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Tempo psicanalitico

versão impressa ISSN 0101-4838versão On-line ISSN 2316-6576

Tempo psicanal. vol.51 no.2 Rio de Janeiro jul./dez. 2019

 

ARTIGOS

 

Alienação e separação no Seminário 11 de Lacan: uma proposta de interpretação

 

Alienation and separation in Seminar 11 of Lacan: a proposal of interpretation

 

Alienación y separación en el Seminario 11 de Lacan: una propuesta de interpretación

 

 

Pedro Costa Zanola*; Rosane Zétola LustozaI**

IUniversidade Federal do Paraná - UFPR - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo propõe um estudo teórico interpretativo das operações alienação e separação da causação do sujeito, tal como apresentadas por Lacan no seminário Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Será dada ênfase especial à afirmação lacaniana de que a separação implicaria em um retorno à alienação. Essa questão nos levou a deslindar duas vertentes distintas da alienação: a raiz da alienação, que descreve como o sujeito surge no campo simbólico marcado por uma falta radical de essência, sendo a subjetividade causada a partir de uma perda primordial de ser; há também um segundo sentido, o retorno da alienação, que se consolida após a separação, na qual o sujeito se fixa como objeto frente ao desejo do Outro. Lacan definirá também uma separação adicional que deveria ser produzida no final de uma análise. Esse processo ficará conhecido como a travessia do fantasma, indicando uma separação derradeira, permitindo ao sujeito se separar do segundo sentido apresentado da alienação, deparando-se com a falta como causa do desejo para além de suas fixações.

Palavras-chave: psicanálise, Lacan, alienação, separação, divisão do sujeito.


ABSTRACT

This article proposes an interpretative study of the operations of alienation and separation, as presented by Lacan in the seminar The four fundamental concepts of psychoanalysis, with special emphasis to the Lacanian assertion that separation would imply into a return of the alienation. This question led us to delineate two distinct concepts of alienation: the root of alienation, which describes how the subject arises in the symbolic field as marked by a radical lack of essence, where the subjectivity is caused by a primordial loss of the being; there is also a second meaning, the return of alienation, which is consolidated after the separation, in which the subjectivity is fixed in its position as object in front of the Other's desire. Lacan will also define an additional separation that should be produced in the end of an analysis. This process will be known as the crossing of the fantasy, indicating a final separation, allowing the subject to separate from the second presented meaning of the alienation, encountering the emptiness as cause of desire beyond its fixations.

Keywords: psychoanalysis, Lacan, alienation, separation, division of the subjectivity.


RESUMEN

Este artículo propone un estudio teórico interpretativo de las operaciones alienación y separación, como presentadas por Lacan en el seminario Los cuatro conceptos fundamentales del psicoanálisis. Daremos énfasis especial a la afirmación lacaniana de que la separación implicaría un retorno de la alienación. Esta cuestión nos llevó a deslindar dos vertientes distintas de la alienación. La raíz de la alienación, que describe como el sujeto surge en el campo simbólico marcado por una falta radical de esencia, siendo la subjetividad causada a partir de una pérdida primordial de ser. Hay también un segundo sentido, el retorno de la alienación, que se consolida después de la separación, en la cual el sujeto se fija como objeto frente al deseo del Otro. Lacan definirá también una separación adicional que debería producirse al final de un análisis. Este proceso quedará conocido como la travesía de la fantasía, indicando una separación final, permitiendo al sujeto separarse del segundo sentido presentado de la alienación, encontrándose con la falta como causa del deseo más allá de sus fijaciones.

Palabras clave: psicoanálisis, Lacan, alienación, separación, división del sujeto.


 

 

1. Introdução

Este trabalho propõe uma interpretação da alienação e da separação como operações de causação do sujeito na obra lacaniana, tal como apresentadas no Seminário 11 (Lacan, 1964/2008) e no artigo " Posição do inconsciente" (Lacan, 1964/1998). Tais formulações serão entendidas como um momento particular no interior de um projeto, que continua em construção em elaborações posteriores do autor. Alguns impasses no desenvolvimento desses conceitos apenas recebem um destino mais adequado tardiamente, nos Seminários 14 e 15 (Lacan, 1966-1967; Lacan, 1967-1968). No entanto, considera-se aqui que as formulações anteriores não têm seu valor revogado pelos encaminhamentos ulteriores, mas antes reforçam as interpretações que apresentaremos, o que por si só justifica a oportunidade deste artigo.

Um problema que será tratado de forma mais detalhada é a enigmática afirmação lacaniana de que a separação implicaria em um retorno à alienação. Isso constitui uma dificuldade expressiva para os comentadores, uma vez que ordinariamente os conceitos de alienação e separação são expostos como dois tempos lógicos, porém sem que essa articulação de retorno seja precisada. Essa questão nos levou a deslindar duas vertentes distintas da alienação, conforme será demonstrado ao longo do trabalho.

