SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.38 número60Editorial"Último Tango em Paris" - Áreas Secretas índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Ide

versão impressa ISSN 0101-3106

Ide (São Paulo) vol.38 no.60 São Paulo jul./dez. 2015

 

MEMÓRIA

 

Os primeiros anos da ide - lembranças e reflexões

 

 

Chaim José HamerI; Deodato Curvo de AzambujaII; Myrna Pia FavilliIII; Luiz Tenório de Oliveira LimaIV

IMembro efetivo e didata da SBPSP
IIMembro efetivo e didata da SBPSP
IIIMembro efetivo e didata da SBPSP
IVMembro efetivo da SBPSP

 

 

Como celebração do aniversário de 40 anos da ide, realizamos dois encontros com alguns dos colegas que fizeram parte da primeira Comissão Editorial da revista. Agradecemos a grande generosidade com a qual colaboraram conosco. A seguir, apresentamos uma síntese dos seus depoimentos.

* * *

Em nossa conversa com o Dr. Chaim Hamer, 86 anos, membro efetivo, analista didata e presidente da SBPSP de 1984 a 1986, tivemos o prazer de escutá-lo discorrer com emoção e muito entusiasmo sobre os primeiros tempos da revista que ele idealizou, desde o nome - ide. E, também, ficamos sabendo que, desde menino, tem gosto por desenhar, por ouvir música erudita e por fazer esportes. Mas, além desses gostos, soubemos do seu prazer de trabalhar, como ele mesmo afirmou - "eu gosto do trabalho, para mim a vida é trabalhar". E, sobretudo, o de colecionar obras de arte. Como é reconhecido entre curadores de exposições, Dr. Chaim é um grande colecionador, sobretudo de obras de Ismael Nery, pintor ao qual dedicou escritos.

IDE - Considerando o seu gosto pela arte e pela cultura, de alguma maneira, isso determinou a idealização da ide, uma revista que se propõe a aproximar a psicanálise e a cultura?

Chaim - Sem dúvida, mas o que eu pretendia era introduzir famílias dentro da Sociedade de Psicanálise por meio dos que faziam parte da Sociedade. Para que as pessoas que não eram psicanalistas pudessem conhecer melhor aquilo que estávamos fazendo, que as famílias dos psicanalistas se tornassem interessadas no que eles estavam estudando e praticando. Seria uma valorização da psicanálise em um meio mais amplo.

IDE - Como foi que surgiu a ideia da revista?

Chaim - Eu tinha colaboradores de primeira. Eu era o editor e coordenador-geral. Havia outros coordenadores - Deodato Azambuja, Beatriz Picoli, Maria Lucia Pacheco Silva, Myrna Pia Favilli, Paulo Duarte Guimarães Filho, Sonia Azambuja, Rose-li Azambuja, Luiz Tenório, entre outros. Esse pessoal era muito bom. O meu grupo de colaboradores era um grupo de elite. Eram todos muito bons, formidáveis mesmo. Como editor, eu procurava dar a eles muita liberdade para que trabalhassem e pensassem como fazer cada número da revista. Nós fazíamos reuniões aqui em casa, meu filho fotografava tudo. Foi um tempo muito bom. Eu tenho saudade dessa época. Bom, como surgiu a ideia da ide, a ideia inicial? Em poucas palavras, foi assim: Laerte Ferrão foi presidente da SBPSP, anterior à minha presidência, e ele queria que eu fizesse uma coisa nova. Então, eu pensei em fazer uma coisa que não fosse apenas para os estudantes ou para os analistas, mas que incluísse as famílias, que a família se interessasse também. A ide tinha esse propósito, sempre teve esse propósito. Não era uma revista para os psicanalistas, era uma revista para os amigos e para as famílias dos psicanalistas, uma publicação que deveria ir em direção à comunidade, apresentando a psicanálise para um grupo mais amplo. Eu queria que a psicanálise se difundisse, que se expandisse, que um público mais amplo soubesse o que é fazer psicanálise, por que se faz psicanálise. A partir da revista, havia eventos que visavam reunir as famílias, tínhamos muitas vezes conferências que o público frequentava. Eu mesmo dei conferência para um público que não era de psicanalistas, que não trabalhava com análise e eu achei muito útil. Ainda hoje eu acho que é muito útil. A ideia não era trazer a cultura para os psicanalistas, mas de levar a psicanálise para a cultura. Era uma ideia nova. Havia gente que achava que não se devia difundir a psicanálise. Imagina? É difícil dizer o que na época se argumentava, mas o fato é que alguns colegas achavam que psicanálise é alguma coisa de elite. E até certo ponto é verdade, infelizmente. Mas, nós crescemos, já existem analistas muito bons que trabalham em muitos lugares. Nós temos gente muito boa na profissão. De qualquer maneira, apesar das resistências que toda instituição sempre tem em relação às ideias novas, vejam que a aceitação desse projeto foi boa, tanto é que a ide sobreviveu...

