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Reverso

versão impressa ISSN 0102-7395

Reverso vol.41 no.78 Belo Horizonte jul./dez. 2019

 

EDITORIAL

 

A vitalidade e a competência de uma instituição é medida pela importância de seus aportes à sociedade maior, na qual ela está inserida. Numa instituição psicanalítica esse dado também prevalece. O dispositivo de retorno ao meio social se traduz não só pelo atendimento aos que a ela recorrem, mas também pelo registro escrito de seus avanços na teoria e na própria clínica.

Dessa forma, captar o movimento pulsante da psicanálise e expandi-lo para o social é uma retribuição e um dever de quem tem um saber específico e quer compartilhar com os outros os seus resultados.

A revista Reverso, publicação semestral do CPMG, tem se mostrado um instrumento de qualidade dentro do mundo psicanalítico. Num cenário em que as publicações digitais predominam pela dificuldade de fazer tais edições no papel, a Reverso se diferencia, por conseguir se manter como objeto concreto, o que realmente não é fácil numa época imediatista e acelerada como a atual.

Nascida do desejo de uma sociedade psicanalítica de registrar, divulgar e transmitir a psicanálise, a Reverso se propõe a chegar tanto aos estudantes através da doação de seus exemplares às bibliotecas universitárias, quanto aos profissionais da área, que podem fazer de sua leitura um enriquecimento pela troca de dados sobre a teoria e a prática psicanalíticas, além da coletividade geral que tenha interesse pelo conteúdo de seus artigos.

Hoje ela está bem indexada e apresenta o exemplar número 78, o que atesta a garra e o desejo decidido de uma sociedade psicanalítica de manter acesa a chama da psicanálise, saber que se faz sempre presente na conscientização e no avanço do sujeito contemporâneo.

O número atual traz um leque bem variado de artigos, contemplando diversas áreas da psicanálise.

Como articulista convidado contamos com o texto Não há senão isto: o laço social, de Joseph Rouzel, psicanalista que, após muitos anos como educador junto a públicos variados (psicóticos, toxicômanos), hoje se dedica ao consultório particular. Lecionou em Toulouse e Montpellier. No presente artigo, Rouzel discute o laço social e reflete sobre os efeitos nocivos do discurso capitalista na sociedade contemporânea, tendo a teoria lacaniana como suporte teórico.

Na categoria de TEORIA E CLÍNICA PSICANALÍTICAS temos cinco artigos. Angústia: o afeto que não engana, escrito por Ana Carolina Peck Vasconcelos e Breno Ferreira Penna. Os autores tecem um breve conceito do percurso da angústia, tendo como base o Seminário 10, de Lacan, privilegiando não só as nuances teóricas mas também as clínicas no trato com a angústia.

Segue-se o artigo A dinâmica psíquica do suicídio sob a perspectiva do desnudamento do Eu na melancolia, de autoria do grupo formado por Alexandre Durra Gomes da Cruz, Dordania de Souza Resende e Joanna Brown Wetter de Oliveira Reis. O artigo considera o suicídio na perspectiva da identificação melancólica com o objeto perdido. É feita uma abordagem do ato suicida destacando o insuportável que afeta o sujeito, a ponto de apagar sua subjetividade e passar ao ato como recurso derradeiro.

A seguir temos o artigo de Eliana Rodrigues Pereira Mendes O estranho entre nós: a intolerância à diferença. O artigo foi apresentado na mesa de abertura do X Fórum Mineiro de Psicanálise, sediado na cidade mineira de Divinópolis, cujo tema foi Ex-tranho: a Psicanálise @s voltas com Unheimliche, a propósito dos 100 anos de publicação do texto de Freud (1919) O infamiliar. O texto traz uma visão panorâmica do trabalho freudiano, afirmando que, com a noção de inconsciente, Freud revela a divisão do ser humano e a estranheza de cada um de nós. Chega até a situação atual em que os migrantes e os refugiados se configuram num retorno do recalcado, numa reatualização do ódio latente em cada uma das partes, tendo como situação inicial as colonizações feitas pela Europa nos países da África e das Américas. Se a psicanálise é subversiva e libertária, a intolerância à diferença tem nela um baluarte, pois permite ao sujeito a conscientização de seus fantasmas e o torna capaz de tolerar e acolher as estranhezas do outro.

