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Estudos de Psicanálise

Print version ISSN 0100-3437

Estud. psicanal.  no.52 Belo Horizonte July/Dec. 2019

 

PAINÉIS E COMUNICAÇÕES SIMULTÂNEAS - TEXTOS COMPLETOS

 

Experiências extraordinárias entre o xamanismo e a psicanálise: uma reflexão psicopatológica transcultural1

 

Extraordinary experiences between shamanism and psychoanalysis: a cross-cultural psychopathological reflection

 

 

Víctor Cruz de FreitasI; Ka RibasII; Paulo Roberto CeccarelliIII, IV

I Sociedade Brasileira de Psicanálise – MG
II Espaço de Saúde Integra-Ativa
III Universidade Federal do Pará
IV Société de Psychanalyse Freudienne

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

No presente trabalho propomos compartilhar nossas “experiências extraordinárias” para além do setting psicanalítico, ensejadas a partir do projeto Espaço de Saúde Integra-Ativa. Tal projeto foi criado por dois psicanalistas e um xamã/curandeiro, com o objetivo de proporcionar palestras e promover discussões acerca dos benefícios das práticas integrativas e complementares de saúde (PIC) para a saúde mental e de outras práticas análogas a estas, como foi o caso do xamanismo.2 Numa perspectiva integrativa entre o xamanismo e a psicanálise, conforme a ótica da psicopatologia fundamental e transcultural, propõe-se reflexões acerca dessas experiências extraordinárias. Resta-nos a questão: quais são os riscos de a contratransferência cultural se transformar em defesa, quando os universais constitutivos do humano propostos pela psicanálise se singularizam diferentemente segundo as culturas.

Palavras-chave: Xamanismo, Psicanálise, Transculturalidade, Contratransferência cultural.


ABSTRACT

In this work we propose to share our “extraordinary experiences” beyond the psychoanalytic setting, arising from the Integra-Ativa Health Space project. This project was created by two psychoanalysts and a shaman / healer, with the objective of providing lectures and promoting discussions about the benefits of integrative practices and complementary health services (PIC) for mental health and other practices similar to these, as was the case with shamanism. In an integrative perspective between shamanism and psychoanalysis, according to the perspective of fundamental and cross-cultural psychopathology, reflections on these extraordinary experiences are proposed. The question remains: what are the risks of cultural countertransference becoming defense, when the constitutive universals of the human proposed by psychoanalysis are differentiated according to cultures.

Keywords: Shamanism, Psychoanalysis, Transculturality, Cultural countertransference.


 

O xamanismo traz a certeza de que os seres humanos não estão sozinhos em um mundo estrangeiro, rodeados por demônios e “forças do mal”. Semelhantes aos deuses e seres sobrenaturais, aos quais são feitos sacrifícios e orações, os xamãs são “especialistas do sagrado”, homens capazes de “ver” os espíritos, de subir aos céus e encontrar-se com os deuses, de descer ao mundo inferior e lutar contra os demônios, a doença e a morte.
Mircea Eliade

 

Introdução

Desde 2015 vimos/ investigando os benefícios de práticas xamânicas para o tratamento das adições e toxicomanias3 e, subsequentemente, para outras afecções psíquicas como ansiedade, estresse e depressão.

Em 2016, em visita aos centros Hampichicuy e Takiwasi na alta selva amazônica peruana, foi possível ter um primeiro contato com a utilização de saberes ancestrais e com o uso de plantas sagradas integradas à psicoterapia ocidental voltada para o tratamento das toxicomanias e outras adições.

Ao cerne da Clínica Ampliada de Saúde Mental4 (CASM) com as modalidades psicanalíticas, psicoterápicas e psiquiátrica, criamos um projeto denominado Espaço de Saúde Integra-Ativa.5

Este projeto foi fundado por dois psicólogos psicanalistas e um xamã/curandeiro com o objetivo de proporcionar palestras e promover discussões acerca dos benefícios das práticas integrativas e complementares de saúde (PIC), e de outras práticas análogas como foi o caso do xamanismo para a saúde mental.

Após um ano de investigações e discussões, acompanhando o movimento da OMS e do SUS no que diz respeito à regulamentação de cerca de 23 práticas integrativas e complementares de saúde, avançamos um pouco mais em nossas investigações.

Consequentemente, algumas dessas PICs6 foram/são utilizadas terapeuticamente no Espaço de Saúde Integra-Ativa, justamente por termos compreendido seus benefícios para o tratamento do sofrimento mental a título adjuvante.

Entendemos que, no campo da saúde mental, os profissionais envolvidos serão interpelados pelas dimensões orgânica, antropológica, etnológica, ambiental, cultural, filosófica e espiritual.

A perspectiva da psicopatologia fundamental nos ajuda a compreender tais fenômenos7 e contribui

[...] para a redefinição do campo do psicopatológico. Ela propõe uma reflexão crítica dos modelos existentes e uma discussão dos paradigmas que afetam nossos objetos de pesquisa, nossas teorias e nossas práticas. A Psicopatologia Fundamental reconhece e dialoga com outras leituras presentes na polis psicopatológica. A noção de fundamental deve ser compreendida no sentido de uma “fundamentalidade”, uma “intercientificidade dos objetos conceituais. Trata-se de um projeto de natureza intercientífica, onde a comparação epistemológica dos modelos teórico-clínicos e de seu funcionamento propiciaria a ampliação do limite e da operacionalidade de cada um destes modelos e, consequentemente, uma transformação destes últimos. A Psicopatologia Fundamental é o fórum de toda a metapsicopatologia (CECCARELLI, 2005, p. 373-374).

