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Tempo psicanalitico

versão impressa ISSN 0101-4838

Tempo psicanal. vol.42 no.2 Rio de Janeiro jun. 2010

 

SEÇÃO LIVRE

 

Tornar-se pai, tornar-se mãe: o processo de construção da parentalidade

 

Becoming a father, becoming a mother: the process of construction of parenthood

 

 

Silvia Maria Abu-Jamra Zornig

Membro psicanalista da Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle; Professora do Departamento de Psicologia da PUC-Rio; Coordenadora do curso de Especialização em Psicologia Clínica com Crianças, PUC-Rio; Presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Bebê

 

 


RESUMO

O objetivo deste texto é refletir sobre os elementos fundamentais da construção da parentalidade a partir do conceitual psicanalítico que questiona a ideia de um modelo familiar ideal e busca indicar como o processo de tornar-se pai e tornar-se mãe é um longo percurso que se inicia muito antes do nascimento de um filho. Pretendemos argumentar que, se este percurso se inicia na infância de cada um dos pais, o nascimento de um filho produz uma mudança irreversível no psiquismo parental, podendo inclusive, auxiliar na retificação de sua história infantil.

Palavras-chave: parentalidade; fantasmas parentais; primeira infância.


ABSTRACT

The main objective of this paper is to analyze the main concepts in the construction of parenthood, based on the psychoanalytic notion that the process of becoming a parent begins long before the birth of the child. Nevertheless, the article intends to stress the fact that if the transition to parenthood is a process initiated during the parents childhood, the birth of an infant can produce an irreversible change in the parental psychic, helping them to reevaluate their own infantile history.

Keywords: parenthood; parental ghosts; infancy.


 

 

INTRODUÇÃO

A parentalidade é um termo relativamente recente, que começou a ser utilizado na literatura psicanalítica francesa a partir dos anos 60 para marcar a dimensão de processo e de construção no exercício da relação dos pais com os filhos. Apesar de as dimensões inerentes ao parentesco terem sido estudadas por outras áreas do saber, como a antropologia, a filosofia e a sociologia, é no campo da psicologia e da psicanálise que podemos encontrar uma vasta pesquisa referente aos processos psíquicos e mudanças subjetivas produzidas nos pais a partir do desejo de ter um filho.

Se fizermos uma breve retrospectiva histórica, podemos observar que nas sociedades tradicionais as relações de aliança eram estabelecidas em função do patrimônio familiar, mas a partir do século XVIII, com o discurso iluminista e com a importância do romantismo, o amor entre casais e entre pais e filhos é priorizado e as alianças conjugais passam a ser estabelecidas com base no afeto e não mais como arranjos externos, que não levavam em consideração as escolhas individuais. O amor entre pais e filhos é fortemente marcado pela noção de educação e a formação das crianças torna-se um fator importante para o desenvolvimento de um país e garantia de uma sociedade saudável.

Como assinala P. Julien (2000), a modernidade introduz uma disjunção entre o público e o privado e entre a conjugalidade e a parentalidade. Os arranjos familiares não dependem somente da parentalidade, mas sim do desejo entre casais de estabelecerem relações íntimas. Neste contexto, as relações conjugais são mantidas no espaço privado e dependem somente do desejo de cada um dos cônjuges. No entanto, quando este casal ou indivíduo decide ter filhos, o espaço público invade o espaço privado da conjugalidade, organizando as relações de parentesco e definindo as responsabilidades dos pais e do estado em relação às crianças. Como exemplo, podemos citar o caso da adoção que coloca a parentalidade submetida às regras de seleção impostas pelo poder público como uma maneira de assegurar às crianças pais adotivos "suficientemente" adequados à função. A argumentação do autor é que esta disjunção, aliada ao declínio da função paterna e a uma pluralização das referências simbólicas, coloca sobre o casal parental ou família de origem a responsabilidade de transmitir às gerações futuras os elementos fundadores de sua constituição psíquica.