 

2. Alienação

No Seminário 11 (Lacan, 1964/2008) e em "Posição do Inconsciente" (Lacan, 1964/1998), o problema da causação é analisado pela via da constituição do sujeito pelo universo simbólico. A causação do sujeito é ali desdobrada em duas operações, a alienação e a separação. Quando se considera a alienação como uma das causas, nota-se de saída que se trata de uma operação na qual o sujeito será pensado como sujeito dividido, o que seria efeito de seu acesso ao registro simbólico. A entrada do sujeito no campo simbólico das representações inclui uma castração, uma perda. Logo, é justamente a tentativa de ligar o processo de divisão do sujeito ao ingresso na ordem simbólica que levará Lacan (1964/2008, p. 205) a circunscrever "em que consiste a raiz dessa famosa alienação".

A causação - ou seja, o ponto originário a partir do qual o sujeito se constitui - será, portanto, situada na linguagem: "o efeito de linguagem é a causa introduzida no sujeito. Por esse efeito, ele não é causa de si mesmo, mas traz em si o germe que o cinde" (Lacan, 1964/1998, p. 849). O conceito lacaniano de sujeito se distingue aqui radicalmente da noção de indivíduo, uma vez que ele é não é causa de si próprio, mas efeito do significante.

Portanto, o fato de o sujeito ser efeito do significante é a raiz que funda os processos de alienação, uma vez que a constituição pelo significante tem como resultado um sujeito dividido. "A alienação reside na divisão do sujeito que acabamos de designar em sua causa" (Lacan, 1964/1998, p. 855). Desse modo, Lacan apresenta uma definição bastante inovadora do conceito, própria ao campo psicanalítico. Passemos agora a analisar sua estrutura lógica.

A operação de alienação será lida a partir de instrumentos tomados de empréstimo por Lacan à lógica e à teoria dos conjuntos. Conforme o autor, a alienação designaria os efeitos provenientes da reunião entre dois conjuntos, o campo do ser e o campo do sentido, no momento de constituição do sujeito ao ingressar no universo simbólico. Tal como apresentado no grafo que analisaremos a seguir:

 

 

Fig. 1: O grafo da alienação
Fonte: Lacan, J. (1964/2008). O seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise (2ª ed.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, p. 207. (Seminário original de 1964).

Em certas operações matemáticas de reunião entre dois conjuntos, utiliza-se o conectivo denominado de vel, que é expresso pelo termo gramatical ou - temos então, o ser ou o sentido. Mas Lacan indica que na operação de alienação é posto em uso um tipo singular de vel, um vel que promove "uma escolha forçada e forçosamente perdedora" (Lacan, 1967-1968). Assim, no momento de sua constituição, o sujeito é colocado diante da escolha pelo ser ou pelo sentido; mas essa escolha é forçada em direção ao sentido, gerando uma perda no campo do ser. A raiz da alienação residiria justamente nessa correlação íntima entre a eleição do sentido e a perda do ser. Assim, curiosamente, Lacan lembra que uma perda de ser é necessária para o surgimento do sujeito no universo simbólico, o que o leva a dizer que "o sujeito não é causa de si, que ele é consequência da perda" (Lacan, 1967-1968), surgindo, desde o princípio, como sujeito dividido.

Compreendemos que o sujeito, ao surgir no universo simbólico, deve aprender a se reconhecer num universo de valores e normas culturais que lhe são estrangeiros e o determinam (Outro). Trata-se aqui de uma determinação não recíproca graças à qual o sujeito se submete a uma estrutura sociolinguística que o define, porém o contrário não ocorre, ou seja, o sujeito não domina nem pode modificar os valores culturais aos quais é convocado a aderir. É nessa direção que vai o famoso comentário feito por J. A. Miller (Lacan, 1964/2008, p. 210) no interior do Seminário 11: "[...] a alienação de um sujeito que recebeu a definição de ser nascido na, constituído por, e ordenado a um campo que lhe é exterior". Assim, a entrada no universo simbólico envolve uma profunda alteração na natureza do ser: "Para ser pars [parte], ele realmente sacrificaria grande parte de seus interesses" (Lacan, 1964/2008, p. 857). O sujeito então se vê condenado a emergir no campo do sentido.

Ocorre que esse ganho de sentido não devolve ao sujeito a consistência de ser. É aqui que opera a outra face da alienação: a perda de ser possui um valor tão operatório quanto o acréscimo de sentido. Isso quer dizer que o ser fará falta, ou seja, seremos aqueles a quem falta o ser. A falta tem valor fundacional, ela opera produzindo consequências.

Ao ingressarmos no simbólico, ocorre um distanciamento dos referentes naturais de localização. Essa perda do estatuto de puro organismo não será seguida por um acréscimo de identidade substancial, pois a ordem simbólica não oferece ao sujeito humano nenhuma garantia quanto ao "quem és". Nesse sentido, a definição do sujeito como falta-a-ser é radicalmente oposta a qualquer definição essencialista ou idealista. A partir dessa perda de ser, o sujeito deslizará num processo infinito de produção de significações, afastando-se assim de uma verdade definitiva sobre si. Assim, mais do que um dado concreto, sabido, o sujeito é para Lacan fundamentalmente uma questão, um "quem sou?" nunca definitivamente respondido.

