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versão impressa ISSN 0101-3106

Ide (São Paulo) vol.40 no.65 São Paulo jan./jun. 2018

 

CRIATIVIDADE E OUTRAS PAUTAS

 

Vicissitudes no desenvolvimento da psicossexualidade em Lou Andréas-Salomé: a poetisa da psicanálise

 

Vicissitudes in the development of psychosexuality in Lou Andréas-Salomé: the poetess of psychoanalysis

 

 

Jurenice Picado Alvares

Membro efetivo e docente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP), membro fundador do Núcleo de Psicanálise de Santos e Região e membro de enlace do Comitê Mulheres e Psicanálise (Women and Psychoanalysis Committee – COWAP –, da Associação Psicanalítica Internacional – IPA), Santos (SP)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A autora verifica como se desenvolveu a psicossexualidade de Lou Andréas-Salomé, uma escritora e psicanalista que, convivendo com o espírito patriarcal da época e o cosmopolitismo que marcava a virada do século XIX para o XX, testemunhou movimentos revolucionários na literatura e nas artes. Seu interesse pelas relações humanas, pela condição feminina e por assuntos como o amor e o erotismo, acabou aproximando-a de Freud. Nos contatos com o mestre, preservou suas próprias ideias, divergindo quanto às teorias sobre o narcisismo e a feminilidade. Também foi interlocutora de grandes pensadores, como Nietzsche, Rilke, entre outros, desempenhando seu papel na história intelectual de seu tempo. Lembremo-nos de que, nessa época, mulheres com ideias liberais questionavam seu lugar e seu papel em vários segmentos da sociedade.

Palavras-chave: Psicossexualidade. Relações humanas. Amor. Erotismo. Narcisismo.


SUMMARY

The author examines how was the development psychosexuality of Lou Andréas-Salomé, a writer and psychoanalyst, who, living with the patriarcal spirit of the time and the cosmopolitanism that marked the turn 19th-20th centuries, witnessed revolutionary movements in literature and arts. Her interest in human relationships, the female conditions as well as subjects such as love and eroticism, she ended up approaching Freud. In her contacts with the master, she preserved her own ideas, differing in theories about narcissism and femininity. Also was interlocutor of great thinkers, like Nietzsche, Rilke among others, playing her part on the whole history of her time. Let us remember that, at that time, women of liberal ideas, questioned their place and their role in various segments of society.

Keywords: Psychosexuality. Human relations. Love. Eroticism. Narcissism.


 

 

A vida de Lou Andréas-Salomé despertou meu interesse quando comecei a participar do Comitê Mulheres e Psicanálise (COWAP), que se formou em 1998 durante o Congresso Latino-Americano, em Cartagena, e iniciamos estudos sobre o feminino.

Nessa ocasião, resolvemos que cada colega se incumbiria de apresentar as pioneiras da psicanálise e eu desenvolvi um trabalho sobre a vida e a obra de Lou Andréas-Salomé1. Mais tarde, estudando questões de gênero, eu o retomei com o olhar em direção ao desenvolvimento da psicossexualidade de Lou2.

Sabemos que o desenvolvimento da psicossexualidade exige muito trabalho, considerando que ela começa a se organizar desde antes do nascimento a partir das expectativas conscientes e inconscientes dos pais, e que a masculinidade e a feminilidade existem em todas as pessoas em formas e graus diferentes.

Aqui verificaremos como se desenvolveu a psicossexualidade de Lou Andréas-Salomé, uma escritora e psicanalista que, convivendo com o espírito patriarcal da época e o cosmopolitismo que marcava a virada do século XIX para o XX, testemunhou movimentos revolucionários na literatura, nas artes e encontrou a psicanálise e as ideias de Freud sobre o inconsciente e a sexualidade. Lembremo-nos de que, nessa época, mulheres com ideias liberais questionavam seu lugar e seu papel em vários segmentos da sociedade.

 

Introdução

Lou Andréas-Salomé, considerada por Freud "a poetisa da psicanálise" (Andréas-Salomé, 1988), esteve à frente de seu tempo, tanto intelectualmente quanto no modo de viver. Guiada por uma liberdade radical, escandalizou a sociedade, quebrou regras e provocou paixões em quase todos os homens que a conheceram.

Enraizada na filosofia de sua época, acompanhada pela figura de Spinoza e penetrada pelo conceito psicanalítico do inconsciente, assim como pela teoria da libido, Lou dedicou-se à insolúvel relação conflitante entre o corpo e o espírito, o soma e a psique, a sexualidade e o Eu, o masculino e o feminino, desenvolvendo todas essas questões numa prosa expressiva e poética.

