCARELLI, 2013, p. 134-135).

O psicanalista Robert Stoller, em seu importante trabalho A experiência transexual ([1975] 1982), apresentou conceitos fundamentais para pensarmos a transexualidade fora do registro patológico. Stoller trouxe para a psicanálise a ‘noção’ de gênero, ao estudar a transexualidade diferenciando sexo de gênero.

Para o autor o sexo (no sentido anatômico) se diferencia da identidade, no sentido social ou psíquico, e gênero e sexo não necessariamente são correspondentes. A identidade de gênero se expressa pela convicção de pertencer a este ou àquele sexo e não é inata; é adquirida precocemente: entre os dois e os três anos o sentimento de ser homem ou mulher já está estabelecido.

Segundo o autor a identidade de gênero se constitui em várias etapas, das quais as mais fundamentais são pré-edipianas, ou seja, não conflitantes.

A identidade diz respeito à formação do gênero, enquanto a identificação, em psicanálise, é comumente usada para designar a atividade inconsciente, no processo edípico, de apropriação de aspectos de um dos genitores (PORCHAT, 2014, p. 40).

Seguindo esse pensamento, apresentamos um pequeno fragmento clínico que nos possibilitou explorar essa ideia, considerando a transexualidade como um sentimento de existência psíquica, uma possibilidade identificatória, pela identidade de gênero.

Assim, diante de características da clínica dos estados limite, o desejo em se transexualizar manifestado pela paciente aparece como uma possibilidade, uma saída diante da sintomatologia apresentada.

 

Um pouco de história

Em 1952, um jovem americano de vinte e oito anos, George Jorgensen, foi a primeira pessoa a se submeter a uma operação de transgenitalização. A cirurgia foi realizada na Dinamarca pela equipe do médico Christian Hamburger. O tratamento hormonal e cirúrgico forneceu ao jovem uma aparência feminina completa, e George passa a se chamar desde então Christine. Seu caso ganhou grande projeção midiática e, em 1954, Christine, ex-herói do exército americano, foi eleita a “mulher do ano” (CASTEL, 2001 apud PERELSON, 2011).

Em 1953, ano seguinte ao da cirurgia de George e antecedente ao da eleição de Christine como “mulher do ano” pelas mãos do endocrinologista Harry Benjamin, o fenômeno do transexualismo é isolado e batizado como tal.

Ainda hoje a maior parte dos profissionais que trabalha com transexuais segue o protocolo Harry Benjamin: exigem que antes da cirurgia ou do tratamento hormonal o paciente viva com seu gênero de escolha durante pelo menos um ano, que faça psicoterapia durante o mesmo período e que dois clínicos recomendem os procedimentos médicos (SOLOMON, 2012).

O termo “transexualismo” em 1967, aparece no Index medicus sob rubrica própria. Até essa data estava classificado como “desvios sexuais”. Em 1975 o termo é adotado pelo CID 9 sob o código F.64 (Transtorno de identidade sexual). Já 1980 o termo “transexualismo” aparece no DSM III (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana) como distúrbio da identidade sexual já apresentando “a esquizofrenia como critério de exclusão”.

Na ocasião da revisão do DSM III, em 1987, alguns critérios diagnósticos são modificados assim: “o paciente não deseja mais se livrar de seus órgãos genitais, mas de seus caracteres sexuais primários e secundários” (HERGOTT, 1996, apud PERELSON, 2011):

Alguns profissionais optam por designar como transexuais somente aqueles que se submeteram aos tratamentos hormonais e à cirurgia de redesignação sexual; outros consideram que mesmo os candidatos a tais intervenções médicas poderiam ser designados pelo mesmo termo [...] Pode-se dizer que existem transexuais que não exigem passar por tais procedimentos – para alguns, já basta a alteração de prenome civil, por exemplo –, assim como há sujeitos que os solicitam e nem por isso podem ser diagnosticados como tal (COSSI, 2011, p. 43).

Em 1994, o DSM-IV abandona o termo “transexualismo” e o substitui por Transtorno de Identidade de Gênero. No DSM-V (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Psiquiátrica Americana) ocorreu a retirada da nomenclatura Transtorno de Identidade de Gênero e mudança para Disforia de Gênero. E no CID 10 (Classificação Internacional de Doenças) a transexualidade está descrita como: Transexualismo (F-64.0) Transtorno de identidade sexual. Categoria: Transtornos da identidade sexual [F64].

Entre as diversas formas de critérios clínicos para o diagnóstico e o tratamento da transexualidade, a primeira é o Manual de diagnósticos e estatísticas,1994, da Associação Americana de Psiquiatria; a segunda é o Guidelines for the treatment os transsexuals (Diretrizes para o tratamento de transexuais, 1995), da Associação Harry Benjamin, e a terceira fonte são orientações clínicas estabelecidas pelos diversos comitês de identidade de gênero (RAMSEY, 1998).

Penso que, em se tratando de uma problemática identitária, o que caracteriza o transexual é o fato de não se sentir pertencente ao sexo biológico. Na maioria dos casos, o transexual não investe no órgão sexual de origem, porém em alguns casos pode ocorrer o investimento no órgão, o que não descaracteriza a transexualidade. Assim sendo o fenômeno transexual, não está necessariamente atrelado à cirurgia de redesignação/readequação sexual.

 

Transexualidade e psicanálise

Tratando-se de um fenômeno tão plural, em que a singularidade de cada caso deve ser levada em consideração, a psicanálise poderia ser de grande contribuição para a temática.

Porém, o discurso psicanalítico predominantemente lacaniano trabalha a transexualidade como uma psicose, ou como a psicanalista Collete Chiland, que considera a transexualidade como uma “doença do narcisismo”, baseando-se na evidência de que o transexual somente constrói o seu self ou sentimento de existir identificando-se com o sexo oposto. Para a autora o não reconhecimento dessa crença é vivenciado como uma ameaça (CHILAND apud ÁRAN, 2009).

