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Tempo psicanalitico

versão impressa ISSN 0101-4838versão On-line ISSN 2316-6576

Tempo psicanal. vol.49 no.1 Rio de Janeiro jun. 2017

 

ARTIGOS

 

Psicanálise e neurociências: visões antagônicas ou compatíveis?

 

Psychoanalysis and Neurosciences: antagonistic or compatible views?

 

 

Elaine PinheiroI, II*; Regina HerzogII**

INúcleo de Estudos em Psicanálise e Clínica da Contemporaneidade - NEPECC - Brasil
IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A direção atual de se enxergar manifestações psíquicas como sendo, primordialmente, manifestações biológicas, tem suscitado críticas à psicanálise. Esta última é muitas vezes vista como um tratamento de menor importância quando comparada a terapias medicamentosas e comportamentais. Psicanalistas respondem apontando para a necessidade de se garantir um lugar para a singularidade de cada sujeito, em vez de uma normatização coletiva de subjetividades. Freud, embora sustentasse um projeto de ciência, afastou-se da medicina de sua época ao ver sintomas que não eram explicáveis pela biologia. Hoje, enquanto alguns defendem a atualidade das ideias de Freud, outros anunciam seu fim, argumentando que o próprio Freud cogitou que futuras evoluções no saber sobre o cérebro poderiam tornas suas ideias obsoletas. Este artigo apresenta uma reflexão sobre qual o possível lugar da psicanálise diante dos avanços da biologia atual. Entre autores a favor de uma articulação com as neurociências e autores que veem esse diálogo como um contrassenso, abordamos alguns achados neurocientíficos que se alinham às ideias de Freud; o contexto cultural que faz com que explicações fisicalistas sejam privilegiadas; a dificuldade de se entender o fenômeno mental como sendo restrito à atividade cerebral; e os pressupostos técnicos e terapêuticos da psicanálise. Ao final, refletimos sobre o que poderia ser um diálogo que respeite as especificidades de ambos os campos.

Palavras-chave: psicanálise, psicanálise e neurociência, ética, clínica, sujeito.


ABSTRACT

The current direction of seeing psychic manifestations as being primarily biological manifestations has sparked criticism towards psychoanalysis. The latter is often seen as a treatment of minor importance when compared to drug and behavioral therapies. Psychoanalysts respond pointing out the need to secure a place for the uniqueness of each individual rather than a collective standardization of subjectivities. Even though Freud pursued a science project, he took distance from the medicine of his time when he faced symptoms that could not be biologicaly explained. Today, as some argue the relevance of Freud's ideas, others announce their end, arguing that Freud himself wondered whether future developments in the knowledge about the brain could make his ideas obsolete. This paper presents a reflection on the role of psychoanalysis today, with all biology's advances. Among authors in favor of a connection with neurosciences and authors who see this dialogue as pointless, we address to some neuroscientific findings that align with Freud's ideas; the cultural context that privileges physicalist explanations; the difficulty in understanding the mental phenomenon as restricted to brain activity; and technical and therapeutic assumptions of psychoanalysis. Finally, we reflect on what could be a dialogue that respects the specific characteristics of both fields.

Keywords: psychoanalysis, psychoanalysis and neuroscience, ethics, clinic, subject.


 

 

A proposta deste artigo é investigar a tendência contemporânea de tratar a esfera da subjetividade por um viés biológico e se indagar em que medida essa posição pode se afastar ou se aproximar da teoria e técnica psicanalíticas. Dizendo de outro modo: se a psicanálise considera o sujeito como sendo dotado de uma vida interior, com seus desejos, impulsos e paixões, como pensar esse sujeito no âmbito da biologia? As recentes descobertas são capazes de "matar" a psicanálise?

Atualmente, a psicanálise vem sendo bastante questionada tanto em relação a seus tratamentos longos quanto a sua eficácia. Alguns defendem, inclusive, a sua extinção. Em 2005, a publicação do Livro Negro da Psicanálise teve por objetivo descortinar o engodo teórico-clínico que seria a psicanálise, segundo alguns autores cognitivistas. Em abril de 2012, a revista francesa Le Nouvel Observateur publicou uma matéria com o título "É necessário queimar a psicanálise?", inspirado em associações de pais de autistas, revoltados por entenderem que a psicanálise culpa os pais pelas enfermidades de seus filhos, e que por isso deve ser erradicada.

Concomitantemente, é grande a difusão de tratamentos baseados estritamente em medicamentos e processos de treinamento cognitivo. Explicações de base neurológica têm sido bastante difundidas e abraçadas pelo corpo social como solução para qualquer tipo de disfunção psíquica - seja ela patológica, como é o caso do autismo, seja da ordem de qualquer traço de comportamento que incomode o sujeito, ou seja, visto pela sociedade como pouco adequado. Dentre outros a timidez, a tristeza ou a desatenção. Todos esses procedimentos se situam no campo da ciência.

Freud (1923 [1922]/1996, p. 287) vai definir a psicanálise como:

(1) um procedimento para a investigação de processos mentais que são quase inacessíveis por qualquer outro modo, (2) um método (baseado nessa investigação) para o tratamento de distúrbios neuróticos e (3) uma coleção de informações psicológicas obtidas ao longo dessas linhas, e que gradualmente se acumula numa nova disciplina científica.

Nessa perspectiva aproximou a psicanálise da ciência, uma vez que as duas têm os fenômenos como objeto de investigação. Apesar disso, hoje, em um mundo pautado pela lógica do imediatismo e da produtividade, a psicanálise é cada vez mais criticada, passando a ser valorizados os métodos terapêuticos que colocam a causa primordial do sofrimento no cérebro e pretendem "ajudar" o sujeito para que este se ajuste ao mundo - seja através da eliminação do sintoma pela via medicamentosa, seja através de um método educativo. Apontada por críticos como uma falsa ciência, a psicanálise é basicamente acusada de não ter seu foco na redução sintomática.