O autor prossegue:

É importante frisar que não se trata de uma interdisciplinaridade, mas de uma transdisciplinaridade, pois campos diferentes, cada qual com métodos, procedimentos e objetivos próprios não se comunicam facilmente. A transdisciplinaridade reúne, em uma ampla rede de significações, os conhecimentos específicos e singulares de cada modelo em torno de uma concepção ética comum aos diferentes saberes. Isso possibilitará a existência de um campo discursivo que produza interações e leve a construções metafóricas (CECCARELLI, 2005, p. 374)

É provável que o advento de práticas cerimoniais ritualísticas com o uso de plantas sagradas psicoativas nos centros urbanos seja tributário da falência do discurso dos ideais coletivos tradicionais, o que faz com que o desamparo ressalte. A ausência de sentido para a vida, assim como o vazio e a diminuição da capacidade de sonhar, são marcas do atual mal-estar de nossa cultura.

Em Birman (2014, p. 51) podemos observar a perda ou diminuição da capacidade de desejar ou sonhar:

[...] na atualidade estaríamos no mundo do informe, sem poder sonhar e desejar, mutilados que estamos de nossas possibilidades de fantasmar, sendo engolidos pela dor de existir e pelo pesadelo. É o real, no que existe de mais desértico, que sintetiza a nossa atualidade na sua nudez. É o deserto do real que delineia o campo do sujeito hoje, na ausência de qualquer horizonte possível.

Seria possível almejar um resgate ou incremento da capacidade de sonhar a partir das experiências propostas pelas práticas xamânicas do Temazcal e do Ciclo de Medicinas?

Como poderíamos integrar tais práticas e nos servir dos efeitos das mesmas em benefício da saúde mental e do tratamento para o padecer psíquico?

 

******

Capítulo 1 - Experiências extraordinárias

As origens do xamanismo remontam aos primórdios da humanidade, porém é somente no século XIX que o fenômeno xamânico passa a ser investigado com mais critério, inserindo-se no discurso ocidental sobre primitivismo e no debate acerca da magia e da racionalidade.

No século XX, o pesquisador romeno Mircea Eliade jogará nova luz sobre o estudo e a interpretação do xamanismo.8 Conforme a visão de Eliade, por uma ruptura no equilíbrio psíquico do xamã, o xamanismo opera como uma técnica arcaica do êxtase. Em sua obra sobre discurso xamanístico e literatura Xamanismo – a palavra que cura, o pesquisador Marcel de Lima Santos apresenta os seguintes conceitos de xamã e xamanismo:

Os xamãs são pessoas que podem escapar da vida mundana e mergulhar em outros níveis de consciência através do chamado voo mágico. Entretanto, ao contrário dos médiuns, os xamãs agem conscientemente. Isso significa que eles podem mover-se do mundo racional do conhecimento lógico em direção ao reino mágico do reconhecimento sobrenatural, o qual fornece ao xamã mensagens inalcançáveis pelos níveis usuais de consciência.
[...]
Essas práticas xamânicas envolvem o alcance de um estado alterado de consciência do xamã por meio de um desarranjo consciente e extremo da psique, ou seja, de um “voo” mágico em direção de um estado extático da percepção. Isso é alcançado por meio de um número de técnicas que, em termos gerais, incluem o jejum, o afastamento solitário e/ou a ingestão de plantas sagradas, assim como a batida incessante do tambor acompanhada de cantos rítmicos e performances dramáticas (LIMA SANTOS, 2007, p. 21-23).

Nesse sentido, a experiência xamânica assume o caráter de uma exploração dos campos da consciência. O voo mágico do xamã é uma jornada rumo ao mistério, às dimensões além da racionalidade e do pensamento linear; transcende, transpõe e subverte preceitos, paradigmas e crenças previamente estabelecidas, que são muitas vezes consideradas absolutas e rígidas. Retira o participante do lugar comum e de sua aparente segurança emocional. Uma luminosa incursão ao universo onírico.

O xamanismo é uma experiência poderosa e formidável, que requer um equilíbrio mental e espiritual extremo, na qual xamã e paciente realizam uma viagem emocional, ao transportarem o limite de um mundo paralelo, para penetrar no domínio mítico da matéria dos sonhos (LIMA SANTOS, 2007, p. 24).

Atualmente, as práticas xamânicas encontram-se difundidas e são acessíveis ao público em geral, uma vez que já extrapolaram os limites da cultura originária, chegando aos grandes centros urbanos.

Porém, há que ressaltar a importância da devida preparação por parte do oficiante, assim como o seu reconhecimento de “especialista” e seu vínculo a uma tradição xamânica. Isso se torna fundamental para a legitimidade e para a segurança da experiência xamânica.

Originalmente, esse saber transmitido oralmente era zelosamente guardado. O candidato a “xam㔠passava por duros testes que verificavam a sua capacidade de lidar com as impactantes experiências, os domínios das artes e os saberes de seu ofício.

A vocação muitas vezes era assinalada por uma ruptura em sua vida, manifestada na forma de uma enfermidade que quase o levasse à morte, ou um contato direto com alguma força da natureza (como um raio ou o ataque de um animal). Algo que o destacaria do destino comum dos demais membros de sua comunidade e que indicaria sua missão.

