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Tempo psicanalitico

versión impresa ISSN 0101-4838versión On-line ISSN 2316-6576

Tempo psicanal. vol.54 no.2 Rio de Janeiro jul./dic. 2022

 

ARTIGOS

 

Metateatro (?) e genocídio na trilogia do confinamento, de Aldri Anunciação

 

Metateatro (?) and genocide in the trilogia do confinamento, by Aldri Anunciação

 

Metateatro (?) y genocidio en la trilogia do confinamento, de Aldri Anunciação

 

 

Luiz Henrique Costa de Santana*

Universidade Federal do Agreste Pernambucano - UFAPE - Brasil
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC-Minas - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A incursão do dramaturgo Aldri Anunciação pela literatura dramática na Trilogia do confinamento é louvável. A primeira peça "Namíbia, não!" dá ênfase no lugar de pertencimento do indivíduo, a trama se desenvolve em torno de uma medida provisória que propõe levar todos os de "melanina acentuada" de volta para algum país do Continente Africano. A segunda peça "Embarque Imediato" se desenvolve a partir da perca da identidade e do passaporte de um doutorando negro, numa "sala clean" que fica no próprio aeroporto, esse jovem é combatido incessantemente por ideias de construções identitárias e é levado a refletir acerca da sua identidade. A terceira peça "Campo de batalha: A fantástica história de uma guerra bem sucedida" retrata por um viés mais brando e mais humanitário, que a guerra não tem cor e que o fim é o mesmo para todos os indivíduos que ousam existir. Assim por meio do método de revisão bibliográfica emerge este trabalho, tendo como aporte teórico: Nilson P. de Carvalho (2017), que pesquisa acerca da metaliteratura, e o teórico Abdias de Nascimento (2016), que pesquisa sobre o genocídio do negro brasileiro. O objetivo deste trabalho é compreender como esses conceitos podem ser percebidos nessa obra dramática. Portanto, é possível notar que em todas essas peças há a despersonalização e a descaracterização do negro, unindo os conceitos de metaliteratura e genocídio, pois a narrativa que perpassa as três peças reverbera sobre os rastros do colonialismo no negro.

Palavras-chave: Dramaturgia Brasileira, Metaliteratura, Genocídio na Trilogia do confinamento, Aldri Anunciação.


ABSTRACT

Playwright Aldri Anunciação's foray into dramatic literature in the Trilogy of Confinement is commendable. The first play "Namibia, no!" emphasizes the individual's place of belonging, the plot develops around a provisional measure that proposes to take all those with "accentuated melanin" back to some country in the African Continent. The second play "Immediate Boarding" is based on the loss of identity and passport of a black doctoral student, in a "clean room" at the airport. The third piece "Battlefield: The Fantastic Story of a Successful War" portrays, in a milder and more humanitarian way, that war has no color and that the end is the same for all individuals who dare to exist. Thus, through the literature review method, this work emerges, having as theoretical contribution: Nilson P. de Carvalho (2017) who researches about metaliterature and the theorist Abdias de Nascimento (2016) who researches about the genocide of the Brazilian black. The aim of this work is to understand how these concepts can be perceived in this dramatic work. Therefore, it is possible to note that in all these plays the depersonalization and mischaracterization of the black man is perceptible, uniting the concepts of metaliterature and genocide, because the narrative that runs through the three plays reverberates about the traces of colonialism in the black man.

Keywords: Brazilian dramaturgy, Metaliterature, Genocide in Trilogy of confinement, Aldri Anunciação.


RESUMEN

La incursión del dramaturgo Aldri Anunciação a través de la literatura dramática en la Trilogía del encierro es encomiable. La primera obra "¡Namibia, no!" hace hincapié en el lugar de pertenencia del individuo, la trama se desarrolla en torno a una medida provisional que propone llevar a todos aquellos con "melanina acentuada" a algún país del continente africano. La segunda pieza "Immediate Departure" se basa en la pérdida de identidad y del pasaporte de un estudiante de doctorado negro, en una "sala blanca" del propio aeropuerto, este joven es combatido incesantemente por las ideas de las construcciones identitarias y es llevado a reflexionar sobre su identidad. La tercera pieza "Campo de batalla: la fantástica historia de una guerra exitosa" retrata, a través de un enfoque más suave y humanitario, que la guerra no tiene color y que el final es el mismo para todos los individuos que se atreven a existir. Así a través del método de revisión bibliográfica surge este trabajo, teniendo como aporte teórico: Nilson P. de Carvalho (2017) que investiga sobre la metaliteratura y el teórico Abdias de Nascimento (2016) que investiga sobre el genocidio del negro brasileño. El objetivo de este trabajo es comprender cómo se pueden percibir estos conceptos en esta obra dramática. Por lo tanto, es posible notar que en todas estas obras es perceptible la despersonalización y la mala caracterización del hombre negro, uniendo los conceptos de metaliteratura y genocidio, porque la narrativa que recorre las tres obras reverbera sobre las huellas del colonialismo en el hombre negro.

Palabras clave: Dramaturgia brasileña, Metaliteratura, Genocidio en Trilogía del encierro, Aldri Anunciação.


 

 

Introdução

As distopias consagradas pelo cânone: 1984, do George Orwell; Admirável mundo novo, do Adoul Huxley; Laranja mecânica, do Anthony Burgess; e Nós, do Iegvi Zamiátin, sempre vislumbraram um futuro tenebroso, asqueroso, febril, desumano, vil, totalitário e sem 'os de melanina acentuada'! A ausência de negros nessas narrativas persiste. O futuro tem cor na literatura, e a cor é branca.

Tendo em vista que falta melanina no cânone da literatura mundial e que essa falta engloba tanto autores quanto personagens, é perceptível que há uma tentativa de inserção desses autores nos tempos modernos com o crescimento da luta e do movimento negro que reivindicam essa representatividade. Dito isso, é possível notar que existem várias obras literárias de autoras e autores negros que vêm estando em evidência, e a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie é uma dessas personas, isso no campo da ficção literária, que tem tomado destaque mundial, furando incisivamente a bolha branca e patriarcal da literatura.

Contemplando esse panorama todo, é possível chegar no nível do nosso país e perceber que faltam negros na literatura mundial, tanto como autores e/ou personagens, que em grande parte predomina o romance. Assim, qual o estado da literatura dramática nessa sociedade de silêncios? Diante dessa problemática, é possível localizar a obra teatral Trilogia do confinamento, que emerge de uma situação de epistemicídio acadêmico e silenciamento das literaturas contemporâneas, tidas por alguns como baixa literatura.

Nesse cenário conturbado surge a obra de um dramaturgo negro, nordestino e baiano, Aldri Anunciação, com o livro Trilogia do confinamento (2020). Este livro contém três peças teatrais: " Namíbia, não!", "Embarque imediato" e "Campo de batalha: A fantástica história de uma guerra bem-sucedida"; tais peças inserem o negro de maneira direta e indireta em distopias que tomam por base a realidade objetiva e factual do mundo, subvertendo e acentuando os estigmas da sociedade que envolvem os corpos negros - genocídio negro, racismo estrutural, reflexos da necropolítica estatal.

A metodologia de pesquisa que orientou o trabalho foi de revisão bibliográfica, tomando como base uma análise metaliterária das obras. Diante disso, foram considerados os seguintes teóricos: Terry Eagleton (1999), Jonathan Culler (1999), Wellek e Warren (1979) e Gustavo Bernado (1999), que teorizam acerca da literatura e da sua função. Abdias de Nascimento (1966) foi utilizado com a finalidade de entender o teatro negro e o conceito de genocídio.