Assim, na atualidade, assistimos a um duelo entre adeptos de vários campos - psicanálise, neurologia, psicologia, biologia -, cada um reivindicando para si a autoridade para descortinar os assuntos que inquietam a sociedade. Na ausência de referenciais simbólicos estáveis de instituições religiosas, políticas, e outras, a construção científica, com suas fórmulas e instrumentos de observação cada vez mais apurados, parece ocupar o lugar de uma Verdade de cunho assertivo, para não dizer de uma Verdade definitiva. No que tange à vida humana, a produção científica sobre o corpo tem explicações a dar inclusive sobre aquilo que dizemos ser da ordem dos afetos, do psiquismo. As técnicas de imagem cerebral, ao desvendar mecanismos de funções como memória e fala, e sentimentos como tristeza, euforia e medo, tiveram papel fundamental nessa mudança. Alguns cientistas acreditam que a subjetividade se resume à soma de processos neurofisiológicos. Na última década, adeptos desse saber desferiram ataques virulentos à psicanálise, argumentando que seu método investigativo e terapêutico seria uma grande falácia, e Freud não passaria de um vigarista com uma boa estratégia de divulgação (Meyer, 2011).

Em contrapartida, aqueles que criticam o tratamento do psiquismo, reduzindo -o a uma dimensão biológica, possuem ressalvas, afirmando que as terapias medicamentosas estariam incidindo no modo de vida dos sujeitos para além da doença, e que terapias comportamentais não passam de adestramento. Ambas serviriam na adaptação da massa a ideais da cultura capitalista como autonomia, iniciativa, produtividade e assertividade. No final das contas, estariam a serviço de um controle social e não de um bem-estar universal.

Em nossa revisão bibliográfica sobre esse tema, verificamos que os autores que defendem uma articulação com o biológico foram maioria, sustentando que as neurociências promoveriam uma validação objetiva da psicanálise. Afirmam ainda que se pode observar no cérebro aquilo que Freud só conseguira acessar por meio do relato de pacientes na clínica. Alguns exemplos são a amnésia infantil, o mecanismo de recalque e os afetos. Também em defesa dessa possível articulação, considera-se o fato de Freud ter se valido de outras áreas de conhecimento (como sociologia, filosofia, física, biologia, química) e ter sido um neurologista. Apesar de não admitir que as instâncias psíquicas estariam em locais neuroanatômicos, ele admitia que esse hiato poderia vir a ser desfeito (Freud, 1915b/1976).

Em contrapartida, com respeito à inadequação da articulação entre psicanálise e biologia, argumenta-se que imagens do cérebro em funcionamento não conferem maior validação à psicanálise, pois as questões dignas de serem investigadas, os métodos que devem ser usados e os critérios de observação são ditados por uma comunidade científica afetada por seu ambiente sóciohistórico. O fato de Freud (1915b/1976) ter se ancorado na biologia e admitir que processos psíquicos se davam no corpo (e não em instâncias transcendentes) também não justificaria tal empreitada, uma vez que ele também enfatizava a importância da linguagem nas trocas com o outro e na influência da cultura sobre o sujeito. A psicanálise surgiu, não se pode esquecer, baseada em sintomas sem qualquer causa física detectável. Esses sintomas se modificaram ao longo dos anos, mas sua base na vida relacional permanece.

No campo da biologia, a ideia do dualismo cartesiano de mente e corpo como entes separados - sendo o corpo físico e a mente imaterial - caiu em desuso. Em vez disso, vigora o entendimento monista de que mente e corpo coexistem no mundo físico. Dado esse panorama, encontraremos alguns autores que advogam por um materialismo reducionista. Isso significa que veem a mente como encarnada no corpo e consideram-na como sendo o próprio cérebro, sua anatomia e o conjunto de processos neurofisiológicos por ele desempenhados (Crick, 1995; Herculano-Houzel, 2013). Nessa perspectiva, atividade mental é sinônimo de atividade cerebral. Relembremos a famosa citação de Francis Crick (1995, p.3): "'Você', as suas alegrias e as suas tristezas, as suas memórias e as suas ambições, o seu sentido de identidade pessoal e livre arbítrio, não são de fato mais do que o comportamento de um vasto conjunto de células nervosas e das suas moléculas associadas.

Compreender o que se passa no cérebro, os processos e circuitos ligados a comportamentos, emoções e pensamentos, seria compreender a totalidade do funcionamento mental.

Já outros autores defendem um materialismo não-reducionista, no qual a mente seria um processo complexo e com causas múltiplas envolvendo corpo e ambiente - tanto físico quanto simbólico (Ribeiro, 2011; Zatz, 2000). Enquanto o cérebro é condição de possibilidade para que o psíquico possa existir, conhecer seu funcionamento não é o bastante para abarcar a totalidade da mente.

Vale a pena trazer aqui alguns trabalhos que defendem essa posição.