* * *

Em outro momento, a conversa que tivemos com Deodato Curvo de Azambuja, Myrna Pia Favilli e Luiz Tenório de Oliveira Lima começou com a seguinte pergunta: "Como surgiu a ideia da revista, o que motivou a criação da ide?".

Deodato - Como surgiu a ide? Foi mais ou menos assim: em 1975, o presidente da Sociedade era o Ferrão, que convidou o Chaim, eu e o Arlindo Adeodato ( membro efetivo da SBPSP, já falecido) para que fizéssemos um boletim da Sociedade. Quer dizer, ele não explicou direito o que seria esse boletim, ele explicou para o Chaim, que seria o editor. Mas achamos que nós éramos muito peso pesado para fazer só um boletim tipo boletim de ocorrência, eventualmente um boletim de notícias... Aliás, modéstia à parte, fui eu que dei a ideia de fazer uma publicação mais ambiciosa. Então, eu falei com o Chaim e com o Arlindo que seria interessante se a gente fizesse uma revista que contemplasse não só a Sociedade, mas a Sociedade no seio da cultura. E o Chaim, que era muito aberto a essas ideias, topou na hora, achou interessante e, então, ficamos pensando em quem a gente convidaria como colaboradores. E foram surgindo vários nomes: a Myrna, que está aqui, o Tenório, que está chegando, o Paulo Duarte, que não vai poder vir hoje. Quem mais? A Sonia Azambuja, que participou desde o início. A Rose Azambuja, que não fazia formação aqui, mas foi convidada. Isso é um aspecto interessante porque podíamos convidar pessoas que não eram psicanalistas, mas que poderiam contribuir. A Rose, por exemplo, fazia Sociologia na USP. Quer dizer, convidávamos pessoas de outras formações... Inicialmente apareceu o nome da Rose, e o Chaim, muito receptivo, achou ótimo... Bom, essa foi basicamente a composição da primeira Comissão.

IDE - E o nome ide, surgiu como?

Deodato - As reuniões eram sempre na casa do Chaim. Depois que nós começamos a nos reunir, marcamos de fazer um brain storm, coisa da moda, na época. Então, vários nomes foram sugeridos e o nome ide apareceu. Na cabeça de quem apareceu? Foi o Chaim que surgiu com esse nome. E todo mundo achou ótimo. O Tenório até fez uma interpretação interessante, ele falou: ide tem uma coisa de ir, de abrir caminho. Ide - vamos em frente e seja o que Deus quiser. Na minha maneira de ver não teve nenhuma ligação com Id pulsão ou Id no sentido psicanalítico. A ide tem mais o sentido de abrir caminho, de encontrar caminhos. Tem a ver com Id também, mas é mais um caminho no sentido de caminhando é que se faz o caminho, ou de desbravar também. Mas, a partir daí, uma coisa interessante é que a pessoa que realizava fisicamente a revista, as primeiras revistas, com o uso do mimeógrafo, foi a Lourdes. Ela era uma das secretárias que tomou a coisa com muito amor, muito empenho, porque ela achava que era alguma coisa que precisava ser valorizada. Ela se empenhava muito e trabalhou bastante.