Lou mantinha com a natureza uma relação de cumplicidade porque acreditava que ela contribuía para a saúde do corpo e da mente, produzindo uma inter-relação harmoniosa.

Aproximou-se de Freud devido ao interesse pelas relações humanas, pela condição feminina e por assuntos como amor e erotismo. Encorajada por ele, começou a dedicar-se à psicanálise e tornou-se uma das primeiras mulheres a praticá-la. Freud lhe confiou a análise de sua filha Anna (Muchail, 1989).

Acompanhada de homens criativos, como Nietzsche, Rilke, Freud, entre outros grandes homens com os quais desenvolveu relações intelectuais muito ricas, além de relações afetivas, Lou desempenhou seu papel na história de seu tempo, sendo uma relevante interlocutora desses pensadores tanto em termos intelectuais quanto na vida pessoal de cada um deles.

Além desses nomes, outras figuras menos conhecidas também tiveram importância em sua vida, como Hendrieck Gillot, Paul Rée e Friedrich Carl Andréas.

Como pano de fundo, faço a seguir uma breve contextualização da época vivida por Lou Salomé, ressaltando que ela encontrou uma qualidade própria em suas reflexões, que foram de encontro às vigentes em sua família e cultura.

 

Um pouco da história de Lou

Louise von Salomé nasceu em São Petersburgo, Rússia, em 1861. Foi a sexta e última filha, a única menina, de um general russo, de origem germano-francesa, que contava então 57 anos. Sua mãe, vinte anos mais nova que o pai, provinha de uma família de comerciantes de Hamburgo.

Lou foi criada em condições familiares tradicionais, cresceu em um lar harmonioso onde aprendeu a amar e compreender. Seu pai era extremamente afetuoso, exercia a autoridade paterna com amor. A mãe era uma pessoa profundamente religiosa e dedicada à família, com grande capacidade de resolução e um temperamento independente. Os pais se amavam muito e o respeito mútuo imperava.

Lou escreveu que, em toda a sua primeira infância, seu pai e ela estiveram ligados por uma ternura secreta. Também lembrou que ambos disfarçavam ante a chegada de sua mãe, pois esta não gostava de manifestações de sentimentos.

Considerada rebelde e voluntariosa, frequentemente chocava-se com a autoridade materna, situação que perdurou durante toda a vida. Quando tinha 18 anos, sua mãe lhe escreveu que era impossível ser mais amorosa com ela, pois era tão teimosa e só queria tudo conforme a sua vontade.

Durante toda sua vida Lou foi mimada por seus irmãos.

Libertou-se de todas as formas de repressão familiar. Recusou o sacramento da confirmação da Igreja Evangélica frequentada pela família e, por ocasião da morte do pai, aos 78 anos, afastou-se da religião. Nessa época, com 17 anos, estabeleceu uma relação filial com Hendrick Gillot (1836-1916), pastor em sua cidade, vinte cinco anos mais velho, a quem confiou suas interrogações existenciais. Juntos, liam autores indicados por ele, como Spinoza e outros. "Só então Louise tornou-se Lou, como ele a chamava. Mas Gillot teve o mesmo destino do Deus de sua infância quando a pediu em casamento" (Freud & Andréas-Salomé, 1966/1975, p. 12). Lou recusou e se afastou dele dizendo que queria fazer da sua vida o que bem entendesse, de acordo com a sua ideia.

Aos 19 anos, em 1880, foi com sua mãe para Zurique, para estudar filosofia e história da religião. Após um ano, foi acometida por hemorragias pulmonares e interrompeu os estudos, até então intensos.

Na primavera de 1882, com 21 anos, foi levada por sua mãe a Roma. Com muita sede de conhecimento e munida de uma carta de recomendação, Lou procurou pela escritora Malwida von Meysenbug (1816-1903), que abriu mão de títulos de nobreza para ajudar a emancipar a mulher dos limites que a sociedade lhe impunha.

Na casa de Malwida, Lou Salomé conheceu Paul Rée (18491901), com quem logo estreitou laços de amizade. Com grande admiração pelo filósofo, Lou queria que morassem juntos como amigos, uma ideia inusitada para a época. Em seguida, conhece Nietzsche (1844-1900), que, quando soube do projeto de morarem juntos, ofereceu-se como terceiro nessa aliança. Para ela, a fascinação desse encontro residia no fato de ser um cruzamento dos singulares caminhos intelectuais. Os três estudiosos desejavam concretizar sua fascinação recíproca numa comunidade de trabalho e de vida, isto é, criar uma espécie de "ménage à trois" intelectual, que chamaram de "Santa Trindade" (Muchail, 1989, p. 9). Essa trindade teve um fim abrupto, quando Lou recusou a proposta de casamento de Nietzsche, respondendo que jamais abriria mão de sua liberdade.