O artigo O que é falo passivo é escrito por Sarug Dagir Ribeiro e Fábio Roberto Rodrigues Belo. O texto fala da noção elaborada por Bonaparte e Loewenstein e salienta a passividade fálica tanto feminina quanto masculina. Seu conteúdo ressalta a importância do tema para os nossos dias, não só na abordagem da teoria da sedução generalizada, mas também no aporte ao metabolismo obsessivo.

Encerrando esta seção, temos o artigo Do mestre ao analista: prescindir do exercício de seu poder, cujo autor é Vinícius Moreira Lima. Usando do caso Dora como referência e baseando-se em Lacan na teoria dos discursos, o autor afirma que ali, onde o mestre tem um comando, usando o suposto saber que lhe é atribuído, o discurso analítico opera como seu avesso, fazendo valer a causa do desejo ao recusar o exercício de seu poder.

A seguir, abre-se uma seção PSICANÁLISE E CULTURA, com artigos instigantes apresentando temas originais.

O primeiro deles aborda o tema O estranho gozo no reinado de Oliveira cujos autores, Jailson Salvador Silva e Marina Gabriela Silveira, recorrem a Lacan quando ele formaliza os modos de gozo do falasser e abordam uma expressão cultural e religiosa afro-brasileira da cidade de Oliveira (MG): o reinado de Nossa Senhora do Rosário. Segundo os autores, a mística dos reinadeiros é tomada como mostra do gozo feminino, tornando-se insuportável para os que recusam a estranheza desse gozo que ali se manifesta.

O segundo artigo, escrito por Robenilson Moura Barreto e Paulo Roberto Ceccarelli, sob o tema Mitos e representatividades: a expressão da sexualidade em culturas africanas, apresenta o mito de criação da nação Iorubá, que permite reflexões da prática psicanalítica no contexto cultural de origem africana. Chegam à conclusão de que, diferentemente da cultura ocidental, na cultura Iorubá a sexualidade humana ocupa parte central na vida de seu povo.

A seção PSICANÁLISE E LITERATURA está aqui representada pelo texto A literatura de Stefan Zweig e a revelação de intervenientes da clínica psicanalítica. A autora Mariana Khel afirma a importância da articulação entre psicanálise e literatura, relação bem-vinda na formação do analista tanto na ilustração teórico-conceitual quanto no material correlato à clínica. E para demonstrar sua afirmação, busca a obra de Stefan Zweig, contemporâneo de Freud, na qual se apresentam elementos de grande valia para a psicanálise.

E por fim temos uma seção de PSICANÁLISE E TRANSMISSÃO, com o artigo Entre o intransmissível e o transmissível: a questão do traumatismo fundador e do significante siderante para a formação do psicanalista. Os autores são Laéria Fontenele, Rebeca de Souza Escudeiro, Ruth Arielle Nascimento e Allan Ratts de Sousa. Sua abordagem leva em conta os trabalhos de Gérard Pommier e Alain Didier-Weill, resultando na reflexão sobre as dificuldades próprias à relação entre o desejo do analista e seus laços institucionais. É importante um lugar de resistência na prática tanto clínica quanto institucional.

Gostaria de acrescentar que a Reverso conta com uma comissão de publicação sob a coordenação preciosa e competente de Maria Mazzarello Cotta Ribeiro, com os demais psicanalistas do CPMG: Ana Boczar, Carlos Antônio Andrade Mello, Eliana Rodrigues Pereira Mendes, Marília Brandão Lemos Morais Kallas e Paulo Roberto Ceccarelli. A revisão do material publicável é feita por Dila Bragança de Mendonça, com dedicação e eficiência, e ainda com a ajuda das secretárias do CPMG Edna Malacco de Resende e Adriana Dias Bastos, e da bibliotecária Marta Aparecida Almeida e Almeida. Agradecemos a Valdinei do Carmo, que faz o projeto gráfico e a diagramação da Reverso, além da gráfica O Lutador.

Nossa capa, nesta edição, é tela de autoria do artista David Malkin, que oferece sua arte pela segunda vez à Reverso.

Eliana Rodrigues Pereira Mendes
Membro da Comissão Editorial da Reverso

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