Myrna - Essa ideia inicial é o que a ide é atualmente: uma publicação semestral da Sociedade, desde 1975, que tem como linha editorial o diálogo entre psicanálise e cultura. Esse era o ponto desde o começo. Daí fica explicado porque existe uma significativa coletânea de trabalhos e entrevistas que incluem psicanalistas e pensadores de diversas áreas do conhecimento, assim como literatos, antropólogos, artistas plásticos, sociólogos, nacionais e estrangeiros. O que eu queria salientar é esse start da psicanálise como um diálogo, ou melhor, da linha editorial da revista que procura um diálogo com a cultura, essa é a essência do espírito que a gente imprimiu, não só o corpo editorial, mas, inclusive, todos os colaboradores que nos ajudaram a imprimir esse espírito. O diálogo seria o encontro entre o conhecimento elaborado aqui na Sociedade com outros conhecimentos, com outras áreas de pensamento. Essa era a ideia, a de uma troca mesmo.

Deodato - A ideia do diálogo é uma ideia de abertura, quer dizer, a gente pensava que a Sociedade não poderia se fechar sobre si mesma. Na verdade, essa ideia, num certo sentido, retomava o fato de que a Sociedade surgiu no meio da cultura, então, a nossa ideia era a de uma retomada. No início, o que tínhamos? Havia o Durval Marcondes, que fez parte do movimento modernista de 1922, a Virginia Bicudo, que também era uma pessoa que fazia conferências, dava aulas no rádio, o que é bem interessante... Existia essa história que, de certo modo, mostra que nós não tínhamos nenhuma originalidade, era mais uma espécie de retorno às origens.

IDE - E como foi fazer esse retorno às origens e pensar essa relação da psicanálise com a cultura, num momento histórico difícil como foi o ano de 1975 no Brasil? Vocês tinham alguma ideia dessa relação?

Deodato - Não. Não tínhamos. Num certo sentido, havia uma abertura. Tanto é que houve certa reação na Sociedade de, digamos, não aceitação da revista, a essa ideia da revista ser relacionada à cultura. Quer dizer, existiam pessoas que diziam assim: "aqui é uma Sociedade científica, que negócio é esse de buscar cultura... Tem muita gente boa nessa revista que está indo para esse lado e nós estamos perdendo pessoas importantes, indo para o lado da cultura em vez de se ater à ciência...".

IDE - A ciência não era vista como fazendo parte da cultura?

Deodato - Não. Não era vista assim. Era ciência de um lado e cultura de outro. Agora, a Myrna quer falar...