Inicialmente, do ponto de vista psicanalítico, os transtornos da identidade sexual de gênero levaram a princípio a rubrica da nosografia psiquiátrica do começo do século XX, seguindo um critério prevalentemente descritivo e fenomenológico.

Nessa época o debate sobre transexualismo na teoria psicanalítica estava fortemente marcado pela interpretação freudiana do Caso Schreber (FREUD, [1911] 2006) que, em certa medida, tinha como referência a relação entre homossexualidade e paranoia.

Áran (2006) afirma:

Um marco decisivo nesta compreensão foram os Três ensaios para uma teoria sexual, escrito por Sigmund Freud em 1905. Apesar de Freud não se referir especificamente à transexualidade neste texto, ele inaugura uma nova forma de pensar a relação entre pulsão sexual e cultura, que vai influenciar todas as teorias sobre sexualidade desde então. Para Freud, não existe necessariamente uma correspondência entre pulsão e objeto, já que este último adquire um caráter variável. Neste sentido, as possibilidades subjetivas se fazem de acordo com a contingência da experiência com o outro, a qual sempre será determinada pelos contextos históricos e sociais (ÁRAN, 2006).

Lacan, em parte herdeiro dessa tradição, mesmo considerando as diferenças entre o transexualismo e a compreensão psiquiátrica da psicose, argumenta que o discurso transexual estaria baseado na certeza delirante em relação à identidade e no desejo incontornável de “mudar de sexo”. Nesse sentido, não tendo o Édipo, o recalque e a falta como operadores organizativos, o transexualismo seria uma forma específica de psicose (ÁRAN, 2006).

Segundo Millot (1992), ao comentar o caso Schreber, Lacan sustentava que o delírio de Schreber de se transformar em uma mulher era decorrente da foraclusão do Nome-do-Pai. (mecanismo defensivo psicótico). Não em uma mulher, do lado do não-toda, o que resulta que nenhuma mulher é toda, inteiramente mulher, que nenhuma vale por todas as mulheres. A posição do transexual consiste em se querer toda, inteiramente mulher, mais mulher que todas as mulheres e valendo por todas.

Segundo Czemark (2006):

[...] o empuxo à mulher é comum a toda psicose. Frente ao Nome-do-pai foracluído, constrói-se uma metáfora delirante como suplência. Ser A mulher, justamente aquela que não existe, para assim se tornar Todo, Todo em um (CZEMARK, 2006, p. 148 apud COSSI, 2011, p. 138).

Ao avançar em sua obra, Lacan adotará o real como referência, o que tornaria possível tornando cogitar um gozo próprio na transexualidade, desatrelado das estruturas clínicas. Considerando as múltiplas modalidades de gozo e que cada um tem direito ao seu, podemos pensar dentro do universo transexual várias modalidades de gozo acessíveis. (COSSI, 2011).

Porém, o discurso patologizante acerca do fenômeno transexual permanece entre a maioria de autores lacanianos, entre eles, Henry Frignet (2002), M. Czermak (1986), Caherine Millot (1992) e Joël Dor (1987).

Já para Stoller, a transexualidade está fora do registro das psicoses; é uma problemática da identidade sexual e pode ser estudada a partir da mais tenra infância.

Segundo Millot, “[...] devemos a Robert Stoller a tentativa de resgatar uma estrutura distinta do transexualismo” (MILLOT, 1992, p. 43).

 

Stoller e a transexualidade

Robert J. Stoller, psiquiatra e psicanalista americano, é considerado o maior especialista americano em transexualidade e o teórico responsável por ter trazido para a psicanálise a noção de gênero (gender), proposta inicialmente por John Money. Sua obra é passagem obrigatória em relação à pesquisa sobre o transexualismo.

Stoller criou a Gender Identity Research Clinic em Los Angeles e apresentou teses inovadoras (e muito contestadas) a respeito das formas modernas da sexualidade humana, renovando as interrogações freudianas sobre a identidade sexual, diferença sexual e a sexualidade em geral (ROUDINESCO; PLON, 1998).

Em 1975 Stoller publica seu livro A experiência transexual onde desenvolveu sua teoria a respeito da dinâmica e da etiologia do transexualismo (principalmente o masculino) definindo a transexualidade como:

A convicção de um sujeito biologicamente normal de pertencer ao outro sexo; no adulto, esta crença é acompanhada, na atualidade, de demandas de intervenções cirúrgicas e tratamentos hormonais, a fim de modificar a aparência anatômica do sexo de origem (STOLLER, 1978, p. 114 apud CECCARELLI, 2013, p. 49).

Sob o ponto de vista transgeracional, o autor concluiu que três gerações são necessárias para produzir um transexual, uma mãe bissexual cronicamente deprimida, apresentando forte “inveja do pênis”. A mãe do transexual teve uma mãe distante, pouco afetuosa, vazia e assim mesmo poderosa. Quando se voltava para o pai em busca de conforto compensatório, novamente se decepcionou (COSSI, 2011).

Para o autor há uma determinada configuração familiar que produz o transexual masculino. Somente com a reunião de quatro fatores ele poderia acontecer. Os fatores são: uma mãe bissexual; pai ausente física e psicologicamente; um longo período de união ininterrupto entre mãe e filho e a beleza especial do menino (STOLLER, [1975] 1982, grifo nosso).

Stoller atribuía a relação inicial entre a criança e a mãe como determinante na questão do transexual. O autor descrevia essa relação como uma relação “privilegiada” com a mãe, marcada pela quase permanência de um contato corporal, apontando o caráter quantitativo dessa relação.

Segundo o autor:

[...] a mais importante diferença entre episódios felizes de uma educação normal e a simbiose que produz o transexualismo masculino é que esta última é infindável. Ele não é voluntariamente interrompido nem pela mãe nem pelo pai (STOLLER, [1975] 1982, p. 49).

