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Junguiana

versión On-line ISSN 2595-1297

Junguiana vol.39 no.2 São Paulo jul./dic. 2021

 

O complexo heteropatriarcal: uma contribuição para o estudo da sexualidade na psicologia analítica a partir da teoria social

 

El complejo heteropatriarcal: una contribución al estudio de la sexualidad en psicología analítica basada en la teoría social

 

 

Gustavo Pessoa

Psicólogo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Mestre em Psicologia do Desenvolvimento pela Universidade de São Paulo (USP). Analista Trainee da SBPA. Mantém consultório particular em São Paulo, SP. E-mail: gustavompessoa@gmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo consiste em uma articulação teórica entre a psicologia analítica de C. G. Jung e as referências contemporâneas na teoria social com o objetivo de aprimorar a escuta clínica de psicólogos e de outros profissionais que prestem atendimento à população em relação a questões de gênero e sexualidade. Por meio desta aproximação, pretendo tecer contribuições teóricas que possibilitem uma escuta clínica mais efetiva que considere os aspectos sociopolíticos dos conflitos individuais sem prescindir da perspectiva psicológica.

Palavras-chave: Complexo, heteropatriarcado, sexualidade, gênero.


RESUMEN

Este artículo consiste en una articulación teórica entre la psicología analítica de C. G. Jung y los referentes contemporáneos en la teoría social con el objetivo de mejorar la escucha clínica de los psicólogos y otros profesionales que atienden a la población en temas de género y sexualidad. A través de este enfoque, pretendo realizar aportes teóricos que permitan una escucha clínica más efectiva que considere los aspectos sociopolíticos de los conflictos individuales sin prescindir de la perspectiva psicológica.

Palabras-clave: Complejo, heteropatriarcado, sexualidad, género.


 

 

A proposta deste artigo é contribuir com o estudo da sexualidade na psicologia junguiana, partindo de proposições que vem sendo elaboradas na teoria social desde os anos 1970. Tal articulação entre saberes tem como objetivo sofisticar a escuta clínica nesta abordagem, nas ocasiões em que o analista junguiano se depara com questões relativas à sexualidade humana.

Para avançar sobre o tema, procuro demonstrar que, dentro do arcabouço teórico elaborado por C. G. Jung, alguns fenômenos podem ser tomados por sua dimensão arquetípica e caracterizados como enunciadores de arquétipos. A conceituação de arquétipo, pela própria definição junguiana, relaciona-se aos potenciais presentes no inconsciente coletivo inacessíveis à psique individual e de caráter primordial, relativos às experiências acumuladas no desenvolvimento da espécie humana (JUNG, 2014). Em oposição à possibilidade de caracterizar um fenômeno como diretamente arquetípico, poderíamos nomeá-lo como enunciador de um complexo. O complexo pode ser compreendido como um centro de energia cujo funcionamento independe da vontade do eu, abastecido por uma dimensão arquetípica e que atua de forma concorrente à consciência. Muitas vezes, o complexo traz prejuízos ao funcionamento consciente pela falta de elaboração dos conflitos que ele traz ao nosso eu (JUNG, 2015), embora também se apresente como concentração de energia de potencial criativo, o que impulsiona o desenvolvimento da personalidade. A ideia de complexo penetrou na cultura desde sua primeira proposição e temos, entre os mais frequentemente citados, o complexo de édipo e o complexo de inferioridade, dentre outros exemplos.

O complexo pode ser particular a uma psique individual, no caso do complexo pessoal, ou a uma dada coletividade, no caso de um complexo cultural, este último uma ampliação teórica proposta por Singer e Kimbles (2004)1. A origem dos complexos parece se relacionar à formação e à consolidação da experiência individual ou cultural acerca de uma determinada função ou experiência psíquica, de modo que temos complexos maternos, paternos, complexo de inferioridade, entre outros que versam sobre nosso funcionamento particular em relação a experiências comuns que nos atravessam como humanos.

No estudo da sexualidade, a diferenciação entre um fenômeno que expresse um arquétipo ou um complexo pode se tornar capital, uma vez que a premissa de imutabilidade e eternidade do arquétipo pode lhe conferir um contorno de verdade ou essência. Na seara dos desejos, verdade ou essência frequentemente são usadas como termos que validam uma norma e, portanto, ditam o que é desejável e indesejável, certo ou errado. Em termos práticos, essa discussão se espalha com diferentes linguagens em nossa sociedade e noutros campos do conhecimento quando pensamos na sexualidade. Basta que pensemos no dilema "nasce-se gay ou se torna gay?" para que entendamos a importância da discussão a respeito do que fala diretamente sobre um arquétipo ou de fenômenos que estariam mediados por complexos.