Ela viaja para Berlim e os três continuam a se corresponder. A irmã de Nietzsche, Elizabeth, escandalizava-se, dizendo não entender por que Lou fazia tanto sucesso entre os homens e falava tão abertamente de Deus, de sexo e de moral.

Lou, Rée e Nietzsche se reencontraram novamente em Leipzig, Alemanha. Lou começou a estudar história das religiões com a ajuda de Nietzsche. Mais tarde, ele passou a fazer duras críticas a seu rival, Rée, e em decorrência disso Lou perdeu seu entusiasmo para com ele. Ela e Rée se mudaram para Paris, morando juntos como amigos. Depois, os dois foram para Berlim, onde viveram durante cinco anos (1882-1887). Foi na companhia dele que participou da vida intelectual de Berlim, da efervescente cultura da época e começou a ser reconhecida e fazer sucesso como crítica depois da publicação, em 1885, de seu primeiro romance, Na luta por Deus, sob o pseudônimo de Henri Lou.

Em 1886, com 25 anos, conheceu Friedrich Carl Andréas (1846-1930), professor de línguas orientais de Gottingen. Lou conversou com Rée sobre seu interesse por Andréas e ele não se opôs, até o momento em que percebeu ter se colocado diante de uma decisão voltada contra ele.

No ano seguinte Lou casou-se com Andréas, após uma tentativa de suicídio dele, ficando acordado que não teriam relações sexuais. Rée partiu e deixou escrito para Lou: "Tenha piedade, não me procure" (Andréas-Salomé, 1985, p. 65), e após quatro anos sofreu uma queda mortal das montanhas. Mesmo na velhice, Lou ainda declarava que, de sua parte, jamais teria rompido com Rée, que sua partida foi "uma perda irreparável" (Freud & Andréas-Salomé, 1966/1975, p. 12).

"Lou distinguia o casamento do amor predominantemente sensual" (Freud & Andréas-Salomé, 1966/1975, p. 13), que jamais reconhecera como uma base para o matrimônio. Para ela, o casamento era a admissão de que o casal pertencia um ao outro num sentido quase religioso da palavra. Portanto, a união conjugal, do ponto de vista físico, estava fora de cogitação para ela (Freud & Andréas-Salomé, 1966/1975).

Tinha 31 anos de idade e cinco de casamento quando enfrentou uma crise na relação com o marido e decidiu viajar para Paris e Viena, participando dos círculos intelectuais3. Tornou-se conhecida, aos 33 anos, por seus livros Friedrich Nietzsche em suas obras (1894) e Ruth (1895), romance em que conta sobre suas relações com Gillot aos 17 anos.

Aos 36 anos, conheceu em Munique o poeta austríaco René Maria Rilke (1875-1926), que contava 22 anos de idade e ainda era desconhecido. Ele ficou encantado com ela, tornaram-se amigos e iniciaram uma relação amorosa. Lou o chama de Rainer, nome que ele assumiu como escritor, em vez de René.

Em 1900, Lou fez uma longa viagem com Rilke para a Rússia, ocasião em que romperam a relação amorosa de três anos (1897-1900). Pode-se deduzir que ela passou por uma experiência apaixonada a partir da observação de Freud, em seu elogio fúnebre a Lou, de que "seu destino como mulher havia sido preenchido" na época em que estava com Rilke (Freud & Andréas-Salomé, 1966/1975, p. 14).

Nesse ano, Lou escreveu o ensaio Reflexões sobre o problema do amor, em que apresenta uma delicada abordagem sobre a feminilidade e o sentimento amoroso que encontram eco em nossas experiências contemporâneas. Além disso, revela-nos como os movimentos teóricos sobre a feminilidade foram se constituindo na psicanálise.

Um ano depois, Rilke resolveu passar algumas semanas na casa de um amigo, onde conheceu Clara Westhoff - uma escultora, aluna de Rodin -, com quem se casou, surpreendendo Lou (Andréas-Salomé, 1961/1985). Porém, eles permaneceram amigos e se corresponderam até a morte de Rilke. Lou se tornou para ele a companheira a quem sempre recorria. Ela destruiu grande parte da correspondência entre eles, pois entendia que sua vida particular, no que tinha de mais íntimo, só a ela interessava e só a ela pertencia.