Em síntese, a alienação não implica apenas que o sujeito tenha sua existência definida pelo Outro simbólico, ela também implica que tais produções de sentido (S1-S2) nunca recobrirão inteiramente toda a dimensão subjetiva. A causa do sujeito enquanto dividido seria uma divisão entre o ser e o sentido S1-S2, indicando que se, por um lado, o sujeito aparece na inscrição significante, por outro desaparece em sua perda de ser e falta constitutiva. Essa divisão é precisamente o que Lacan descreve com os termos afânise e petrificação; sendo que a afânise faz referência à perda de ser, e a petrificação refere-se ao S1-S2, ou seja, ao campo das representações do sujeito e da produção de sentido.

Comecemos pelo processo de petrificação, o qual seria induzido pelo casal de significantes (S1-S2). A partir das noções linguísticas, temos que um significante por si só não significa nada, sendo pura abertura a significações possíveis, recebendo seu sentido sempre de forma retroativa a partir de outros significantes. Assim, se o sujeito surge marcado por um S1, na sequência ele faz um "apelo, feito no Outro, ao segundo significante" (Lacan, 1964/1998, p. 849), ou seja, ele demanda ao Outro significantes que lhe deem um sentido, um sentido que responda à sua perda de ser. É só a partir da ligação ao S2 que o S1 - primeiramente pura abertura de significação - ganharia um sentido. Logo, é a inclusão de um segundo significante que causa a petrificação do sujeito sob uma identificação primordial. Esse momento de produção de sentido indicaria uma alienação, na qual o sujeito deixa de ser um mero vazio para se tornar predicado, sujeito identificado.

Essa identificação primordial causada pela inscrição do sujeito sob o primeiro casal significante (S1-S2) é analisada por Lacan como radical, já que se trata de um momento primário de contato do sujeito com o universo simbólico. Essa primeira identificação produz uma petrificação do sujeito, ou seja, uma radical alienação do sujeito à marca que recebe do Outro. Esse deverá se libertar dessa primeira marca paralisante e assim acessar o universo simbólico em sua potência dialética.

Entretanto, há uma outra face do sujeito que fica em fading, inconsciente. Tal processo, denominado afânise, implica que há algo que permanecerá desconhecido, no entanto que continua a atuar, sem que se saiba. Essa parte riscada de nós mesmos, que desapareceu, nem por isso cessou de existir. Ela subsiste na própria relação do sujeito com a verdade subjetiva, que lhe será barrada, alienada, tornada inconsciente. Por isso, Lacan (1964/2008, p. 216) afirma que: "não há sujeito sem, em alguma parte, afânise do sujeito, e é nessa alienação, nessa divisão fundamental, que se institui a dialética do sujeito". Assim, quando o sujeito se liga ao campo das identificações e das representações, acaba por experimentar uma divisão a partir da qual uma parte de sua verdade se torna barrada, inconsciente. O sujeito conhece a fundamentação simbólica que o constitui apenas parcialmente, já que outra parte significativa cai no inconsciente - a afânise do sujeito - parte através da qual a verdade se mostra de forma evanescente. Logo, "só há surgimento do sujeito no nível do sentido por sua afânise no Outro lugar, que é o do inconsciente" (Lacan, 1964/2008, p. 216). A afânise quer dizer que o sentido só subsiste decepado da verdade inconsciente.

Concluímos então que petrificação e afânise apontam para a divisão do sujeito em sua relação com a verdade, a qual implica uma alienação - no sentido de um desconhecimento - da verdade simbólica que o determina. Nesse sentido, importa destacar que a verdade do sujeito não se reduz às suas identificações e representações (S1-S2), permanecendo sempre êxtima a estas. Lá onde o indivíduo se crê ele mesmo e se vê sempre da mesma forma, ali Lacan aponta uma realidade de engodo. É no inconsciente, que por vezes parece tão distante da subjetivação, que reside a verdade do sujeito para além da farsa de suas identificações, a verdade de um sujeito dividido por essência.

Se até aqui nosso exame do conceito de alienação se restringiu à sua articulação com o significante, importa também notar de que forma tal noção se enlaça com a de gozo. É possível demonstrar uma equivalência entre o gozo e o que aparece nomeado nos esquemas lacanianos como o ser. Há uma relação essencial entre a perda do ser com a própria constituição da pulsão - dessa perda original de ser lança-se o movimento pulsional, que visa em seu limite a recuperação do objeto perdido; recuperação marcada como impossível pela Psicanálise, mas ainda sim almejada pelo sujeito. "É em revolver esses objetos para neles resgatar, para restaurar em si sua perda original, que se empenha a atividade que nele denominamos de pulsão (Trieb)" (Lacan, 1964/1998, p. 863). Uma recuperação que visa então um gozo absoluto, inalcançável; razão pela qual Lacan define que a pulsão é essencialmente pulsão de morte.