Roudinesco (2003) avança nesta discussão ao discutir as diversas mudanças ocorridas na família ao longo da história ocidental. A autora distingue três grandes períodos na evolução da família. A família dita tradicional é totalmente submetida a uma autoridade patriarcal e tem como objetivo a transmissão de um patrimônio. Entre os séculos XVIII e XX a autora localiza a família moderna, fundada no amor romântico e na reciprocidade afetiva, na qual o filho aparece como responsabilidade dos pais e do Estado. A autora qualifica de "pós-moderna" a família que aparece a partir da década de 1960, definindo-a como uma relação entre dois indivíduos que buscam relações íntimas ou realização sexual.

A autora enfatiza que, apesar de observarmos mudanças importantes na estruturação familiar, a família contemporânea em sua dimensão horizontal e em redes não só se mantém como estrutura organizadora e segura para seus membros, como se constitui em um espaço fundamental para a troca afetiva e a transmissão simbólica. Segundo a autora, "a família é o único valor seguro ao qual ninguém quer renunciar" (Roudinesco, 2003: 198).

A importância dos argumentos de Julien (2000) e Roudinesco (2003) reside na indicação de que a relação de consanguinidade ou de aliança não é suficiente para assegurar o exercício da parentalidade e que a modernidade, ao produzir uma ruptura entre conjugalidade e parentalidade, demonstra que a parentalidade deixa de ser o principal objetivo da estrutura familiar, mas ao mesmo tempo coloca uma questão fundamental para a nossa discussão: afinal, o que sustenta o desejo de um homem e de uma mulher no processo de transição à parentalidade? Se a atualidade se define principalmente pela derrocada de referenciais simbólicos estáveis e por uma pluralização das leis e de possibilidades de subjetivação, "tornar-se pai" ou "tornar-se mãe" passa a depender muito mais da história individual de cada um dos pais e de uma lógica do desejo do que de um modelo de família nuclear tradicional, como no passado.

O objetivo deste texto é justamente refletir sobre os elementos fundamentais da construção da parentalidade a partir do conceitual psicanalítico que questiona a ideia de um modelo familiar ideal e busca indicar como o processo de tornar-se pai e tornar-se mãe é um longo percurso que se inicia muito antes do nascimento de um filho. No entanto, pretendemos argumentar que, se este percurso se inicia na infância de cada um dos pais, o nascimento de um filho produz uma mudança irreversível no psiquismo parental, podendo, inclusive, auxiliar na retificação de sua história infantil.

 

TORNAR-SE PAI, TORNAR-SE MÃE

A pré-história da criança se inicia na história individual de cada um dos pais; o desejo de ter um filho reatualiza as fantasias de sua própria infância e do tipo de cuidado parental que puderam ter. Como indica Stern (1997), as representações parentais sobre o bebê se iniciam muito antes de seu nascimento e, se pensarmos nas brincadeiras de boneca ou nas fantasias das adolescentes, as representações maternas podem anteceder longamente a concepção. Assim, não podemos restringir a parentalidade à gestação e ao nascimento de um filho, já que as identificações feitas na infância influenciam e determinam a forma como cada um de nós poderá exercitar a parentalidade.

A obra freudiana é extremamente fecunda e sua teorização sobre o Complexo de Édipo e sobre o Narcisismo pode nos fornecer indicações preciosas sobre o processo de constituição da subjetividade, principalmente ao destacar como o fator infantil permanece no psiquismo do adulto. Em 1914 (1976), no texto sobre o narcisismo, Freud sugere que o amor parental nada mais é do que um retorno e reprodução do narcisismo dos pais, que colocam o filho no lugar de "Sua Majestade, o Bebê", procurando, através da valorização afetiva da criança, resgatar seu próprio narcisismo infantil perdido. O autor valoriza o lugar que a criança ocupa no psiquismo parental, principalmente sua função "reparadora", ou seja, de suturar as feridas narcísicas de seus próprios pais. Dessa forma, pensar na concepção de um filho coloca em movimento aspectos do narcisismo de cada um dos pais, assim como suas lembranças e fantasias sobre suas relações objetais primárias.