A proximidade mãe-filho inicial não é heterossexual, já que a situação e o conflito edipiano ainda não teriam se estabelecido. É só a partir da separação entre eles que o menino pode desejar sua mãe como objeto de amor, e para que tal separação ocorra, é necessária a intrusão de um terceiro – o pai.

No complexo de Édipo, a partir da entrada do pai e da demonstração feita pela mãe de que o pai (e não o filho) é seu objeto sexual, desenvolve-se a hostilidade do filho dirigida para ambos os pais. Consequentemente, diante da castração – e principalmente tendo várias realizações do ego relacionadas à masculinidade ameaçada – o menino abre mão de sua mãe. Opta por preservar não só o símbolo de sua virilidade, o pênis, mas principalmente sua identidade como homem (COSSI, 2011).

Para uma mãe bissexual e cronicamente deprimida, que apresenta uma intensa inveja do pênis e um desejo apenas suprimido de ser homem, seu marido é o único tipo de homem que lhe é possível escolher: um homem distante, passivo, embora não efeminado, que não será um competente marido ou pai.

O pai do transexual não é um rival, é simplesmente como se ele não existisse. A ausência do pai leva à impossibilidade de identificação com ele e com isso à impossibilidade de desenvolvimento da masculinidade. O menino não tem rival em relação à mãe. Stoller aponta uma ausência de conflito edipiano, segundo ele, nos outros meninos se desenvolveria por três elementos:

1. O menino separou-se suficientemente de sua mãe para desejá-la como objeto de seu amor. Sua mãe, embora encoraje isso parcialmente, deixa claro que sua escolha final é um adulto, normalmente o pai.

2. Se o menino se opõe a seu pai, descobre que esse último é mais forte. Talvez o lugar de maior vulnerabilidade para o menino, exceto o medo de ser morto é que ele vá perder sua identidade como homem. Não somente o símbolo desta virilidade, seu pênis, pode assim ser posto em perigo, como também – o que é mais difusamente experimentado – todas as inúmeras realizações do ego que são entendidas como masculinidade podem, da mesma forma, ser ameaçadas.

3. E assim, ele recua no desejo por sua mãe, volta-se para outras mulheres, e aprofunda sua identificação com o pai para solidificar a masculinidade que torne possível não apenas a renúncia, mas também as estruturas psíquicas necessárias para ter êxito como um homem masculino no futuro (STOLLER, [1975] 1982, p. 28).

A mãe do menino transexual é uma mulher que não pôde desenvolver sua feminilidade e tem uma intensa inveja do pênis, colocando seu filho no lugar desse pênis desejado. Essa intensa aproximação com a mãe leva a um desenvolvimento não traumático e não conflituoso de feminilidade no filho. Uma mãe que goza incessantemente de seu filho, ele a satisfaz.

Essas crianças verdadeiros falos da mãe, tem seu ‘destino transexual’ traçado bem cedo, entre dois ou três anos de idade, as vezes, antes (Cecarrelli, 2013, p. 50).

Uma mãe superprotetora, que mascara seu ódio através de uma solicitude excessiva. Se o transexual tem horror a seu pênis, é porque este representa “o espinho cravado na feliz simbiose mãe-filho” (STOLLER, [1975] 1982, p. 28).

Não é o ódio que faz falta à mãe do transexual, mas a impossibilidade de suportar a expressão de sua agressividade com relação a seu filho. Stoller denominava como um ambiente caloroso e amoroso, repleto de inquietudes superprotetoras, nas quais se mesclava invisivelmente sua necessidade de destruir a masculinidade de seu filho “[...] Para a criança, trata-se sem dúvida se ser A mulher que sua mãe não é, pois ela é apenas uma mulher” (MILLOT, 1992).

As mães dos transexuais não danificam o desenvolvimento das funções do ego em geral, ou mesmo do ego corporal, exceto em relação a esse senso de feminilidade. De uma maneira que não está até agora clara, elas permitem a seus filhos sentar, engatinhar, pensar, abstrair-se e relacionar-se com objetos animados e inanimados de forma perfeitamente saudável. Nenhum desses meninos mostrou a menor evidência de psicoses ou precursores de psicoses (STOLLER, [1975] 1982).

A fim de afastar a transexualidade das psicoses, Stoller dedica um parágrafo de seu livro para falar sobre a criação da ilusão na transexualidade, diferenciando da ideia de delírio. Para o autor, a convicção do transexual em sua feminilidade é corretamente descrita pela benigna palavra “ilusão”, ou o processo não é mais patologicamente defensivo quanto o implícito na palavra delírio, assim sendo,

[...] o transexualismo não é tampouco, exatamente uma ilusão, mas talvez possamos mantê-lo nessa categoria, porque o transexual, sendo diferente de uma pessoa delirante, nunca nega a realidade externa (o seu sexo anatômico) (STOLLER, [1975] 1982, p. 31).

Stoller separa esses dois processos, delírio e ilusão, comparando com as diferenças entre a feminilidade transexual (a qual não é produto de trauma psíquico, repressão ou defesa) e a efeminação homossexual, que seria fruto de trauma, em que uma mãe deprimida em sua raiva contra a masculinidade não poderia manter tais afetos fora da educação do filho, cuja virilidade seria um estímulo para a raiva dessa mãe, não importando o quanto ela reprimisse (STOLLER, [1975] 1982).

Aqueles que acreditam que os transexuais sejam psicóticos, devem contrastar esses pacientes com aqueles como Schreber, que sentia que Deus estava transformando seu corpo no de uma mulher: os transexuais não conseguem alucinar uma mudança sexual; por isso é que precisam tomar hormônios e buscar a cirurgia para mudar de sexo. [...] Se for dito que o transexual está reprimindo a sua masculinidade, eu pergunto: quando foi que ela existiu? Que forma ela tomou? (STOLLER, [1975] 1982, p. 31, grifo nosso).