Tudo leva a crer que ele foi seu único amor. O primeiro com quem manteve relações sexuais, que parecia possuir a integração entre o corpo e o espírito, o que ela ainda não havia encontrado.

Em 1902, com a morte de Paul Rée e provavelmente com a separação de Rilke, Lou enfrentou uma crise emocional e foi tratar-se com um jovem médico vienense, o Dr. Friedrich Pineles (1868-1936), conhecido como Zemek, com quem ela manteve laços afetivos por alguns anos. Lou recuperou-se da depressão e engravidou dele, mas perdeu o filho, segundo ela, devido a uma queda quando colhia maçãs de uma árvore. Entretanto, há indicações de um aborto voluntário.

Andréas, em 1903, foi designado para uma cadeira na Universidade de Gottingen, Alemanha, para onde se mudaram e Lou permaneceu até sua morte.

A partir de 1906, Lou fez várias visitas a Berlim para assistir às produções de Max Reinhardt e às peças de Gerhart Hauptmann4.

Lou reivindicou o direito ao amor em igualdade de circunstâncias diante do homem. Também assinalou a capacidade que tem a paixão amorosa de nos abrir o caminho ao sentido da totalidade da vida e sua faculdade de nos colocar em estado criativo.

Em seu trabalho O erotismo, Lou apresentou a relação erótica como criação e encontrou ressonância em vários estudiosos, entre eles Martin Buber5, que encomendou o texto para publicação na revista Die Gesellschaft, surpreendido com a abordagem objetiva de Lou. Ela diz que na base do erotismo está a sexualidade e é uma "forma de necessidade física, tal como a fome, a sede, ou qualquer outra manifestação de vida do nosso corpo" (Andréas-Salomé, 2005, p. 55).

No ensaio psicanalítico de 1914, "Do tipo feminino", Lou introduz o ponto de vista feminino no discurso psicanalítico, apresentando suas reflexões sobre a feminilidade e a psicanálise. Entre as suas considerações, ela se manifesta a respeito da diferença dos sexos, enfatizando que esta deve ser considerada para além das diferenças individuais.

 

A psicanálise

Em 1911, aos 50 anos, participou do III Congresso de Weimar da Associação Psicanalítica Internacional, onde foi apresentada a Freud e passou a estudar psicanálise.

No círculo psicanalítico, foi saudada por todos, em especial por Victor Tausk (1877-1919)6, que se apaixonou perdidamente por ela. Lou estabeleceu com ele uma breve relação erótica e compartilhou tarefas intelectuais, pois tinham interesses comuns, como a filosofia spinoziana e o narcisismo. Tausk foi responsável pela iniciação dela no contato com pacientes, permitindo que ela fizesse suas primeiras observações práticas na Clínica de Enfermidades Nervosas de Viena. Quando Lou regressou a Gottingen, ela terminou sua relação com ele e deixou de responder suas cartas. Ao saber por Freud que Tausk havia se suicidado, Lou ouviu que o problema dele era "ter uma alma de fera com um coração terno".

O que a aproximou da psicanálise, segundo ela, foi ter se dado conta da "excepcionalidade e raridade do destino psicológico de cada indivíduo e de ter crescido em meio a um povo que libera sua intimidade sem maiores rodeios" (Andréas-Salomé, 1961/1985, p. 106).

Lou mantinha por Freud e por suas investigações uma grande admiração e reconhecimento, mas, apesar disso, não deixou de levantar algumas interrogações que, por sua vez, ele tão bem soube interpretar.

Em 1921, Lou completa os conceitos de narcisismo primário como fase de desenvolvimento, e do narcisismo como forma patológica do amor a si próprio, em seu texto "O narcisismo como dupla direção".

Sobre o trabalho analítico, em uma carta a Freud, ela diz:

Toda análise deveria atingir, por ser a ocasião de uma regeneração psíquica, o substrato primitivo em nós mesmos, o qual o Sr. batizou com o nome de "narcísico": é a última fronteira ainda discernível que delimita a nossa identidade permanente, e para cujo mais além a "nossa análise grosseira" não basta. Essas ideias, com as quais me entreteve, pessoalmente, em 1912, o Sr. as expôs depois, em "Introdução ao narcisismo", operando assim, uma abertura decisiva para o prosseguimento da pesquisa em psicanálise. (Andréas-Salomé, 1988, p. 21)

Para Lou, que se afirmou sempre como escritora, a vida de cada paciente deve ser vista como um romance. Em sua análise é possível aprofundar, ainda mais, os segredos e os mistérios desta vida.