Apesar das significativas mudanças e do estabelecimento do xamanismo no mundo moderno, a necessidade de vinculação a uma tradição se faz presente e não anula a necessidade de ritos e iniciações para a credibilidade e eficiência de um especialista.

Ora, estamos tratando de uma rede de conhecimento desenvolvida e testada no decorrer de milênios, ancestral, que garante um mapa, um plano seguro para a exploração do vasto e fantástico universo da consciência.

Apesar de abertas a indivíduos que não sejam originalmente de seu contexto cultural, as tradições xamânicas, ainda hoje, se pautam pelo rigor na transmissão de seu saber e na formação de seus especialistas.

Chamamos isso de “linhagem ancestral”, pois une a sabedoria do passado ao momento atual, dando ao especialista legitimidade, credibilidade e competência para exercer o seu ofício, mesmo que não tenha nascido em uma comunidade tribal.

Esclarecido esse ponto, iremos agora abordar duas práticas xamânicas que temos oferecido e realizado com pessoas que buscam o xamanismo para a cura e autoconhecimento: a Cerimônia de Temazcal (sauna sagrada) e o Ciclo de Medicinas (vivência com a ingestão de plantas psicoativas).

 

Temazcal

Sobre a cerimônia de Temazcal, o líder espiritual mexicano Aurelio Díaz Tekpankalli nos esclarece a respeito da linhagem do Fuego Sagrado de Itzachilatlán:

Para nosotros, una de las primeras enseñanzas que existen dentro de la Tradición, es el origen. El origen nuestro es en el vientre de la Madre Tierra, y es una de las primeras ceremonias que tenemos a la hora de venir a tomar forma, a tomar fuerza, a tomar, de alguna manera, suerte en la vida. Se le llama ceremonia de Temazcal9 (TEKPANKALLI, 1996, p. 51).

O Temazcal é uma prática indígena milenar que consiste em uma “sauna sagrada”. Trata-se de um banho de vapor, por meio do qual o participante experimenta uma elevação espiritual e do estado de consciência. [Trata-se de um banho de vapor, que proporciona ao participante uma experiência de elevação espiritual e alteração do estado de consciência.]

Esta cerimônia é encontrada em praticada por diferentes povos e tradições, com destaque para a região conhecida como Mesoamericana (México e América Central) e as Planícies do atual EUA (onde é conhecida com o nome de Inipi). Porém, a técnica de cura com a utilização de vapor é comum em outras culturas e tradições ameríndias, inclusive nos Guarani que a chamam de Opydjerê.10

O nome Temazcal vem do Nahuatl, antiga língua ainda falada no México. Originalmente conhecida como Temazcalli ou Tematzcalli, é alvo de variadas interpretações e traduções, entre elas, “casa de limpeza” ou “casa de purificação”. Essa prática é igualmente conhecida como tenda do suor, caba do suor ou Sweat Lodge.

A cerimônia acontece numa pequena cabana ou tenda de formato circular, que simbolicamente representa o útero da mãe, pois é quente, úmido e escuro. Os toques de tambor, característicos dessa cerimônia, reproduzem os batimentos acelerados do coração de um bebê.

No centro da tenda são depositadas pedras previamente aquecidas numa fogueira externa que, por sua vez, representa o pai, o fogo do Sol que fecunda a Terra. As pedras vão incandescentes para a tenda, fecha-se a porta e joga-se água nelas liberando o vapor que alcança a todos os participantes que, sentados em círculo, começarão a suar.

A escuridão total no interior da tenda, o calor excessivo, os cantos e os toques de tambor realizados pelo condutor da cerimônia, tudo contribui para uma experiência extraordinária. Nas pedras quentes, antes de ser jogada a água, também se costuma colocar ervas e plantas aromáticas, com fortes e agradáveis odores. Assim, nesse ambiente, a privação da luz e consequentemente da visão é compensada pela estimulação dos demais sentidos.

Fisiologicamente, o Temazcal estimula órgãos internos e limpa toxinas acumuladas por medicamentos, produtos químicos, alimentação inadequada, fumo e bebida alcoólica. Promove uma limpeza sanguínea, estimulando as glândulas. Pelo suor liberado pelo calor são eliminadas toxinas, bem como ácido úrico, colesterol e gorduras. Também é eficaz para reduzir a obesidade e promover o rejuvenescimento da pele, a limpeza dos seios nasais e paranasais através dos vapores aromáticos de plantas curativas. Alivia sinusite, catarro, asma e bronquite. Seu efeito relaxante combate a insônia e o estresse. Porém, todos os processos de limpeza do corpo físico e de desintoxicação promovidos pelo Temazcal são apenas a primeira parte do processo de cura.

O Temazcal estimula processos de transformação interna, alcançando o âmago do indivíduo. O contato com o silêncio propicia um sentimento de paz e quietude que preenche e acalma, permitindo a auto-observação. Nessa situação é possível trabalhar dores físicas e psíquicas, fobias e medos. O escuro, o local fechado, a permanência em uma posição aparentemente incômoda e o calor são fatores que levam ao despertar de diversos sentimentos. Uma cerimônia de Temazcal favorece a consciência de que somos capazes, elevando a autoestima, valorizando a pessoa e trazendo nova força para a vida.

A duração da cerimônia é marcada pela abertura da porta da tenda e a entrada de novas pedras. Geralmente isso acontece quatro vezes, em referência ao aspecto quádruplo de manifestações da natureza (as quatro estações, os quatro elementos, as quatro fases da lua, etc.). Em média todo o processo é concluído após cerca de três horas, podendo ser mais extenso.