Myrna - Falarei em meu nome e homenageando também a colega Sonia Azambuja, parceira de tantas lutas, inclusive na abertura da ide. Fomos responsáveis, nesses anos difíceis, pela editoria da ide (Sonia em 1977, e eu em 1979). Vou exemplificar com um acontecimento, quando em determinado momento tivemos que confrontar o temor, que o clima autoritário político nos impregnava, com as decisões editoriais a serem tomadas. Eram anos difíceis, todos sabemos, os chamados "anos de chumbo". Havíamos convidado Walnice Galvão, socióloga e estudiosa da literatura brasileira, a escrever um artigo para a ide. Ela nos enviou o artigo "Frequentação da Donzela Guerreira", inspirado na figura de Iara Iavelberg, sacrificada pela ditadura de então. Tivemos que ousar. Nesse momento existia também um movimento para acabar com a ide. Perguntavam qual era o senti-do dessa revista, para que ela servia para a Sociedade? Deveria continuar ou não? Refletimos muito, Sonia e eu, e enfrentamos o desafio proposto: publicamos o artigo da "donzela guerreira", pois nosso compromisso editorial assim exigia. Continuamos a ousar. Afinal, éramos as representantes da parte feminina da comissão editorial inaugural. Publicamos não só o artigo da Walnice Galvão como também incluímos uma pauta de entrevistas a partir desse número, primeiro com Lygia Amaral, que nos acolheu nessa tarefa. Essa entrevista também causou alvoroço na Sociedade. Naquele tempo havia apenas dez didatas e o res-to era o resto. Não era comum uma sessão de entrevistas, nós decidimos fazer entrevistas porque nós estávamos tentando introduzir uma nova abertura dentro da Sociedade. Sonia coloca bem isso, porque ela diz no editorial: "Sei que a ide não pertence aos clássicos da nossa Sociedade, porém, pertence àquela categoria de elementos onde há muita vida, muito movimento e muitas cores". Me desculpem, sinto saudades, estou comovida; afinal, são quarenta anos de história. Posso dizer que abrimos caminhos. Foi uma época de intensa movimentação. Decidimos trazer à tona o feminismo, em vários artigos sobre a condição da mulher. Era um tema muito pouco oficial que fomos abordando, tanto que a Rose Azambuja pôde escrever sobre uma história em quadrinhos em que se conversava sobre as criadas e as crianças, abordando toda uma dimensão psicológica e cultural. A ide era nova. Tínhamos o Deodato falando da psicanálise existente em nosso meio e refletindo sobre a nossa Sociedade, a de um grupo fazendo ciência; o Chaim falando sobre mitos; eu e o Paulo Duarte falando sobre os candidatos; o Tenório realizando entrevistas com Caetano Veloso, enfim, tínhamos uma temática variada. Abrimos caminhos, eu penso. A Associação de Candidatos já estava nesse mesmo rumo, pois organizou a visita de André Green a São Paulo, continuando a ousar uma independência que os candidatos não costumavam ter - é assim que o Tenório entrevistou o Green para a ide. Houve uma certa repercussão da visita do Green porque ele chegou aqui não sabendo que tinha sido convidado por uma Associação de Candidatos, o que não era comum. Qual não foi nossa surpresa quando vimos que ele estava procurando os didatas. E os didatas não apareceram. Pelo que me lembro, apenas o Ferrão compareceu à palestra. Nós estávamos, também na ide, questionando o ambiente muito fechado dentro da Sociedade que, por sua história, se organizou dentro do modelo britânico de pensamento psicanalítico. Penso que por isso a ide começou a ficar meio incômoda. A ide servia para nos representar no sentido de que uma Sociedade de Psicanálise não é um museu de cera em que só há artigos consagrados. Esses foram os começos de um grupo lutador, respirando os ares perigosos que uma ditadura política sempre impregna. Em 1979, já estavam querendo fechar a ide. A questão veio a público e foi realizada uma consulta entre os colegas. Estávamos no número 7 e a questão fundamental se colocava: se esta revista valia a pena para a Sociedade. No meu editorial ficou registrado assim: "Nós da ide acreditamos que sim e procuramos durante todos esses anos desenvolver o objetivo de transcender um simples boletim de ocorrências e fazer das notícias e dos atrativos algo para ser pensado e elaborado. Para tanto, nós e os colaboradores nos transformamos muitas vezes e com muito amadorismo em repórteres, redatores, revisores, enfim, tudo aquilo que um trabalho de imprensa requer para que a vida da nossa Sociedade, das pessoas que a integram, suas histórias, as atividades que elas patrocinam surgissem como vivas, pensantes, debatendo e levantando indagações para promover novos fatos e novos pensamentos. Como analistas procuramos sempre trazer temas que, embora de caráter filosófico, sociológico, artístico, possam guardar o seu relacionamento com o objetivo da psicanálise. São sempre trabalhos que visam o homem, a vida e suas implicações. Acreditamos que isso é útil e necessário para não nos retermos. Pois afinal, somos todos seres humanos apenas dentro de nós mesmos ou de nossos consultórios?". Então, publicamos na ide os artigos, as entrevistas, inclusive com a Lourdes, que o Deodato citou, que era secretária e criadora artística da parte gráfica da revista e que era uma personagem periférica. Nós todos éramos periféricos, é isso que quero enfatizar. Acreditamos que todos nós, participantes e colaboradores que editaram a ide, lutamos pela responsabilidade de publicar uma revista de cultura, que se transformou e acredito que transformou também a nossa Sociedade. Conseguir fazer a ide foi um sonho, foi uma luta que realmente valeu a pena. Conseguimos, acredito, abrir a Sociedade para um diálogo mais amplo.