 

Transexualidade feminina: uma breve abordagem

A respeito da transexualidade feminina (sexo biológico feminino, identidade de gênero masculina) Stoller é mais cauteloso quanto à construção de uma teoria – trata-se de caso mais raro que o masculino e tipo ao qual se dedicou menos, o que não o impediu de levantar hipóteses. Aqui, a etiologia lhe parecia mais variável, e a semiologia apresentaria limites menos definidos do que o transexualismo masculino (COSSI, 2011, p. 113).

A transexualidade que interessava a Stoller, que ele considerava verdadeira, a pura transexualidade, seria a transexualidade masculina. Porém, o autor em seu livro A experiência transexual (1982) dedicou-se também ao estudo da transexualidade feminina. Segundo Stoller:

Ninguém, até agora, sugeriu que o transexualismo feminino não seja a mesma condição – exceto pelo fato de ocorrer em mulheres – que o transexualismo masculino. Eu, no entanto, farei isso agora (STOLLER, [1975] 1982, p. 223).

Na transexualidade feminina, o fato de a menina não ter a “feminilidade primordial” para superar levou Stoller à tentativa de num primeiro momento a aproximá-lo do travesti masculino. Mas a ausência do componente exibicionista dos travestis fez com que o autor abandonasse a hipótese. Para o autor a manifestação da transexualidade em meninas é um pouco mais tardia, depois dos três ou quatro anos, tornando-se explícito em torno dos sete ou oito anos.

A etiologia não será mais a mesma: não é o fato de terem ficado na simbiose primitiva com a mãe que as faz transexuais. Essa simbiose acontece no sentido da feminilidade. Na transexualidade feminina sua identificação masculina supõe a participação do pai e forças opostas à feminilidade primeira.

As transexuais encontradas por Stoller não tinham precisamente conhecido a simbiose feliz. As mães dessas pessoas, à época do nascimento de suas filhas, estavam acometidas de depressão ou de doença. Essas mães pouco cuidaram de seus bebês. Mais tarde, o pai se interessou pela criança até então abandonada e fez dela o companheiro de suas diversões, e por vezes de seus trabalhos.

Ele a associa as suas atividades viris. “O amor que ele suscita, assim, toma repentinamente a forma de identificação” (MILLOT, 1992, p. 90).

A hipótese da relação simbiótica com o pai não dura muito. Segundo o autor, é depois de passados os primeiros anos da infância que o pai começa a se interessar pela filha. E a mãe não está ausente como objeto de amor para a menina; além disso, o pai a coloca numa posição de suplência com relação à mãe.

O autor explora também a fantasia transexual feminina de “salvar uma bela mulher desamparada”. Um encorajamento sistemático à masculinidade, da parte do pai, em particular, o autor denomina de shaping (dar forma) (Millot, 1992).

Ceccarelli (2013) afirma:

Stoller sustenta que a filha seria levada a disputar com o pai o lugar de marido. Na idade adulta, o mesmo papel seria reproduzido nos relacionamentos com outras mulheres. A partir destas hipóteses, Stoller conclui que o transexualismo feminino deve ser entendido como uma problemática homossexual (CECCARELLI, 2013, p. 51).

 

Da identificação primária em Freud à feminilidade primária em Stoller

Freud utiliza pela primeira vez o conceito de identificação no seu trabalho Três ensaios sobre a sexualidade ([1905] 2006) tendo como referência o conceito de incorporação, e a identificação é uma evolução desse conceito:

A primeira dessas organizações sexuais pré-genitais é oral, ou se preferirmos, canibalesca. Nela, a atividade sexual ainda não se separou da nutrição, nem tampouco se diferenciaram correntes opostas em seu interior. O objeto de uma atividade é também o da outra, e o alvo sexual consiste na incorporação do objeto – modelo do que mais tarde irá desempenhar, sob a forma da identificação, um papel psíquico tão importante (FREUD, [1905] 2006, p. 187).

Em seu texto O ego e o id ([1923] 2006) o autor define um modelo de identificação (primária) como bastante primitiva e anterior a qualquer catexia de objeto. “[...] trata-se de uma identificação direta e imediata, e se efetua mais primitivamente do que qualquer catexia do objeto” (FREUD, 1923, p. 44).

Laplanche e Pontalis definem assim a identificação:

Processo psicológico pelo qual um sujeito assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo desse outro. A personalidade constitui-se e diferencia-se por uma série de identificações [...] Na obra de Freud, o conceito de identificação assumiu progressivamente o valor central que faz dela, mais do que um mecanismo psicológico entre outros, a operação pela qual o sujeito humano se constitui (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001, p. 226-227).

Freud esclarece que a identificação primária é a identificação com o pai em sua pré-história, e é a mais importante na vida do indivíduo. Freud, porém, não expressa essa concepção de pré-história explicitamente, podendo ser entendida como uma história anterior à vida adulta. Em nota de rodapé, o autor acrescenta que seria melhor considerarmos essa identificação com os pais, já que a criança ainda não faz a distinção sexual entre eles.

Em Psicologia de grupo e análise do ego (1921) Freud afirma que essas identificações da primeira infância apresentam efeitos mais intensos e duradouros, pois o ego se encontra mais frágil e sem as resistências posteriores.

Sobre a noção de identificação a exposição mais completa que tentou apresentar está no capítulo VII de Psicologia de grupo e análise do ego, em que Freud distingue três modalidades de identificação, segundo Laplanche e Pontalis (2001):

a. Como forma originária do laço afetivo com o objeto. Trata-se aqui de uma identificação pré-edipiana marcada pela relação canibalesca de saída ambivalente (ver: identificação primária);

b. Como substituto regressivo de uma escolha de objeto abandonada;

c. Não havendo qualquer investimento sexual do outro, o sujeito pode todavia identificar-se com ele na medida em que ambos têm em comum um elemento (desejo de ser amado, por exemplo); por deslocamento, será em outro ponto que irá produzir-se a identificação (identificação histérica) (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001, p. 229).