A clínica dos primórdios é um testemunho inequívoco da relação entre os fantasmas parentais e os sintomas apresentados pelo bebê. Como indica Lebovici (1987), os conflitos infantis dos pais determinam a natureza das identificações da criança e os sintomas apresentados pelo bebê têm a marca da problemática parental. Assim, o processo de filiação se inicia antes do nascimento do bebê, a partir da transmissão consciente e inconsciente da história infantil dos pais, de seus conflitos inconscientes, da relação com seus próprios pais, que colorem sua própria representação sobre a parentalidade.

Bernard Golse (2002) propõe quatro tipos de representações parentais sobre o bebê: a criança fantasmática, relacionada à criança que os pais separadamente têm em mente a partir de sua própria história; a criança imaginária como uma representação menos inconsciente que pertence ao casal, como traços imaginados, sexo, etc; a criança narcísica ligada à representação de seus ideais, de como o filho irá sucedê-los; e a criança mítica ou cultural, que se refere a um grupo de representações coletivas de uma determinada sociedade em um determinado momento.

Essas representações influenciam os diferentes tipos de interação que ocorrem entre o bebê e seus cuidadores, podendo facilitar a instauração de vínculos afetivos seguros ou dificultar seu processo. Não podemos esquecer que os afetos ambivalentes marcam a relação entre os pais e o bebê, pois ao mesmo tempo que o nascimento de um filho traz consigo expectativas de que o bebê possa reparar falhas da história parental, provoca também uma ruptura no equilíbrio do casal, fazendo com que os fantasmas edípicos seja reativados. Assim, é comum que o pai se sinta excluído da díade mãe-bebê e vivencie o bebê como um rival, reativando sua própria vivência infantil de se sentir excluído da relação dos pais; ou que a mãe se sinta inadequada na função materna por não conseguir abrir mão de um modelo idealizado.

Os trabalhos de Stern (1992, 1997) sobre a constelação da maternidade e sobre as relações interpessoais na primeira infância indicam como as representações dos pais sobre o bebê e sobre eles mesmos como pais desempenham um papel importante na natureza dos vínculos estabelecidos entre pais e filhos e se iniciam antes das interações atuais com o bebê, englobando as fantasias parentais, medos, sonhos, lembranças da própria infância e profecias sobre o futuro do bebê. A partir de dados oriundos de pesquisas empíricas sobre o apego, o autor ressalta que os resultados indicam que as representações da mãe sobre sua própria mãe são um importante fator de predição do padrão de apego que a mãe estabelecerá com seu próprio filho. No entanto, o aspecto mais preditivo do futuro comportamento materno não é o que ocorreu no passado, mas sim a forma como a história passada é organizada em uma narrativa. Ou seja, a narrativa da história passada pode ser tão relevante como a história passada em si.

Freud ([1924] 1976), ao analisar o percurso subjetivo da mulher, sugere que o lugar designado a um filho é o resultado de um complicado processo de resolução edípica, diferente da trajetória masculina. Apesar de não ser nossa intenção retomar toda a argumentação freudiana relativa à constituição da feminilidade, cabe ressaltar alguns pontos que nos parecem fundamentais para nossa discussão. Segundo o autor, a feminilidade normal adviria de um abandono da posição fálica e de uma aceitação da castração materna que possibilitaria o acesso ao pai e o desejo de ter o pênis do pai ou algo que o representasse. Assim, o desejo de ter um filho seria um deslizamento do desejo de ter um pênis, colocando o bebê numa equação simbólica: bebê = falo. Nesta perspectiva, a maternidade seria a solução aos impasses da feminilidade e a resolução edípica por excelência. Não podemos deixar de assinalar que Freud ([1931] 1976), no texto sobre a sexualidade feminina, se interroga sobre a feminilidade, ressaltando a importância da relação pré-edípica entre a menina e sua mãe para a constituição da posição feminina.