Tais aportes teóricos foram usados com o intuito de compreender como o teatro e a distopia se encaixam. Já a questão de pesquisa que norteou o trabalho foi a seguinte: de que forma as peças teatrais nessa obra podem conter dois conceitos completos como o da autorreferenciação literária e o do genocídio negro? Defronte tantos autores magníficos que a contemporaneidade nos trouxe, o que motiva a persistência dos estudos literários nos autores consagrados e o silenciamento dos autores recentes nesse momento? Dessa forma, a justificativa que consolida este trabalho está em olhar para a literatura contemporânea como um lugar de potência para discussões de cunho estético, histórico e social.

 

1 Metaliteratura, metadrama e/ou metateatro

De antemão é válido apontar que a literatura não tem um conceito próprio. Definir e/ou conceituar implica em delimitar; e a literatura não aceita amarras. Diante disso, o que se tem em matéria de teoria são: tentativas! E nas circunstâncias que o tema é a literatura, o texto literário e o fazer literário, a tentativa é uma palavra cabível e adequada. Ela implica no que está inacabado, no que está por fazer, no que perspectiva um fim; mas só perspectiva, sem projetar.

Dessa forma, é possível perceber que ao tentar subdividir o que existe no nosso mundo, entre artifícios naturais e não naturais, podemos chegar à literatura da seguinte forma: a fauna, a flora, os rios e os oceanos são artifícios naturais do mundo, eles não precisaram da humanidade para existir; já a cultura, as artes, as tecnologias e as vestes foram criadas pelo ser humano no decorrer da história; sendo assim, a literatura está localizada entre os artifícios não naturais da humanidade e, por isso, é possível conjecturar o seguinte pensamento: a literatura é produto cultural da humanidade, isso pode parecer óbvio para alguns, mas eu indago: o que é óbvio na literatura?

Assim, pelos estudos pré-estruturalistas, estruturalistas e pós-estruturalistas a tentativa que coube aos teóricos foi, é, e tem sido a de se aproximar. Entender se a literatura tem alguma função, entender se é válido discutir sobre a sua natureza e se é possível reverberar sobre a sua essência, caso tenha alguma. Por isso os estudos culturais do filósofo e teórico Terry Eagleton (1999, p. 316) foram importantes, pois, ao entender a literatura enquanto "um fenômeno histórico", ele necessariamente a localiza entre os diversos produtos culturais da humanidade, por surgir no decorrer da história e surgir com o ser humano.

Diante dessa concepção, Eagleton situa a linguagem literária, termo esse contraditório e pouco unânime entre os teóricos, como sendo uma linguagem extraordinária que foge do comum e que transcende o usual e corriqueiro, nisso, defronte dessa teoria a literatura afasta-se "sistematicamente da fala cotidiana" (Eagleton, 1999, p. 03).

Com essa linguagem, a literatura não nos projeta para uma realidade como o idealismo romântico sugere; a literatura nos leva a uma espécie de transe coletivo e onírico que, por vezes, nos apresenta um mundo similar a essa dimensão que chamamos de realidade objetiva; e, em outras ocasiões, nos induz a mundos fantásticos, tenebrosos, terríveis e distópicos. Assim sendo, a literatura nos projeta em uma realidade além do irreal.

Por conta da variação que permeia o pensamento do crítico literário, isto é, com a mudança de linhas e correntes teóricas utilizadas, o pensamento e o olhar sob e sobre a literatura mudam. Desse modo, Jonnathan Culler, ao tentar teorizar acerca da literatura, ressalta a relevância que cada lente teórica possui sobre o pesquisador - os estudos sociais e culturais vão ler o mesmo texto de modo distinto da teoria feminista e Queer, e assim é possível notar que as lentes que cada escola teórica forma auxilia e guia a leitura do crítico (Culler, 1999, pp. 119-126).

O viés pelo qual Culler olha para a literatura difere do que teoriza Eagleton; se para Eagleton a literatura subverte o ordinário, para Culler (1999, pp. 33-34) a literatura se conceitua mais pela ficcionalidade do texto literário do que pela subversão da ordem do comum na linguagem. Dito isso, vê-se que entre esses dois teóricos as visões acerca do mesmo objeto são díspares, isto é, em pouco se assemelham.

Culler (1999, p. 41) ainda esboça uma reflexão em torno da literatura como construção intertextual e/ou autorreflexiva; diante disso, as proposições que guiam a análise desse teórico se assemelham à perspectiva exposta pelo teórico do parágrafo seguinte. De acordo com Culler, na literatura instaura-se uma reflexão acerca da própria literatura; assim, intertextualidade e autotextualidade são "traços definidores" da literatura se autocentrado em si, e potencializar o uso da linguagem nessa dimensão da realidade dos fatos em um ambiente virtual e onírico.

Já para Gustavo Bernardo, no livro de Introdução aos termos literários, no ensaio intitulado de " Conceito de literatura", a literatura diz mais de si do que de outros temas, como uma das características da literatura é se voltar para a sua própria estrutura; a literatura é essa constante que volta para si. Acerca disso, ele encaminha a reflexão para o caráter autotextual da literatura, isto é, a metaliteratura ( Bernardo, 1999, p. 165).

A perspectiva de Bernardo dialoga com os estudos dos teóricos Wellek e Waren (1976). Ao abordarem sobre uma função consoante à literatura, eles conduzem a reflexão para um caráter semelhante à perspectiva anteriormente citada; aqui, a função da literatura para eles seria ser fiel ao falar sobre si, isto é, a literatura se diz, ou nas palavras dos próprios teóricos, "a sua função primordial e principal é a da fidelidade a sua própria natureza" (Wellek & Waren, p. 42).

Assim, podemos conduzir o debate em torno da essência da literatura da seguinte forma: se a essência da literatura é se dizer, a literatura em essência é metaliterária; pois a função que evidencia o texto literário é essa incursão em si próprio, esse ser autocentrado. Com isso, o questionamento que guiará a nossa reflexão é o seguinte: se a literatura em si, é metaliterária, como o teatro se autotextualiza? É possível falar de metadrama, metateatro?

Embora a macrodivisão dos gêneros literários em épico, lírico e dramático date da antiguidade clássica, mais especificamente da Poética de Aristóteles (335 a.C. e 323 a.C.), ainda é possível falar de textos que correspondem a esse padrão clássico, mesmo que na contemporaneidade os gêneros se interligam ao máximo. Diante disso, o texto dramático se caracteriza como o texto em que os acontecimentos são vividos, encenados e interpretados.

Dessa forma, a professora Angélica Soares (2007) imprime uma leitura acerca do gênero dramático da seguinte forma:

[...] podemos observar que o dramático, como indica a própria origem da palavra (drama vem do verbo grego dráo = fazer), é ação. Por isso, o mundo nele representado (pois o texto dramático se completa na representação) apresenta-se como se existisse por si mesmo, sem a interferência de um narrador. (Soares, 2007, p. 59).

A partir do exposto, é possível pensar em que tempo cada gênero literário marca e de que modo o marca; a poesia lírica potencializa a expressão de sentimentos e presentifica as emoções, evoca o sentir para o momento presente; a gênero épico (narrativo) relata ocorridos, fatos do universo e do ficcional que já passaram e, desse modo, o texto literário narrativo (romance, novela, crônica e conto) tem o foco no pretérito; contudo, o gênero dramático projeta os acontecimentos - das peças, dos autos, em cada Ato e/ou Cena - para o futuro, pois cada ação é desencadeada pelo que há de vir (Soares, 2007, p. 59).