Em Totem e tabu ([1913] 2006) Freud discute também a incorporação do objeto, pela noção canibalesca, quando descreve o ritual totêmico. O autor afirma ainda que a incorporação e a identificação, ou mesmo a recusa de incorporação, pelos integrantes de um clã com um totem (que ocupa o lugar do pai) tem como referência uma crença mágica ou religiosa que pressupõem que através da identificação com o totem há um empréstimo de suas qualidades.

O violento pai primevo fora sem dúvida o temido e invejado modelo de cada um do grupo de irmãos: e pelo ato de devorá-lo, realizavam a identificação com ele, cada um deles adquirindo uma parte de sua força (FREUD, [1913] 2006, p. 145).

Para Freud tanto para o menino quanto para a menina, o resultado da passagem pelo Édipo seria a identificação: no caso do menino, tendo reconhecido no pai a potência fálica, poderá a partir de então identificar-se com ele e construir sua própria identidade viril; no caso da menina, a identificação com a mãe é problemática, já que a castração materna desvaloriza a mãe aos olhos da filha – a mãe tomada como objeto de amor inicial era a mãe fálica, e não essa mãe privada de atributos de potência. Portanto, fica difícil para a menina, segundo Freud, a constituição de uma identidade feminina positiva para si (COSSI, 2011, p. 72-73).

O estudo do transexualismo feito por Stoller revê as teorias freudianas a respeito do desenvolvimento sexual. Inicialmente para Freud a masculinidade era primária, tendo a libido tem caráter único, masculino. No final de Novas conferências introdutórias ([1932-1936] 2006) no artigo sobre feminilidade Freud aponta que não podemos atribuir nenhum caráter sexual à libido, nem masculino nem feminino.

Segundo Freud:

Existe apenas uma libido, que tanto serve às funções sexuais masculinas, como às femininas. À libido como tal não podemos atribuir nenhum sexo (FREUD, [1933-1932] 2006, p. 139).

Para Stoller a feminilidade é primária, passada da mãe para o bebê de forma atraumática, através de um processo anterior que o autor denominou de imprinting. Essa feminilidade não seria desenvolvida pelo processo identificatório nos modelos da psicanálise. Esse tipo de identificação requer suficiente desenvolvimento da memória e da fantasia para que a criança possa absorver aspectos de sua mãe e tomá-los como seus.

Segundo o autor:

As palavras “incorporação”, “introjeção e “identificação” conotam uma atividade motivada, dirigida em direção a um objeto que não é reconhecido como parte de si mesmo. Isso significa que deve haver uma psique (mente) suficientemente desenvolvida para apreender o objeto (parcial) e desejar alojá-lo no interior de si [...]. Mas nossa teoria deve também reservar um lugar para outros mecanismos, não mentais (quer dizer, não motivados pelo indivíduo), graças aos quais a realidade externa possa também encontrar seu lugar no interior (STOLLER, 1978, p. 211 apud RIBEIRO, 2005, p. 239-240).

Stoller importa o conceito de imprinting da etologia utilizando-o para caracterizar as impressões e os sinais que a criança recebe da mãe nos primeiros instantes de vida. Só pode ser pensado vinculado ao

[...] mais primitivo estágio do desenvolvimento da masculinidade e da feminilidade, o núcleo da identidade genérica: o senso de pertencer ao sexo masculino ou feminino (STOLLER, [1975] 1982, p. 292).

Nesse estágio a feminilidade seria transmitida de forma atraumática (sem a criança levantar defesas, recebendo passivamente) através da excessiva imposição dos corpos (mãe-filho) deixando marcas impressas sobre a protopsique do filho.

O autor importou este termo da etologia, assim como em alguns animais, a escolha de objeto pode ser criada em total desacordo com o esperado para aquela espécie (por exemplo, pássaros que após sofrerem imprinting, por terem sido limitados em um determinado período inicial da vida ao contato com seres humanos, passarão a tentar se acasalar somente com estes últimos). O imprinting se dá de forma não conflitual. Stoller então levanta a hipótese de que este processo psicobiológico de imprinting também faria parte da determinação da escolha de objeto ou do comportamento genérico, da identidade sexual dos seres humanos (COSSI, 2011, p. 79-80).

Para Stoller, os fatores biológicos, psicológicos e biopsíquicos (condicionamento e imprinting) contribuem para a formação da identidade genérica. Ao definir a feminilidade primária e o conceito de imprinting Stoller descreve:

Eu não olhei o relacionamento mãe-criança, do ponto de vista das fantasias ou psicodinâmicas dessa criança (as quais, já que não podem ser medidas, devem ser deduzidas). Não o fiz porque acredito como outros (e.g.3) que não existe estrutura psíquica adequada nos primeiros meses de vida para carregar a carga de tais intrincadas fantasias [...] Concordando com muitos autores que a criança seja a princípio um organismo fisiológico e só gradualmente desenvolva uma psique, sinto que a criança é especialmente suscetível, nesses primeiros meses, a tais influências condicionadoras e imprinting, o que é demonstrável em animais inferiores na escala evolutiva (STOLLER, [1975] 1982, p. 52).

Pensando a transexualidade como uma experiência identificatória pré-edípica,

[...] o transexual verdadeiro não entra no complexo de Édipo. O menino não toma sua mãe como objeto sexual desejado e não entra em uma batalha com seu pai pela posse dela (STOLLER, [1975] 1982, p. 37).

Ainda sobre a identificação feminina o autor nos diz:

Se meninos, no interior da normal simbiose criança-mãe, identificam-se com suas mães, e se a excessiva, prolongada e feliz proximidade produz neles uma extrema feminilidade, o menino que se deve tornar masculino terá de repudiar aquela feminilidade. Mas então a feminilidade (identificação feminina) estará presente não por ser parte da herança biológica da humanidade, mas, antes, porque todos os meninos têm mulheres como mães (STOLLER, [1975] 1982, p. 13).

Assim sendo, na ausência de uma figura paterna identificatória o transexual não terá possibilidade de repudiar a feminilidade primária sustentando o feminino como forma de existência psíquica.