Em 1928, ela teve seu último encontro com Freud, que, com dificuldade, conseguia falar um pouco. Revoltada com o martírio do mestre, disse-lhe que, enquanto ela tagarelava entusiasmada, ele padecia. Depois, espantada com a sinceridade de suas palavras, suspirou alta e incontidamente. Freud não respondeu. Lou sentiu apenas seu braço em torno dela (Andréas-Salomé, 1961/1985).

Eles trocaram correspondência até a morte de Lou, em 1937, uma semana antes de completar 76 anos, por insuficiência renal. Em 1935, ela já havia deixado de trabalhar como psicanalista por problemas de coração, precisando muitas vezes ficar hospitalizada, e também fez uma cirurgia devido a um câncer de mama. Estava diabética e quase cega.

Na ocasião da sua morte, em fevereiro de 1937, Freud, em uma parte de seus Breves escritos (1937-1938), escreveu para Strachey sobre Lou dizendo, entre outras informações, que:

Durante os últimos 25 anos de sua vida, essa notável mulher esteve ligada à psicanálise, à qual contribuiu com trabalhos valiosos e que também praticou. Todos os colegas se sentiram honrados quando ela se juntou às fileiras dos colaboradores e, também, como uma nova garantia da verdade das teorias da análise. (Freud, 1937/1976c, p. 333)

Em seu "Hino à morte", Lou escreve:

No dia em que eu estiver no meu leito de morte
Faísca que se apagou
Acaricia ainda uma vez meus cabelos
Com tua mão bem-amada
Antes que devolvam à terra
O que deve voltar à terra,
Pousa sobre minha boca que amaste
Ainda um beijo.

Mas não esqueças: no esquife estrangeiro
Eu só repouso em aparência,
Porque em ti minha vida se refugiou
E agora sou toda tua. (Ferreira, 1987, p. 372)

Para ela a morte desfaz a distância entre os amantes, que agora vivem um no outro, sem que o individualismo os separe. A morte não é uma partida, mas uma volta, um retorno do indivíduo àquela união primitiva com as coisas, e por isso não devemos temê-la.

 

Sua produção

Lou Andréas-Salomé produziu uma obra vasta e variada. Seus escritos sobre Nietzsche, Rilke e Freud ilustram a natureza particular de cada uma dessas relações: o livro sobre Nietzsche é essencialmente uma investigação; sobre Rilke, cujo título original era Rainer, são memórias pessoais; sobre Freud, uma expressão de gratidão por tudo que dele recebera (Andréas-Salomé, 1966/1975, p. 10).

Também encontramos romances, contos, poemas, estudos literários, ensaios, monografias, estudos psicanalíticos, de 1885, com o texto Na luta por Deus, até 1931, com Carta aberta a Freud, que ela dedica a ele por ocasião de seus 75 anos de idade. Houve publicações póstumas, de 1951, Minha vida, esboço de algumas lembranças de vida, até 1986, Uma longa dissipação, novela escrita em sua juventude, traduzida para o francês nessa época, em que ela apresenta uma mulher, Adine, que renuncia ao homem amado em nome da independência de sua vida pessoal.

Dias depois de sua morte, a Gestapo confiscou seus livros e papéis com anotações por considerar a psicanálise uma ciência judaica. Lou havia pedido a Ernst Pfeiffer que guardasse todo o material para que fosse publicado postumamente.

É certo, porém, que não somente pela sua obra Lou se fez conhecida. Sua vida, sua presença sedutora ou fascinante, nos círculos intelectuais dos grandes centros (Berlim, Viena, Paris, Roma), as relações pessoais, quase sempre tumultuadas, com notórios pensadores e artistas, suas ligações amorosas, tudo isso fez de Lou quase uma lenda.

Mais recentemente, essa excêntrica senhora russa ressurgiu como personagem do romance Quando Nietzsche chorou, de Irvin D. Yalon, e do filme Lou, lançado no Brasil em 11 de janeiro de 2018.

 

Considerações teóricas

Além da bissexualidade biológica inata, há a bissexualidade psíquica, pois somos produto e criação de nossos pais, uma mulher e um homem. Esses aspectos da masculinidade e da feminilidade entrarão na constituição da identidade infantil, desde a gestação, a relação primária e a relação edípica com o casal, resultando na identidade psicossexual adulta.

Considero a importância da capacidade de reverie materna (Bion, 1962/1991) para a constituição do psiquismo da criança, assim como o olhar materno (Winnicott, 1975) que proporciona ao bebê ver-se como um ser único, abrindo, assim, um caminho em direção ao estabelecimento da genitalidade.