Note-se que esse ser, cuja perda é imposta pelo processo de alienação, poderia aqui ser assimilado a um estado anterior, no qual a pulsão encontrava completa satisfação em um objeto. Ocorre que esse estado anterior jamais existiu, representando um momento mítico no qual somos levados a crer erroneamente. A satisfação absoluta, na qual toda falta se encontraria tamponada, não passa de uma experiência jamais usufruída por ninguém. A perda aqui não incide sobre uma satisfação absoluta que existia num tempo anterior, ela antes inaugura o campo das satisfações possíveis na atualidade.

Assim, se o sujeito aparece apenas mediante uma perda de ser, é no campo do pulsional que ele pode visar uma restituição do que foi perdido, uma sensação de preenchimento do buraco aberto pelo simbólico. Logo, há uma clara associação na teoria lacaniana entre o campo do ser - enquanto perdido, barrado - e a dimensão pulsional, cujo movimento visaria um tamponamento dessa falta radical e insuperável marcada na constituição da subjetividade.

Destarte, quando indicamos que a simbolização primordial produz uma divisão subjetiva, importa notar que esta também se expressa frente ao campo pulsional, o qual, ao aceder ao simbólico, é dividido entre uma pulsão representada, simbolizada - a pulsão de vida, na qual o campo das representações se estrutura conforme o princípio do prazer - e uma pulsão que tomba no real, não se limitando ao princípio do prazer e se expressando no caráter excessivo da compulsão à repetição - o gozo. Por isso, Lacan descreve as pulsões como pulsões parciais, ou seja, apenas parcialmente representáveis. Portanto, encontramos a noção de alienação também como divisão do campo pulsional, tal como descreve Lacan (1964/2008, p. 235): "é o reconhecimento da pulsão que permite construir, com mais certeza, o funcionamento dito por mim de divisão do sujeito, ou de alienação".

No momento do acesso ao simbólico, ocorre em um só momento uma divisão subjetiva entre um corpo estruturado pelo narcisismo e um resto do campo pulsional que não é inscrito no simbólico - "Vocês constatam, sobretudo, que o que estrutura o nível do prazer já dá o início de uma articulação possível da alienação [...] O Lust-Ich se distingue, e no mesmo instante o Unlust, fundamento do não-eu, tomba" (Lacan, 1964/2008, p. 234). No mesmo momento em que ocorre a inscrição de um corpo enquanto representado, demarca-se também um resto que resiste à apreensão simbólica, delimitando a divisão do sujeito frente ao campo pulsional, que só é parcialmente possível de ser representado - "somos o produto da intersecção de um corpo com a palavra, e [...] disto decorre uma divisão estrutural" (Rodrigues, 2017, p. 9).

Logo, a operação de alienação em referência ao campo pulsional indica a divisão do sujeito frente ao processo de simbolização fundado na exclusão do real pulsional. Parte do pulsional é inscrito e se submete às representações e ao narcisismo, enquanto outra parte tomba no real. Esse processo marca o sujeito com uma falta, que o lança na busca de satisfação pulsional, visando uma recuperação dessa perda.

 

3. Separação

Analisaremos agora a segunda operação, a separação, através da qual conclui-se a causação do sujeito desejante. Entendemos que a separação se refere ao percurso que vai do sujeito como falta-a-ser para a articulação do desejo como desejo do Outro. A separação se estabelece através dos efeitos vividos pelo sujeito em seu contato com o desejo do Outro em sua opacidade fundamental.

Lacan vai definir a separação como o que se refere à intersecção entre os dois conjuntos reunidos na operação de alienação. Novamente, verifica-se aqui um caso especial de intersecção: não se trata do que pertence a ambos os conjuntos, mas do que falta a ambos. O que eles têm em comum é a falta, uma falta que os põe em relação. Nesse ponto de falta, Lacan localiza a causa do desejo, o objeto a.

A separação se institui na medida em que o discurso do Outro apresenta pontos de opacidade, graças aos quais o sujeito poderá situar interrogações sobre o desejo do Outro. Essa é a via pela qual é possível a confrontação do sujeito com o enigma do discurso do Outro, por onde surge a questão referente ao desejo:

Uma falta é, pelo sujeito, encontrada no Outro, na intimação mesma que lhe faz o Outro por seu discurso. Nos intervalos do discurso do Outro, surge na experiência da criança, o seguinte, que é radicalmente destacável - ele me diz isso, mas o que é que ele quer? Nesse intervalo cortando os significantes, que faz parte da estrutura mesma do significante, está a morada do que, em outros registros de meu desenvolvimento, chamei de metonímia. É de lá que se inclina, é lá que se desliza, é lá que foge como o furão, o que chamamos desejo. O desejo do Outro é apreendido pelo sujeito naquilo que não cola, nas faltas do discurso do Outro, e todos os por-quês? da criança testemunham menos de uma avidez da razão das coisas do que constituem uma colocação em prova do adulto, um por que será que você me diz isso? sempre re-suscitado de seu fundo, que é o enigma do desejo do adulto (Lacan, 1964/2008, p. 209).