Ao contrário do funcionamento do complexo, o arquétipo é um construto que antecede a formação da consciência individual; ele é apriorístico e, portanto, não é sensível às mudanças que temos na história de vida pessoal. O arquétipo nos fala sobre uma predisposição inata à formação de certas imagens na psique e ao cumprimento de algumas funções na vida, como a função materna, por exemplo (JUNG, 2014). O que se transforma no decorrer da vida é a expressão arquetípica que ocorre por imagens, pela arte, pelos sonhos e pelos complexos individuais e culturais. Desta forma, argumentar que conceitos que habitam as discussões sobre sexualidade sejam diretamente arquetípicos pode trazer o verniz do essencialismo sobre temas como a homossexualidade e a heterossexualidade, o que não se conforma com os debates contemporâneos na teoria social a respeito destas questões. Além disso, dificultam a ênfase sobre os conflitos que vivenciamos, uma vez que a situação conflituosa ocorre na interação humana aqui e agora. O arquétipo, por psicoide e não humano, não é em si mesmo o palco dos conflitos. Por isso, optei por trabalhar com o conceito de complexo, trazendo a noção de experiência e construção histórica como fundamentais para a elaboração da psique humana.

Precisamos superar certa visão monolítica do par hetero-homossexualidade que o enxerga como características identitárias aplicadas aos sujeitos, possivelmente estanques ao longo da vida, de ordem arquetípica. Uma perspectiva que me parece mais interessante é a visão desta problemática como pertinente a um complexo cultural, denunciador de conflitos que nos atravessam a todos na exploração do fenômeno da sexualidade como foi vivenciado ao longo dos séculos, formando a noção coletiva de como deveríamos, supostamente, vivenciá-lo e compreendê-lo.

Uma vantagem de tratar o fenômeno da heterossexualidade como complexo em vez de arquétipo reside no alinhamento com as propostas contemporâneas da teoria social e da história que fundamentam essa proposta. A partir destas contribuições, paramos de tratar a heterossexualidade como uma predisposição essencial do ser humano, em vez disso tomando-a como uma dentre muitas possibilidades de expressão tanto da identidade2 como da sexualidade. A intenção dessa perspectiva é cessar a visão da heterossexualidade como um dado apriorístico. Em vez disso, podemos pensar a heterossexualidade como o complexo que se forma na psique humana a partir de nossos desafios em elaborar um fenômeno muito mais amplo em sua origem, a própria sexualidade. Talvez esta possa mais facilmente se encaixar na categoria de arquétipo. Também resta importante notar que, como filho do capitalismo, o complexo heteropatriarcal abarca os conflitos que emergem entre os impulsos sexuais e o sistema socioeconômico que erigimos, indisposto por natureza a abarcar múltiplas possibilidades que não sejam padronizáveis e comercializáveis em larga escala.

A escolha do termo complexo heteropatriarcal toma emprestada a noção de Preciado (2017) de que a vivência das opressões e conflitos relacionados à sexualidade não se refere apenas à problemática do desejo entre os opostos homem-mulher; antes, hierarquiza o homem branco heterossexual e suas associações estereotípicas como superiores às questões da heterossexualidade da mulher. Além disso, ressalta as relações de poder construídas numa lógica patriarcal que privilegiam a heterossexualidade do homem. Para estes fins, torna-se mais preciso trabalharmos com a ideia mais ampla de heteropatriarcalidade. A crítica à heterossexualidade neste texto, portanto, deve sempre ser compreendida como crítica à heteropatriarcalidade.

Proponho, quando nos debruçamos sobre a categoria mais clássica a respeito da sexualidade, isto é, o par hetero-homossexualidade, largamente criticado por Foucault (2020), que estejamos tratando de um complexo em vez de um arquétipo. A clareza com a qual o autor nos traz o processo histórico que sustenta as transformações que levam à nossa ideia atual de sexualidade como heterossexualidade instiga a reflexão de que estejamos tratando de uma experiência localizada, portanto parcial e marcada por especificidades, o que melhor se inscreve na ideia de complexo. Essa perspectiva é sustentada por Katz (1996) quando o autor argumenta que a heterossexualidade é um fenômeno histórico recente e de compreensão mutante a partir de sua formulação no século XIX. Ora, se estamos diante de um fenômeno localizado historicamente, pontuado por transformações, de compreensão cambiante e marcado por conflitos ao longo de seu tempo de existência, é mais provável que estejamos tratando de um fenômeno mediado por um complexo, este por sua vez amparado por bases arquetípicas, em vez de discutirmos diretamente o arquétipo que o fundamenta. A noção de complexo como algo de ordem coletiva nos permite dar guarida às teorias construcionistas na psicologia analítica: muito do que vivemos psicologicamente se trata de uma construção sociocultural3. Katz (1996) afirma, ele mesmo, que a heterossexualidade foi uma construção social, isto é, foi mesmo inventada.