A sensação após a conclusão da cerimônia é de profundo relaxamento e, ao mesmo tempo, euforia e vigor físico. Os participantes experimentam uma força interna e grande capacidade de realização. A saída de dentro da tenda representa o momento do nascimento, completando o parto, por isso o Temazcal é considerado uma cerimônia de renascimento.

 

Ciclo de medicinas

A ingestão de plantas sagradas, mágicas e visionárias, em sua capacidade de estimular e provocar a experiência extática (o “voo mágico”), é um importante recurso do xamanismo. Existe uma ampla variedade de plantas e diferentes formas de utilização em rituais e cerimônias.

Caminhar na natureza, realizar uma peregrinação, percorrer uma rota sagrada, subir lugares elevados, como o topo de montanhas, também é uma vivência xamânica. Muitas vezes, esse ritual em movimento é acompanhado pelo uso das plantas sagradas. O ato de caminhar carrega um profundo simbolismo e sentido metafórico como um reflexo da própria vida. Há culturas e tradições que exploram bem essa prática e compreendem o caminhar como uma atividade espiritual. É o caso da cultura guarani.

Os guaranis têm, até os dias de hoje, um profundo respeito pelos caminhos. O “caminho”, o “caminhante” e o “caminhar” são realidades e conceitos preciosos dentro do seu complexo mundo cultural.

Tanto que eles, notadamente os mbyás, orgulhosamente se autodefinem como tapejaras.
Esta palavra, algumas vezes, aparece traduzida como “povo sempre em movimento”. [...] Mais que isso: a tribo inclusive sacraliza as caminhadas, que chama de oguatá (BOND, 2009, p. 180-181).

No livro o Caminho do Peabiru, a rota indígena sul-americana, que liga o litoral sul do Brasil ao oceano Pacífico, a historiadora Rosana Bond ( 2009, p. 182 ) cita a antropóloga Flávia de Melo para falar do sentido espiritual do “caminhar”:

Oguatá Porã significa literalmente boa caminhada. O caminhar tem uma conotação cosmológica fundamental para os Guarani. [...] É a forma com que os deuses construíram o mundo, e o caminhar pelas distintas aldeias, reconstruindo suas casas, roças, suas vidas, enfim, reproduz essa conduta (das atividades). [...] Em sentido mais amplo, oguatá é uma metáfora para “viver”. As oguatá, ato de caminhar, ou as “viagens”, são ações fundamentais para a aquisição e a utilização dos poderes xamânicos.

O caminhar na natureza com a ingestão de plantas mágicas, atividade que denominamos de “ciclo de medicinas”, tem sido utilizado por nós como prática xamânica. Nessas práticas são utilizadas algumas plantas sagradas conhecidas por povos tradicionais como “medicinas”.

O local de nossa prática tem sido as montanhas do entorno do Parque Estadual da Serra do Rola Moça, região metropolitana de Belo Horizonte (MG), que apesar da proximidade com o centro urbano, conserva belas paisagens naturais e é rica em diversidade de fauna e flora.

Quanto às medicinas, temos utilizado, alternadamente ou conjugados, o tabaco (Nicotiana tabacum e Nicotiana rustica); a ayahuasca (bebida feita do cipó Banisteriopsis caapi junto às folhas da Psychotria viridis); wachuma (Echinopsis pachanoi) e os honguitos (Psilocybe cubensis).

A atividade consiste em caminhar até o topo de uma montanha, com propósito (definido) de cura e autoconhecimento mediante a ingestão ritual de plantas sagradas. Nesse contexto, a caminhada assume o caráter de uma metáfora da própria vida do caminhante. Em estado de consciência ampliada, pode-se fazer insights e significativas reflexões acerca da alma e da vida.

Toda a atividade, desde antes da subida da montanha inclusive a prática ritual com a ingestão das medicinas, o momento de partilha da experiência com os participantes até a descida, demanda cerca de 8 horas. A etapa final, a descida da montanha, faz analogia à descida do voo mágico, pois na chegada ao pé da montanha o participante ou participantes já se encontram praticamente em um estado de consciência ordinária. Não obstante, sentindo a força e o impacto transformador da experiência.

 

*****

 

Capítulo 2 - Uma leitura psicanalítica e transdisciplinar

Conforme demonstramos anteriormente,11 os estados ampliados de consciência – sobretudo aqueles engendrados pelo uso de plantas de poder psicoativas – ativam e potencializam algumas funções já exercidas pelo nosso próprio organismo quando em estado extremo ou extraordinário.

Entre eles, observamos:

• Desorientação psíquica, que pode ser acompanhada pela perda momentânea da consciência e da noção de unidade.
• Ampliação/modificação da sensopercepção e da consciência.
• Sentimento de unidade com o todo, “sentimento oceânico”.
• Produção de imagens representativas/metafóricas.

D. Nanni (2015) complementa nossa observação acerca dos estados ampliados de consciência acrescentando a ativação e a intensificação de sensações corporais e anímicas, assim como a capacidade que esses estados têm de reduzir significativamente os momentos de racionalização e de intelectualização de modo que os insights sejam consideravelmente favorecidos.

