SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.34 número52Aprendizagem do amor índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Ide

versión impresa ISSN 0101-3106

Ide (São Paulo) vol.34 no.52 São Paulo ago. 2011

 

EM PAUTA - AMORES

 

Entrevista com João Jardim

 

Interview with João Jardim

 

 

Patrícia Cabianca Gazire* ; Dora Tognolli**

Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo

 

 

João Jardim é cineasta, conhecido por seus documentários Janela da alma (2001), Pro dia nascer feliz (2007) e Lixo extraordinário (2010). Seu recém-lançado Amor? (2011) traz oito depoimentos sobre relações amorosas violentas, interpretadas por conhecidos atores da TV e do cinema brasileiro. O corpo editorial da revista ide entrevistou-o em junho de 2011. Nessa entrevista, relembra suas produções anteriores, discorre sobre as relações entre a produção cinematográfica e a psicanálise, e aborda os temas do amor e da violência nos dias atuais – tema de seu mais recente filme.

IDE – Inicialmente gostaríamos de pedir que você relatasse brevemente o seu percurso no cinema.

João Jardim – Eu trabalho com cinema, sempre estive envolvido com a atividade cinematográfica. O primeiro filme que fiz foi o Janela da alma, que demorou quase seis anos para ser concebido. A ideia inicial partiu da tentativa de investigar o fato de eu não enxergar direito, de como o fato de eu ser muito míope teria de alguma forma influenciado a minha vida. O filme partiu disso, e pude perceber muito rapidamente que havia coisas mais interessantes para serem pesquisadas e abordadas do que a minha problemática individual. Mas é muito gratificante você fazer um trabalho a partir de uma experiência intrinsecamente ligada à sua razão de ser: eu sempre fui muito míope, desde pequeno, então essa questão de ver, como ver e como ser visto sempre foi algo que passou pela minha cabeça, sobre o que sempre refleti. Janela da alma foi um trabalho que durou quase seis anos, meu primeiro filme, demorou muito para amadurecer e acabou sendo um filme sobre o olhar. Revi o filme outro dia: fala sobre a palavra, sobre o pensamento, é quase um ensaio que você vai assistindo e vai ouvindo pessoas falando coisas interessantes. Nem saberia dizer o tema dele exatamente, porque acho que o mais legal é aquilo que você fica ouvindo sobre diversas coisas diferentes. Cada coisa que é dita ali tem um subtexto diferente. Em seguida, a ideia foi fazer um filme sobre a questão da escola e da adolescência. A questão proposta era a falta de percepção, a tentativa de investigar a falta de percepção da escola, qual a relação da escola com determinada pessoa, um jovem com idade entre os treze e quinze anos, amadurecendo, passando por um momento único e intenso na vida e lidando com um sistema educacional falho. Ao mesmo tempo, esse jovem não tinha nenhum acesso ao processo pelo qual ele estava passando. Isso piorava as coisas, a própria escola piorava e o próprio rito de passagem se tornava também mais difícil pela falta de compreensão daquele momento. Foi um filme interessante de fazer porque eu fui descobrindo muitas coisas, coisas que eu imaginava ao fazer o filme.

IDE – O Pro dia nascer feliz também teve relação com alguma experiência pessoal sua, como o Janela da alma com a sua miopia?

JJ – Acho que sempre tem. Pro dia nascer feliz tem a ver com a situação do país, da minha vontade de fazer alguma coisa pelo país, vontade de entender por que o Brasil é como é. Então achei que seria interessante investigar a escola, o que acontece dentro da escola. E também a minha própria adolescência, talvez por ter sido um período bem marcante para mim. Tive vontade de voltar a esse momento, mas nada muito consciente. Eu comecei a fazer uma pesquisa sobre gravidez precoce com adolescentes e eles começaram a falar da escola. Então eu também falei. A problemática deles na escola foi se tornando mais interessante que a questão da gravidez precoce. Foi a partir daí que surgiu a ideia de pesquisar o filme. É um filme muito pessoal, mas tem uma relação pessoal diferente do Janela da alma.

IDE – Podemos dizer que há, no Janela da alma, a ideia de que a gente percebe muito mais pelo interior do que pelo exterior, muito mais por aquilo que a gente tem dentro, pelo acervo interno.