Com isso, dialogar uma peça dramática com uma ambiência distópica é mais que favorável; é genial, pois existe aí a potencialização do olhar para o futuro, porque a distopia vislumbra um futuro no qual a sociedade se encontra caótica e os diversos problemas sociais que existem se encontram superpotencializados, isso é o que distingue a distopia da utopia; enquanto a primeira é o desastre, a segunda é o sonho; o drama projeta as ações para o futuro. Essa fusão de elementos intensifica o processo catártico do leitor, que agora se vê duplamente lançado em uma expressão artística que o imerge duas vezes nesse rio chamado futuro.

Por meio disso, é viável apontar o seguinte: distopias teatrais são um lugar de potência para proporcionar a reflexão acerca do futuro da sociedade e de como esses estigmas serão mais acentuados no decorrer dos anos. A literatura dramática distópica é uma possibilidade de olhar para um futuro da dimensão onírica da literatura e da realidade dos fatos desses universos ficcionais; olhando para esse futuro existe o auto-olhar e o olhar-se. Este tipo de literatura nos lança para a realidade exterior ao momento da leitura, olhando para dentro desse universo textual.

Diante dessa proposição, é possível apontar o seguinte: se a essência da literatura, com base nos teóricos discutidos, é a incursão que ela faz para si e assim se configura como essa autorreferenciação no texto literário, como fica a literatura dramática quando o texto dramático se diz?

O metateatro, também chamado de metadrama, pode ser entendido como a autorreflexão que a literatura dramática faz sobre si, ou seja, ele instaura um movimento de representação da representação no texto. A função primeva que esse esquema estilístico imprime é a de interrogar a veracidade da situação dramática, fazendo uma incursão sobre si e sobre os modos do seu exercício.

Um texto na literatura clássica que implementa, ou melhor, adota essa característica estética é a peça A tragédia de Hamlet, o príncipe da Dinamarca (1599-1601), do bardo William Shakespeare, isto é, durante o segundo ato, o protagonista escreve um trecho de uma peça, a encena e a apresenta para todos no castelo de Elsinor; essa encenação dentro de outra encenação é um dos exemplos mais escrachados de metateatro, pois na própria peça há uma peça sendo representada.

Contudo, existem outros meios de se chegar a uma encenação dentro de outra encenação; a reprodução de diálogos em uma conversa entre os protagonistas e a fala sobre terceiros faz a peça ingressar em um segundo nível de encenação; os sonhos também elevam o grau de abstração literária. Além disso, o fato de a peça se aproximar da realidade e questionar pressupostos sociais é uma dinâmica metadramática, pois a encenação do real persiste em ser um recurso do metateatro, pois questiona a realidade sem fazer rodeios, de maneira direta e concisa.

 

2 Teatro negro

É difícil precisar com esmero as peças que pedem que os textos sejam interpretados por um ator negro, isto é, se torna complexo na atualidade perceber quais textos dramáticos possuem personagens negros que encenem uma determinada trama. Por isso, Abdias do Nascimento, percebendo essa ausência de melanina na instituição teatro, fundou o teatro experimental negro, com o intuito de o negro protagonizar peças e não ser apenas o cômico, o bruto, o grosseiro. Eera necessário que nesse teatro o negro fosse a Arte, não a sub-arte (conceito problemático na teoria da arte, mas empregado aqui como um recurso estilístico). (Nascimento, 1966, p. 2)

Diante disso, a fundação do Teatro Experimental do Negro (TEN) foi de suma importância para que houvesse uma integração do negro no teatro brasileiro, por isso é possível dizer que existe um teatro antes e outro teatro depois do TEN. Sendo assim, escolhemos 3 relatos/testemunhos do livro Teatro Experimental do Negro, organizado pelo Abdias do Nascimento, com o intuito de caracterizar este teórico não apenas como um intelectual acadêmico que dialoga com a comunidade, mas como um ativista político que articulou mecanismos para combater o genocídio negro no âmbito cultural.

Com isso, o primeiro testemunho que nos chamou atenção foi do ator Tomás Santa Rosa Junior. Em seu relato intitulado de " Teatro Experimental do Negro", ele definiu essa instituição como:

É uma nova contribuição ao Teatro, pela forma e pelo que sugere nas sutis interpretações do mundo do negro; pejado de ancestralidades, imprevisto, no seu lirismo ou subitamente, violentado pela força do instinto. (ROSA, T. S., 1966, p. 43, grifo nosso)

Com esse relato, Santa Rosa caracteriza o teatro negro como uma experiência que solicita a vivência do negro-ator na sociedade. Neste espaço, o negro pode se inserir; desaguar seus traumas, suas emoções, suas aflições e suas felicidades. Assim, o palco configura-se como a extensão da própria vida, simulando os estigmas sociais e potencializando a prática teatral.

Segundo o pensador Abdias do Nascimento (1966, p. 80), organizador do livro que contém esse testemunho supracitado e outros, o TEN é um movimento complexo cujo pico do iceberg é o palco e a encenação, mas há todo um trabalho de base envolvendo o letramento e a alfabetização de domésticas e operários, a parte do iceberg que fica submersa na água. Sendo assim, Nascimento define o TEN da seguinte forma:

Com essas palavras desejo assimilar que o Teatro Experimental do Negro não é, nem uma sociedade política, nem simplesmente uma associação artística, mas um experimento psico-sociológico, tendo em vista adestrar gradativamente a gente negra nos estilos de comportamento de classe média e superior da sociedade brasileira. (Nascimento, 1966, p. 80)

Dito isso, Abdias condensa o título dado a essa conferência Espírito e fisionomia do teatro experimental do negro, que foi transcrita no livro que reúne os testemunhos. Nessa conferência ele consegue mostrar a relevância dos movimentos sociais na ocupação desses espaços outrora negados - que, quando havia negros nos ambientes teatrais, era na encenação de peças ridicularizantes e estereotipadas - com o intuito de promover e disseminar uma literatura dramática encenada por negros para negros e brancos.

A partir disso, Napoleão Lopes Filho tenta precisar uma Metafísica negra no TEN. De início, no seu testemunho, o autor retrata e reverbera sobre Abdias do Nascimento, precisando a sua luta e extraindo um sentido singular do posicionamento do Teórico e Ativista. As práticas que se chocam e se somam à história de Abdias transcendem o físico e chegam ao outro. O trabalho de Abdias com o TEN diz de si, assim como diz do outro. Nesse intuito, Filho (1966) entende o seguinte:

Toda a obra de Abdias visa a afirmação da negritude. E a negritude é uma metafísica negra que se desmembrará, como a clássica árvore filosófica, em uma ética negra uma estética negra, uma cultura negra, atual, viva, participante de todos os problemas que afetam o homem moderno. Há um modo negro de transcendência que precisa ser expresso. (Filho, [1952] 1966, p. 107).

Napoleão Filho entende a negritude como um conjunto de partes, e essas partes mesclam e dialogam com a filosofia negra, a estética negra, a cultura negra e todos os que participam dessa rede de interconexões complexas e pluralizantes. Assim, essa metafísica negra materializa-se na expressão artística dramática, o teatro como um nó, composto por várias cordas, une e entrelaça diversas vivências.