Consonante o entendimento sobre a sensopercepção e a consciência (JUNG, 1964), observamos que não é possível perceber plenamente, tampouco entender por completo. Tudo isso depende necessariamente da quantidade e da qualidade dos sentidos, do armazenamento e do acesso ao material inconsciente, portanto existe uma limitação significativa. Podemos inferir com certa tranquilidade que toda experiência contém um número indefinido de fatores desconhecidos e que existem aspectos inconscientes da nossa percepção da realidade e da memória. Percebemos isso no fenômeno do sonho noturno.

A partir de Freud ([1900] 1996), é possível considerar, entre outras coisas, que os sonhos são produções do inconsciente que nos ajudam na compreensão dos traumas e conflitos, uma espécie de ajuda especial para digerir aqueles restos de vida diurnos que excedem no psiquismo. Pensar por imagens é mais próximo dos processos inconscientes do que pensar por palavras (FREUD, [1923] 1996).

Como método de exploração da vida psíquica através da associação livre de ideias, dos chistes, atos falhos, sintomas e dos sonhos, a psicanálise permite o acesso ao material inconsciente, abrindo a possibilidade de tratar o sofrimento psíquico que acomete os indivíduos.

O modelo ontogênico da construção da subjetividade é proposto por Freud a partir de/considerando um corpo pulsional originário que se complexifica consoante o desenvolvimento psicossexual, muito embora Freud nunca tenha desconsiderado a participação da perspectiva da filogênese.

Alguns autores vão além. Racamier (1992) compreende que o sujeito é o único gerador e responsável pelo seu engendramento. Para o autor, o inconsciente não é obrigado a permanecer na psique, o que amplia a concepção de subjetividade.

A noção do rizoma,12 de Deleuze e Guattari (1980), ajuda-nos a melhor elucidar o potencial criativo de novas redes de conexões ao acreditar num universo de infinitas possibilidades. Assim, podemos ir além do Édipo no sentido de reestabelecer o ser humano em sua totalidade e na diversidade de suas relações. É legítimo, pois, associar o “corpo sem órgãos” às experiências extraordinárias que evocam os estados ampliados de consciência, ainda que, paradoxalmente, esse/tal fenômeno possa culminar no risco de o indivíduo se perder na infinidade ou cair no vazio.

Segundo Jung (1964), os sonhos não são apenas um depositário de restos diurnos e de vida, tampouco um quarto de despejos dos desejos reprimidos. Para o autor, valeria a pena entender os sonhos como um “grande guia, um amigo e um conselheiro do consciente”.

O homem só se torna um ser integrado, tranquilo, fértil e feliz se o seu processo de individuação está realizado, ou seja, quando consciente e inconsciente aprendem a conviver em paz e completando-se um ao outro (JUNG, 1964, p. 11).

Ferenczi (1924), em Thalassa, demonstra que seria necessário ir mais além da ontogênese até a infância da espécie humana.

N. Abraham e M. Torok, em L'écorce et le noyau, (2001) propõem pensar a psicanálise como uma ciência universal que precisa ir além da dualidade “organismo-psiquê”, no sentido de reestabelecer o ser vivo em sua totalidade. Para os autores, uma sessão de análise deveria poder nos conduzir até o passado mais remoto dos seres vivos.

Nesse sentido, consideramos pertinente almejar um resgate e um incremento da capacidade de sonhar a partir das experiências extraordinárias propostas pelas práticas xamânicas e do ciclo de medicinas.

Conforme Abraham e Torok (2001), somos tecidos de símbolos, nos átomos, nas células, nos fins ideais. Tais símbolos levam em suas histórias o sentido de sua gênese. A psicanálise das origens é ao mesmo tempo uma filosofia e um instrumento de exploração, de busca (de sentidos, logo terapêutica). Ademais, é munida de mecanismo técnico e finalismo místico, oriundos do Thalassa, reunindo em si causa e sentido, corpo e alma, fenômenos e transfenômenos.

A regressão, processo psíquico descrito por Freud (1900, 1901 e 1905), é tomada em analogia por Gastelumendi (2016, p. 6) no que se refere ao uso da ayahuasca.

Durante la experiencia con ayahuasca ocurre una regresión por lo general intensa, producto tanto por efectos bioquímicos cuanto por el entorno. Debido a que la forma más frecuente del ritual es a oscuras, en un relativo silencio de los participantes y en medio de los ícaros del chamán, se facilita, digámoslo en el lenguaje freudiano de 1900, el movimiento regresivo de los estímulos en el aparato psíquico. Los estímulos internos tenderán a descargarse en el polo perceptual del mismo, generando los sueños durante el dormir, pero también las visiones durante la toma de ayahuasca, siendo ambas manifestaciones de una regresión tópica. Al mismo tiempo, la ayahuasca irá produciendo cambios somáticos, modificando también el funcionamiento de la mente, de la percepción, del self.

Constatamos, entretanto, que as imagens e os símbolos forjados a partir das experiências extraordinárias (psicodélicas) são mais vigorosas e pitorescas do que aquelas dos sonhos, além de ser acompanhadas de um importante conteúdo afetivo.

A atribuição de sentidos e os afetos continuam sendo nossos principais focos no que se refere ao potencial terapêutico proveniente do encontro transdisciplinar, transcultural e integrativo entre as práticas do xamanismo e da psicanálise.

Vieira, Bastos e Teixeira (2017, p. 151) nos ajudam a elucidar que

No dizer de Freud, o elemento indiferenciado seria na verdade a pulsão, que só ganha qualidade perceptiva como afeto ao se associar ao objeto que lhe confere uma representação. O afeto passa, assim, a ser definido como tonalidade subjetiva da descarga pulsional associada a esse elemento representativo. Neste sentido, notamos que a pulsão só afeta a percepção se receber uma representação da linguagem, cujos elementos se organizam, como se verá, numa lógica independente do discurso da consciência.