JJ – Com certeza, acho que o filme fala disso, tudo nós compreendemos a partir daquilo que já havíamos compreendido antes. Tudo o que vemos, olhamos e associamos com algo que já vimos antes para poder entender seu significado. Quando um geólogo olha para uma pedra ele não vê só uma pedra, ele vê ali tudo aquilo de informação que ele tem sobre aquela pedra. Penso que isso é uma metáfora para as percepções ao longo da vida. Quando olhamos para um objeto e ainda não temos o conhecimento daquele objeto, ele é só uma pedra. Quando começamos a ter o conhecimento do que aquilo significa, o que mais tem ali dentro além daquele simples objeto, vamos vendo outras coisas. Então acho que tem muito isso, você sempre projeta naquilo que está vendo, todo o conhecimento e toda a experiência que você tem dentro de você, principalmente a experiência.

IDE – E o filme Amor? vem na sequência, seu último filme.

JJ – Antes fiz Lixo extraordinário. Boa parte da filmagem, seis ou sete meses, ocorreu dentro do aterro sanitário do Jardim Gramacho, mostrando os catadores de lixo. Apesar da ideia não ter sido minha, foi muito forte fazer o filme, porque a vivência, estar no aterro sanitário junto com os catadores de lixo, entendendo como aquelas pessoas foram parar ali dentro, sobrevivem ali dentro, essa quebra de paradigma vivida por nós, vivida por mim. Achamos que quem está ali é o pior da sociedade, e não é, porque o pior não sobrevive ali dentro. Então é muito interessante. Há um lugar que é muito difícil, muito desagradável de estar, mas nele há pessoas interessantes, com valores, porque senão elas não conseguiriam resistir ali dentro. Um mendigo, uma pessoa que não tem força de vontade, que não tem capacidade, que não tem inteligência, não sobrevive dentro de um lixão. É um lugar muito difícil. É como uma guerra o dia a dia ali. Não guerra no sentido da diversidade, mas guerra no sentido dos perigos enfrentados.

IDE – Vamos falar do filme Amor?, que é também o tema da revista. Como você chegou a esse tema, a essa conexão entre amor e violência?

JJ – Esse tema está aí o tempo todo, vemos esse assunto surgir a todo momento: o amor ligado à violência. O que eu quis investigar é como uma relação que começa amorosa, com paixão, com algo muito positivo, como aquilo evolui para algo muito desagradável, violento, que de alguma maneira aniquila a personalidade da pessoa. Eu tinha curiosidade de entender também por que as pessoas não saíam dessas relações, o que acontecia para chegarem até ali. Então o filme foi uma investigação desse processo.

IDE – Você tinha então um objetivo investigativo?

JJ – Acredito que para um documentário ser interessante ele não pode saber aonde vai chegar. O "fazer o filme" também tem de ser uma descoberta, porque o espectador precisa viver essa descoberta. Se você tem um monte de conhecimento e só despeja esse conhecimento em cima do espectador, certamente o resultado será chato. Um documentário bom precisa ter essa investigação.

IDE – É um processo que vai ocorrendo...

JJ – Sim, isso é algo próprio da técnica do cinema, é preciso haver um deslocamento. Um bom filme precisa se deslocar no espaço, no tempo, naquilo que você pensa, como a questão do herói, que começa de um jeito e, quando o filme termina, ele se tornou outra pessoa. Esse deslocamento é dramaturgicamente importante. A maneira de isso ser feito no documentário é essa, a pesquisa que o filme tem passa a fazer parte do próprio conteúdo dele.

IDE – A ideia do filme teve relação com alguma experiência sua? Você acha que existe uma questão essencial que une amor e violência, os dois caminham juntos na experiência humana de modo geral?

JJ – A violência é algo intrínseco ao ser humano, não de todos, mas a questão da violência está em todos nós. Evoluímos, aprendemos a lidar com ela. Assim como a questão do amor, da necessidade do relacionamento afetivo, de ser amado, de ter relações afetivas. O fato de amor e violência se misturarem não é tão estranho assim, a questão de perder o amor, da força daquilo que o amor provoca dentro da gente e a perda disso pode provocar reações violentas. O ser humano tem necessidade de poder, de dominar, de ter o outro fazendo aquilo que ele quer para que não se sinta ameaçado, inseguro. Então as formas mais sutis de violência também estão ligadas a esse tipo de necessidade.