Para Stoller a transexualidade não seria uma psicose, tampouco uma perversão e por não serem acessíveis a nenhuma forma de terapia, inclusive a psicanálise, o tratamento hormonal e a cirurgia são recomendáveis (CECCARELLI, 2013).

 

Caso clínico: uma solução transexual

O fragmento clínico apresentado a seguir diz respeito a um breve período de atendimentos que fiz a Marta (nome fictício), 28 anos, que me permitiu pensar a questão transexual como uma solução, uma forma de existência psíquica, seguindo o modelo identificatório pré-edípico, em uma situação clínica em que a sintomatologia apresentada trazia predominantemente questões relativas à clínica dos estados limite.

Nessa clínica o funcionamento psíquico do paciente apresenta uma dificuldade em relação ao objeto, uma violenta angústia diante da ameaça de abandono e paradoxalmente o desespero diante de ser invadido, engolfado pelo outro. Esse é um modo singular de subjetivação, em que a relação Eu/Outro se encontra prejudicada e não segue a lógica do conflito psíquico do recalque e da representação.

Cardoso (2005) esclarece:

Estamos diante de patologias nas quais elementos “irrepresentáveis” tem forte dominância. Aspectos da vida subjetiva diante dos quais os mecanismos psíquicos mais elaborados tendem a falhar e, no seu lugar, são acionadas defesas de caráter mais elementar (CARDOSO, 2005 apud CARDOSO; GARCIA, 2010, p. 17).

A ‘solução’ transexual representaria então uma forma de “sobrevivência psíquica” (MCDOUGALL, 1997, p. 263); uma tentativa infantil de autocura, segundo a autora em seu trabalho sobre as neossexualidades (1997).

Podemos pensar em uma maneira de ‘escapar’ à psicose, uma solução radical, uma última tentativa de manter coesos o dinamismo psíquico e as capacidades identificatórias constitutivas do eu nas situações em que uma identidade sexuada em desacordo com a anatomia seja “preferível”, ou pelo menos não tão angustiante, do que a ameaça de não existência, ou a angústia igualmente terrificante, de possuir um corpo despedaçado (CECCARELLI, 2013).

Marta, na primeira entrevista, se apresentou como uma transexual masculina (sexo biológico masculino, identidade de gênero feminina). No entanto, sua aparência era andrógina, com traços femininos e masculinos, o que me chamou muita atenção no primeiro momento.

Sua fala era muito confusa, e um forte desejo de transexualização movido por uma impossibilidade era recorrente em seu discurso. Seu discurso paradoxal sempre me remetia a sua imagem andrógina. Era como se Marta sem recursos “representacionais” me “apresentasse” corporalmente seu conflito.

Tomava hormônios desde os 17 anos sem acompanhamento médico. A cirurgia de mudança de sexo (transgenitalização ou redesignação sexual) também era da ordem da impossibilidade. Marta, em uma sessão, falou um pouco sobre essa questão, relatou que não conseguiria fazer, pois os hospitais do Rio de Janeiro não são especializados nesse procedimento.

Marta se queixava de um vazio muito grande e uma “depressão” que a impossibilitava muitas vezes de se levantar da cama. Tinha muita vergonha de sua imagem e só saia de casa com o corpo coberto, pois se considerava uma aberração.

Na primeira sessão chegou com o corpo todo coberto, vestindo casaco, calça e gorro dizendo que os olhares que recebia de outras pessoas eram sempre acusatórios, persecutórios e agressivos. “Sentindo que as pessoas a olhavam na rua de forma esquisita”.

Relatou ser soropositiva, sem demonstrar angústia ao falar sobre o assunto, apenas relatou que estava tomando sua medicação corretamente. Em seguida relatou três tentativas de suicídio. Em uma ocasião ela ingeriu muita bebida alcoólica na praia e foi para o mar na tentativa de se matar, porém foi salva, e nas outras duas vezes misturou bebida com medicação antidepressiva.

Seu relacionamento em casa era muito difícil. Morava com a tia e o marido de sua tia, que ela chamava de pai e o descrevia como muito distante, e de poucas palavras. Sua tia, muito religiosa, não aceitava o seu desejo de se transexualizar.

Marta não conheceu o pai biológico. Sua mãe, deficiente visual, a deixou para ser criada com essa tia quando era ainda um bebê. Marta não havia perdido o contato com a mãe, que morava próximo, porém a distância da mãe era justificada pela deficiência visual.

Em uma sessão Marta chegou acompanhada de sua mãe e sua tia, me chamando a atenção o fato de sua mãe realmente ser muito distante, de poucas palavras e sua tia se referindo a Marta como “meu sobrinho”, no masculino.

Marta se cortava com frequência e se sentia aliviada após os cortes. “Podemos pensar em um alívio decorrente do sentimento de unidade, de estabelecer um limite representado pela pele, essas mutilações, as mutilações da pele – às vezes reais, mais frequentemente imaginárias – são tentativas dramáticas de manter os limites do corpo e do Eu” (ANZIEU, 2000, p. 36).

Freud já apontava essa questão em seu trabalho O ego e o id ([1923] 2006) quando descrevia que o “[...] o ego é, primeiro e acima de tudo, um ego corporal”.

Marta muitas vezes me agredia verbalmente: com uma fala agressiva questionava o tratamento. Era uma pessoa desamparada e se defendia como podia. A questão especular comparece na transferência nos Estados Limite quando o paciente demanda que o analista funcione como “o espelho negativo de si” retornando (em reflexo) o que não pode ser sentido de si, não pôde ser sofrido de si, ou aquilo que segundo o autor, foi sentido, visto, ouvido como um “mau sentido de si” (ROUSILLON, 1999 apud CARDOSO, 2010, p. 58).

Ainda segundo Roussillon citado por Cardoso e Garcia:

[...] trata-se nesses casos de uma “falta de ser”, em contraposição a uma “falta no ser”, típica da neurose (ROUSILLON, 1999 apud CARDOSO; GARCIA, 2010, p. 57).