Seguindo a linha do materialismo não-reducionista, alguns neurocientistas tentam conjugar o estudo da psicanálise com o que já se conhece sobre o funcionamento cerebral. Solms e Kaplan-Solms (2004), precursores da neuropsicanálise, afirmam que o conhecimento limitado da neurologia na época de Freud o impediu de elaborar um método mais objetivo para testar suas hipóteses teóricas e seus resultados clínicos. A neurociência viria a suprir essa lacuna entre psicanálise e neurobiologia, conjugando o ponto de vista do sujeito, que vive a experiência, com o observador, que vê a base orgânica necessária ao pensamento. Isso oferece validade objetiva à teoria e técnica analíticas. Conforme Kandel (1999), a psicanálise tem o melhor modelo de mente dentre os existentes, tendo alcançado insights brilhantes sobre o funcionamento psíquico, como amnésia infantil, funcionamento inconsciente e impulsos irracionais. Ainda para esse autor (Kandel, 2012) Freud, se ainda fosse vivo, adoraria as neurociências, mas seus sucessores não mantiveram seu espírito científico investigativo e seguiram pouco férteis na produção e verificação de novas ideias. Ele considera que a psicanálise possui o modelo mais satisfatório para a dinâmica mental, e a neurociência entraria fornecendo bases teóricas mais concretas que a metapsicologia; nesse viés propõe que se mude o método de investigação: em vez das impressões do analista (e o risco do filtro subjetivo do observador), as imagens da atividade cerebral. Tanto Kandel quanto Solms reconhecem que o ambiente reservado do encontro clínico e a confiança do paciente no analista são essenciais para que o sujeito fale de si e que, por esse método, se chegou a temas importantes de serem investigados. Todavia, na atualidade teria chegado a hora de a neurociência fornecer bases empíricas e conceituais que tornem a psicanálise mais científica. Vemos aqui a tentativa de explicar a psicanálise através das neurociências, pela importação de conceitos e métodos.

Há ainda propostas com o intuito de unir os dois saberes em suas zonas de sobreposição, resguardando os termos e especificidades de cada um. Ansermet e Magistretti (2006) lembram mesmo Freud acreditando que um dia seriam encontradas as bases fisiológicas dos fenômenos psicológicos, os dois domínios permaneceram separados. O psicanalista e o neurocientista pretendem então explorar as interseções entre fato biológico e fato psíquico. Diferente do inconsciente cognitivo, onde estariam os automatismos e reflexos que executamos, o inconsciente freudiano é formado por traços deixados por experiências vividas, os quais se associam de modo a formar uma personalidade singular. Na neurobiologia moderna, a ideia de traço refere-se a modificações que toda experiência deixa nas conexões da rede neuronal. Desse modo, os traços das experiências seriam um campo privilegiado para questões que envolvam neurociência e psicanálise. Sabe-se atualmente que a rede neuronal não é estanque e imutável, mas aberta a mudanças. Sinapses mudam sua forma, tamanho e quantidade conforme as experiências, guardando relação direta com os sentidos corporais. A hipótese da dupla é que traços de memória iniciais se reordenam por meio da plasticidade neuronal e dão origem a uma realidade inconsciente interna que rege as escolhas do sujeito.

É importante lembrar que encontramos na biologia atual ideias que remetem a um organismo aberto ao mundo, que transforma o ambiente ao mesmo tempo que se transforma. O conceito de plasticidade neuronal mostra que, mais que o desdobramento de um mapa genético, o cérebro é a combinação de fatores genéticos e marcas deixadas por vivências. Trata-se, desde o nascimento, de um órgão que se modifica e cria conexões conforme a experiência. Dentre os fatores que influenciam a plasticidade, estão as vivências sensório-motoras, estresse, relações com os pais e com outros seres humanos (Kolb, & Gibb, 2011). Epigenética é o ramo de estudo que investiga como fatores ambientais afetam a atividade genética de um indivíduo sem que seu DNA se altere (Weinhold, 2006). Vemos que cada organismo nasce com um leque de possibilidades inatas na sequência de seu DNA, mas é a interação com o meio que dirá quais vão se manifestar e quais proteínas serão transcritas (Simmons, 2008). Em 1994, neurocientistas italianos descobriram o que chamaram de neurônios-espelho (Rizzolatti, Fogassi, & Gallese, 2006). Ao observar uma ação alheia, o córtex motor de quem observa é ativado nas áreas correspondentes ao movimento visto. O cérebro parece simular a ação como se o próprio observador a executasse. Esses neurônios têm sua atividade aumentada quando o indivíduo é capaz de perceber a finalidade da ação observada. Seriam então os responsáveis orgânicos pelo aprendizado por imitação e pela compreensão empática. Essas são noções que falam de uma ciência aberta à imprevisibilidade dos eventos e à singularidade de cada ser humano.

Além disso, é curioso ver que vários dos pressupostos de Freud encontram eco em experimentos da neurociência atual. Anderson e Levy (2009) mostraram que é possível suprimir memórias ativamente, o que seria análogo ao mecanismo de recalque. À medida que se tenta esquecer, há maior ativação de áreas pré-frontais, responsáveis pelo controle executivo, e inibição de áreas ligadas à memória episódica (hipocampo) e valoração negativa da lembrança (amígdala).

Solms (2000) conduziu um estudo para dissociar a ideia de que a fase de sono REM seria o equivalente fisiológico do sonho, baseado na evidência de que o processo onírico é controlado por áreas pré-frontais. Investigou lesões na área tegmental ventral (VTA), cujos neurônios dopaminérgicos enviam axônios para a região frontal do cérebro. VTA é relacionada a mecanismos de evitação de punição, busca por recompensa e satisfação física, bem como aos sintomas positivos da esquizofrenia. Quando lesionada, o paciente experimenta alterações na esfera do desejo: redução na iniciativa, no interesse em interagir com o mundo, na capacidade de planejamento e na imaginação. Além disso, o paciente não sonha, muito embora a eletrofisiologia do sono REM permaneça inalterada. Hiperativação da mesma área induz a sonhos e pesadelos bastante vívidos e a sintomas psicóticos, dois fenômenos frequentemente relacionados. Diante dessas informações, é razoável dizer que a premissa freudiana do sonho como realização de desejos possui evidência científica.