IDE – As histórias são muito diversas, apesar de todas abordarem o tema do amor e da violência, ou da paixão e da violência. Como você fez para selecionar essas pessoas, esses depoimentos, como é que foi o processo inicial de chegar às pessoas?

JJ – Era importante que fosse diverso, que nós não ficássemos batendo na mesma tecla, que pudéssemos rodear o assunto. A partir do tema das relações entre amor e violência, tentamos dar a volta nele, mostrando vários aspectos. Algo interessante no filme é que os homens são violentos, mas de alguma maneira eles também sofrem.

IDE – À medida que os depoimentos se sucedem, as cenas se dirigem para a violência física. Você já tinha isso em vista ou foi aparecendo nos depoimentos?

JJ – Depois que o filme ficou pronto, muitas pessoas que assistiam se identificavam com as coisas que o filme falava, sem terem obrigatoriamente passado por uma experiência que envolvesse alguma violência física ou até alguma violência moral mais forte. As pessoas se identificaram de uma maneira intensa com o filme. Eu achava que ocorreria uma identificação, mas não tão forte. Para parte do público, essa questão da violência física acaba sendo não um detalhe, mas algo que não é aquilo que é mais marcante. Quando estava editando o filme, isso também aconteceu, acabava sendo o físico, mas o processo que envolvia uma pessoa que agia de forma violenta era mais intenso e mais presente do que se podia imaginar. O que considero mais interessante é que acho que isso acontece porque confundimos atos violentos com demonstrações de amor. Então confundimos a intensidade. Por isso que eu acho que as pessoas se identificam tanto assim, de alguma maneira a gente passa por aquilo sem lê-lo como algo violento. Quando aquilo é mostrado como uma violência, as pessoas dizem "Não!", embora já tenham passado por aquilo. "Mas isso aí é uma violência, poxa, mas eu não achei que fosse!" Acho que isso é uma das razões por que a violência é tão frequente: nós somos pouco informados sobre aquilo que pode ou não pode em uma relação. Então penso que a questão da violência física, no filme, aparece quase como uma pergunta: Por que precisou chegar lá? Acho que isso toca a questão da violência moral.

IDE – Em uma de suas entrevistas para um jornal de São Paulo, você disse que achava que o filme atingia de maneiras diferentes os homens e as mulheres. Você tinha a impressão de que as mulheres assistiam a um filme e os homens assistiam a outro filme. Como foi essa impressão?

JJ – Não que não houvesse homens que vissem da mesma maneira que as mulheres. Mas, genericamente, acho que era isso. Acho que os homens se sentiam incomodados porque é muito surpreendente e incomoda muito alguma coisa que questiona o fato, por exemplo, de que é o homem que escolhe o canal de televisão a ser assistido. De maneira geral, acho que os homens são surpreendidos por um filme incompreensível para eles. Não me refiro aos homens que possuem familiaridade com o tema, eu me refiro aos que não possuem familiaridade com essa questão. As mulheres tinham uma visão mais generosa, embora o filme aborde questões bastante difíceis sobre elas. Elas se sentiam representadas, algumas ficavam incomodadas. Já com os homens era diferente, boa parte deles não entendia o filme.

IDE – O filme provoca nos homens um estranhamento...

JJ – Totalmente. Alguns acharam que o filme era um equívoco. Diziam: "Mas como assim? Não são assim as coisas!". Chegava a ser cômico. Eles diziam "Não é assim!", como se se tratasse de ficção. As opiniões dos homens variavam muito, não consigo generalizar. O que eu percebia era uma reação muito diferente entre os homens e entre as mulheres. Na maioria dos filmes as opiniões são variadas, mas elas variam em geral, não por sexo. A diferença é que em Amor? o sexo também determinava, na maior parte das vezes, a opinião sobre o filme.

IDE – Na maior parte das histórias do filme as mulheres são agredidas.

JJ – Sim. Mas a afirmação de que o filme enfoca os homens como agressores é simplista. Não penso que os homens acharam o filme agressivo.

IDE – O filme não é agressivo com os homens, ele relata uma realidade.

JJ – Exatamente.

IDE – Você acha que a questão amor e violência se relaciona com a questão da posse do outro, do domínio do outro nas relações?

JJ – Sim, a questão do poder.

IDE – Poder sobre o outro.

JJ – Exatamente, a questão do poder, um domina o outro, um tem o outro sob o seu controle.