Tendo em vista esses três relatos - que são apenas alguns entre os demais do livro Teatro Experimental do Negro, organizado pelo ativista, teórico, dramaturgo e ensaísta Abdias do Nascimento -, é possível perceber uma janela potencialmente aberta através do teatro para os negros nessa parede chamada sociedade macroestrutural racista. Por isso, é impossível falar de teatro negro e não abordar esse feito do Abdias de Nascimento. Registrado isso, passamos para o tópico seguinte.

 

3 Genocídio negro

Michel Foucault, Achille Mbembe, Abdias do Nascimento são a tríade para entender o conceito de genocídio negro. Se observado bem, é possível notar que os conceitos de biopolítica, necropolítica e genocídio negro estão correlacionados, pois este último nada mais é do que a ampliação, ozoom dos conceitos anteriores dado a um objeto de estudo mais específico. Assim, é viável caracterizar o genocídio negro como um conceito que amplia a bio e a necropolítica.

Sendo assim, nos livros História da Sexualidade I - A vontade de saber (1976); Vigiar e punir: o nascimento da prisão (1975) e Nascimento da biopolítica (1978-1979), o filósofo Michel Foucault utiliza o termo biopolítica, que possui duas raízes gregas (bios) bio = vida e (polis) política = forma de governo, e com isso biopolítica seria uma forma que o estado encontra de governar a vida das pessoas.

Assim, essa dominação estatal configura-se como exercício pleno do controle sobre as nossas vidas, sobre os nossos corpos, sobre as nossas mentes, inserindo nelas ideologias e suscitando desejos e vontades que dantes não existam, isto é, o estado molda o indivíduo a seu bel-prazer e o transforma em um consumidor em massa de produtos, ideais e estéticas (Foucault, 1999, p. 306).

Ao se deparar com este conceito extremamente complexo e denso, Achille Mbembe (2017, p. 125), filósofo negro e camaronês, potencializa esse conceito a ponto de (re)caracterizá-lo na seguinte premissa: se o estado manipula a vida, ele decide quem vive e como vive; logo, decide quem morre e como morre. A partir do exposto emerge o conceito de necropolítica, com a finalidade de entender diversos recursos, procedimentos e decisões políticas que culminam na morte de diversos seres humanos em razão de algo que os liga, os associa e os vincula coletivamente, seja cor/raça, sexualidade ou religião. Fato é que a necropolítica aniquila subjetividades diversas e distintas, em uma tentativa de padronizar, legitimar e apoiar certas formas de viver.

Com isso, no ensaio de título homônimo ao conceito, é possível perceber essa tensão entre diversas camadas da sociedade; pois a desigualdade social é um dos recursos que esta necropolítica utiliza para legitimar as mortes e a baixa qualidade de vida, que culmina na diminuição da expectativa de vida dos indivíduos, e que, sobre isso, Achille Mbembe assevera:

Mecanizada, a execução em série transformou-se em um procedimento puramente técnico, impessoal, silencioso e rápido. Esse processo foi, em parte, facilitado pelos estereótipos racistas e pelo florescimento de um racismo baseado em classe que, ao traduzir os conflitos sociais do mundo industrial em termos raciais, acabou comparando as classes trabalhadoras e os "desamparados pelo Estado" do mundo industrial com os "selvagens" do mundo colonial. (Mbembe, [2003] 2017, p. 129)

Nesse ponto do ensaio, Mbembe conjuga ambas as violências como "racismo baseado em classe", ou seja, a violência que é o preconceito racial somada à violência que é a desigualdade social. Dessa forma, é perceptível como o Estado age com soberania sobre a vida das pessoas, decidindo quem pode viver e quem pode morrer, como irão viver e como irão morrer.

A analogia que Mbembe faz entre o mundo colonial e o mundo industrial é relevante, porque em ambas as realidades o homem branco europeu detém o poderio e a soberania em relação à camada da sociedade que faz parte do proletariado (isso no mundo industrial) e a sociedade que se encontra na condição de escravizada (isso no mundo colonial). Por isso, há inúmeros estudos a respeito do trabalho durante a Primeira Revolução Industrial (1760-1840) como sendo análogo à escravidão1. Essa analogia diz muito sobre a maneira como a nossa sociedade está fundamentada.

Dito isso, o que a bio e a necropolítica têm a ver com o genocídio negro? Exatamente tudo! Achille Mbembe (2017, p. 125) diz que a necropolítica esvazia e destrói "corpos humanos e populações", o que dialoga com o conceito de genocídio negro proposto por Abdias do Nascimento. De acordo com Abdias do Nascimento, em Genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado (1978), a ação de exterminar pessoas em razão da sua cor, raça, cultura e crença está vinculada a esse processo racista e necropolítico que dificulta e, por vezes, inviabiliza o negro de ascender socialmente. Assim sendo, Abdias amplia o conceito de genocídio a ponto de entender que a morte e a aniquilação dos corpos negros são o último estágio desse processo sórdido, desumano, estatal e sujo.

Diante disso, Abdias conceitua esse processo como gradual, de forma que, em primeiro nível, está a despersonalização e a desumanização do negro. O típico pensamento: um corpo negro não traz comoção nacional, ou como diria a Elza Soares: "A carne mais barata do mercado é a carne negra". Ao negar a sensibilização aos mortos por essa violência em potência que é o racismo, somado à pobreza, à violência policial e ao abuso de autoridade, essas instituições condicionam a vida de toda uma população; por vezes, a morte de pessoas que são assassinadas pelas diversas corporações policiais é justificada pelo histórico e pelos antecedentes criminais por meio da mídia. E isto de alguma forma parece justificar no imaginário coletivo que pessoas dessa índole devem morrer, ainda que já tenham pagado pelos crimes cometidos (Nascimento, 1979, p. 53).

Depois, em um segundo nível, após negar a humanidade aos nossos corpos, à nossa raça e à nossa cor, a vítima da vez é a nossa cultura, seja ela ancestral, nascente nos Países do continente africano, seja ela periférica, cuja originalidade se dá nos morros, favelas, complexos e bairros periféricos. A nossa cultura passa por um processo de apagamento e invisibilização histórica, que estereotipa e estigmatiza as ações culturais seja ela religiosa ou artística, fato é: vem do povo negro, então, não presta! É este pensamento que circunda e impera no imaginário coletivo e na estrutura das instituições públicas. Por diversas vezes (problemáticos) o rap e o funk, originalmente periféricos, foram associados a práticas criminosas em facções, isto é, a criminalização do funk e do rap. Com isso, silenciam ou pelo menos tentam calar a realidade que orbita no morro (Nascimento, 1979, p. 102).

O candomblé, a umbanda e as demais vertentes que pertencem a matrizes de religiões africanas sofrem por conta do desconhecimento da cultura e pela influência católica que retrata que estas religiões, desde o momento fatídico da colonização, são do mal. Figuram e constroem todo um preconceito com base no desconhecimento e na negação da prática religiosa alheia que, de acordo com Abdias, são "a principal trincheira de resistência cultural do africano" (Nascimento, 1979, p. 103).