Estudos mostram que crianças bem pequenas são capazes de registrar experiências (Meltzoff, 1999) e que a interação dos bebês com o mundo deixa marcas na personalidade (Kolb, & Gibb, 2011; Meltzoff, 2016). Apesar de não haver conclusão sobre o destino das memórias antes dos 3 anos de idade - se acabam se perdendo para dar lugar a outras informações, ou se são apenas de difícil evocação -, a amnésia infantil é um fenômeno aceito pela comunidade científica de modo geral (Bauer, 2004; Josselyn, & Frankland, 2012). Ainda na esteira de fenômenos observados por Freud, há evidências de que o funcionamento consciente é apenas uma parte pequena de nosso funcionamento psíquico (Morsella, Godwin, Jantz, Krieger, & Gazzaley, 2015).

 

Da emergência do sujeito freudiano ao "sujeito" biológico

Psicanálise e ciência sempre guardaram entre si pontos de interlocução. Sendo Freud um neurologista de formação, e uma vez que a Psicanálise surgiu de seu interesse sobre os sintomas histéricos, o diálogo com a medicina sempre esteve presente. Em 1932, Freud, em sua conferência sobre a Weltanschauung, afirmou que a psicanálise tem a visão de mundo da ciência, apesar de não ser ela mesma uma ciência natural. Isso se deve ao fato de apoiar-se na investigação intelectual dos fenômenos psíquicos, mas sem a intenção de estabelecer um sistema de pensamento hermético, como seria o caso de uma filosofia. Vejamos de forma breve como se encontra o saber científico na época em que Freud constrói sua teoria.

Com o estudo da anatomia, no século XVIII, inaugurou-se o paradigma anátomo-clínico e, com ele, a medicina científica, que estava preocupada em encontrar as lesões ou disfunções no órgão que causavam a doença. O médico deixa de perguntar ao paciente sobre como ele se sente para perguntar onde dói. Com o status de ciência, a medicina passa a ostentar o discurso soberano sobre os cuidados com o corpo.

O modelo anátomo-clínico que servia de norte para a medicina era o grande entrave para a elucidação dos sintomas histéricos, uma vez que não se encontrava qualquer lesão anatômica que pudesse ser apontada como cerne daquela patologia. (Birman, 2010).

No entanto, não é demais lembrar que Freud, desde o início de seus trabalhos, teve o cuidado de conferir um rigor científico ao campo de saber que construía. Como aponta Herzog (1988), essa busca pelo status de cientificidade está presente em vários dos artigos do primeiro psicanalista. Os processos pulsionais (acúmulo e escoamento de energia) análogos a processos das ciências naturais, a descrição dos procedimentos técnicos e dos fenômenos descobertos são exemplos disso. Essa busca por objetividade era um esforço necessário para que seu trabalho não fosse tomado como místico ou como mais uma forma de sugestão. Mesmo em 1923, quando já se contabilizavam mais de duas décadas de investigações acerca dos processos inconscientes, cabe repetir aqui a afirmação veemente de Freud acerca da legitimidade de sua descoberta, ao caracterizar a psicanálise como "um procedimento para a investigação de processos mentais que são quase inacessíveis por qualquer outro modo" (Freud, 1923 [1922]/1976, p. 287).

A Psicanálise, cujo objeto de investigação são as formações inconscientes, desde seu surgimento implicou uma ruptura epistemológica com o campo da medicina, ao trazer uma noção de corpo calcada no conceito de pulsão, definido por Freud (1915a/1976, p. 142) como: "um conceito situado na fronteira entre o mental e o somático, como o representante psíquico dos estímulos que se originam dentro do organismo e alcançam a mente, como uma medida da exigência feita à mente no sentido de trabalhar em consequência de sua ligação com o corpo".

Ao contrário do instinto, que possui objeto pré-definido, a pulsão não tem estabelecido previamente nem seu objeto nem sua forma de satisfação, que serão moldados conforme a história do sujeito. Desse modo, o corpo passa a ser compreendido como indissociável do registro simbólico e, consequentemente, da relação com o próximo.

Vemos então que a discussão biológico x psicológico não é propriamente nova. Mesmo atingido pelas referências de seu tempo, Freud dá um passo a mais e pensará, posteriormente, num corpo pulsional - em oposição a um corpo meramente anatômico -, que depende da relação com o semelhante para se formar. É por conta do outro que nomeia, atende e frustra suas demandas que um sujeito pode advir como tal. Com isso, Freud desfaz a dicotomia que toma mente e corpo como dois lugares separados. Além do mais, Freud (1923/1976), ao definir o Eu como uma instância corporal, que tem sua origem nas sensações físicas (que serão constitutivas do sujeito), torna inválidas as críticas daqueles que o acusam de ter negligenciado a questão do corpo.

O sintoma é forjado pela palavra, expressão de um conflito inconsciente, totalmente distinto do sintoma da medicina. O desejo em conflito com a consciência encontra ligação com alguma palavra que se associe a ele. Sendo assim, o sintoma é a expressão de um desejo. Trata-se então de uma formação de compromisso entre o Consciente e o Inconsciente (Freud, 1900/1996).

Postular um aparelho psíquico cujo motor principal estava no Inconsciente, instância esta não localizável no corpo anatômico e responsável por produções psíquicas aparentemente desprovidas de sentido, foi um grande passo que possibilitou a Freud romper com o discurso médico e instituir o discurso psicanalítico. Esse aparelho era guiado pelo princípio do prazer. Isso quer dizer que sua finalidade era fazer uma mediação entre as contingências ambientais e as forças pulsionais, buscando evitar o desprazer.