Bydlowiski (2002) sugere que o desejo de ter um filho vai além da demanda fálica de completude e pode ter dois significados: um consciente, de ser mãe, ligado à perpetuação da espécie, e outro inconsciente, relacionado à elaboração da feminilidade, às representações da maternidade, ao lugar designado ao filho no inconsciente da mulher. A gravidez, por ser um momento de permeabilidade entre as representações conscientes e inconscientes, permitiria uma investigação maior sobre as significações inconscientes do desejo de ter um filho. A autora denomina "transparência psíquica" o momento em que os fragmentos do pré-consciente e do inconsciente chegam facilmente à consciência. Este estado de transparência psíquica se estabelece porque na gravidez o equilíbrio psíquico encontra-se abalado pelo duplo status do bebê: ele está presente no interior do corpo da mãe e em suas representações mentais, mas está ausente da realidade visível. A gestante faz uma ponte entre a situação da gravidez atual e lembranças de seu passado, diminuindo seu investimento no mundo exterior e permitindo que reminiscências antigas e fantasmas geralmente esquecidos venham à tona sem serem barrados pela censura.

Assim, a posição da criança no inconsciente materno relacionase à sexualidade infantil que retorna na gravidez de maneira nostálgica como um encontro íntimo da mulher consigo mesma, encontro em que a criança só pode ser representada por elementos do passado.

É interessante observar como durante a gravidez e no período pós-natal a constelação da maternidade se torna o eixo organizador dominante da vida psíquica da mãe, deixando em segundo plano o complexo edípico (enquanto eixo organizador nuclear). Ou seja, a tríade edípica mãe, mãe-da-mãe, pai-da-mãe e sua reedição mãe-pai-bebê saem de cena para dar lugar a uma nova tríade psíquica: mãe-da-mãe, mãe-bebê (Stern, 1997).

O autor relaciona a constelação da maternidade a três preocupações e discursos diferentes, mas ligados, que acontecem interna e externamente: o discurso da mãe com sua própria mãe, especialmente com a mãe de sua infância, seu discurso com ela mesma, especialmente com ela mesma como mãe, e seu discurso com o bebê. Essa trilogia da maternidade passa a ser sua maior preocupação, requerendo um profundo realinhamento de seus interesses e desejos.

O acesso à paternidade também implica profundas transformações que se iniciam a partir da identificação edípica ao modelo paterno, mas que apontam para a reativação de uma relação primordial com a mãe. As perturbações somáticas que afetam os homens durante a gestação de suas companheiras seriam exemplos do conflito entre o próprio desejo de maternidade do homem e a identificação a seu pai (Bydlowski & Luca, 2002). Estudos empíricos indicam que a grande ocorrência de distúrbios psicossomáticos em homens durante a gravidez de suas companheiras demonstra que tais transtornos não são sinais de psicopatologia e sim a confirmação de uma identificação feminina. Através de sua identificação com a gravidez da mulher, o homem divide com a mulher alguns sintomas e ela, em retribuição, inclui o pai em suas representações do bebê, criando um espaço para os cuidados paternos, antes mesmo do nascimento do filho (Trethovan e Conlon, 1965; Stern, 1997).

Freud ([1924] 1976), em "A dissolução do Complexo de Édipo", indica como a ameaça de castração impulsiona o menino a sair do conflito edípico através da identificação ao pai e do acesso à posição masculina. Para conservar sua virilidade, a criança abre mão do desejo de ser amada pelo pai (posição feminina) e do desejo de ter a mãe (pai como rival), identificando-se aos atributos paternos, à possibilidade de ser como o pai no futuro ao invés de tentar tomar o seu lugar. Assim, a resolução do Édipo permite a triangulação relacional e possibilita ao homem, no futuro, aceder à paternidade e abrir um espaço para o bebê, funcionando como uma ligação entre este e o mundo.

Nesta perspectiva, se a maternidade pode ser uma solução para a castração por seu estatuto ilusório de completude narcísica, a função paterna confronta a mulher com seu estatuto de sujeito desejante, ao indicar um espaço que se coloca entre a mãe e o bebê. A função materna e a introdução da função paterna permitem sustentar a dupla inserção do bebê enquanto produto e enquanto alteridade - e é justamente esta tensão entre ausência e presença, entre dentro e fora, que permite ao bebê aceder ao processo de subjetivação.