Assim, a despersonalização, a desumanização, o apagamento histórico das nossas culturas e a demonização das nossas religiões legitimam o extermínio da população negra que afro-descende dos negros sequestrados de África e aqui foram escravizados. Diante disso, é possível apontar para o seguinte: o genocídio negro é uma prática bio/necropolítica extremamente organizada que visa, em último nível, ao extermínio e à aniquilação da população negra e é necessário combatê-la: inserindo os nossos na academia, no mercado de trabalho, com políticas públicas que visem ao letramento e aprimoramento estudantil dos nossos e reafirmando a nossa negritude através de mecanismos complexos como a nossa cultura e a nossa estética. Dessa forma, é possível aniquilar o genocídio, nas palavras de Abdias, "um racismo mascarado", mas nem tanto.

 

4 Peças em (sob) análise

A explanação dos conceitos anteriores foi relevante, pois, a partir daqui, perceberemos e entenderemos como essas concepções se aplicam e podem ser vistas nas peças teatrais do livro Trilogia do confinamento (2020), do autor Aldri Anunciação. Metateatro, teatro negro e genocídio são três definições que se entrelaçam e possibilitam a existência dessa obra.

Aldri Anunciação é um visionário, um homem que vislumbra o seu tempo e projeta atitudes e ações que poderão ser adotadas por alguns governos macroestruturais racistas, isto é, o que Aldri Anunciação faz nessas peças é condensar diversas questões que mobilizam o nosso meio social, tais como: reparação histórica, herança ancestral, humanismo e período pós-racial2; este último ainda não há em nossa sociedade enquanto prática, mas é possível vislumbrar uma sociedade em que a diversidade existe, mas não motiva a morte de uma população nem a morte da sua respectiva cultura.

As peças " Namíbia, não!", "Embarque Imediato" e "Campo de batalha: A fantástica história de uma guerra bem-sucedida" baseiam-se em uma forma de fala simplória e objetiva: o diálogo. O que todas as peças possuem em comum, além da temática racial, seja na afirmação ou na ausência, são dois personagens principais que dialogam do início ao fim do texto dramático sobre o momento que está sendo vivido e seus desdobramentos.

De acordo com Angélica Soares (2007, p. 59), "o diálogo [...] é a forma própria para que as personagens ajam sem qualquer mediação, dando sempre a impressão, até mesmo nos dramas históricos, de que tudo está acontecendo pela primeira vez". Diante disso, o diálogo permite que o texto dramático não tenha e nem necessite de um narrador para situar os acontecimentos dentro de um contexto. Por essas e outras que Aldri Anunciação é genial, pois ele nos faz atentar para o diálogo, isto é, algo que tem perdido o seu potencial comumente. O autor potencializa e revitaliza o diálogo subvertendo a realidade objetiva.

Dito isso, os parágrafos seguintes serão utilizados para explanar acerca dos conceitos metateatro e genocídio em cada uma das peças. No intuito de contemplar como esses conceitos podem ser percebidos em cada um dos textos dramáticos, há uma tentativa de dialogar teoria e prática.

"Namíbia, não!"

A peça que abre a trilogia faz menção à reparação histórica que compreende o período da escravidão. Em " Namíbia, não!", os negros estão sendo mandados de volta para países do continente africano, escolhidos aleatoriamente sem nem se consultar a árvore genealógica de cada um. Diante disso, dois primos que moram juntos em um apartamento lotado de coisas brancas - a pintura do apartamento também é branca - se veem encurralados com essa situação, pois ambos são de "melanina acentuada"3 - termo usado durante toda a peça para denominar os negros desse Brasil distópico.

Detalhe, um artifício estético é empregado durante toda a peça. Logo no início, o texto indica que a peça deve ser lida como se estivesse cinco anos à frente do ano do leitor no plano real, isto é, como essa leitura está sendo feita em 2021, o tempo da peça é o ano de 2026. Sempre se somam 5 anos ao ano corrente do leitor. Isso insere um caráter futurístico ao âmbito textual, pois projeta o leitor sempre em uma direção e um futuro por hora não factual.

A tranquilidade do apartamento dá lugar ao caos do mundo exterior ao prédio. Antônio, formado em Direito e primo de André, estudante de Direto, está arrumando a mesa do café da manhã. André chega em silêncio; Antônio presume que André tenha chegado de uma noitada; porém, Antônio não dá muito crédito ao estado estarrecido de André (p. 38).

Após trocarem algumas farpas, André explica que passara a noite toda correndo, fugindo da polícia por conta da Medida Provisória que o governo emitira. E, ainda na primeira cena, ele explica o que seria a Medida Provisória:

André: Saiu a Medida provisória do governo! Cidadãos de melanina acentuada que forem encontrados circulando pelas ruas do país, a partir de hoje, serão capturados e enviados de volta pra África. (Anunciação, 2020, p. 40).

Antônio invalida a fala de André, dizendo que já sabia que não seria bom trazer André para a cidade grande e que ele estava enlouquecendo (p. 40). Após descredibilizar a fala de André, Antônio sai de casa (p. 41) mas logo retorna, pois o mundo se encontra caótico fora do apartamento (prédio). Nesse momento, André relata a Antônio tudo que acontecera depois das 00:00 horas, quando a medida passara a valer. Alguns policiais chegaram e o conduziram à delegacia; lá, ele conversou com uma socióloga que lhe explicou o que estava acontecendo (p. 44).

Nesse trecho da peça, é utilizado um recurso denominado pelo autor de Efeito-memória, que nada mais é do que o flashback tão conhecido e popularizado, pois projeta o texto dramático em uma retrospectiva para acontecimentos.

Já fora desse enquadramento, que é o apartamento dos primos Antônio e André, no contexto da noite anterior, a socióloga conversara com André:

Socióloga (off): Como vocês não sabem de onde vieram seus tataravós? Vocês têm a obrigação de saber a origem de vocês. Questão de cultura! Eu, por exemplo, meu sobrenome é Garcez! Logo, sei muito bem que meus antepassados vieram da Espanha!
André: Então por que a senhora não volta pra lá? Para os seus familiares espanhóis?
Socióloga (off): Porque a medida provisória é muito clara, meu querido! Muito clara na sua redação: "Cidadãos com traços e características que lembrem, mesmo que de longe, uma ascendência africana, a partir de hoje, 13 de maio de 2025, deverão ser capturados e deportados para países africanos como medida de correção do erro cometido pela então colônia portuguesa, e continuado pela República brasileira. Erro esse que gerou quatro séculos de trabalhos gratuitos realizados por uma população injustamente transferida de suas terras de origem para as terras brasilianas. Como o intuito de reparar esse gravíssimo erro cometido pela União, essa Medida prevê a volta desses cidadãos, e de seus descendentes, para terras africanas em caráter de urgência."
Sai efeito-memória. (Anunciação, 2020, p. 44, grifos nossos).

A fala da socióloga é repleta de minimizações e apagamentos históricos. A escolha de cada um dos termos usados por ela subtrai a seriedade que compreende esses terrores históricos. Ao falar de "transferência", ela nega a gravidade do processo histórico de tráfico dos negros pelo Atlântico e de sequestro das terras do continente africano. Quando ela se refere a "trabalhos gratuitos", ela nega a complexidade do processo de escravização, toda a desumanização que os corpos negros sofreram por parte da legitimação das instituições, quanto à ausência da alma nos corpos negros (isso amparado pela dominação religiosa-cristã) e o amparo legal que autorizava a venda, a compra de escravos, e os castigos.

Nessa fala carregada de minimizações, é possível perceber como o processo necropolítico do genocídio negro é sutil, por vezes. Estimam que a escravização "não foi isso tudo"4, sem respaldo historiográfico algum, e findam por invalidar as lutas e as reivindicações do movimento negro por visibilidade e reparações históricas.