Wittig (1992) traz a reflexão da heterossexualidade como um modo de pensamento e, de forma mais sofisticada, um sistema político que ordena a vida pública e privada de todos nós. Tanto esta autora quanto Katz (1996) anunciam, em acordo com Foucault (2020), que a heterossexualidade como a conhecemos serve ao propósito de estabelecimento de normas e padrões que permitem a construção da sociedade capitalista ocidental como a conhecemos, fundamentada na família nuclear heterossexual. Este modelo produz a exclusão de tudo o que é considerado desviante da norma com a finalidade de permitir a acumulação de poder e riqueza por meio da escalabilidade do padrão heterossexual. Tudo o que desvia do objetivo outrora político e posteriormente fabril do casamento heterossexual é excluído e destituído de legitimidade, permanecendo às margens da sociedade.

Este funcionamento pode parecer estranhamente familiar aos conhecedores da teoria dos complexos de Jung (2015). O autor também propõe que a formação de complexos se relaciona à atitude da consciência de apartar uma dimensão da psique do restante do eu, produzindo a exclusão de conteúdos que sejam conflituosos ou dolorosos para o sujeito e que atuam de maneira autônoma. O benefício da dissociação para a consciência está na possibilidade de se identificar como um eu razoavelmente consistente e unificado. Este mesmo eu cuidadosamente desenvolvido, contudo, permanece sob prejuízo de afastar elementos da personalidade por considerá-los estranhos ao seu senso de si mesmo.

Sei bem, na clínica, o quanto do trabalho analítico reside em restabelecer pontes entre um eu individual e os conteúdos que foram considerados estrangeiros a suas identidades e são rejeitados pela consciência. Um movimento similar pode ser observado na dinâmica do preconceito como fenômeno social, vista a dificuldade em nos relacionarmos com as sexualidades que distam da norma heterossexual. O padrão de funcionamento do pensamento heteropatriarcal, mais uma vez, se assemelha à dinâmica tipicamente observada em complexos individuais, o que leva inevitavelmente à erupção de conteúdos sombrios representados por sexualidades dissidentes da norma.

É necessário notar que, na psicologia analítica, somos atravessados por ao menos dois fatos históricos relevantes no estudo da sexualidade. O primeiro é a separação entre Freud e Jung ter ocorrido por uma divergência teórica que tange ao fenômeno da sexualidade, quando Jung (2013a) afirma que a libido não possui fundamento exclusivamente sexual, mas tem o caráter mais amplo de energia psíquica, distanciando-se da psicanálise do início do século XX. Mesmo abrindo esta discordância, o autor enaltece a função da psicanálise em algumas circunstâncias, não tratando mais especificamente das dinâmicas de sexo e desejo de forma aprofundada a partir de seu rompimento com Freud. Este fator constitui hipótese relevante do porquê a sexualidade parece tema pouco explorado na psicologia analítica, afinal, para que estudar um motivo de divergência tão fundamental que, segundo o próprio Jung (2013a), parece ter sido suficientemente abarcado pela psicanálise?