Devemos pensar na qualidade desse olhar materno que, pressupostamente, seria o de uma mãe em que predominaria psiquicamente o funcionamento genital, pois é através da relação primária com essa mãe, que além do amor pelo bebê teria que ter amor pelo pai do bebê, que a criança introjeta a capacidade continente da mãe e, com isso, torna-se autocontinente de seus conteúdos psíquicos.

Guignard (2002, p. 136) também nos aponta a importância das relações "materno-primário" e "feminino-primário", termos originados em Klein (1932/1981), e diz que o desenvolvimento da sexualidade é silenciosamente tecido em ambos os sexos a partir da passagem de uma para outra.

As identificações secundárias se realizam na relação com o casal e na relação com a mãe e o pai edípicos, reais e/ou fantasiados. Paixão e rivalidade edípicas são vividas por cada criança a partir de sua singularidade e de seu nível simbólico.

Aqui devemos salientar a importância de um casal que efetivamente realize sua sexualidade genital. Esse casal é um dos fatores significativos na introjeção do masculino e do feminino pela criança.

Freud (1923/1976b) aponta as vicissitudes das identificações secundárias, dizendo que a situação edipiana é dupla, negativa e positiva; assim, uma menina não tem somente uma afetuosa escolha de objeto em relação ao pai, mas também manifesta uma atitude feminina afetuosa em relação à mãe e ciúme e hostilidade em relação ao pai. O ideal de ego é formado através da situação edipiana negativa, quero ser como minha mãe, na menina, ou quero ser como meu pai, no menino. Daí a relevância de uma mãe pós-genital que tenha em sua mente um espaço para o pai e permita que o pai real exerça sua função.

Assim como a fase feminino-primário é considerada momento da primeira individuação, a segunda individuação (Blos, 1996) acontece na adolescência, e é uma reedição do processo de separação/individuação para buscar uma identidade singular, resultando na capacidade de responsabilizar-se cada vez mais pelo que se faz e pelo que se é, em vez de depositar a responsabilidade nos pais.

Enfatizo que tanto na realidade natural como na psíquica não existe uma regularidade nem padrões, mas a singularidade de cada história. Ressalto a dimensão de pensarmos as vicissitudes da sexualidade e, portanto, a constituição do psiquismo como um desafio que se impõe na contemporaneidade.

 

Desenvolvimento psicossexual de Lou

Lou é a primeira filha menina de um pai carinhoso, vinte anos mais velho que sua mãe. Esta gostaria que Lou se encaixasse nos padrões patriarcais da época, assim como ela. Parece ter sido uma mãe dedicada durante toda a vida de Lou, acompanhando-a sempre, favorecendo sua expansão intelectual e cultural. Seu marido, apaixonado por ela, sugerira dar seu nome à filha: Louise.

Pressupomos, então, que Lou gozou de uma boa relação primária com a mãe e que esta tinha um lugar para o pai em sua mente, formando com ele um casal amoroso. Seu pai dedicava-lhe carinho e atenção especiais desde sempre, o que é um elemento essencial para a constituição da feminilidade (Freud, 1933/1976a).

Lou teve condições básicas para uma narcisização saudável a partir da relação com a mãe (estabelecimento da confiança básica) e a oportunidade de elaborar razoavelmente seu Édipo.

Aos 17 anos, Lou perde o pai e transfere seus sentimentos filiais ao pastor Gillot, elevando-o ao status de um "homem divino", pois a salvara da "solidão da fantasia". Embora Lou tivesse se afastado da religião parental, ainda trazia idealizações para suas relações. Mas logo se decepciona quando Gillot, um homem, apaixona-se por ela. Separa-se dele, dizendo que queria moldar sua vida de acordo com sua própria ideia, independentemente do que acontecesse.

Lou caminha em direção a sua segunda individuação (Blos, 1996), indo estudar em Zurique acompanhada pela mãe. Tornou-se uma mulher encantadora. Sua alegria de viver e sua paixão pela vida transpareciam em seu próprio físico, afinal pertencia ao povo russo, conforme ela dizia ao se referir à espontaneidade de seus gestos. O próprio Freud parece não ter sido indiferente à graça de Lou, que a qualificou de "raio de sol" (Ferreira, 1987, p. 359).

Assim como Malwida, Lou também desejava ir além dos limites da sociedade, abandonando uma vida conforme o modelo materno e procurando companhias que preenchiam sua busca.

Quanto aos irmãos, estes a mimaram durante toda a sua vida. Penso que, pelo fato de estar ligada por laços fraternais aos homens e por ser a caçula e única filha de um pai extremamente atencioso e afetuoso, ela pôde conversar livremente entre eles sobre diferentes assuntos.