Para além da fala problemática da socióloga, é perceptível que, quando André se põe a contar o que acontecera na noite anterior, o efeito-memória projeta o leitor para outro momento. Nisso há uma representação dentro de uma representação; a lembrança do ocorrido é recuperada pela memória de André e esse recurso expõe para o leitor do texto dramático que há uma história sendo representada aí. Em um primeiro nível, há uma metanarração, pois no texto dramático há uma narração e, em um segundo nível, há uma metarrepresentação (metadrama) em que dois personagens representam na própria representação.

É necessário fazer algumas digressões e algumas projeções na análise do texto, pois é impossível dissecar em um artigo todo o livro e todas as intromissões do conceito de metateatro e genocídio. Por conta disso, serão usadas algumas cenas pontuais. Falo de cena porque as peças nessa obra utilizam-se de cena e não de atos como os dramas tradicionais do teatro.

Dito isso, algumas cenas depois, isto é, na cena 8 após passar todo um drama e sentir o terror do retorno cada vez mais próximo e a sórdida realidade perto de se concretizar. André e Antônio passam por instantes agonizantes que, no trecho seguinte, transcrevo:

Sons da multidão e do helicóptero aumentam. A socióloga lá fora repete frases em alemão ao megafone. Ouvem-se na escuridão mais tentativas de arrombamento da porta do apartamento. De repente, a porta é definitivamente arrombada. Em desespero de vida e sem conseguirem enxergar o que está acontecendo devido á extrema escuridão, Antônio e André são sumariamente metralhados pela ação policial em plena sala de estar do apartamento decorado com mobílias brancas. Nesse momento, de súbito a energia elétrica volta a ser fornecida ao prédio. As luzes da sala acendem, revelando os corpos de melanina acentuada de André e Antônio estirados em sangue sobre o assoalho branco. (Anunciação, p. 88, 2020, grifo nosso).

Embora estivessem amparados pelo Artigo 150 do Código Penal, que entende a ação policial destacada no trecho acima como crime a invasão de domicílio, e isso é o tempo todo ressaltado por Antônio (p. 86), os policiais entram na casa deles e metralham ambos os primos violentamente. Essa cena é muito característica, pois dialoga bastante com o genocídio negro na nossa realidade objetiva. Policiais fortemente armados matando civis com a autorização, legitimação e afirmação do Estado.

Porém, essa ainda não é a última cena da peça; na cena 9, logo na rubrica é possível perceber que o massacre dos primos na cena anterior não passara de um pesadelo de André: "Amanhece no apartamento. Ao perceber a luz do sol que entra pela janela da sala aberta queimando o seu rosto, André acorda exaltado, Antônio, calmo coloca uma chaleira branca no fogo." (Anunciação, p. 88, 2020, grifo nosso). Na cena anterior, ocorre o que nos parágrafos supracitados denominamos de metadrama, o sonho de um personagem sendo representado como verdade factual nesse Brasil distópico da peça e, na cena seguinte, sendo descortinado esse véu frente a nossa face, ou seja, a passagem anterior instaura esse regime da representação da representação na peça, e o sonho de André esquematiza uma realidade não tão distante da dele, o sonho de André é uma metarrepresentação genocida de sua sociedade.

"Embarque imediato"

A segunda peça da trilogia também perpassa os temas genocídio e metateatro, porém de um modo mais sutil e mais sorrateiro. Os macrotemas que coexistem nessa peça são: herança ancestral, identidade (ambiguidade emplacada com o documento de nomenclatura homônima), apagamento e abandono de princípios morais e éticos além-Europa, racismo, perda das raízes e uma tentativa de adequação aos padrões europeus de vivência. A peça se passa em uma sala de um aeroporto totalmente branca, denominada de sala clean; dois homens negros, um velho cidadão e um jovem cidadão (brasileiro) estão lá, por terem problemas com a documentação.

Aldri Anunciação, nessa peça, soma o embate de gerações ao embate de identidades e reconhecimentos de lugares. Essa junção é potente, pois há toda uma busca nos países que foram colonizados pelo entendimento de si e das suas culturas originárias, no plural mesmo, pois são a soma de diversas outras que a cada década foram se diluindo e desaguando em outras culturas. Por vezes, os diálogos tornam-se densos e é essencial que essa complexidade inquiete o interlocutor do idoso africano. A influência nos trajes, na fala, na maneira inquieta e impaciente de ser nos mostra o quanto o jovem doutorando brasileiro é transpassado pela cultura europeia.

Na peça não há marcação de tempo, isto é, não se sabe a respeito do ano que se passa isso nesse universo complexo. As cenas são rotuladas de Cena-Rastro, dando ênfase a uma memória individual ou coletiva, pois evidencia os rastros da memória. Dito isso, ao fim da Cena-Rastro 1, é possível notar que o diálogo entre o Velho Cidadão, com trajes referentes ao continente africado, e o jovem cidadão, com trajes mais americanizados, é transpassado pela ambiguidade da palavra identidade; vejamos esse exemplo no trecho a seguir:

JOVEM CIDADÃO: O mais importante eu não tinha. Meu passaporte... minha identidade. VELHO CIDADÃO: Sim... esses você perdeu. Sons de turbinas de avião Boeing 737 alçando voo invadem completamente o ambiente, diluindo-se logo depois. Os dois cidadãos olham mais uma vez na mesma direção, como que observando a decolagem ao longe e imaginando que mais um grupo de pessoas partiu. (Anunciação, 2020, p. 136).

A ambiguidade, o duplo sentido ou os vários e diversos sentidos que a palavra pode ter potencializam a dimensão metafórica da literatura. Identidade nesse trecho de um texto dramático assume dois sentidos - no primeiro, documento geral, um registro que contém informações sobre nós, tais como: data de nascimento, nome da mãe e do pai, instituição emissora do documento; o segundo sentido diz respeito a um lugar histórico de uma identidade coletiva que redireciona e guia o indivíduo em um caminho de ancestralidade e reconhecimento sócio-histórico.

O velho cidadão reafirma que o jovem perdera a identidade, não só a mera documentação; mas a identidade que nos orienta na vida em sociedade. Ao negar, ou perder determinada identidade, é possível perceber que o jovem adota outra, nas suas decisões acadêmicas, no âmbito das roupas, no vocabulário e na mente cauterizada por não notar quem "em razão da sua raça5" ele foi e quem agora ele é. Pois, o jovem cidadão e o velho cidadão foram os únicos que tiveram problemas na documentação antes do embarque, enquanto os amigos dele seguiram viagem.

A negação da identidade não deixa de ser uma faceta do genocídio negro (relativa ao primeiro nível ou estágio genocida), pois compreende o processo de desumanização e despersonalização do negro, anulando e negando a sua cultura, fazendo com que ele se aculture, culminando, assim, no processo de adesão de uma cultura hegemonicamente branca e europeia. Nisso, o apagamento cultural, como bem caracteriza Abdias do Nascimento (1969), é um processo do genocídio negro.