Sobre as transformações culturais que possibilitaram tal visão de psiquismo, valendo-nos das considerações de Kehl (2002), vemos que a transição cultural de um modo de vida referido ao coletivo para outro modo de vida, referido cada vez mais ao individualismo, foi o que permitiu o surgimento do sujeito neurótico, marcado pelo conflito, sobre o qual a psicanálise montou suas investigações, uma vez que as regras rígidas de uma comunidade "liberam o sujeito da necessidade de elaborar uma resposta neurótica para seu conflito" (Kehl, 2002, p. 46). Em uma cultura de formações sociais bem demarcadas e estáveis que regem a vida do ser humano (tal como ocorria no mundo antigo e medieval) o sujeito é menos livre para ser autor de seu próprio destino. Enquanto nas culturas antigas as normas, transgressões e punições são explícitas e decididas pela coletividade, nas modernas sociedades individualistas essas regras são internalizadas, e cabe cada vez mais ao sujeito julgar a natureza de seus atos.

Nas sociedades antigas e medievais, as formações sociais com códigos rígidos e públicos, tanto no que tocam a vida pública quanto a vida privada, eram o que salvava o sujeito da neurose. Segundo Kehl (2002) a internalização das leis e dos ideais na forma de um Supereu se dá na medida em que esse processo de descentralização da verdade avança.

Vemos assim que o sujeito moderno, diferente do medieval, é um sujeito não mais tão referido à coletividade e à linhagem, mas à sua interioridade. É aberto um espaço para a interpretação e, consequentemente, para a dúvida sobre o que fazer consigo mesmo e seu destino. Cada um será levado a pensar sobre si e procurar um sentido para sua existência.

A sociedade atual caminha conforme as coordenadas estipuladas por Guy Debord em 1968, na sua obra A sociedade do espetáculo. Nela, o autor descrevia um panorama de sociedade em forma de encenação performática onde o que importa é a aparência. Os sujeitos absorvem passivamente esse desfile de imagens que estampa a superfluidade do social. Nesse modelo, não importa muito o que o sujeito é. Basta parecer que é alguma coisa, pois o que está em jogo é o personagem socialmente exibido. Os meios de comunicação em massa são responsáveis por veicularem o modelo que deve ser seguido. Esse desfile de imagens não convida ao pensamento, mas à mimetização.

Na tradição ocidental, o sujeito sempre fora definido ou por seus atos (relacionados à aparição pública) ou por sua interioridade emocional (relacionada à vida privada). Na contemporaneidade, nem um nem outro, mas o corpo é o referencial usado para que um sujeito se defina.

O medo atual não é o da punição, mas o da vergonha de se sentir insuficiente e não estar à altura dos ideais. Enquanto na neurose clássica dos tempos de Freud o conflito fundamental era entre a lei externa e o desejo individual, o conflito atual se dá entre o que é possível e impossível de ser feito. Entre o século XIX e início do século XX, a culpa recaía sobre impulsos sexuais e agressivos, enquanto hoje recai sobre a não-autonomia e a dependência (Phillips, & Taylor, 2010, citados por Farah, 2012).

Fortes (2010), em um artigo sobre a anorexia, aborda o lugar central que o corpo vem ocupando na cultura atual. Ocorre na clínica um número enorme de sintomas corporais sem que o paciente manifeste claramente qualquer conflito psíquico. Nota-se paralelamente na cultura um cuidado voltado cada vez menos para o cultivo de valores morais e de aptidões intelectuais e cada vez mais uma preocupação com um corpo esteticamente belo, saudável e capaz de viver por longos anos.

Houve um deslocamento do foco da vida sentimental para a vida física. Estar "bem consigo mesmo" não remete mais apenas a um estado de conforto sentimental, mas diz respeito à ostentação de um corpo que siga os padrões publicitários. Se antes o corpo era um meio para transformar o mundo e dar vazão às vontades daquele ao qual pertence, agora o corpo é um fim em si mesmo. (Costa, 2005).

Diante das autoridades destronadas e de uma abertura a sentidos e interpretações cada vez mais plurais, a ciência, com seus experimentos concretos e fórmulas matemáticas, tornou-se aquilo que deve ser seguido. A ciência será a instituição em torno da qual todas as outras vão se organizar. Trabalho, família, política, religião continuam existindo e sendo referência para várias pessoas, porém com uma tonalidade mais individual, uma vez que não existe mais um modo exato e incontestável de enquadramento e é maior a liberdade de escolha (vários arranjos familiares, vários modos de exercer a profissão, credos diversos, etc.).

Acerca da neurociência, Ehrenberg (2009) cita o modo como seu domínio passou de doenças neurológicas e funções - como movimento e sentidos - para as emoções, comportamentos sociais e sentimentos morais; ou seja, o domínio do espírito; o que foi facilitado pelos procedimentos de imageria cerebral e biologia molecular. A "biologia do espírito" seria reflexo da crença individualista de que o homem está "fechado na interioridade de seu corpo, lugar de sua verdade" (Ehrenberg, 2009, p. 190), e que depois se relaciona com outros para formar o social. Esse modelo é denominado por ele de Sujeito Cerebral.

Conhecer um cérebro serviria apenas para identificar uma pessoa dentre tantas outras de sua espécie; diferenciá-la, dizer que é ela e não outra. Mas as características orgânicas, os mecanismos biológicos em nível molecular, só são desencadeados em determinadas situações. Poderíamos ver características de personalidade mais destacadas que outras, mas não determinar o que ou quem despertaria essas características. Elas só aparecem porque o sujeito está inserido em um contexto, está em relação com um semelhante. O sentido desta personalidade, desta identidade, só é visto no social, em relação com os outros.