O segundo elemento relevante é autobiográfico: do conhecimento que dispomos, Jung exerceu sua vida como homem branco heterossexual com muita desenvoltura, casando-se com uma mulher branca heterossexual e relacionando-se com inúmeras outras (BAIR, 2004). Quando buscou teorizar sobre o tema do gênero, Jung (2014) fez uma contribuição a partir de um pensamento fundamentalmente heterossexualizado. Em primeiro lugar, propôs o par anima-animus como um componente psíquico inconsciente contrassexual. Afirmou, por dedução, que, como havia encontrado uma figura feminina que emergiu a partir de seu inconsciente, haveria, portanto, uma figura masculina equivalente atuando com função similar no inconsciente das mulheres. Essa incursão teórica na psicologia do gênero não foi fundamentada por pesquisa direta, como no caso da teoria dos complexos; dados bibliográficos secundários, como na teoria dos tipos psicológicos; experiência clínica direta, a partir da qual propôs inúmeros conceitos; ou estudo comparativo das mitologias e religiões, como no caso da teoria arquetípica. Uma hipótese que paira sobre a formulação dos conceitos de anima e animus, a qual estranhamente fugiu aos métodos científicos e rigorosos aplicados por Jung, é a de que ela mesma possa ser atravessada pelo complexo heteropatriarcal que atua sobre nossa forma de pensar e enxergar o mundo. Não haveria qualquer motivo para que o complexo cultural, como conjunto de imagens coletivas a respeito de experiências históricas de difícil elaboração, não afetasse Jung de maneira semelhante, fazendo-o ignorar ou mesmo consentir com estereótipos e reminiscências do trauma sociocultural a respeito da sexualidade que assola o ocidente. Cabe resgatar o próprio autor, quando confessa que, sobre o amor, ele não havia mesmo entendido nada (JUNG, 2005).

Devo explicar o que pretendo ao afirmar que existe um pensamento heterossexualizado. Para isso, faço um pequeno resgate histórico tributário a Katz (1996) sobre o uso das palavras hetero e homossexualidade, rememorando o pano de fundo da medicina do século XIX, a partir da qual se viu nascer também a psicanálise e posteriormente a psicologia analítica. Segundo o autor, o par hetero-homossexualidade é reconhecido pela primeira vez no final do século XIX, na obra Psychopatia Sexualis, do psiquiatra alemão Krafft-Ebing.

Esta obra tem papel fundamental para o estabelecimento da noção de uma sexualidade normal e desviante dentro do novo padrão iluminista europeu no qual os fenômenos são observados para que sejam avaliados e, se necessário, curados. Neste caso, a cura significa adaptação à sociedade heteropatriarcal e a medicina toma um papel que anteriormente pertencia à religião. A partir desta publicação, o tema foi explorado majoritariamente por médicos homens, brancos e heterossexuais, que omitiram o eixo normativo deste par, a heterossexualidade, para concentrar suas explorações no que era considerado um desvio, como no caso da homossexualidade, com vistas à cura-adaptação.

O questionamento do pensamento médico se desenvolve na filosofia e nas ciências sociais, relacionando-se às lutas pelos direitos das mulheres a partir dos anos 1960. Rubin (2017) afirma a existência de um sistema sexo-gênero como um fenômeno histórico que organiza nossas relações. Para Butler (2003), o gênero é uma performance intimamente relacionada com a cultura e, como tal, possui um caráter socialmente construído e mutável. Rubin (2017) não concebe o sexo separadamente do gênero, uma vez que ambos são categorias destinadas à organização social dos nossos desejos e possibilidades. Berry (2014) caminha em perspectiva semelhante no seminal O Dogma de Gênero, dentro da psicologia analítica, anunciando a fixidez de gênero como uma estratégia (hetero)patriarcal de ordenação e controle, tal como fazem as autoras das teorias sociais. A identidade sexual nasce no seio das discussões de gênero e não deve ser confundida com os atos sexuais. É interessante notar que o conceito de fluidez de sexo e gênero é um avanço proposto por mulheres e pessoas LGBTs, brancas e negras, em contrapartida à teorização rígida de divisões e categorias anteriormente propostas por homens brancos heterossexuais na medicina.

Analisando a ideia de heterossexualidade anterior aos séculos XIX e XX, Katz (1996), argumenta existir grave anacronismo na fantasia de que existia homossexualidade como identidade na Grécia Antiga. O autor demonstra que o desejo pelo mesmo sexo ou pelo sexo oposto era vivido como atos em vez de compreendido como aspecto da personalidade individual. A própria noção de indivíduo não existia à época. A nomeação de uma pessoa como heterossexual ou homossexual, segundo o autor, ocorre nos manuais de medicina e chega aos Estados Unidos apenas em 1892. A própria formulação de heterossexualidade passa por mudanças até se estabelecer como norma contra a qual se colocam as demais sexualidades a partir do século XX. A ideia dos homossexuais gregos pode ser considerada mais uma fantasia trazida pelo complexo heteropatriarcal.