No trecho anterior foi possível discutir acerca do genocídio negro, mas no trecho seguinte será possível ver que o modo como o metateatro se apresenta nessa peça se equipara ao da peça anterior por meio de um sonho; todavia, aqui o artifício utilizado é o devaneio, que pode ser entendido como um sonho lúcido ou algo semelhante, vejamos:

Em mais um golpe de lembrança (ou golpe de visagem), o Jovem Cidadão devaneia, sentando-se na cadeira. Inicia fantasticamente a sua defesa de doutoramento, sob o olhar tranquilo do Velho cidadão. Numa constituição espiralar do tempo. JOVEM CIDADÃO: Bom dia a todos! Desculpa, mas não consigo enxergar a banca por causa da luz. VOZ DE BRECHT (off): É dessa forma que se dará a arguição dessa banca da sua defesa de tese. Com muita luz! JOVEM CIDADÃO: Mas eu preciso saber com quem estou falando! Essa voz assim... O senhor faz parte da banca? VOZ DE BRECHT (off): Digamos que sim. JOVEM CIDADÃO: Quem é você?! VOZ DE BRECHT (off): Eu sou Brecht! Mais precisamente, a Voz de Brecht. Ou se preferir... eu sou o tema! Sua tese, seu objeto de pesquisa da universidade! O Jovem Cidadão se assusta (Anunciação, 2020, p. 159).

A representação da representação instaura-se no desvaneio do Jovem Cidadão; é fato que na realidade da peça sua defesa de doutoramento ainda não ocorrera, pois é necessário que ele vá a Monique; mas, na sua mente, a defesa começa a acontecer e o autor do seu objeto de estudo, que é a dramaturgia de Bertolt Brecht, está presente na defesa e começa a questionar vários pontos feitos na tese desse doutorando. O sonho do jovem é uma projeção do seu íntimo, um consciente conturbado e pouco evidente. Nesse nível, o metadrama representa os anseios e as aflições deste estudante em um segundo nível de representação, que é descortinado na cena-rastro seguinte, na qual a rubrica do texto-teatral diz:

De repente, como que despertando do emaranhado tempo espiralar, o jovem cidadão levante-se em alerta da cadeira do aeroporto sob o olhar atento do Velho Cidadão. Jovem Cidadão: Cadê? Cadê? Velho Cidadão: Algum problema meu Jovem? Jovem Cidadão: Cadê o senhor Brecht?! Bertold Brecht! Cadê? Velho Cidadão: Quem? Você teve um pesadelo! (Anunciação, 2020, p. 163).

Ao acordar, o jovem retorna para o primeiro nível de representação da peça. Atônito, pois o seu sonho havia o dispersado daquele lugar, a sala clean, vazia de qualquer influência cultural, uma totalidade branca. O jovem dialoga mais um pouco com o velho e começamos a perceber uma mudança de consciência discursiva e identitária. O jovem faz um discurso, e termina com "O passado é estático! Identidade não!" (p. 166). O velho cidadão conta uma história sobre a violência da ação dos europeus no litoral do Senegal e como essas atitudes forçam ações tomadas em razão do desespero, isto é, uma vida movida em prol da sobrevivência.

Existe um adágio que percorre toda a peça que pode se configurar como uma metáfora do compromisso ancestral e histórico. A metáfora do copo de água meio cheio, a cultura e o retorno às tradições antigas de um povo, essa cultura como algo inacabado imprimindo uma ação que projeta e solicita uma continuidade. Tomar ou lançar fora o que restou do copo de água que outrem deixou? As culturas em xeque são as africanas; os povos, os africanos. A tentativa de unificar as culturas africanas e negar a individualidade também é uma faceta do processo de genocídio. A pergunta feita pelo Velho Cidadão ao jovem é a mesma pergunta, sobre o copo de água, feita a nós, negros ocidentais: "Não está cheio! A água está pela metade! Quer dar continuidade?" (p. 167).

 

"Campo de batalha: a fantástica história de uma guerra bem-sucedida"

A obra na qual essa peça se insere guia as reflexões e norteia as leituras que podem ser desencadeadas a partir das situações que ocorrem no universo da representação. Nisso, é possível caracterizar o seguinte: as peças anteriores demonstram um nível do genocídio negro, mais escancarado e nítido, ainda que na segunda peça isso seja mais sutil; nesta que abordamos, acerca do campo de batalha, é praticamente inexiste o de(em)bate racial. A trilogia do confinamento projeta isso sobre os leitores, uma sensação que presentifica o enclausuramento. A palavra confinamento foi bem escolhida aqui, pois aprisionar declararia um valor moral ao racismo, como sendo algo intransponível. Mas, ao longo de todos esses anos de debate e afronte, é possível perceber como a macroestrutura racista do mundo pode ruir. Porém, ainda existe muito a fazer para que a nossa sociedade se iguale com o Brasil do contexto pós-racial que consta nessa derradeira peça.

A peça se passa em um cenário distópico no qual está ocorrendo uma Terceira Guerra Mundial; o ambiente é horrendo, porque a batalha travada, ou melhor, o episódio dessa batalha que estamos acompanhando se passa no "leito seco e árido do rio Amazonas (p. 177)." O motivo dessa guerra é a falta d'água no mundo e o poder sobre a pouca água que resta. As roupas que ambos soldados utilizam remete às duas grandes guerras que houve no século XX. E o drama-embate que percorre toda peça é um diálogo entre ambos personagens (soldado 1 e soldado 2). O momento que presenciamos data de uma pausa ocorrida na guerra, pois as munições acabaram no campo de batalha e a indústria não consegue atender a demanda da produção de munição para esta guerra. A guerra está sendo transmitida ao vivo nas mais diversas plataformas de streaming, isto é, a população está vendo simultaneamente tudo que ocorre nesta guerra. Com a guerra pausada, eles não podem matar, só quando a ordem for dada é que se torna possível aniquilar o inimigo.

Dito isso, vamos dar enfoque aos conceitos de genocídio e metateatro, e como esses conceitos podem ser percebidos nessa peça que, de perto, já se distancia do debate racial e de todo o embate étnico.

De antemão, é possível listar alguns processos - sobre o genocídio negro, a peça ressalta a questão racial pela sua ausência. A ausência do pressuposto racial nessa peça se destaca, pois, quando o que se está em jogo são as necessidades basilares de se hidratar e se alimentar, a raça sai de cena e a humanidade impera, uma vez que a sede e a fome nos unem. Diante disso, a guerra por água toma um rumo distinto dos pressupostos das peças anteriores. Aqui o debate racial é superado e um contexto pós-racial persiste e se mantém. Resta a nós a leitura do metadrama nos parágrafos seguintes.

Assim sendo, é válido apontar que precisar um momento no qual a representação da representação está instaura é complexo, mas uma possibilidade de leitura é a contextualização dessa história, ou melhor, o panorama dessa encenação ser uma Terceira Guerra Mundial (pp. 177-178). Nesse movimento, a literatura questiona não só a falta de diálogo e conscientização na resolução de certos problemas, mas a predisposição da raça humana em promover guerras acerca de inúmeros fatores.

Nisso, nota-se que, dentre as peças anteriores, promove uma autorreflexão, mas essa autorreflexão ocorre em um terceiro nível de análise. A literatura está refletindo não sobre a própria literatura, mas sobre a humanidade/sociedade que, se olharmos o prisma desta pesquisa, é o núcleo no fazer literário. O metateatro aqui encena de uma maneira interrogativa, fazendo-nos pensar sobre a veracidade da situação dramática, pois a realidade de uma Terceira Grande Guerra é muito mais real do que ilusória. Ou seja, o metateatro nessa peça entende como um grande palco a existência humana no planeta Terra e projeta várias problemáticas possíveis, dadas as circunstâncias nas quais a raça humana vive.