Deodato - Isso foi em 1986/87, quando eu fui presidente. Aí fecharam o Instituto, e os candidatos escreveram para a ide. Mas eu quero lembrar também que, antes disso, existia uma turma que falava em retorno a Freud... Então, nós fizemos um grupo na Sociedade, porque no currículo do Instituto não havia um estudo dos trabalhos culturais de Freud, Mal-estar da civilização, Moisés e o monoteísmo, Psicologia das massas, por exemplo, tudo isso não se estudava. Desse modo, criamos um grupo em que estava o Tenório, o Paulo Duarte, Myrna, Sonia... Eu não sei se a formação desse grupo que se interessava pela cultura, pelos trabalhos culturais do Freud, por trazer esse outro lado da psicanálise que não existia no currículo do Instituto, não sei dizer se coincidiu com o começo da ide. Existia o fechamento na sociedade em geral com a ditadura militar, mas havia também um fechamento na Sociedade, que não era o mesmo tipo de fechamento. Isso foi em 1973.

Tenório - Exatamente, em 73. A gente se reunia uma vez por mês ou a cada quinze dias, alguma coisa assim, e foi muito interessante. Eu não sei se esse grupo foi um grupo que influenciou a ideia de retomada não só de Freud, mas retomada dessa vertente final que buscava fazer uma entrada, desenvolver essa entrada que Freud havia dado já em termos da psicanálise no seio da cultura, não só vivificando a psicanálise, mas vivificando a cultura também. Agora há um outro lado que aparece através desse outro aspecto do fechamento da Sociedade, paralelamente à ditadura militar, quer dizer, existia um fechamento na Sociedade mais no sentido de, vamos dizer, uma certa elitização. Uma elitização no tocante aos didatas que eram muito poucos. No final dos anos 70, havia uma demanda muito grande por psicanálise, uma fila de cem pessoas mais ou menos que queriam se candidatar. Por exemplo, eu fiquei anos esperando uma vaga. Na verdade fiquei seis anos porque eu escrevi, fiz os testes e fui solicitado em 1968, no segundo semestre de 1968. Em 70, vocês, Deodato e Myrna, já estavam. E eu só entrei para o Instituto em 1975.

Myrna - Deixa eu lembrar a pergunta feita inicialmente, considerando esse momento da Sociedade, esse movimento de abrir e fechar o Instituto, isso foi em 75?

Tenório - Isso foi depois.

Myrna - Então, temos que lembrar que o tempo histórico é lento. Uma coisa pode acontecer hoje e os efeitos são percebidos depois de alguns anos. Vocês agora apresentaram um pouco o contexto da Sociedade num sentido mais amplo, e se considerarmos a própria ide, a gente pode dizer que ela está situada nesse contexto. Foi feita uma pergunta inicial - se existia uma relação entre a ide e o momento histórico brasileiro naquela época. E o Deodato colocou que não existia diretamente. Mas, indiretamente existia, se a gente pensar.

Tenório - O que me ocorre é o seguinte: no contexto dessa história surge a ideia de fazer um boletim, depois uma revista de psicanálise e cultura, muito artesanal, com esse nome ide, no sentido de um caminho que, eu acho, não foi pensado naquele momento claramente que esse caminho era político. Curiosamente, o Chaim, que foi o primeiro editor da ide, foi o candidato da transição, na presidência da Sociedade. O Chaim foi uma presença interessante, se você observar que, em 1975, ele foi indicado por Ferrão para ser o editor. Então aquela pergunta é interessante e nunca tinha me ocorrido isso, mas o caminho foi bem político desde o início. A verdade é que nós éramos políticos e com o Chaim nós tivemos liberdade absoluta para inventar o caminho inicial da revista.

Myrna - Uma coisa que eu sempre suspeitei, mas não estava tão claro para mim, é essa questão da resistência à abertura e à aproximação em relação à cultura ter uma dimensão política. E, quer a gente queira, quer não, nós temos que reconhecer isso. O problema é que sempre houve resistência, mas a gente não tinha uma ideia claramente política dessa resistência. Nós estávamos com o peito aberto, vamos que vamos, tínhamos que fazer o que precisava ser feito e a gente ia fazendo.

Creative Commons License