Embora tenha se casado aos 26 anos com Andréas, Lou não manteve relações sexuais com ele. No meu entender, ela buscava a estabilidade da mulher casada na sociedade patriarcal da época para não sofrer preconceitos e sanções por não ter esse status. Ela abdica da pensão do pai para se casar, troca a situação estável de filha de general pela situação de mulher casada com um professor universitário.

Seu grande amor foi Rilke, 14 anos mais novo, quando ela tinha 36 anos. Parece que conflitos e tensões que precederam a fase em que conheceu Rilke podem ter contribuído para que ela experimentasse o amor numa atmosfera de aceitação.

Com ele, Lou resgata a integração entre corpo e alma, escrevendo nessa época um ensaio sobre o amor:

Se fui tua mulher durante anos, é porque fostes para mim a primeira realidade em que o corpo e o homem são indiscerníveis, fato incontestável da própria vida. Eu teria podido te dizer, palavra por palavra, o que tu me disseste ao confessar teu amor: "Tu só, és real". Foi assim que nos tornamos marido e mulher, antes mesmo de nos tornarmos amigos, e esta amizade não foi o fruto de uma escolha, mas de núpcias clandestinas. Não eram duas metades que se buscavam em nós: nossa unidade surpresa se reconhecia, trêmula, numa unidade insondável. Assim, éramos irmão e irmã - mas como num passado distante, antes que o incesto fosse sacrilégio. (Ferreira, 1987, p. 365)

Os três anos de relacionamento entre eles foi uma época muito produtiva para Lou. Pela primeira vez Lou se enamora e forma um casal com Rilke, e diz:

Só aquele que permanece inteiramente ele próprio pode, com o tempo, permanecer objeto do amor, porque só ele é capaz de simbolizar para o outro a vida, ser sentido como tal. Assim, nada há de mais inepto em amor do que se adaptar um ao outro, de se polir um contra o outro, e todo esse sistema interminável de concessões mútuas... e, quanto mais os seres chegam ao extremo do refinamento, tanto mais é funesto de se enxertar um sobre o outro, em nome do amor, de se transformar um em parasita do outro, quando cada um deles deve se enraizar robustamente em um solo particular, a fim de se tornar todo um mundo para o outro. (Ferreira, 1987, p. 370)

Lou realiza sua psicossexualidade feminina adulta nesse momento e se sente fertilizada (assim como Rilke).

Em seu ensaio sobre o erotismo (1910/2005) e em um posterior intitulado "Anal e sexual", do mesmo ano, ela nos lembra

[…] que na união física a gente não possui um ao outro por meio do corpo, mas apesar do corpo, que, como todo mundo sabe, não se identifica jamais [...] completamente com o todo da pessoa, mas aparece sempre como uma parte dela e resiste à dominação mais viva. (Ferreira, 1987, p. 368)

E Lou continua nos dizendo que, quando alcançamos na união com um corpo amado e desejado aquele "momento esplêndido", momentos de exceção e breves, vivenciamos o que ela chama de "egoísmo erótico", referindo-se ao momento em que durante a festa só se festeja a si mesmo (Ferreira, 1987, p. 368).

Lou é uma mulher singular para um homem singular e ambos se respeitam. Quando se separam, continuam correspondendo-se intimamente até a morte dele.

Entendo, assim como Freud (1966/1975), que Rilke foi o homem com quem Lou vivenciou sua sexualidade, mas ele a deixou depois de três anos de intensas relações, pois ela não concordava em se separar do marido.

Lou pôde se entregar ao amor, mas não a um vínculo duradouro com um homem.

 

Lou e a maternidade

Aos 41 anos, Lou mantém relações com o psiquiatra Zemek. Apesar da veemente insistência deste para que ela se divorciasse, ela não cede, embora estivesse grávida dele.

A gravidez de Lou é interrompida por sua queda de uma árvore, de forma involuntária, ou voluntária, segundo alguns biógrafos.

O que fica evidente é a constante busca de Lou por independência: ela nunca aceita estar comprometida com um homem. Aceitaria comprometer-se com um filho?

 

Lou, a despertadora de paixões

Desde sua juventude, Lou desperta paixões masculinas: Gillot, Rée, Nietzsche, Rilke, Zemek e, aos 50 anos, Tausk, que se suicida, assim como Rée, conforme alguns biógrafos.

Aos 25 anos, ela se casa com Andréas, que também ameaçara suicidar-se, mas não mantém relações sexuais com ele.

Lou parece ter dificuldade para dedicar-se ao outro, estabelecendo uma relação de reciprocidade. É assim que ela acredita que pode manter sua autonomia.