 

A PARENTALIZAÇÃO DOS PAIS

O estabelecimento de laços entre os pais e o bebê favorece seu desenvolvimento afetivo e cognitivo, mas, ao mesmo tempo, propicia aos pais o sentimento de serem "pais suficientemente bons" especificamente para aquele bebê. Diversos autores (Konicheckis, 2008; Golse, 2006; Stern, 1997) ressaltam a dimensão simbólica do acesso à parentalidade, sugerindo que o nascimento de um filho transforma definitivamente o psiquismo de cada um dos pais. Stern indica que o nascimento de um filho provoca uma neoformação psíquica nos pais, sugerindo que a inclusão do bebê no psiquismo parental produz mudanças profundas e irreversíveis.

Essas mudanças ocorrem não só em função das projeções e representações parentais sobre o bebê, mas da mudança que a presença real do bebê provoca nas interações entre ele e seus pais. O nascimento de um filho implica uma dupla dimensão: para que um bebê sobreviva física e psiquicamente, é necessário inscrevê-lo em uma história familiar e transgeracional. No entanto, a dimensão ascendente da transmissão (filhos-pais) é igualmente fundamental, pois só o reconhecimento do filho em sua diferença permite aos pais construir uma relação com a marca do novo e da criatividade, indo além de uma repetição do passado e permitindo que o bebê se aproprie das marcas e inscrições de sua história relacional inicial.

Golse e Bydlowski (2002) postulam que a maternidade introduz uma dialética entre o bebê interno e o bebê enquanto objeto externo, ou seja, entre o bebê que a mãe foi ou que acredita ter sido e seu bebê de carne e osso. Essa passagem testemunha o trabalho psíquico efetuado pela mãe, que se inicia na gravidez com uma reativação do objeto interno (metáfora de seu passado, de sua infância) para o gradual reconhecimento do bebê enquanto alteridade, tendo uma dimensão subjetiva que vai além das representações parentais. Logicamente essa passagem não ocorre abruptamente, mas decorre da possibilidade de um desinvestimento progressivo do objeto interno em benefício do bebê enquanto externo à mãe. Nem sempre esse processo coincide com o nascimento do bebê, sendo comum algumas mães tentarem reter o objeto interno perdido, tendo dificuldade em olhar para seu bebê.

A função paterna, enquanto função de mediação entre a mãe e o bebê, auxilia a mãe a reconhecer o bebê em sua dimensão de sujeito e alteridade, já que para o pai o bebê se constitui como objeto externo desde a concepção. É nesse momento que a presença do bebê real funciona como um catalisador que modifica os fantasmas parentais e permite aos pais retificar as fantasias de sua infância. Na medida em que o bebê não é um reservatório passivo dos cuidados parentais, suas respostas podem modelar o tipo de parentalidade que lhe é oferecida, propiciando novas formas de interação que vão além dos modelos identificatórios que os pais trazem de suas histórias individuais.

Corroborando essa hipótese, a clínica da relação pais/bebê atesta esta dupla dimensão: se, por um lado, os fantasmas parentais influenciam o aparecimento de sintomas psicossomáticos no bebê (Debray, 1999; Lebovici, 1987), as competências e capacidades interativas dos bebês reparam e modificam as fantasias dos pais, auxiliando-os no processo de "parentificação" (Houzel, 2004).

A noção implícita nessa ideia é a de uma mutualidade nas trocas entre pais e bebê que possibilita ao infante iniciar o processo de subjetivação e permite aos pais se apropriarem de seu lugar de pais. Haag (1985) propõe a noção de "identificações intracorporais" para valorizar o trabalho de encenação corporal feita pelo bebê segundo o qual a criança representa em seu corpo a experiência de uma relação significativa com a mãe através de junções corporais que lhe permitem acesso a uma vivência sensorial e emocional reasseguradora. Nessa perspectiva, podemos valorizar a concepção de um psiquismo que se constrói através das trocas afetivas e não-verbais entre o bebê e seus adultos fundamentais, assim como enfatizar a ideia da parentalidade como um processo de co-construção, que é modificado pela presença real do bebê.