Os estados ampliados de consciência decorrentes de práticas xamânicas parecem nos abrir a possibilidade, tal como nos sonhos, de trabalhar com um material inconsciente pouco acessível.

Segundo Ferreira (2016, p. 4)

Pesquisas recentes com neuroimagens fazem uma comparação da experiência com a ayahuasca com os sonhos, pois as áreas que são ativadas são semelhantes, observaram que a ayahuasca ativa uma região do cérebro relacionada à memória e outra ligada à visão, e a intensidade da ativação na área visual seria a mesma se a pessoa estivesse com os olhos abertos.

Não obstante, diríamos que, no caso da ayahuasca, entre outras coisas, ocorreria algo mais aproximado a um sonho lúcido do que um sonho ordinário, pois são incomuns relatos de perda de consciência durante as mirações.

Para que o sujeito consiga, então, se apropriar das metáforas que farão parecer real seu paraíso, será necessário cativar e se deixar ser cativado por aquilo susceptível de proporcionar o bem, em outras palavras, envolver-se o mais verdadeiramente possível com o amor, pois é por falta dele que se sofre e é por falta dele que se padece. [...] trata-se de uma proposta de tratamento do anímico em seu sentido mais amplo e mais profundo (FREITAS, 2016, p. 10).

Enfim, ressaltamos que, por mais espetaculares que sejam, as imagens nos interessam menos do que a psicoativação afetiva, os insights e a atribuição de sentidos.

 

Considerações finais

O advento de práticas cerimoniais nos centros urbanos nos instiga a investigar os limites e as possibilidades de um diálogo transcultural, dentro de uma perspectiva discursiva ensejada pela psicanálise e pela psicopatologia fundamental, e apoiada pela experiência clínica.

Entretanto, é importante estarmos atentos para que os novos sentidos produzidos por essas práticas, sobretudo nos centros urbanos, não se transformem em uma espécie de prótese13 totêmica capaz de nos amparar na falta de sentido de uma cultura que falha, produzindo a “contratransferência cultural” (CECCARELLI, 2016). Isto é, produzir “sentidos” que, no fundo, apenas mascaram, pela repetição do mesmo em cópias variadas, o mal-estar que levou o sujeito a procurar novas saídas.

Segundo Freud ([1913] 1996, p. 115 ), o totêmico

[...] constitui tanto uma religião como um sistema social. Em seu aspecto religioso, consiste nas relações de respeito e proteção mútua entre um homem e o seu totem. No aspecto social, consiste nas relações dos integrantes do clã uns com os outros e com os homens de outros clãs.

Nosso primeiro alvo de discussão é a capacidade que estas cerimônias – regadas a plantas de poder – teriam em propiciar a produção de novos sentidos e/ou de fazer um resgate sensível dos afetos/emoções e do corpo.

Observamos uma totemização das plantas sagradas ou de poder, na qual

[...] a vinculação entre um homem e seu totem é mutuamente benéfica, (pois) o totem protege o homem e este mostra seu respeito por aquele de diversas maneiras [...] (FREUD, [1913] 1996, p. 115).

Ademais, o

Totem é [...] um nome indicativo de ancestralidade [...], possui também uma significação mitológica” (FREUD, [1913] 1996, p. 117).

Parece haver alguma relação entre o que denominamos Totem e o Ideal do Eu. No caso da ayahuasca e de tantas outras medicinas ancestrais consideradas como plantas maestras ou plantas professoras, percebemos que elas têm também a mesma função do mentor, isto é, trazem enseñanza.

Os mitos representam o capital fantasmático de uma cultura. Eles possibilitam construir o ponto de partida que permite fundar, historicamente, a origem do homem, dos animais e das coisas, assegurando dessa forma um ordenamento do irrepresentável às representações linguísticas, ou do gozo ao desejo. Os relatos míticos têm a função de cura (CECCARELLI, 2012, p. 67)

Segundo Freitas (2017),14 o uso da ayahuasca incrementaria o que ele denomina de matéria dos sonhos.15 A matéria dos sonhos seria composta pelos símbolos inscritos em um inconsciente coletivo, mas que se personaliza (individualmente). Encontramos ressonância com esse modo de entender o psiquismo nos trabalhos de Jung (1964) sobre as relações entre os sonhos e os mitos. Isso se dá em função da história de cada um, da sua subjetividade, das suas experiências e vivências. Ademais, se para a psicanálise os sonhos são o mais fecundo e acessível campo de exploração do inconsciente (FREUD, [1900] 1996), a utilização de psicodélicos/enteógenos – sobretudo no contexto cerimonial ritualístico – incrementaria ainda mais esses recursos (sonhos).

A matéria dos sonhos é de inspiração mitológica e arquetípica, e proporciona um encontro com os resíduos arcaicos. No campo do xamanismo e de outras manifestações religiosas/espiritualistas, são transmitidas por fábulas, cantos, contação de histórias, rezos, ícaros, hinos, etc.

A psicoativação da matéria dos sonhos se dá pelo acesso ao material inconsciente individual/coletivo, e chegaria conforme imagens e símbolos que, por sua vez, são enlaçadas afetivamente.

Para os autores, a atribuição de sentido e significação para a vida, atrelada às funções totêmicas (religiosa e social) tem muito potencial curativo.