Em muitas situações Marta se agredia, com inúmeras tentativas de suicídio, cortes pelo corpo e comportamentos sexuais arriscados. Uma roleta russa macabra com inúmeras atuações diante da impossibilidade representacional. O que Marta não conseguia representar, repetia em ato, como característica da pulsão de morte.

André Green explorou a temática em seu importante trabalho intitulado O trabalho do negativo (2010):

O trabalho do negativo pode ser entendido como expressão princeps da pulsão de morte, pois sua tarefa consiste nas atividades de negativização, de rompimento, desligamento e, em última análise, de desobjetalização. É por meio, essencialmente, do dizer não que os limites psíquicos podem se estabelecer, favorecendo a capacidade de representação e a constituição subjetiva. Com o conceito de trabalho do negativo, Green traz a ideia de que toda negação pode ser estruturante ou patológica dependendo em que condições e em que contexto este não se dá (GREEN, 2010 apud GARCIA; MENDES, 2012, p. 281).

Marta relatou ter se relacionado durante um bom tempo, com uma transexual masculina (sexo biológico masculino, identidade de gênero feminina) que morava São Paulo (Camila, nome fictício), que ela conheceu pela internet e descreveu como muito importante em sua vida. Ela a descrevia como uma mulher linda, um exemplo, pois seu processo de transição foi muito rápido, e ela conseguiu alcançar seu objetivo.

Em seguida relatou que se tratava de uma relação sem sexo, onde era permitido se relacionar com pessoas fora da relação, o que me fez pensar em uma relação especular e idealizada.

Fora da relação com Camila, Marta apresentava um comportamento sexual arriscado, transando sem preservativo, o que aumentava seus pensamentos negativos. Relatava se sentir um objeto sexual para as pessoas e que somente no relacionamento que teve com Camila se sentiu amada e amou verdadeiramente.

O dilema com a identidade, a questão do narcisismo, a agressividade, a impulsividade e o suicídio são problemas frequentes na clínica dos estados limite. Uma angústia de separação sentida pelo paciente de perda do objeto, demanda uma relação de apoio com o outro.

Em uma sessão relatou com muita emoção um abuso sexual que sofreu quando criança (ela tinha nove anos) de um primo de seu primo, que ela relatou como pedófilo, já que o rapaz era bem mais velho que ela. Marta relatou que ele a colocava em seu colo na frente de todos da família que, segundo ela, fingiam que nada estava acontecendo.

Podemos pensar na questão do abuso sofrido por Marta como uma situação traumática, que se deu a partir da confusão de demandas entre a linguagem de uma criança, possivelmente buscando um olhar de investimento vindo de uma figura masculina recebendo em troca uma demanda sexualizada e posteriormente desmentida familiarmente.

Utilizando conceitos de Ferenczi (1932), podemos pensar em uma Confusão de línguas entre os adultos e a criança (a linguagem da ternura e da paixão) seguida por um desmentido familiar.

Marta relatava que diante sua família presenciava a cena e nada fazia, fingindo não ver o que estava acontecendo.

Para Ferenczi (1933)

O pior é realmente o desmentido, a afirmação de que não aconteceu nada, de que não houve sofrimento [...] é isso, sobretudo, o que torna o traumatismo patogênico (FÉRENCZI, 1933 p. 79 apud GONDAR, 2012, p. 196).

Ferenczi construiu esse modelo a partir de histórias familiares que envolviam criança abusada.

Segundo Pinheiro:

Férenczi vai dizer que esse desmentido só teria valor traumático se houvesse uma incompatibilidade simbólica, ou seja, se o lugar dessa fala fosse de uma univocidade tal que impedisse a inscrição simbólica, em que a polissemia é absolutamente fundamental. [...] Férenczi vai dizer que o resultado do trauma é a identificação com o agressor (PINHEIRO apud KATZ, 1996, p. 28).

Penso que a vivência dessa experiência traumática por Marta, em que sexualidade é percebida como abusiva e uma possibilidade de ser observada em seu comportamento sexual mortífero e compulsiva a serviço da pulsão de morte, relacionando-se sexualmente com pessoas sem usar preservativo. E no relacionamento com Camila protegia seu objeto de amor (idealizado), em uma relação dessexualizada, onde o sexo era secundário.

Em nossa última sessão Marta relatou ter passado o final de semana inteiro trancada em seu quarto. Só conversou com Camila e disse que não via a hora de ir para São Paulo morar com ela.

Devido ao recesso acadêmico, os atendimentos foram encerrados e no retorno do período letivo não consegui mais contato com Marta. Os poucos encontros que tivemos (sete atendimentos) não foram suficientes para um trabalho analítico propriamente dito, porém uma escuta inicialmente acolhedora, proporcionou a Marta uma confiança no setting, sensação que lhe fora negligenciada pelo ambiente hostil que vivenciava em sua casa.

Por muitas vezes, durante as sessões tentei dar um significado à confusão de ideias de Márcia. Era um momento não de interpretações ou pontuações, e sim tentar validar alguns de seus sentimentos através de uma escuta acolhedora,

Fontes (2010) pontua:

Porque o que houve foi da ordem da privação, não da castração (sendo esta posterior). A ênfase cai, portanto, no conceito de regressão. Faz-se necessário acompanhar o paciente onde não houve experiência, para que viva, na experiência analítica, a função que faltou (FONTES, 2010, p. 100).

Minimamente algumas coisas puderam ser organizadas: Marta havia conseguido um emprego e já não precisava se ‘esconder’ em suas roupas. Suas roupas não serviam mais de envelopes psíquicos de proteção e contenção, o que foi proporcionando a ela uma sensação de integração fazendo com que gradativamente sua angústia fosse diminuindo.