Como indica D. Houzel (2004), a parentalidade compreende numerosos aspectos que se relacionam à realidade psíquica de cada um dos pais, principalmente as modificações psíquicas que se produzem em cada um deles no decorrer da gestação e do pós-parto, assim como o processo de parentificação que se relaciona ao campo dos cuidados parentais e às trocas estabelecidas entre os pais e a criança.

O autor sugere refletir sobre o conceito de parentalidade a partir de três eixos. O primeiro se refere ao exercício da parentalidade, aqui tomado no sentido de uma função que define e organiza os laços de parentesco e a transmissão de regras e valores de um determinado grupo social. Houzel (2004) ressalta como o exercício da parentalidade se dá através dos aspectos jurídicos do parentesco e da filiação. O segundo eixo se refere à experiência da parentalidade, que compreende as modificações psíquicas que se produzem nos pais no decorrer do processo de sua transição para a parentalidade. O terceiro eixo é designado de prática da parentalidade, englobando todo o campo dos cuidados parentais, ou seja, o campo das interações afetivas e fantasmáticas entre os pais e seu filho. Esses três eixos articulam-se entre si e definem o processo de constituição de um lugar parental.

Na perspectiva do autor, manter uma articulação entre os três eixos da parentalidade permite evitar privilegiar apenas uma dimensão do processo em detrimento de outra. Assim, é preciso reconhecer a influência da realidade psíquica de cada um dos pais, as transformações ocorridas nas formas de parentalidade, bem como a importância das interações e trocas entre pais e filhos para definir o processo de transição à parentalidade e favorecer o funcionamento das famílias na atualidade.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os estudos sobre os arranjos familiares na atualidade revelam que a mobilidade social, o impacto das tecnologias e a ausência de referências simbólicas estáveis afetam as expectativas de homens e mulheres perante as relações interpessoais, já que não existem mais parâmetros externos que definam completamente a estrutura familiar ou a função parental (Kehl, 2001; Quartim de Moraes, 2001).

Alguns autores enfatizam a disjunção entre conjugalidade e parentalidade, argumentando que a família atual é definida pela relação conjugal, mas não necessariamente marcada pela parentalidade (Julien, 2000; Roudinesco, 2003). Outros postulam uma anterioridade lógica da conjugalidade em relação à parentalidade, enfatizando como a qualidade da relação conjugal atua como um fator de proteção dos filhos (Wagner & Mosmann, 2009). Ou seja, os bons níveis de adaptação e equilíbrio na vida a dois repercutem positivamente na relação com os filhos.

Muitas pesquisas, no entanto, reconhecem a interdependência entre a relação conjugal e a parentalidade, pois, como procuramos argumentar ao longo do texto, as relações entre pais e filhos são influenciadas pela história infantil de cada um dos pais e pelo modelo de relação amorosa que eles internalizaram. Ou seja, a parentalidade é fortemente marcada pelas fantasias e fantasmas parentais, podendo ser exercida de forma criativa ou sintomática, tendo a função de transmitir a história transgeracional às gerações futuras ou de repetir sintomaticamente os segredos e conflitos passados (Zornig, 2009).

Na clínica direcionada à parentalidade, temos observado cada vez mais a necessidade de manter uma relação dialética entre a história cultural e familiar que antecede os pais e a possibilidade de criar uma nova relação, um novo espaço entre pais e filhos. Estudos empíricos sobre a família e o casamento na contemporaneidade revelam que, apesar da diversidade e flexibilização de modelos conjugais e arranjos familiares propostos na atualidade, existe um descompasso entre velhos e novos modelos de conjugalidade, de vida familiar e de exercício da parentalidade (Diniz, 2009; Jablonski, 2009). Na clínica psicanalítica este descompasso se traduz pela dificuldade dos pais em exercerem a função parental de maneira plena, ou seja, reconhecendo a dívida simbólica da transmissão geracional, sem, no entanto, se limitarem a repetir padrões que desconsiderem o tempo presente.

