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Ide

Print version ISSN 0101-3106

Ide (São Paulo) vol.42 no.69 São Paulo Jan./June 2020

 

LITERÁRIAS

 

O anão e o gigante

 

 

Maria Olympia França

Membro efetivo e analista didata da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). E-mail: mofranc@terra.com.br

Correspondência

 

 

Um desafio à arrogância do gigante: coronavirus! O anão não se sabe de onde veio nem se sabe quando irá esconder-se. O gigante luta, pede ajuda a todos os viventes, mas o anão ri dos chefes poderosos, aqueles que já foram à Lua e pretendem ir a Marte. Tecnologia, estudos avançados em ciência, aparelhos mil, desde liquidificadores até maquinas avançadas que fabricam de tudo, de tudo, não vencem de pronto o anão. A ganância de chefes poderosos, que disfarçadamente humilham os desfavorecidos para mantê-los submissos ao poder dos mesmos, não tem conseguido a submissão do anãozinho.

Quem sabe a lei selvagem dos mais fortes quando usada pelos humanos não seria também um virus, a fim de perpetuar a pobreza e a ignorância? Tão necessárias para manter a força, as riquezas, se estas forem apenas as materiais! A lei dos mais fortes ignorantes, impiedosos, usando da mentira para engrandecer-se.

Há, no entanto, o poder humanitário dos chefes, cuja riqueza seja ela material, cultural ou cientifica, lutam por um mundo melhor para todos, sem distinção de classe, de raça, de cor e de saber divergente. Para estes a riqueza material não os fez perder o censo da ética moral e social nem mesmo a noção de que um possivel nascimento privilegiado seja as chances que a vida lhes ofereceu; não se percebem como uma "raça pura e melhor". E aí aparece o anão chamado vírus, com nome importante "coronavírus", que se dirige a todos, poderosos ou não; aliás, exceção aos animais, sejam domésticos ou selvagens, salvos pois apenas seguem o caminho determinado pela sua genética, ainda que "o cachorro mata o gato que mata o rato que fura a parede"; no fim dessa estorinha popular aparece o Deus mais poderoso que todos. Dizem que Deus não está ajudando como poderia...talvez ele esteja desanimado com a burrice humana...

O anão encontrou um hospedeiro, o humano, lembrando-nos a estória da Geny, retratada pelo humanista Chico Buarque. Na terra da Geny, atiravam pedras, a humilhavam, cuspiam quando ela se recusou a se humilhar face aos poderosos. E agora? Não adianta nem mesmo esses recursos de tão perversa humanidade. Os humanos gigantes, tão poucas vezes unidos, talvez comecem a perceber que suas conquistas (muitas vezes benéficas para toda a humanidade) ou a ganância que desune não é um recurso face ao anão. Quem sabe dando-se conta do anão que existe dentro de nós e que para ele somos todos iguais. É um anão sem preconceitos...

Poderá ser uma lição aprendida de nossa pequenez? Que o poderoso ou o pequeno tem a morte pela frente, mais cedo ou mais tarde, todos nascem e morrem sem mesmo a intervenção do anão? Diz o povo que desta vida não se leva nada, mas se pode deixar algo. Quem sabe o pequeno anão nos faça lembrar disso.

 

 

Correspondência:
MARIA OLYMPIA FRANÇA
Rua Angelina Maffei Vita, 625/31, Jardim Europa
01455-070 - São Paulo/SP
Tel.: 11 3032.8735

Recebido 26.05.2020
Aceito 14.06.2020

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