 

Palavras finais

Lou foi um "raio de sol" (Ferreira, 1987, p. 359) e parece não ter abdicado de ser o centro das atenções, principalmente dos homens, repetindo a sua situação infantil de filha única admirada pelo pai e pelos irmãos.

No meu entender, essa predominância de uma situação narcísica, ao mesmo tempo que incrementou sua confiança em si e em sua criatividade, impediu-a de estabelecer uma relação mais comprometida com um outro singular e imprevisível.

 

REFERÊNCIAS

Andréas-Salomé, L. (1985). Lou Andréas Salomé: minha vida. (3ª ed.). São Paulo: Brasiliense. (Trabalho original publicado em 1961).         [ Links ]

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Endereço para correspondência:
JURENICE PICADO ALVARES
Av. Bernardino de Campos, 562/602
11065-002 – Santos – SP
tel.: 13 3237-0093
jurenice@uol.com.br

Recebido 24.05.2018
Aceito 16.06.2018

 

 

1 Apresentado em 2008, na SBPSP, em seminário do COWAP.
2 Apresentado no Congresso Brasileiro de Psicanálise em Campo Grande, setembro de 2013.
3 Em Paris encontrou Benjamin Frank Wedekind (1864-1918), ator, dramaturgo e romancista, um dos precursores do movimento expressionista, é autor de O despertar da primavera (1891), sua peça teatral mais conhecida. Em Viena, participou do círculo de Arthur Schnitzler (1862-1931), escritor e médico austríaco que decidiu dedicar-se à literatura e ficou conhecido como escritor com a publicação de Anatol (1893) e Ronda (1897), peças de teatro que descrevem a atmosfera de erotismo e melancolia da Viena no fim de século e que causaram escândalo quando encenadas. Ela conheceu Hugo von Hofmannsthal (1874-1929), escritor e dramaturgo austríaco, um dos instituidores do Festival de Salzburgo. Hofmannsthal alcançou prestígio internacional graças a sua colaboração com o compositor e maestro alemão Richard Strauss e foi um dos mais importantes representantes do movimento Fin de Siècle da língua alemã. Lou ficou, pela primeira vez, na casa da baronesa Marie Freifrau von Ebner-Eschenbach (1830-1916), escritora austríaca que, através de suas novelas, é considerada, juntamente com Ferdinand von Saar, escritor e poeta também austríaco, a mais importante escritora da língua alemã da segunda metade do século XIX.
4 Max Reinhardt (1873-1943), produtor e diretor de teatro austríaco que se tornou famoso por suas grandes produções. Fez experiências com diversas formas e estilos teatrais. Na montagem da pantomima religiosa O milagre, reformou o interior de um teatro a fim de dar a impressão de uma catedral. Encenou também Sonho de uma noite de verão, de Shakespeare, e mais tarde fez um filme baseado na peça. Em 1920 fundou o festival de teatro de Salzburgo, na Áustria. De origem judaica, quando os nazistas tomaram o poder, imigrou para os Estados Unidos da América, naturalizando-se cidadão estadunidense em 1940.
Gerhart Hauptmann (1862-1946), romancista e dramaturgo alemão, laureado com o Nobel de Literatura de 1912, foi um dos responsáveis pela introdução das tendências naturalistas no teatro alemão, suas peças evoluíram no sentido de um complexo simbolismo metafísico e religioso. Estudou escultura e interessou-se depois por história, filosofia e ciências.
5 Martin Buber (1878-1965), filósofo, escritor e pedagogo. Judeu de origem austríaca e tendência sionista. Era poliglota: em casa aprendeu ídiche e alemão, na escola, hebraico, francês e polonês, com formação universitária em Viena. Em suas publicações filosóficas deu ênfase à opinião de que não há existência sem comunicação e diálogo, e que objetos não existem sem que haja uma interação com eles. As palavras-princípio, Eu-Tu (relação), Eu-Isso (experiência), demonstram as duas dimensões da filosofia do diálogo, que, segundo Buber, abarcam a existência. Segundo ele, o homem nasce com a capacidade de inter-relacionamento com seu semelhante, ou seja, a intersubjetividade, a relação entre sujeito e sujeito e/ou sujeito e objeto. Intersubjetividade é uma das áreas que envolvem a vida do homem e, por isso, precisa ser refletida e analisada pela filosofia, em especial pela antropologia filosófica.
6 Victor Tausk - psicanalista de origem croata. Primeiramente jurista, depois jornalista, ele se tornou membro da Associação Vienense de Psicanálise em 1909 (Andréas-Salomé, 1988, p. 95).

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