IDE – Mas que a gente nunca tem...

JJ – Essa é a questão mais comum. Mas há a questão de que o homem se torna muitas vezes violento quando ele é submetido. Porque muitas vezes o casal se provoca e isso evolui para algo cada vez mais violento, como a história que a Lilian Cabral conta no início do filme. Acho que aquela é uma história típica. O que acontece na relação é que uma pessoa pode ficar realmente muitos e muitos anos subjugada a outra, como na história interpretada pela Julia Lemmertz. Foram anos e anos, dois filhos, mas ela também é uma pessoa difícil. As mulheres hoje em dia têm como revidar de alguma maneira, as mulheres são informadas, entendem o que está acontecendo.

IDE – Sim. Mas tem um peso histórico, relacionado à repressão do prazer da mulher durante séculos. Então isso de alguma maneira está aí ainda, tem um papel aí...

JJ – Sim, mas hoje em dia talvez o maior peso seja a questão financeira, pois as pessoas não querem abrir mão de determinado padrão de vida. Então existe uma sombra sobre as relações: "Se eu me separar dele não vou ter isso ou aquilo". Esse é um sentimento terrível.

IDE – Gostaríamos que você contasse como foi o trabalho de colher os depoimentos e depois o trabalho com os atores. Porque um dos pontos altos do filme é o desempenho dos atores. Como isso se passou?

JJ – Em relação aos depoimentos, o processo foi abordar as pessoas pedindo indicações de amigos ou de instituições que lidavam com esse tipo de situação. Ou mesmo as próprias pessoas, com a premissa de que elas não seriam identificadas. Dizíamos o seguinte: "Você pode nos contar a sua história? Isso faz parte de uma pesquisa, seu depoimento pode ser utilizado ou não, mas, se for utilizado, você não será identificado. Só você saberá porque a história é a sua. Mas algumas mudanças serão feitas para que você não seja identificado". E conseguíamos histórias boas e ruins. Foi um trabalho de persistência. Fomos aprendendo como perguntar, como questionar. Íamos evoluindo durante o processo. Foi um trabalho difícil, mas bastante interessante. Em seguida, com os atores, eu quis manter principalmente a ideia de um documentário. A leitura que os atores fariam do texto daquela história, do ponto de vista pessoal deles, determinaria como seria aquele personagem. Cada ator teria de incorporar a história como sua. Interpretavam, compunham um personagem, as decisões seriam muito pessoais de cada ator. Porque normalmente o ator pensa "esse personagem é assim ou é assado", mas o personagem está fora do ator. No caso desse filme, o ator teria de pensar como se tivesse vivido a situação a ser interpretada. Compondo algo, mas sem procurar nada fora, procurando tudo dentro dele.

IDE – Incorporar mesmo.

JJ – Exatamente. Ensaiamos muito, questionamos muito. Eu perguntava aos atores: "Por que isso? Por que aquilo? Por que você acha que nessa situação teria feito isso, ou aquilo?". Esse era um jeito de tentar ajudar os atores, não no sentido de realizar uma investigação psicanalítica com eles, mas no sentido de fazê-los sentir e tomar as decisões que o personagem tomou. A fim de ajudá-los a incorporar aquela história. Eu perguntava "Por que você optou por isso? Por que você optou por aquilo?", e dessa forma eu fazia com que eles achassem uma justificativa do que levou aquela pessoa a agir daquela maneira.

IDE – É, no caso da Julia Lemmertz foi possível observar o envolvimento que ela teve com a história, pois, quando a cena terminou, ela estava ainda emocionada, chorando. Quer dizer, o laboratório dos atores era o interior deles próprios.

JJ – Exato, no caso desse filme isso foi possível, porque se tratava de depoimentos. Eu tinha de dar a eles espaço, porque dependia só deles, mas ao mesmo tempo tinha de oferecer um caminho legal para eles. Então foi bom, foi prazeroso, foi uma troca boa.

IDE – Os atores tinham o texto dos depoimentos?

JJ – Sim, eles receberam o texto com os depoimentos. Alguns quiseram ouvir o depoimento original, a Lilian e o Ângelo ouviram, mas só uma vez, sem copiar nada, só para entender algumas coisas.