A emergência das identidades sexuais é um fenômeno do século XX no continuum histórico que vai tornando prevalente a fantasia do amor romântico e sensual entre indivíduos complementares que formarão uma família. A família será vista, no capitalismo industrial dos séculos XVIII e XIX, como perfeita unidade para produção de pessoas que atuarão de forma escalável na produção das fábricas surgidas com a revolução industrial. É interessante notar a convergência entre as demandas por trabalhadores, a consolidação do conceito de casamento por amor romântico e da identidade sexual alinhada à função reprodutiva. Esta conjunção de fatores parece propiciar a validação de que o sexo e a sexualidade possam ser exercidos de forma sensual, isto é, os atos sexuais podem nesta época ser concretizados e o amor toma forma material em vez do ideal abstrato vivido em épocas anteriores (KATZ, 1996).

O par complementar que produzirá filhos, compreendido então como homem e mulher, se articula no pensamento de forma diferente às modalidades anteriores de interpretação. A ideia de complementaridade também não parece se sustentar na mítica grega, fonte de estudo cara à psicologia analítica. A maioria dos motivos arquetípicos encarnados em personagens não se relaciona a um par fixo homem-mulher, embora possamos observá-lo com suas características específicas no par Zeus-Hera e no par Eros-Psique, os quais parecem fundamentar a ideia de casamento como instituição e união por amor, respectivamente. Entretanto, com mais frequência, observamos mitemas de personagens individuais dotados de fenomenologia própria, como o nascimento de Dioniso, os trabalhos de Hércules, os julgamentos de Atena, entre outros exemplos.

O complexo heteropatriarcal como proponho se aproxima, teoricamente, ao dinamismo patriarcal de consciência (NEUMANN, 1990). Tal funcionamento atua como estruturador de uma discriminação binária dos elementos que vivenciamos. O sexo e o gênero, nesta compreensão, se dividem em dois e permanecem nessa dualidade rígida, jamais se elaborando em três ou mais categorias, fixando-se numa etapa da consciência que traz desafios à própria individuação. Ao se distanciar da profusão dos desejos e não se constituir como um sistema de afetos, o complexo heteropatriarcal assume um papel mais moral e ético, determinando o que é certo e errado em relação a nossos desejos e cumprindo um papel político de organização e ordenação social. Dessa forma, o complexo atua em sua formação mais sombria, transformando em estrutura lógica aquilo que inicialmente era uma pulsão erótica. Tudo é dois. Todo dois é homem e mulher, masculino e feminino. Essa divisão reforça a compreensão da heterossexualidade como fenômeno de validade universal não questionado, o que se anuncia na sociedade contemporânea em exemplos desde as tomadas macho e fêmea das lojas de construção até as articulações entre mulher, feminino e sensibilidade, por um lado, e a identificação do homem com masculino e assertividade, por outro. Estas associações reforçam um binarismo a serviço da manutenção de uma ordem social de exclusão do Eros em sua potência arquetípica. A função dessa dinâmica opressiva se concentra em normatizar maniacamente em vez de possibilitar a vivência erótica.

Roughgarden (2005) fortalece a hipótese da existência de um complexo heteropatriarcal ao afirmar, como bióloga, que as pesquisas no campo das ciências naturais não apontam para o binarismo de sexo-gênero. Ao contrário, a autora lista inúmeras espécies que apresentam mais de dois sexos-gêneros e outras em que há mudança de sexo-gênero durante a vida de um animal. Concluo, baseando-me em Roughgarden (2005), que a leitura de um sistema sexo-gênero dual pode ser vista como uma interpretação cultural nossa. O viés exercido pelo complexo cultural da heteropatriarcalidade nos impele a enxergar um par complementar mesmo onde ele não se apresenta.

Em 1970, a publicação nos Estados Unidos do Gay Manifesto pelo ativista de causas LGBTs Carl Wittman (1970) sintetiza o movimento que emerge naquela sociedade. O documento, quando foi revisado, urgiu as pessoas para considerar atuarem de forma política, como protagonistas de uma mudança social que incluía outros temas, incluindo a luta contra o que ali se compreendia como chauvinismo. O entrelaçamento de temas revela a disposição de parte do movimento LGBT norte-americano da época em reconhecer o caráter político de sua identidade sexual, fundamentando a luta pelo reconhecimento dos direitos pertinentes à sexualidade no campo da política. Neste sentido, o movimento LGBT da época tem mais sucesso em articular a dimensão erótica privada à racionalidade da lógica pública, sem prejuízo entre os campos. O manifesto se torna um documento histórico clássico para o movimento LGBT norte-americano e termina com uma citação de Marcuse (1999, Prefácio Político, p. xxi): "hoje, a luta por Eros, a luta pela vida, é a luta política".