Assim, o enigma do desejo do Outro causa, provoca o desejo do sujeito, que se interroga sobre o desejo (Che Vuoi?), abrindo uma falha no campo do sentido. Logo, a confrontação com uma falta no Outro, pela qual se experimenta que há um desejo do Outro para além do sujeito, é essencial para que este se descubra enquanto desejante. Na ausência do Outro ou nas próprias lacunas do seu discurso, o sujeito se interroga sobre o que o Outro deseja, ponto de abertura que causa o seu próprio desejo. Por isso, Lacan (1964/2008, p. 209) aponta que o desejo "surge do recobrimento de duas faltas". Ou seja, o desejo só se desenvolve como tal ao desejar outro desejo e no contato com a falta através do desejo do Outro.

Lembremos que, em outro momento de seu ensino, Lacan ( 1956-1957/1995) definia a operação de separação através do conceito de função ou metáfora paterna - "a metáfora do pai como princípio de separação" (Lacan, 1998, p. 863), em que a função do Pai indicava a existência de um desejo materno para além do infans, possibilitando a instauração de uma falta no momento de ausência do Outro, que funciona como causa para o desejo do infans. Assim, a função paterna seria responsável por romper a relação dual entre o infans e o Outro materno, possibilitando o desenvolvimento do desejo na falta, sendo o pai o símbolo que representa um outro desejo materno para além do bebê. Esse momento marcaria a inclusão do sujeito no registro simbólico com a instauração do Nome-do-Pai, uma Lei que barra o gozo da relação dual entre mãe e bebê, através da qual o sujeito pode acessar a dialética do desejo.

Já no âmbito do Seminário 11, Lacan (1964/2008) marcará a separação como uma função essencial a ser desempenhada pelo próprio sujeito, a de se interessar pelos intervalos do discurso do Outro, ou seja, de se interessar pelo enigma do desejo que transparece na polissemia dos significantes, na falha do que surge como sentido, por onde se desenvolve o desejo: " É no que seu desejo está para além ou para aquém no que ela diz, do que ele intima do que ela faz surgir como sentido, é no que seu desejo é desconhecido, é nesse ponto de falta que se constitui o desejo do sujeito" (Lacan, 1964/2008, p. 214).

Assim, o "Che Vuoi?" - a questão sobre o desejo do Outro - age como causa do desejo. Ao entrar em contato com esse ponto de falha do sentido onde transcorre o desejo, o sujeito se separa da prisão ao sentido e de uma alienação radical à identificação primordial, à marca que recebia em sua relação alienada com o Outro - a qual, recordemos, está referida à cópula entre o casal de significantes. "É na medida em que o sujeito vem representar sua parte e jogar sua partida na separação que o significante binário, o Vorstellungsreprasentanz é unterdruckt, cai por baixo" (Lacan, 1964/2008, p. 214).

Com a queda dessa identificação primordial, institui-se uma hiância na relação do sujeito com o campo do Outro a partir da qual o sujeito desenvolve um contato dialético com o universo simbólico. É a partir da instauração dessa queda que Lacan pensará por que o sujeito é não-todo alienado ao campo de suas identificações simbólicas e separado de uma nociva relação dual com o Outro materno, desenvolvendo-se enquanto sujeito desejante a partir da inscrição desse ponto de falta.

Com a separação, instaura-se uma hiância na relação do sujeito em seu contato com o desejo do Outro e, ao mesmo tempo, em seu contato com as representações simbólicas, separando-se de uma alienação radical ao sentido. Por isso, Lacan também indica que temos não apenas uma divisão do sujeito, mas também uma divisão do campo do Outro, do simbólico, que é não-todo e por isso mesmo, dialético, não reduzindo o sujeito à petrificação.

 

4. O movimento final da operação separação - o retorno da alienação

Apresentamos inicialmente a operação de separação como um movimento no qual a falta do Outro atua como causa da falta a partir da qual o sujeito se constitui como desejante. Porém há ainda um segundo movimento, usualmente pouco explorado pelos comentadores, que constitui igualmente a operação de separação. Embora tal movimento frequentemente passe despercebido, sua compreensão é essencial para refinarmos o entendimento do próprio conceito de alienação. Nesse movimento final da separação, temos a determinação do desejo do sujeito a partir do prisma fornecido pelo desejo do Outro. Nesse sentido, um trecho da explicação lacaniana sobre a operação de separação merece um destaque especial.