As pesquisas desenvolvidas sobre a primeira infância nas últimas décadas, principalmente estudos vindos da psicologia do desenvolvimento e da neurociência, nos apresentam um bebê ativo desde o nascimento, com competências e capacidades que lhe permitem interagir com seu entorno, diferenciar características de seus cuidadores, engajar-se em interações afetivas e até mesmo modular o tipo de interação no qual se encontra. O bebê do século XXI é um parceiro ativo de suas interações com o mundo e com seus objetos e não mais pensado como passivo e reativo simplesmente. Em oposição ao que se acreditou por muito tempo, o bebê, desde o início, ao invés de estar centrado sobre si mesmo, engaja-se em trocas emocionais significativas com seus cuidadores.

Diversos autores têm desenvolvido pesquisas sobre a intersubjetividade primária (Stern,1992; Trevarthen, 2001) sobre as competências e capacidades do bebê (Rochat, 2001), sobre a diferenciação entre o self e os objetos (Bermudez & Marcel, 1995; Braconnier, 1998) para marcar o impacto do bebê sobre o mundo e suas possibilidades inatas de relação e interação. Nenhuma dessas pesquisas, no entanto, desconsidera um fator essencial - de que é necessário um meio ambiente afetivo e sensível às necessidades do bebê para que seu potencial inato se atualize e se desenvolva. A noção de plasticidade cerebral corrobora esta ideia através da ênfase na inter-relação entre as capacidades do bebê e o investimento de seus objetos primordiais para que o desenvolvimento neurológico e afetivo se constitua.

Cabe assinalar que, no contexto deste texto, as pesquisas desenvolvidas no âmbito da primeira infância nos auxiliam a defender a noção de uma coconstrução no processo de transição à parentalidade, que tem início nas relações objetais precoces de cada um dos pais, mas que pode ser retificado pelo processo de vinculação estabelecido com o filho (Solis-Ponton, 2004).

A noção de sintonia afetiva, mecanismo pelo qual os pais comunicam ao bebê aquilo que é compartilhável, ou seja, as experiências ou comportamentos que se encontram dentro de um território de mútua aceitação, é particularmente relevante para esta discussão (Stern, 1992). Segundo Stern, os pais selecionam consciente e inconscientemente as experiências e os afetos a serem compartilhados, criando um modelo de relação interpessoal que será a base para o mundo intrapsíquico da criança. Assim, "os medos, desejos, proibições e fantasias dos pais desenham o contorno das experiências psíquicas da criança" (Stern, 1992: 186).

Nesta perspectiva, as fantasias parentais sobre o bebê (bebê fantasmático), incluindo seus medos, sonhos, lembranças da própria infância, modelos de pais, ou seja, o mundo mental de suas representações, assumem o estatuto de uma ancoragem fundamental à construção do senso de self do sujeito. Da mesma forma, como ilustrou magistralmente Selma Fraiberg (Fraiberg, Adelson & Shapiro, 1975), as fantasias maternas podem aparecer como "fantasmas que rondam o quarto do bebê", contribuindo para distúrbios no relacionamento pais-bebê e na formação de sintomas na primeira infância.

Os estudos direcionados a uma clínica dos primórdios são fundamentais para pensarmos em estratégias clínicas direcionadas não só à primeira infância, mas a condições que permitam e sirvam como fonte de apoio à construção da parentalidade. O desenvolvimento de pesquisas no âmbito das relações objetais precoces deverá dar subsídios importantes para a clínica da parentalidade e da primeira infância, pois, se a parentalidade se inicia na infância dos pais, seu exercício e sua prática influenciam, de maneira indelével, a construção subjetiva da criança.

 

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Recebido em 10 de junho de 2010
Aceito para publicação em 20 de agosto de 2010

 

 

Silvia Maria Abu-Jamra Zornig
Membro psicanalista da Sociedade de Psicanálise Iracy Doyle; Professora do Departamento de Psicologia da PUC-Rio; Coordenadora do curso de Especialização em Psicologia Clínica com Crianças, PUC-Rio; Presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Bebê. Rua Sara Vilela, 100 − 22460-180 − Rio de Janeiro - RJ. Tel.: (021) 2294-5605 E-mail: silvia.zornig@terra.com.br

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