Ballint (1968) analisa:

Pressupõe um entorno que aceite e consista em sustentar e carregar o paciente, como a terra ou a água sustenta e carrega um homem que apoia seu peso nelas. O analista não deve resistir, deve consentir, não deve dar origem a muito atrito, deve aceitar e transportar o paciente durante um certo tempo [...] Tudo isso significa consentimento, participação e envolvimento, mas não necessariamente ação, apenas compreensão e tolerância; o que realmente interessa é a criação e a manutenção de condições nas quais os eventos possam ocorrer internamente, na mente do paciente (BALLINT, 1968 apud HEGENBERG, 2009, p. 87).

Marta não se encaixava no modelo de transexualidade proposto por Stoller. Porém, um fato parecia comum aos dois casos: a transexualidade como uma identidade per se sendo a expressão do “verdadeiro eu (self) do paciente” (STOLLER, [1975] 1982, p. 2).

Se pensarmos na feminilidade primária proposta pelo autor, o verdadeiro self de Marta passaria por essa feminilidade primária. Segundo Stoller, a feminilidade primária é passada sem conflito ao bebê pelo mecanismo de imprinting. Somente posteriormente ocorreria, no caso do menino, uma desidentificação desse feminino e a entrada na masculinidade.

Mesmo diante do conflito e impossibilidades apresentadas na fala da paciente. Era como se algo da feminilidade primária passada através do imprinting ainda em um protopsiquismo garantisse a Marta uma possibilidade de identificatória. Uma enunciação do feminino garantindo sua existência psíquica através do desejo de transexualização. Assim, para finalizar um pensamento de Cecarrelli, que elucida de forma pontual a apresentação clínica:

Que personagem o transexual encarna na cena familiar? A quem e a que ele deverá responder? Tenho hipótese que a solução transexual foi a única resposta possível que o sujeito pôde dar para sobreviver psiquicamente: na cena familiar, o personagem que ele precisa encarnar para constituir-se psiquicamente, não leva em conta o seu sexo anatômico (CECCARELLI, 2013, p. 137).

 

Considerações finais

O fragmento clínico apresentando demonstra que, diante da pluralidade do fenômeno, a solução que o transexual encontra para seu sofrimento não é necessariamente unívoca (COSSI, 2011), o que nos permite pensar em inúmeras possibilidades de manifestação do fenômeno transexual.

Assim, “da universalidade do fenômeno transexual, passamos à singularidade do sujeito transexual” onde não é possível isolar as transexualidades como entidades nosográficas bem definidas, como se fosse uma patologia. É preciso aceitar cada vez mais, que as transexualidades sejam manifestações da sexualidade como qualquer outra (CECCARELLI, 2013, grifo nosso).

Sobre a necessidade de um enquadre clínico muitas vezes precipitado, assim pensa Berlinck (1997):

[...] que a aplicação de categorias nosográficas na clínica, sem uma escuta cuidadosa e prolongada pode se constituir numa resistência do psicanalista à sua própria escuta. Declarar que um sujeito é histérico, obsessivo, perverso ou psicótico serve muitas vezes para evitar a confrontação com o enigma que o outro é (BERLINCK, 1997 apud MARRACINI, p. 35).

Sob o ponto de vista psicanalítico, nosso objetivo foi apresentar o modelo identificatório transexual pré-edípico, mediante um modelo de identificação pela feminilidade primária, questionando o determinismo reducionista edípico/falocêntrico nas situações em que não ocorre a possibilidade da vivência edípica, em que o mito de Édipo, o incesto e o parricídio perdem espaço para Hamlet e seu famoso questionamento “Ser ou não ser?”. Sobre essa questão pensa Ceccarelli:

A busca identitária é tributária da cartografia imaginária que sustenta suas origens. Se, por um lado, nenhum objeto satisfaz definitivamente a pulsão, a noção de “identidade”, no sentido de uma certeza, pertence ao domínio do fantasma e a possibilidade de inadequação entre anatomia e identidade sexual é concebível, produzindo os mais diversos discursos. Sem dúvida, a especificidade da dinâmica pulsional no transexual nos impressiona por seu radicalismo. Entretanto, essa especificidade nos informa sobre a particularidade de seu trajeto identificatório. O lugar que lhe fora destinado na economia libidinal da família, em ressonância com uma problemática transgeracional, determinou a sexuação de seu corpo e, em seguida, a construção de seu sentimento de identidade sexual (CECCARELLI, 2013, p. 150).

Tratando-se de um ‘fenômeno’ tão múltiplo e complexo, qualquer forma de conclusão pode ser prejudicial e até mesmo nociva. Finalizo o presente artigo deixando em aberto a discussão para futuros trabalhos em que a transexualidade possa ser explorada sempre dentro de um discurso libertário/despatologizante.

Assim finalizo, deixando para reflexão, um fragmento da poesia de Drummond, que condensa em poucos versos a sensação do transexual em vivenciar um corpo como um objeto estranho, que o aprisiona como um “inquilino no próprio corpo” (CECARELLI, 2013).

Assim nos diz Drummond em As contradições do corpo (1984):

Meu corpo não é meu corpo
É ilusão de outro ser.
Sabe a arte de esconder-me
E é de tal modo sagaz
Que a mim de mim ele oculta.

 

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Endereço para correspondência
E-mail: rzmelo@hotmail.com

Recebido em: 13/03/2015
Aprovado em: 06/04/2016

 

 

SOBRE O AUTOR

Rodrigo Zanon de Melo
Psicólogo.
Candidato a psicanalista e membro efetivo do Centro de Estudos Antonio Franco Ribeiro da Silva do Círculo Brasileiro de Psicanálise Seção-Rio de Janeiro (CBP-RJ).
Participante do Núcleo de Estudos Psicanalíticos da Infância (NEPsI) do CBP-RJ.

 

 

1 Trabalho parcialmente apresentado na VI Jornada de Psicanálise do CBP-RJ – Neossexualidades – novas escutas, Hotel Mirador, Copacabana, Rio de Janeiro, 20 nov. 2015.

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