O que ele coloca aí é sua própria falta, sob a forma da falta que produziria no Outro por seu próprio desaparecimento. Desaparecimento que, se assim podemos dizer, ele tem nas mãos, da parte de si mesmo que lhe cabe por sua alienação primária. Mas, o que ele assim preenche não é a falha que ele encontra no Outro, e sim, antes, a da perda constitutiva de uma de suas partes, e pela qual ele se acha constituído em duas partes. Nisso reside a torção através da qual a separação representa o retorno da alienação (Lacan, 1964/1998, p. 858).

Gostaríamos de destacar aqui, inicialmente, os termos "alienação primária" e, em seguida, "o retorno da alienação", a qual se efetivaria através de uma torção. Recorde-se que, quando tematizamos a raiz da alienação primária, indicamos que a constituição do sujeito se realizava apenas mediante uma perda de ser da qual resultava um sujeito dividido. Só que temos agora o aparecimento de um segundo sentido do conceito de alienação, sob a forma de um retorno da alienação na operação de separação. Como entender esse apontamento?

Conforme discutimos, para se constituir enquanto desejante o sujeito deverá renunciar ao gozo do ser. Um dos sentidos que tal gozo recebeu no texto lacaniano é o de uma satisfação incestuosa, que deveria ser rompida para o desenvolvimento do sujeito enquanto desejante. Porém, ainda que o sujeito venha a renunciar a tal gozo (graças à separação efetuada com o auxílio da função paterna), sua posição de objeto frente ao desejo do Outro não deixará de determiná-lo intensamente, pois ele seguirá perseguindo aquela satisfação. A diferença é que agora o sujeito o fará no interior da dialética do desejo e no simbólico; ainda assim sem jamais renunciar totalmente àquela ambição de se juntar ao ser. Tal como aponta Seganfredo (2007, p. 70-71): "A ação do Nome-do-Pai, como significante que interdita o gozo, impede que o sujeito se ofereça como objeto do Outro, diretamente, mas ele não o deixa de fazer por intermédio do significante".

Portanto, na busca de se fazer representar pela via do significante, característica da alienação, o sujeito entra na tentativa de resgate não só de uma representação, mas sobretudo de um gozo perdido. Isso representa um esforço de reencontrar uma estabilidade, a qual fica abalada uma vez que perdemos o ser.

Há dois modos de tentar encontrar uma estabilidade. O primeiro é pela via da identificação, graças à qual as flutuações próprias ao significante podem encontrar uma certa âncora. Porém lembremos que a operação de separação pode sempre promover a perda da estabilidade, na medida em que o sujeito puder encontrar a ausência de resposta sobre o que o Outro quer dele. Resta então uma nova forma de ancoragem e estabilização, que protege o sujeito da indeterminação da cadeia: tal estabilidade será fornecida pelo fantasma.

Uma vez que o desejo do Outro surge primariamente para o sujeito como uma causa enigmática (Che Vuoi?), o sujeito buscará constituir respostas a esse enigma tentando se localizar como seu objeto desejado. A produção dessas respostas é exatamente o que Lacan entende como o conceito de fantasma nesse momento de seu ensino.

Lacan aponta que o que o sujeito coloca aí, na falta do Outro, é a sua própria falta, ou seja, o sujeito tenta se situar frente ao desejo do Outro. Mas - eis o ponto chave - o que ele assim preenche não é a falha que ele encontra no Outro, mas a da perda constitutiva de si, ou seja, o sujeito produz uma determinação sobre sua falta-a-ser frente ao que percebe como desejável pelo Outro, definindo o campo sobre o qual construirá suas identificações - temos então o retorno da alienação por uma torção. Logo, o fantasma se constrói frente à interrogação sobre o desejo do Outro, mas acaba por se constituir em uma resposta mais fundamental à própria identidade subjetiva, tal como aponta Seganfredo (2007, p. 30): "de uma pergunta que o sujeito dirige ao Outro para tentar saber a respeito de seu desejo: 'que queres?'. Mas o sujeito se faz incluir nessa pergunta, o que nos faz lê-la como um 'que queres de mim?'". Portanto, o sujeito se inclui na própria interrogação que faz frente ao desejo do Outro, tomando a interpretação desse desejo como referência para se constituir.

Assim, frente ao desejo do Outro, o sujeito tenta se colocar como seu objeto desejado, produzindo respostas fantasmáticas sobre o que o Outro desejaria. Nesse movimento, o sujeito não encontra uma resposta para o desejo do Outro; todavia, no que Lacan chama de uma torção, numa reflexão, o sujeito retorna à determinação de seu próprio desejo, constituindo-se enquanto sujeito frente ao que percebe como desejado pelo Outro. Por isso, Lacan afirma que o desejo neurótico encontra-se preso à demanda do Outro, substituindo o objeto a no matema do fantasma ($ ◊a), pelo D da demanda do Outro - $ ◊D. Assim, o sujeito neurótico vive alienado a satisfazer o Outro, o que aponta uma alienação de seu desejo - "O desejo do neurótico gira em torno da demanda do Outro" (Lacan, 1966-1967, p. 198).