O movimento LGBT brasileiro historicamente interagiu com outras frentes de lutas políticas, participando de inúmeras manifestações a favor do movimento negro e dos sindicatos por melhores condições trabalhistas nos anos 1980 (GREEN, 2018). Formado no final dos anos 1970, o movimento LGBT no Brasil buscou participação na cena política brasileira de forma autônoma, mas também pela via partidária, nos anos 1980 se aproximando do Partido dos Trabalhadores. Nota-se, naquele contexto, uma enorme rejeição à incorporação das pautas do movimento, esclarecendo-se desde então a LGBTfobia que marca o pensamento brasileiro de todo o espectro político. Mesmo dentro do movimento LGBT brasileiro, fica posta a dificuldade em promover relações iguais em relação às mulheres lésbicas e às pessoas trans (GREEN, 2018), mais uma vez reproduzindo o desafio do complexo heteropatriarcal hierarquizante que valoriza o homem branco em detrimento de mulheres e pessoas identificadas com outras possibilidades de sexo e gênero.

A partir das lutas dos anos 1980 e 1990, a questão gay ganha mais espaço na mídia e na política. O avanço da luta por direitos e a nova visibilidade privilegia novamente os homens brancos gays, enquanto o Brasil se mantém ano após ano como o líder mundial em assassinato de pessoas trans, segundo o Grupo Gay da Bahia. A exclusão de mulheres e pessoas trans não é novidade: após os movimentos em reação ao massacre de Stonewall de 1969 nos Estados Unidos, do qual participaram as travestis Marsha P. Johnson, uma mulher trans negra, e Sylvia Rivera, mulher trans latina, esta última é expulsa por homens gays brancos de um palco em uma parada gay de Nova York, em explícita transfobia (DUBERMAN, 2018).

Uma fantasia comum sustentada pelo complexo heteropatriarcal é esta: a heterossexualidade sempre existiu, ao contrário de outras expressões da sexualidade. Quanto menos uma sexualidade se conforma dentro da heterossexualidade patriarcal, seja por semelhança ou oposição a ela, como no caso da homossexualidade masculina branca, tanto mais esta sexualidade será vista como estranha e recém-descoberta. Como nos mostra Katz (1996), a narrativa heterossexual é a de que ela é e sempre foi a norma. Por ser a norma, portanto o normal, ela prescinde de explicações e tem a qualidade daquilo que é eterno e essencial. Todo o resto são fenômenos estranhos que emergem em algum momento, seja a partir da norma ou como desvio indesejado da norma. As sexualidades homoeróticas ou trans seriam, portanto, fenômenos derivados (e desviantes) da heterossexualidade e posteriores a ela, mais recentes, segundo a fantasia.

Um exame histórico apurado, contudo, desmancha no ar tal fantasia sem qualquer dificuldade. Mesmo em um país com dificuldade em manter registros históricos, temos a existência de Xica Manicongo, a primeira travesti identificada na terra brasilis, na cidade de Salvador nos idos de 1591 (JESUS, 2019). Xica Manicongo era uma travesti negra que andava livre pelas ruas da cidade, até a primeira visita da Inquisição no Brasil, o que a obrigou a usar trajes destinados aos homens para se salvar de punições contra sua vida.

A visibilidade das identidades trans e das sexualidades subalternizadas nos ajudam a repensar outra fantasia comum do complexo heteropatriarcal: a de que existem apenas dois sexos-gêneros e suas possíveis combinações. A emergência do gay branco como possível protagonista de algumas circunstâncias numa sociedade tingida por este complexo não causa fissura definitiva em seu funcionamento, já que a combinação homem-homem não rompe com o caráter dual necessário para a constituição da heterossexualidade e do patriarcado. O que ocorre, contudo, ao pensarmos que não há um número pré-estabelecido de sexos e gêneros? E, principalmente, se pudermos pensar que este número não é necessariamente o dois? Mais ainda, como podemos pensar que as sexualidades e os gêneros podem não ser apenas um ou dois dentro da mesma pessoa? São estas as primeiras perguntas que me ocorrem no esforço de questionar o pensamento heteropatriarcal.

A consequência dessa reflexão é a insustentabilidade mesmo do par consciência masculina-figura feminina inconsciente, como propôs Jung (2014). Tal construto é fruto da fantasia heterossexual de dualidade essencial, o que não se comprova quando dialogamos com pessoas trans e outras sexualidades dissidentes da norma. Outro precioso ensinamento de meu fazer clínico, repetido à exaustão por diversos professores e confirmado pela própria experiência, é de que jamais devemos buscar encaixar pessoas nas teorias, conforme a própria obra de Jung nos traz. A função da teoria psicológica, de origem empírica como posto pelo próprio Jung (2015), é poder dar conta dos fenômenos que a vida nos apresenta, jamais tentando encaixar as pessoas em nossas ideias a fim de validar o que foi pensado.