IDE – Você acha que a realização do filme transformou sua visão sobre o amor, sobre a violência? Você falou que não prevemos aonde vamos chegar, de que há uma transformação. Houve uma transformação sua também depois de ter finalizado o filme?

JJ - Com certeza. Esse filme é próximo, em sua forma ensaística, do Janela da alma. O Janela da alma foi um mergulho em algo luminoso na alma das pessoas. E esse filme é profundo, mas enfoca um lado obscuro da alma, toca em algo com que é difícil tomar contato, que é desagradável. Como são experiências desagradáveis, foi difícil conseguir que o filme não ficasse "para baixo", "deprê". Ele tem esse mergulho no lado sombrio. É estranho trazer para as pessoas uma experiência sombria, impactante. O filme tem um efeito positivo e acho que era isso que eu deveria estar querendo. Mas não consegui ainda elaborar, está recente ainda para elaborar essas consequências, foi um esforço grande o lançamento do filme. Para fazermos com que ele tivesse a carreira que tem tido – vai chegar a vinte mil espectadores –, foi um esforço grande, um trabalho árduo, de envolvimento com um tema difícil, e que muita gente tenta pôr em segundo plano. É engraçado isso, é como se as pessoas dissessem: "Isso de fato existe, mas será que precisa de tanta atenção?".

IDE – Quando você disse "Isso é o que eu deveria estar querendo" se aproximou da psicanálise, é muito psicanalítico, mas isso não está totalmente nas suas mãos, você não controla.

JJ – E no filme mais ainda, porque não se pode fazer um filme com intenção, entende? Porque, quando se tem uma intenção, na ficção tudo bem, porque você vai preparando a pessoa. No documentário, em um filme de arte, tudo que é intencional demais não atinge as pessoas. Então você tem de o tempo todo se policiar para não querer ser manipulador. O Lixo extraordinário tem um pouco dessa manipulação. É engraçado, mas a manipulação provoca rejeição nas pessoas. Quando se está fazendo um filme, há como manipular. Veja um filme infantil, por exemplo, mesmo os adultos se emocionam com alguma coisa. Existe uma técnica cinematográfica para chegar a determinada emoção. Quando o filme é de ficção, isso é ótimo. Por exemplo, um filme que se aproxima de uma fábula, vem uma emoção, as pessoas a aceitam felizes da vida, e pensam: "Que bom que estou sentindo isso, que bom que isso está acontecendo". Quando se trata de um filme mais sério, quando o filme traz uma informação que faz as pessoas trabalharem com o lado racional, e o filme traz uma manipulação qualquer, as pessoas estão atentas àquilo e então a rejeitam. Porque é outra forma de assistir. Tela grande e uma hora e meia de duração é bem diferente de televisão.

IDE – Como foi a repercussão do filme para a crítica, para o público?

JJ – Para mim foi boa. É engraçado porque a recepção foi muito variada, tem gente que sai do filme e diz que esse é meu melhor filme. Tem gente que sai impressionada, mexida. Ao mesmo tempo, há pessoas que se sentem incomodadas, que falam que o filme é um exagero, que as coisas não são assim, ou perguntam: "Para que isso?". Acho que a subjetividade é assim, um filme pode despertar opiniões diferentes. Mas a grande parte da crítica foi muito boa. Um crítico não gostar faz parte, não tem problema. Não acho a crítica importante do ponto de vista da história do filme, vejo isso por meus outros filmes. A história do filme é escrita mais pela forma que o filme vive, pelo modo que algumas pessoas falam dele do que propriamente pelo que diz o crítico.

IDE – Sua opção é a linguagem do documentário ou você pretende fazer algum filme de ficção? Você acha que tem mais coisas a dizer pela linguagem do documentário? Quais são seus projetos futuros? O que você está filmando agora?

JJ – Estou fazendo uma pesquisa para um projeto do canal GNT sobre as novas relações familiares que existem hoje em dia. As famílias hoje em dia estão muito diferentes, há um pai de setenta anos com um filho de dez. Há duas mulheres criando filhos, famílias com quatro filhos de casamentos diferentes. Estou fazendo uma pesquisa para elaborar um projeto sobre esse tema. Estou fazendo também um projeto de um longa-metragem sobre o suicídio de Getulio Vargas, uma ficção baseada em fatos reais sobre os últimos dezenove dias da vida dele.

 

 

* Membro filiado da SBPSP.
** Membro filiado da SBPSP.