Lembremos que frisávamos que o desejo do Outro aparecia em uma opacidade fundamental para o sujeito, restando sempre desconhecido enquanto tal. Logo, devemos notar que a significação produzida sobre o desejo do Outro é sempre um fantasma do sujeito, respostas a partir das quais o sujeito se determina ao se localizar frente ao que percebe como desejável pelo Outro. Por isso Lacan afirma que a determinação do desejo do sujeito efetuada pelo fantasma constitui-se sobre um engano - o engano do desejo. Se o desejo enquanto tal é falta, o fantasma constrói uma determinação do desejo, uma reificação que se dá sobre esse engano, indicando "o que desejar" a partir de uma alienação fundamental do desejo - a determinação do desejo como desejo do Outro. O fantasma é então uma encenação do desejo do Outro sobre o qual o sujeito se constitui.

Assim, frente ao enigma genuinamente angustiante, do Che Vuoi?, o sujeito materializa certas respostas para poder se inserir como objeto desejado pelo Outro. Nesse sentido, Silva (2014) afirma que o fantasma é como uma retórica, fazendo da pergunta uma resposta. Essa produção de significação constitui uma defesa do sujeito frente à angústia da falta e do enigma do desejo do Outro, uma defesa contra a castração, dando uma forma à falta. Tal como descreve Silva (2014, p. 59): "Esta saída, da parte do sujeito, é o modo como ele se defende da castração: gerando um conhecimento - nos moldes de uma ficção - a respeito do Outro e de sua posição com relação ao que falta a ele".

Desse modo, o fantasma tem como função mascarar a falta do Outro constituindo uma ficção sobre a relação do sujeito com o Outro. Sobre ela, o sujeito se constrói escamoteando o vazio de sua existência como falta-a-ser, ao colocar-se como objeto do Outro. Logo, Lacan remete o Outro, o eixo da dialética desejante do sujeito, à ficção.

Portanto, compreendemos que o fantasma conjuga a separação com o retorno da alienação. Já que, por um lado, a passagem da separação representava a possibilidade de o sujeito romper com a relação dual com o Outro para se constituir enquanto sujeito desejante, criando relações objetais mediadas pelo fantasma. Nesse sentido, pode-se entender por que Lacan (1964/2008) localiza a emergência do fantasma justamente na separação. Mas, por outro lado, o fantasma também representa um retorno da alienação, já que amplamente referenciando o desejo ao desejo do Outro, na determinação do desejo a partir do prisma fornecido pelo Outro.

É o fantasma que representa então o retorno da alienação e nessa via Lacan pontua que a separação se conclui com a fixação do sujeito no fantasma - "projetando a topologia do sujeito no instante da fantasia" (Lacan, 1964/1998, p. 850). Entendemos que o fantasma promove uma fixação do sujeito da falta-a-ser simbólica ao enlaçá-lo na relação objetal - "à espécie de fixidez que Freud atribui ao voto inconsciente" (Lacan, 1964/1998, p. 849). Logo, concluímos que o fechamento da falta-a-ser, ou seja, a reificação do sujeito, se refere à inclusão do sujeito no fantasma, na conjunção de um sujeito barrado (falta-a-ser ligada ao simbólico) com o objeto a.

Assim, tanto o fantasma quanto as identificações do sujeito são pensadas por Lacan como alienações, fornecendo o segundo sentido que gostaríamos de destacar sobre o conceito de alienação - a alienação enquanto uma fixação do sujeito que é construída a partir das referências do desejo do Outro encenadas no fantasma. Nesse sentido, percebemos que, durante todo o percurso de uma teoria da alienação desenvolvida por Lacan, encontramos definições de como o sujeito produz uma identidade fixa a partir de sua posição como objeto frente ao desejo do Outro. Nessa via, temos que:

- nos dois primeiros seminários (Lacan, 1953-1954/1986; Lacan, 1954-1955/1985), Lacan conceituava a identificação imaginária como produzida a partir de uma relação especular com o outro - i(a), construindo a imagem de si a partir da imagem do outro; logo, sob uma alienação.

- No seminário 11 (Lacan, 1964/2008), o autor abordará a produção das identificações simbólicas - I(A) - que constrói a sustentação simbólica da imagem narcísica. "O ponto do ideal do eu é de onde o sujeito se verá, como se diz, como visto pelo Outro" (Lacan, 1964/2008, p. 259). Assim, conceitua a identificação como a produção da imagem de si que é dependente da forma como o sujeito se percebe como reconhecido pelo Outro, o que se expressa em significantes ideais com os quais o sujeito se identifica.

- E por fim, nos seminários 14 e 15 (Lacan, 1966-1967; Lacan, 1967-1968), Lacan pensará a fixação do sujeito no fantasma como substrato à produção das identificações, ligada a um resto de gozo da relação primitiva que o sujeito mantinha como objeto de gozo do Outro, expressando-se na compulsão à repetição, um ponto de gozo que indica uma fixação no real.