Para esse autor (Ehrenberg, 2009), o sucesso das neurociências em nossa sociedade se deve ao fato de dar respostas simples que atendem ao "ideal de autonomia individual generalizada" - pois concentram no indivíduo as causas de seus êxitos e insucessos, negligenciando contextos. O componente biológico ameniza o peso das tomadas de decisão e de responsabilidade que são exigidas das pessoas. O cérebro justifica qualquer fracasso, admitindo, ao mesmo tempo, soluções mais simples, como as de ordem pedagógica ou farmacológica. O "Eu neuroquímico" (Neurochemical Self) de Rose (2003) é análogo ao que Ehrenberg batizou de Sujeito Cerebral.

Enquanto nas doenças puramente físicas o funcionamento dos órgãos explica a totalidade dos sintomas, nas doenças mentais isso não ocorre. Não é verossímil dizer que a imagem dos processos cerebrais em um sujeito com depressão abarque a totalidade do estado depressivo. Há uma série de sinais não esmiuçáveis por meio dessas imagens, como por exemplo: pensamento lentificado, baixa autoestima, tristeza, ausência de vontade, tendência à inação, etc. Além disso, há diferentes quadros depressivos com relação à duração e intensidade dos sintomas, e as causas ambientais que os engatilharam (rompimento amoroso, fracasso profissional, luto, saudades da terra natal, dificuldade financeiras, doença física grave, etc) (Costa, 2005).

A atividade cerebral relacionada aos sintomas não é a causa nem a totalidade do estado depressivo. A depressão é um processo que envolve a esfera relacional dos acontecimentos, a consciência do sujeito de si e do mundo. Envolve padrões de pensamento e comportamento usuais do sujeito, mas também respostas físicas e mentais não usuais, que especialmente ocorrem em situações únicas - e cujos efeitos podem reverberar por mais tempo (Costa, 2005). Podemos incluir aí ocasiões em que o sujeito executa um ato em que não se reconhece. Esses acontecimentos, tão caros à psicanálise, são surpreendentes até para quem os provoca por destoarem da unidade egoica coesa. Essas respostas, específicas e sob medida para certos eventos não se repetem. Por isso mesmo não podem ser englobadas em um padrão a ser investigado ou medido, sobre o qual possamos intervir.

Para exemplificar como conexões neuronais e processos bioquímicos não alcançam a complexidade de experiências subjetivas, D'Aquili e Newberg (1999) escanearam os cérebros de oito budistas americanos em estado de meditação tibetana e três freiras franciscanas em oração contemplativa. Mesmo tendo imagens cerebrais semelhantes, os dois tipos de práticas observados possuem bases teológicas distintas e estão inseridos em contextos socioculturais diversos. Isso implicaria em uma simplificação da riqueza da vida mental.

 

A direção da cura para a psicanálise

Entre as críticas que a psicanálise enfrenta, a mais importante de ser analisada diz respeito à questão da interpretação. Argumenta-se que as interpretações seriam mais baseadas em clichês datados e carregariam em si o escudo para sua inconsistência, pois qualquer tentativa de refutá-las seria resistência do paciente. Essa ideia supõe que a psicanálise proporia encontrar uma verdade oculta que é finalmente desvelada no setting. Todavia, para a psicanálise, a verdade do sujeito diz respeito ao seu desejo e se constrói na fala. O paciente narra uma série de episódios, repete certos elementos que compõem sua história e que afetarão suas escolhas futuras. É com esse material que a psicanálise trabalha, não sendo levado em consideração se o que é dito é imaginário ou real.

O sujeito se reestrutura no reordenamento da fala, ou seja, ganha novas formas de recontar os episódios e de tomar lugar naquilo que aconteceu. Essa reconfiguração subjetiva só é possível quando, ao ser interpelado pelo analista, algo salta como interrogação para o paciente. Ao produzir elaborações na fala, reconhece que em seu discurso há algo de sua verdade e de seu desejo inconsciente. A partir daí, pode dar um passo ético, que consiste também, se podemos dizer assim, em um passo de liberdade: arriscar agir diferente, arriscar se posicionar de outro modo perante a existência, mesmo não tendo garantias de que isso lhe trará felicidade ou conforto e, ainda assim, bancando a total responsabilidade por seus atos e mudanças. O acontecimento permanece, mas o sentido é posterior, dado em análise.

Freud (1912/1996) coloca que o modo como cada um conduz sua vida - pessoas pelas quais se tem predisposição para afeiçoar, as satisfações que se busca e o modo como é feito, os objetivos que se estabelece - deriva principalmente de "disposição inata e das influências sofridas durante os primeiros anos" (Freud, 1912/1996, p. 111). Forma-se um modo de agir que se repetirá durante a vida posterior do sujeito. As necessidades insatisfeitas também guiam a conduta do sujeito, de modo a tentarem encontrar escoamento libidinal que as satisfaça - sejam essas necessidades conscientes ou inconscientes. Esse modo de agir será repetido inclusive na relação com o analista.

O fenômeno da transferência, apesar de oferecer resistência e ser de difícil manejo, é o que permite a manifestação de impulsos inconscientes e permite ao analista chegar até eles. Quando o analista consegue, com sucesso, esclarecer que ele, paciente, está sujeito aos fenômenos de transferência, a resistência seria superada e haveria um ganho terapêutico, uma vez que, segundo Freud (1938/1996), o paciente jamais esquece o que foi vivenciado no âmbito da transferência. O Eu seria alterado de modo a influenciar o posicionamento do paciente perante as demais situações da vida.

Portanto, o manejo da transferência e a interpretação devem ser o norte da técnica do profissional para lidar com as resistências que inevitavelmente surgirão no discurso do analisando, à medida que sua fala em análise for se aproximando de algum material recalcado.

Espera-se, como em toda análise, que os progressos feitos não cessem com o seu término. Pelo contrário, que o Eu conserve a capacidade de se adaptar às próximas mudanças que se fizerem necessárias na vida, e que as novas experiências sejam vividas de modo mais racional e flexível, à luz do que foi trabalhado em análise (Freud, 1937/1996).