Uma alternativa ao pensamento heterossexual é a contrassexualidade, como nos apresenta Preciado (2017). Segundo o autor, este termo é uma proposta de enxergar o sexo e a sexualidade incorporando suas construções sociopolíticas e de ler o regime heterossexual e suas consequências a partir de outro ponto de vista. Um dos esforços nesta perspectiva é poder questionar a fácil associação entre a sexualidade e a genitália, o que inscreve fatalmente a identidade sexual novamente no par homo-heterossexual e privilegia a genitália aparente, ou seja, a anatomia sexual do homem. Conforme nos mostra Laqueur (2001), na visão do século XIX os corpos eram identificados em seu gênero a partir de uma noção de calor físico: os corpos dos homens eram mais quentes e os corpos das mulheres mais frios e, por isso, mulheres possuíam vaginas, as quais eram uma atrofia do órgão reprodutor devida a falta de calor. Se as mulheres tivessem o nível adequado de calor (como os homens), todos teriam pênis.

Ao explorar a proposta de Deleuze de homossexualidade molecular, Preciado (2017) nos dá visão dessa lógica binária que sustenta o pensamento heteropatriarcal:

Tanto a homossexualidade como a heterossexualidade são produto de uma arquitetura disciplinadora que ao mesmo tempo separa os órgãos masculinos e femininos e os condena a permanecer unidos. Desse modo, toda relação intersexual (isto é, heterossexual), é o cenário do intercâmbio de signos hermafroditas entre almas do mesmo sexo (p. 187).

Aqui, a crítica de Preciado parece residir no furor disciplinar da heterossexualidade que associa e dissocia a genitália ao mesmo tempo, obrigando que uma coniunctio ocorra a partir do encontro de corpos anatomicamente diferentes dentro de uma perspectiva dual. A igualdade se revelaria apenas no plano imaterial, no tocante às almas, e neste sentido a homossexualidade e outras dissidências podem ser toleradas. Mantendo-se o celibato e o segredo, não é problema que alguém confesse impulsos homossexuais porque permanecem no nível da ideia. Este aspecto do complexo heteropatriarcal subsiste a partir da hierarquização do que pode ser sexualizado e generificado para ser vivido no cotidiano material, por um lado, e de outros fenômenos que serão mantidos a uma distância e uma abstração apropriadas, por outro.

No Brasil dos anos 1980, popularizou-se o show de transformistas na TV e foi recorde de vendas numa revista de nudez o corpo de uma das mulheres transexuais mais famosas do país à época. A distância mediada pela TV e pela revista são apropriadas e os corpos dissidentes podem ser sexualizados em segredo, mantendo a estrutura pública da heterossexualidade como o sistema a ser perseguido, jamais questionando sua estabilidade.

Muitas vezes, sequer questionamos a distância que adquirimos dos eventos das sexualidades dissidentes e também não percebemos as associações quase inconscientes entre sexo e genitália que se expressam no preconceito cotidiano. Quantas vezes não ouvi "mas o que fazem duas lésbicas juntas?" numa ode (não)acidental ao falo proferida por tantas pessoas. Por outro lado, muitos colegas identificados como heterossexuais jamais consideraram estranha a ausência de flerte entre pessoas do mesmo sexo em bares e restaurantes que não fossem explicitamente identificados como LGBT ou gay friendly até muito pouco tempo atrás.

Rich (2010) discorre sobre a heterossexualidade compulsória, criticando o modelo que nomeia como heterocentricidade. Neste modelo, a mulher é inevitavelmente levada até o homem como uma espécie de força gravitacional, na qual o desejo é naturalizado e o par complementar homem-mulher é uma fatalidade. A autora denuncia os modos de roubar o poder das mulheres, seja pelo comando do trabalho doméstico numa perspectiva servil e não remunerada, pelo estupro, pelo rapto de seus filhos, por sua constituição como objeto material de valor, entre outros motivos. A existência lésbica, segundo Rich (2010), é continuamente apagada com o objetivo de reforçar a heterossexualidade e colocar as mulheres numa perspectiva sem saída em que precisam se render aos homens e ao suposto desejo inegável por eles.