Devemos ainda estar atentos aos ensinamentos de Freud ([1927] 1996) e ficar alertas quanto ao caráter ilusório, quiçá delirante das representações religiosas. Para o autor, a cultura é o que cria estas representações.

Cria-se um tesouro de representações, nascidas da necessidade de tornar suportável o desamparo humano, edificado a partir do material (ics) que são as lembranças da própria infância e do gênero humano (FREUD, [1927] 1996, p. 341).

André (1995), sob as plumas de Freud, nos diz que a denegação é um mecanismo forte presente nas doutrinas religiosas e sinaliza uma afeção narcísica, na qual, entre outras coisas, denega-se a morte. É neurotizante, pois cria-se normas e ritos de proteção e de purificação para preservação da espécie, “Não matarás”. É também psicotizante, pois garante a vida eterna e distingue muito pouco a ilusão da alucinação: a religiosidade tende a restaurar, sob um modo alucinatório, o narcisismo ilimitado correlato do sentimento de impotência infantil. Freud não está distante de retomar as palavras de Marx: “A religião é o ópio do povo” e considerar que sua ação pode ser assimilada à ação de um narcótico.

Naturalmente, devemos salientar que, no campo da saúde mental, tais práticas não são indicadas aos indivíduos portadores do sofrimento psíquico como psicótico, incluindo os TAB, por risco de descompensação.

A partir de uma experiência extraordinária e transcultural, existiria a possibilidade de o sujeito se apropriar satisfatoriamente das metáforas religiosas que farão parecer real o seu paraíso?

Quais os riscos de a contratransferência cultural transformar-se em defesa quando os universais constitutivos do humano propostos pela psicanálise se singularizam diferentemente segundo as culturas? (CECCARELLI, 2016).

Nossas pesquisas teórico-clínicas sugerem que os elementos presentes na contratransferência cultural, assim como os que sustentam a psicopatologia fundamental (a particularidade dos caminhos do pathos de cada sujeito, devido à singularidade de sua história), podem servir tanto para propiciar uma visão diferente do sofrimento psíquico quanto para aumentar o diálogo entre diferentes formas de sublimação.

Muito embora haja pesquisadores que propõem o uso clínico de psicoativos, nossa aposta é numa proposta integrativa, na qual os psicoativos e as experiências extraordinárias ficariam ao encargo dos xamãs/curandeiros.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Víctor Cruz de Freitas
E-mail: vcruzfreitas@gmail.com

Ka Ribas
E-mail: aguiaecondor@gmail.com

Paulo Roberto Ceccarelli
E-mail: paulorcbh@mac.com

Recebido em: 15/11/2019
Aprovado em: 12/12/2019

 

 

SOBRE OS AUTORES

Víctor Cruz de Freitas
Psicólogo.
Mestre em Psicologia: Psicopatologia e Psicanálise pela Université Paris VII, Diderot, França.
Sócio-diretor e psicoterapeuta da CASM (Clínica Ampliada de Saúde Mental).
Postulante junto à Sociedade Brasileira de Psicanálise – MG (SBP-MG).
Formação em Psicanálise, Círculo Psicanalítico de Minas Gerais (CPMG).
Professor de pós-graduação.
Professor do Instituto Contemporâneo de Psicanálise e Transdisciplinaridade.
Membro do grupo Aberto Sándor Ferenczi.
Coordenador do Núcleo de Investigação sobre o Corpo e cocoordenador do Grupo de Estudos Toxicomanias e Psicanálise da CASM.

Ka Ribas
Homem Medicina, terapeuta sistêmico e educador.
Especialista em História da América Latina.
Condutor de cerimônias ancestrais e membro conselheiro da Igreja Nativa Guarani Tatá Endy Rekowé.
Idealizador do Método A.R.C.O. - Aplicação e Resgate de Conhecimentos Originários. Cocoordenador do Espaço de Saúde Integra-Ativa.

Paulo Roberto Ceccarelli
Psicólogo.
Psicanalista.
Doutor em psicopatologia fundamental e psicanálise pela Universidade de Paris 7 - Diderot.
Pós-doutor pela Universidade de Paris 7.
Coordenador do Instituto Mineiro de Sexualidade (IMSEX <www.imsex.com.br>).
Diretor científico do Centro de Atenção à Saúde Mental (CESAME < www.cesamebh.com.br>).
Membro da Société de Psychanalyse Freudienne - Paris, França.
Membro da Associação Universitária de Pesquisa em psicopatologia fundamental.
Pesquisador do CNPq.
Professor Adjunto IV da PUC Minas.
Professor e orientador de pesquisas do mestrado de Promoção de Saúde e Prevenção da Violência/MP, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Professor e orientador de pesquisas na pós-graduação em psicologia da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Sócio do Círculo Psicanalítico de Minas Gerais (CPMG).
Sócio fundador do Círculo Psicanalítico do Pará (CPPA).