Dessa maneira, a fixação do sujeito no que Lacan (1966-1967) chama de um falso-self é amplamente associada à posição do sujeito como objeto (seja como i(a), I(A), ou $ ◊a) frente ao desejo do Outro, logo, sustentada sobre uma alienação - "o objeto é o único falso ser que temos" (Rabinovich, 2000, p.78). Encontramos, então, uma clara ligação entre a construção de uma identidade fixa do sujeito e uma posição de objeto ocupada frente ao desejo do Outro. Se o sujeito é falta, a forma como o sujeito se percebe como um "ser" sempre se constrói, no pensamento lacaniano, sob alienações. Assim, não há uma essência verdadeira do sujeito pronta para ser desvelada, só há sua imisção com a alteridade. Portanto, todo self é um falso-self, já que construído sob a forma de alienações (Rabinovich, 2000). Por isso Lacan demarca como única essência verdadeira do sujeito a falta.

 

5. Conclusão

Apontamos então duas formas de pensar a alienação do sujeito. A raiz da alienação como a divisão subjetiva, que o constitui enquanto falta-a-ser; e a fixação do sujeito construída a partir de sua posição como objeto frente ao desejo do Outro, que podemos definir como alienação secundária. Essas duas formas de pensar a alienação são logicamente interligadas no pensamento lacaniano, pois Lacan primeiro situava como o sujeito surgia no campo do simbólico marcado por uma falta radical de essência, sendo a subjetividade causada a partir de uma perda primordial - a raiz da alienação. Mas, frente a essa falta, o sujeito era logo empurrado para processos de reificação através dos quais ele passaria a se reconhecer enquanto sujeito. Desse modo, o sujeito se constituiria mediante processos reflexivos com o Outro, visando identificar-se à posição de seu objeto desejado, fixando-se. Logo, frente à castração, o sujeito vivencia um empuxo em direção à reificação, como resposta para a falta, constituindo-se em correspondência ao desejo do Outro. Por isso, é possível afirmar que: "a castração e a alienação se implicam reciprocamente, pois é a primeira que impulsiona o sujeito a ir de encontro ao Outro" (Nascimento, 2010, p. 8).

Indicamos também como a separação não era uma operação definitiva, pois que ao final a alienação se replicava na determinação do desejo como desejo do Outro. Era exatamente por isso que a operação de separação se tornava também um dispositivo clínico, indicando que uma separação adicional deveria ser produzida no interior da análise para que o sujeito pudesse atravessar o campo das identificações e do fantasma, separando-se. Assim, a separação como operação clínica visava o que Lacan (1964/2008) denomina de travessia das identificações ou travessia do fantasma, o que podemos ler como a travessia das alienações, no segundo sentido do conceito que apresentamos. Assim, o tratamento visaria desvelar a verdade do sujeito enquanto dividido e faltante, a verdade subjacente à alienação: só encontramos uma separação derradeira com a proposta de travessia do fantasma.

Essas leituras se comprovam com várias indicações que podemos encontrar na noção de alienação que Lacan desenvolve nos seminários 14 e 15 (Lacan, 1966-1967; Lacan, 1967-1968) - no esquema do quadrângulo - que entendemos como uma transformação das operações de alienação e separação, resolvendo alguns de seus impasses. Nesse sentido, temos que:

- Desaparece a operação de separação, sendo totalmente incluída na operação de alienação, já que, como indicamos, a separação se concluía em um retorno da alienação. Assim, a operação de alienação passa a ser descrita como o movimento que produz primeiramente o sujeito como falta pelo processo de uma perda constitutiva (a raiz da alienação) e que se consolida na produção das fixações do sujeito, que Lacan define como o polo descrito como "não penso", o campo do falso-self enquanto reificações frente ao desejo do Outro (o que analisávamos como o retorno da alienação).

- A escolha forçada deixa de ser pelo campo do sentido e se torna escolha forçada por sua fixação, "não penso". Pois, como indicamos, da falta-a-ser o sujeito vivencia um empuxo à reificação, já que manter-se enquanto falta é propriamente impossível para Lacan. Nessa via, o sujeito toma a significação sobre o desejo do Outro (construído no fantasma) como referencial para se constituir.

- E, por fim, Lacan coloca claramente a conjugação do fantasma enquanto uma alienação do sujeito, ao localizá-la no campo do "não penso" (que é definido por Lacan como a escolha forçada da alienação como fixações), provando a veracidade do raciocínio que efetuamos de que o fantasma na separação indicava o retorno da alienação.

 

 

Referências

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Artigo recebido em: 22/12/2017
Aprovado para publicação em: 14/05/2019

Endereço para correspondência
Pedro Costa Zanola
E-mail: pedro_zanola@hotmail.com
Rosane Zétola Lustoza
E-mail: rosanelustoza@yahoo.com.br

 

 

*Psicólogo. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná.
**Doutora em Teoria Psicanalítica pela UFRJ. Professora do PPG em Psicologia da UFPR.

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