Posto que o analista não deve encarnar o papel de professor ou de exemplo, a experiência de análise não é de natureza educativa. Sobre a rememoração do material recalcado, Lacan (1953-1954/1986) aponta que se trata menos de lembrar e mais de reescrever a própria história. No ano seguinte, insiste nessa perspectiva ao afirmar: "Um sentido é uma ordem, isto é, um surgimento" (Lacan, 1954-1955/1985, p. 292). É algo a ser produzido pelo homem a partir disso que o perturba e insiste. Diante disso, podemos depreender que o fortalecimento do Eu citado por Freud não diz respeito a encaixar-se em um modo correto de funcionamento ditado pelo analista. Ocorre que, ciente dos significantes que determinam seu inconsciente, o sujeito pode ressignificar seu entorno. Assim, ganha mais liberdade de escolha para operar de outro modo e vislumbrar novos destinos para suas pulsões.

Nosso objetivo não será dissipar todas as peculiaridades do caráter humano em benefício de uma "normalidade" esquemática, nem tampouco exigir que a pessoa que foi completamente analisada não sinta paixões nem desenvolva conflitos internos. A missão da análise é garantir as melhores condições psicológicas possíveis para as funções do ego; com isso, ela se desincumbiu de sua tarefa (Freud, 1937/1996, p. 266-267).

Não se trata de um método normativo, já que não há uma medida de bem-estar comum a todos os seres, ou algo que garanta uma solução última frente ao mal-estar (Freud, 1930/1996). Sempre haverá um vazio que não poderá ser reduzido a um objeto ou explicação, permanecendo sem sentido. É exatamente esse vazio que impelirá o sujeito a criar algo de novo. O bem supremo está no campo da moral, da norma, enquanto no fim de análise o sujeito deixaria de esperar uma solução definitiva para, entre as brechas da norma, achar um escoamento para seu desejo, responsabilizando-se por ele e pagando o preço que isso exigir (Lacan, 1959-1960/2008). Nesses termos não se trata de uma posição hedonista. Em momento algum há garantia de que o sujeito atingirá êxito em sua empreitada. Ao se lançar em direção a qualquer objetivo, não pode ter certeza de que obterá prazer, sucesso, reconhecimento ou acolhimento alheio. Não há fórmulas previamente dadas. O desejo não necessariamente está em confluência com o caminho mais cômodo para o sujeito, nem tampouco com aquilo que poderia ser descrito como um bem geral. Isso é a sustentação do desejo singular. É justamente por haver algo de que o saber científico não dá conta que a psicanálise existe: confrontar-nos com a dimensão do impossível, que se faz presente nas diversas formas de mal-estar. O destino do homem depende de um passo ético.

Por ser uma ética do desejo, a psicanálise não aposta em um treinamento ou pedagogia. O analista trabalha com as palavras vindas do sujeito, para que ele mesmo tome suas decisões. A mudança de posição perante sua verdade, o que implica a construção de um saber, de uma nova verdade, feita a partir de novos sentidos produzidos conforme o sujeito narra e revê sua história (Lacan, 1953/1978). Considerando Canguilhem (1971), podemos dizer que a psicanálise tem em vista permitir que o sujeito passe de um modo patológico (com normas de funcionamento inflexíveis, que causam sofrimento) a um estado de maior saúde psíquica. A normatividade definida por esse autor não tem como base um pré-modelo externo, mas um organismo apto a criar novas normas de funcionamento, mais elásticas, para responder às exigências de seu ambiente.

O que os partidários do materialismo reducionista parecem ignorar é que o cérebro está inserido em um corpo afetado por tudo que o circunda: o ambiente físico que ocupa, em um certo contexto cultural, as relações com os semelhantes e a imprevisibilidade dos acontecimentos - fatores que não podem ser esmiuçados em análises laboratoriais ou de neuroimagem. Encontrar correlatos neurais de processos mentais e entender como alterações cerebrais e genéticas influenciam a maneira de estar no mundo, além de confirmar nossa condição de seres orgânicos, ajuda a pensar modos de intervenção que desenvolvam capacidades ou aliviem sofrimentos. Mas a atividade neuroquímica só faz sentido quando articulada ao relato singular que cada indivíduo tem de suas experiências. Por esse motivo, o estudo da mente deve ser objeto da biologia, mas não somente. Outras disciplinas vão apresentar outros pontos de vista a fim de compreender a dinâmica da atividade mental e da vivência subjetiva. Tentar objetivizar demais o fenômeno mental acaba por excluir o lugar do sujeito: o que diz de sua identidade, com as palavras que escolhe e os sentidos que constrói. A vivência subjetiva é algo que ocorre dentro e fora do corpo, no encontro entre o ser humano e o outro, agindo sobre o ambiente, usando seu aprendizado e atualizando-o, criando respostas para as situações rotineiras ou atípicas que se apresentam. Claramente, tudo isso seria inviável sem o cérebro. No entanto, mais que o processamento de estímulos internos e externos, o fenômeno mental envolve a criação de sentidos que é sempre referida a um universo linguístico e social. Para Bezerra Jr. (2010) o reducionismo metodológico que cada disciplina faz para dar conta de um objeto de estudo não torna dispensáveis investigações de outra ordem. Enquanto conceitos psicodinâmicos abordam o funcionamento mental visando uma mudança no modo como o sujeito lida com suas questões, os elementos da neurociência abordam outro ângulo do mesmo fenômeno, dando base para intervenções farmacológicas.