Diante disso, se comparada às outras peças que compõem a trilogia, " Campo de Batalha" institui uma quebra de expectativa no fluxo da leitura, pois nas peças anteriores o racismo, o genocídio cultural e o metateatro são nítidos. Os personagens sofrem uma tentativa forçada de retorno ao continente africano (" Namíbia, não!"), um jovem tenta se enquadrar nessa sociedade macroestruturalmente racista e nega toda a sua ancestralidade ("Embarque Imediato"), mas em " Campo de Batalha" nada em relação ao debate racial acontece.

Com isso, existem duas possibilidades a serem testadas; na primeira, entendo que o de(em)bate acerca do racismo foi superado, e nessa sociedade distópica as preocupações mais centrais são relativas à falta de água e alimento, por isso, diante da necessidade essencial de se alimentar e de se hidratar, debater sobra raça é infundável; a segunda hipótese é que nessa sociedade as diferenças se tornaram ínfimas e o racismo morreu gritando6, isto é, nesse ambiente os seres humanos vivem em um mundo pós-racial, no qual raça não é uma questão a ser pensada, porque vivem em uma situação de equidade. A segunda hipótese me faz mais sentido, pois é um contexto que se espera com todo o debate racial - que haja um momento no futuro histórico longínquo que negros não sofram com essa estrutura de opressão que legitima nossa pobreza, nossa ausência nos cargos de poder e nossa morte.

Nesse âmbito, o genocídio presentifica-se pela ausência de demarcação da estrutura racista da sociedade. Desse modo, as menções que orbitam nesse universo representativo podem direcionar a pesquisa a uma chave de metaficção historiográfica, pois há várias menções à Primeira e à Segunda Guerra Mundial (pp. 186-187). E, também, pode implicar em uma chave metaliterária; na Cena 16 - "Tronco Falantes", há menção a uma frase de um poeta, como destaco na citação a seguir:

Soldado 1 : Uma vez eu li uma frase de um poeta que me deixou intrigado. Soldado 2: Poeta? O que diz um poeta? Soldado 1: no meio da vida a gente recebe a visita da morte. Mas, nessa visita ela não leva a gente embora. Ela apenas deixa um sinal. E esse sinal a gente leva para vida toda até a morte! (Anunciação, 2020, p. 235).

Não há vestígios que indiquem a qual poeta o Soldado 1 se refere, é possível depreender que esse poeta pode ser um poeta universal de uma poesia universal que pertence a todos e a ninguém simultaneamente. Mas nada fica claro, e sobre o incerto só resta o silêncio. Sendo assim, não é por acaso a última peça ser marcada por diversas ausências e obscuridades: a ausência racial, a obscuridade de uma representação de uma representação mais objetiva e a ausência de referencial objetivo.

 

Para não concluir

O trabalho que o dramaturgo Aldri Anunciação implementa na Trilogia do Confinamento é fruto de dedicação e de esforço exponenciais. O esmero com a linguagem, a sustentação do diálogo e os contextos distópicos fazem dessa obra uma pérola negra. Tudo isso é feito com maestria e domínio, tocando em temas sócio-raciais, com uma influência do metateatro, além da representação da representação.

A obra caminha do macro ao micro, do racismo escancarado ("Namíbia, não!"), racismo sutil e sorrateiro ("Embarque imediato") ao racismo inexistente ou irrelevante ("Campo de batalha: a fantástica história de uma guerra bem-sucedida"). A técnica que Anunciação utiliza conduz a trama a uma descida de degraus, em que a primeira peça flerta o absurdo com o possível; a segunda peça torna o comum em poético; e a terceira peça conduz um diálogo comum a um evento fantástico.

Em uma época na qual as pessoas esperam sua vez de falar, e não ouvem o outro, tampouco sustentam um diálogo proveitoso. Aldri Anunciação reafirma o diálogo como um lugar de potência na transformação do indivíduo, capaz de conduzir o ser em uma introspecção psicanalítica, mudando rotas, caminhos e decisões. Nessa perspectiva, o dramaturgo reverbera sobre os valores sociais, solicitando o pensamento de que o diálogo e a escuta são relevantes nesse momento histórico em que todos falam e ninguém se escuta.

Dessa maneira, ele sintetiza as faces do genocídio negro nas três peças, do ponto mais absurdista e distópico ao mais brando e quase nulo. Fato é, o tema do genocídio negro implica no debate da ancestralidade, da reparação histórica, das múltiplas identidades e subjetividades negras, da ontologia, das culturas africanas e da necropolítica estatal que legitima, aprova e financia o extermínio da população negra. Antes de sermos mortos, dando fim ao ciclo genocida, já exterminaram tudo o que nos preenchia, em tema de arte, cultura, ancestralidade, religiosidade e vivência.

Tomando por base isso, a obra de Aldri Anunciação é um grito de reafirmação de que o debate racial importa e não pode ser invisibilizado nem invalidado. O dramaturgo perfura as camadas da literatura contemporânea brasileira para reverberar sobre o que a sociedade não costuma ouvir: genocídio negro é mais que um conceito; é a prática estatal de nos exterminar: acordem, lutem, estudem!

 

 

Referências

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Endereço para correspondência
Luiz Henrique Costa de Santana
E-mail: santanaluizhc@gmail.com

 

 

*Educador Popular. Graduando da Universidade Federal do Agreste Pernambucano (UFAPE) do 8º período do curso de Licenciatura em Letras - Português e Inglês. Membro do Grupo de Estudos em História e Literatura (GEHISLIT/ PUC Minas). Residente bolsista da Fundação Apolônio Salles de Desenvolvimento Educacional - FADURPE. PETiano bolsista do Grupo PET-Conexões - Comunidades populares e quilombolas, subsidiado pelo FNDE. Integrante do Grupo de Pesquisa (CNPq/UFAPE) - NUPELEM - Núcleo de Pesquisa em Literaturas Escritas por Mulheres - atuando na seguinte linha de pesquisa: Literaturas Afro, Latino e Nativo-Americanas Contemporâneas (Literatura e Decolonialidades). Tem interesse em Literatura, Estudos Culturais, Estudos Subalternos, Metaficção Historiográfica e Contranarrativa. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3707-7119
1Alcantara, A. F. G. (2017, 14 outubro). Trabalho análogo ao de escravo: evolução histórica e normativa, formas de combate e "lista suja". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, 22(5218). Recuperado em 19/02/2021 em: <https://jus.com.br/artigos/61165>.
2Que seria um período no qual as discussões de raça estariam esgotadas e a humanidade estaria preocupada com questões mais práticas e pouco epistêmicas, como, por exemplo, a falta de água potável, ressaltada na última peça da trilogia, " Campo de batalha: A fantástica história de uma guerra bem-sucedida".
3Maneira de ironizar termos que o movimento do politicamente correto empreende na fala coloquial como o uso do termo "afrodescendente" ao invés de negro ou preto.
4Como no livro escrito pelo jornalista Leandro Narloch (2009), Guia politicamente incorreto da História do Brasil, que relativiza o passado escravocrata do Brasil.
5Juíza racista que sentenciou o homem negro com essa frase no documento. Recuperado em: <https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2020/08/12/sentenca-de-cunho-racista.html>.
6Silvio Almeida na Live com o Mano Brown. Recuperado em 19/02/2021 em: <https://www.youtube.com/watch?v=jLYM6Slieug&t=256s>.

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