 

 

1 Trabalho apresentado no Painel 3 – Psicanálise e subjetividades contemporâneas do XXIII CONGRESSO DO CÍRCULO BRASILEIRO DE PSICANÁLISE e da III JORNADA DO CÍRCULO PSICANALÍTICO DO PARÁ, Psicanálise e diversidades: inconsciente, cultura e caminhos pulsionais. Belém (PA), 7-11 nov. 2019.
2 Xamanismo é um termo cunhado por antropólogos para definir um conjunto de práticas ancestrais de cura, êxtase, devoção e conexão com o transcendente. Esse conjunto de práticas é encontrado em todo o mundo, o que transforma o xamanismo em um fenômeno universal e essencialmente humano. Suas origens remontam há 40 ou 50.000 anos, no período paleolítico, o que o torna a primigênia forma do ser humano de se conectar ao sagrado e a mais antiga prática espiritual da humanidade. A expressão originou-se a partir da palavra “Saman”, que é a denominação dada pelos povos das estepes da Sibéria e Mongólia à pessoa, ao especialista que domina e utiliza essas práticas ancestrais e detém o conhecimento e sabedoria ancestral a elas relacionados. Entre os fundamentos do xamanismo, estão o reconhecimento do sagrado e transcendente nas diferentes manifestações de vida e respeito pela ecologia; a utilização de inúmeros recursos naturais de cura oferecidos pela natureza disponíveis nos reinos mineral, vegetal e animal; a relacionalidade e interconectividade de tudo; a necessidade de expansão de consciência humana e a comunicação com os outros mundos, dimensões e realidades. Disponível em: http://kawribas.blogspot.com/2017/03/os-beneficios-do-xamanismo-para-o.html?m=1. Acesso em: 07 de abril de 2020.
3 Minimamente, diríamos que o uso cerimonial de plantas psicoativas poderia funcionar coma uma forma de gestão do gozo na medida em que o enquadre e a condução do xamã abriria a possibilidade de uma nova maneira de o indivíduo se relacionar com os psicoativos.
4 A CASM é uma Clínica Ampliada de Saúde Mental situada no município de Belo Horizonte, que conta com uma equipe multi disciplinar de psiquiatras e psicólogos, e atua em diversas abordagens teórico-práticas. Desde 2013 , busca acolher as pessoas com sofrimento psíquico e promover tratamentos individualizados visando a melhora da qualidade de vida, almejando ser referência em tratamento psiquiátrico e psicológico em Belo Horizonte.
5 O Espaço de Saúde Integra-Ativa é uma proposta voltada para a promoção de saúde, prevenção de doenças e para redução de danos e das condutas de risco.
6 Referimo-nos às práticas do yoga, arteterapia, musicoterapia e constelação familiar, já regulamentadas como PICs.
7 Observamos o aumento considerável de práticas complementares de saúde, assim como um advento de práticas cerimoniais ritualísticas que envolvem o uso de plantas sagradas psicoativas.
8 “De fato, a obra clássica de Mircea Eliade foi a primeira a fornecer um estudo histórico do fenômeno do xamanismo, sistematizando e unificando as até então espalhadas e escassas fontes etnográficas. Eliade é certamente o principal pesquisador do xamanismo entre os pensadores ocidentais, [...] a visão hoje consagrada do fenômeno como um conceito religioso fundamental, isto é, do xamanismo como ingrediente primordial da religião, é proveniente de sua extensa pesquisa sobre o assunto. Longe de ser uma autoridade neutra, Eliade é por assim dizer o criador da categoria “xamanismo”. [...] Como publicou muitas obras seminais em temas ligados à religião, Eliade foi certamente o primeiro pesquisador ocidental a considerar a problemática do xamanismo e defini-la em sua complexidade” (Lima Santos , 2007, p. 20).
9 Tradução livre: Para nós, um dos primeiros ensinamentos que existem dentro da Tradição, é a origem. Nossa origem é no ventre da Mãe Terra, e é uma das primeiras cerimônias que temos na hora de vir a tomar forma, a tomar força, a tomar, de alguma maneira, sorte na vida. Chama-se a cerimônia de Temazcal.
10 Denominação usada na aldeia Mbyá Guarani, Tekoha Yynn Moroti Wherá, localizada em Biguaçu, Estado de Santa Catarina e sede da Igreja Nativa Guarani Tatá Endy Rekowé.
11 Artigo Psicopatologia das adições e alguns entraves clínicos apresentado no VII Congresso Internacional de Psicopatologia Fundamenta (2016) e na palestra intitulada Ayahuasca e o Incremento da Matéria dos Sonhos no Centro de Atenção à Saúde Mental - Belo Horizonte (2017), evento do Espaço de Saúde Integra-Ativa.
12 O rizoma é um conceito inspirado na botânica. O rizoma apresenta-se das formas mais diversas, desde sua extensão superficial ramificada em todos os sentidos até suas concretizações em bulbos e tubérculos [...] Em um rizoma, cada traço não renvoie necessariamente a um traço linguístico: as cadeias semióticas de toda natureza são conectadas a estes conforme os modos de codificação mais diversos, cadeias biológicas, políticas, econômicas, etc., colocando em jogo não apenas os diferentes signos, mas também os estatutos dos estados das coisas (Deleuze; Guattari, 1980, p. 13).
13 Prótese (do grego antigo prósthesis, “adição, aplicação, acessório”) é o componente artificial que tem por finalidade suprir necessidades e funções de indivíduos sequelados por  amputações, traumas ou deficiências físicas de nascença. A prótese pode virar “um substituto ideal”, com a vantagem de ser mais resistente. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Pr%C3%B3tese>. Acesso em: 19 jun. 2018.
14 Palestra Ayahuasca e o incremento da matéria dos sonhos realizada no Espaço de Saúde Integra-Ativa do Centro de Atenção à Saúde Mental, em Belo Horizonte, no dia 28/08/2017.
15 Termo criado pelo autor.

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