É importante lembrar que dentro da própria psicanálise as posições são divergentes. Há representantes que defendem um diálogo entre os dois campos, onde se preservem os conceitos específicos de cada um deles (Bezerra Jr., 2010; Sollero-de-Campos, 2009; Winograd, 2004). Um segundo grupo, da neuropsicanálise de Mark Solms (fundador da The Neuropsychoanalysis Association), acha que o problema de Freud foi a neurologia de sua época não dispor de aparato suficiente para observar fenômenos cerebrais. Já um terceiro grupo critica a submissão à tendência de se interpretar tudo conforme o saber científico; alega que a ambição científica foi justamente o entrave freudiano, ainda que volta e meia recorresse à história, filosofia e mitologia. A psicanálise não é uma ciência natural: enquanto a segunda exclui o sujeito para não perder objetividade, a primeira dá a ele um lugar, com seus desejos e contradições (Elia, 1999). Como a psicanálise se debruça sobre a realidade interna, e não a realidade objetiva, a aproximação com a objetividade da neurociência comprometeria o acesso à subjetividade (Faveret, 2006). Eric Laurent (2014a, 2014b) afirma que as emoções são reflexos conscientes de processos corporais, e isso atrapalha a investigação do que é essencial, como os processos inconscientes, a relação com a linguagem e com o imprevisível. Para ele, a psicanálise pode contribuir com a ciência mostrando como mesmo seus produtos destinados a combater o mal-estar podem virar objeto de satisfação pessoal, independentemente das normas fixadas por especialistas (por exemplo, o uso off-label e o vício em medicamentos psiquiátricos e a forte identificação com diagnósticos de transtornos mentais). Além disso, questionando a tentativa de uma classificação psicopatológica minuciosamente perfeita que descreva a natureza do humano. São propostas interessantes, mas unilaterais, nas quais apenas a ciência seria passível de questionamentos.

Freud nunca desistiu de seu projeto de ciência, tampouco menosprezou a importância do orgânico. Chegou mesmo a afirmar que a biologia, "terra de possibilidades ilimitadas", poderia um dia nos dar explicações "de um tipo que ponha por terra toda a nossa estrutura artificial de hipóteses" (Freud, 1920/1976, p. 81). Ao longo de sua vida, não hesitava em rever seus conceitos e métodos, influenciado por aquilo que encontrava em suas observações clínicas e suas pesquisas em diversas áreas. Sustentava, nunca é demais repetir, que é necessário e legítimo lançar mão da inferência quando os dados empiricamente observáveis não se mostram suficientes. "Uma apreensão maior do significado das coisas constitui motivo perfeitamente justificável para ir além dos limites da experiência direta" (Freud, 1915b/1976, p. 192). Submeter a psicanálise à neurociência como se houvesse uma hierarquia entre elas, simplesmente importando o vocabulário da segunda para a primeira, soa equivocado. Assim como soa equivocado aferrar-se a conceitos psicanalíticos de modo rígido. Ambas as posturas destoam do espírito curioso do criador da psicanálise. A possibilidade de dialogar com outros campos que tratem do funcionamento mental pode ser enriquecedora do ponto de vista da pesquisa e da clínica, desde que guardando as particularidades de cada disciplina. As interrogações entre os dois saberes podem ser diversas, por exemplo: como a neurociência pode buscar na psicanálise questões para investigar? Como a psicanálise pode questionar a corrente reducionista das neurociências e os impactos sociais de suas conclusões? Como lidar com indivíduos que usam tão maciçamente o referencial orgânico para definir e enxergar a vida, a si mesmos e aos outros? Como o comprometimento de funções cognitivas (como linguagem, percepção, atenção, memória) afetam a compreensão que alguém tem de sua própria identidade ao longo do tempo e a adesão à regra da associação livre?

Tentemos fugir dos reducionismos. Abrir espaço para uma singularidade que não é passível de objetividade e para o acaso que impede soluções prêt-à-porter não implica rechaçar a ciência. A psicanálise continua a tratar do desconhecido. Do mesmo modo, a crítica à escassez de pesquisas clínicas que mostrem propostas e resultados em psicanálise não são descabidas. Mas investigar como duas áreas interagem, convergem e se influenciam não significa que se possa traduzir uma através da outra. Mesmo compartilhando interfaces, lidam com aspectos diferentes da mente: o orgânico e as relações vividas. Conceitos e métodos podem ser revistos dentro das próprias disciplinas.

Acreditamos que Freud, se vivo fosse, provavelmente gostaria das neurociências. Não só por ver concretizada sua esperança de encontrar marcadores biológicos para processos psíquicos, mas por poder constatar o quão muito do que escreveu ainda é atual. O cérebro nos mostra estados de ânimo, mas a definição biológica não basta para destrinchar a natureza da experiência do sujeito, que depende da linguagem para ser razoavelmente compreendida. Ao postular um funcionamento psíquico dinâmico, a psicanálise trata de um corpo físico que se debate com sua história e seu entorno, e que pode recriar-se em seus atos e suas ideias de mundo. Permanece, então, atenta àquele ponto de opacidade da vida sem respostas universais, onde estão o desamparo e o imprevisível, e com o qual cada um de nós deve se deparar. Um ponto que o enquadre científico não esgota e que exige uma saída singular. Trata-se da criação e não da prescrição.

 

 

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Artigo recebido em: 05/10/2016
Aprovado para publicação em: 15/05/2017

Endereço para correspondência
Elaine Pinheiro
E-mail: elainep00@gmail.com
Regina Herzog
E-mail: rherzog@globo.com

 

 

*Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica/UFRJ; membro do Núcleo de Estudos em Psicanálise e Clínica da Contemporaneidade (NEPECC); psicóloga do IPUB-UFRJ.
**Psicanalista, professora associada do Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica/UFRJ, bolsista de produtividade em pesquisa do CNPq.

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