A subordinação da mulher é fetichizada e erotizada, em processo semelhante à subalternização dos corpos das pessoas trans e travestis. A inferiorização é um atributo inerente ao patriarcado que busca ordenar, discriminar e categorizar sem limites, a despeito das necessidades, desejos e sentimentos daqueles que são categorizados. Atuando sombriamente, reduz-se uma possibilidade a sexualidade a relações de poder e política polarizadas, denunciando a ação do complexo como sabotador de parte da consciência coletiva. Isto leva à intensificação de conflitos dentro da vivência de sexos e gêneros. Uma das alternativas de resistência apontada por Rich (2010) é o estímulo a relações entre mulheres no continuum lésbico, definido como

um conjunto - ao longo da vida de cada mulher e através da história - de experiências de identificação da mulher, não simplesmente o fato de que uma mulher tivesse alguma vez tido ou conscientemente tivesse desejado uma experiência sexual genital com outra mulher. Se nós ampliamos isso a fim de abarcar muito mais formas de intensidade primária entre mulheres, inclusive o compartilhamento de uma vida interior mais rica, um vínculo contra a tirania masculina, o dar e receber de apoio prático e político, se nós podemos ouvir isso em associações como uma resistência ao casamento e em um comportamento, digamos, "exaurido", [...], nós começaremos a compreender a abrangência da história e da psicologia feminina que permaneceu fora de alcance como consequência de definições mais limitadas, na maioria clínicas, de lesbianismo (p. 35).

A suspeita da autora é de que existe um excluído do olhar sobre a sexualidade quando se trabalha sob a ótica da heterocentricidade. Este excluído é a própria psicologia da mulher, a qual pode ser observada mais precisamente nas suas relações com outras mulheres. A autora retira da psicologia da mulher a inevitabilidade do par homem-mulher, libertando o desejo feminino para outras configurações pensadas a partir da fenomenologia de um ser próprio, que é construído a partir de si mesmo e da interação com suas semelhantes. A tentativa aqui é superar o mito da mulher como costela do homem, uma das narrativas embebidas no complexo heteropatriarcal. O continuum lésbico é uma das radicalidades possíveis para dentro do fenômeno da sexualidade, povoada por muitos seres, entre eles este que é a mulher do século XX.

O pensamento junguiano é marcado pela proposição da tensão de opostos. Ao explicar a noção de arquétipo em contraposição a instinto, Jung (2014) recorre às polaridades para explicar o funcionamento psíquico que havia descoberto à época. Entretanto, é no mesmo Jung (2012) em que é explorado o Axioma de Maria, trazido pela alquimista Maria Prophetissa no século III. Ao analisar o axioma, o autor propõe que o caminho da individuação implica o desenvolvimento do elemento inicial, o um, para o dois e, em seguida, o desdobramento para o terceiro, até a formação dinâmica do quarto elemento que retornará ao um transformado. Assim, desenvolvem-se o indivíduo e a coletividade, desdobrando-se e elaborando a tensão entre opostos até que surja o terceiro elemento criativo em direção à totalidade, representada pelo quatérnio. Este, por sua vez, é um estado provisório que retorna ao elemento único para o reinício de um novo processo, no ciclo infindável da individuação. Esse dinamismo do um ao quatro demonstra o caráter mutável da própria polarização no processo de elaboração psíquica, que não se localiza somente na tensão entre dois elementos e cujos elementos que se tensionam não se mantêm necessariamente os mesmos ao longo do processo de elaboração. Em outro momento, Jung (2013b) propõe que, em resultado da tensão de opostos suportada pelo tempo adequado, teremos a formação de um terceiro que inaugurará um novo caminho para o conflito. Novamente, vemos o dois evoluir para o trio de dimensões que indicará uma alternativa para o caminho da individuação.

A partir dessas reflexões, que nos livremos do par complementar como dois termos fixos que se mantêm ao longo do tempo, como o par homem-mulher ou o par homo-heterossexual. Busquemos a superação do pensamento antiquado: a fixação normativa no par complementar e na tensão de opostos, sem considerar o dinamismo que leva ao três e ao quatro para o final retorno ao um e reinício do processo. Em outras palavras, precisamos, como coletividade, tornar obsoleta a formulação de que o dois é a norma. O dois, alternativamente, pode ser visto como um momento no processo de desenvolvimento humano.

O propósito do complexo heteropatriarcal é nos manter a todos na fixidez do par complementar, identificado a partir da função reprodutiva da genitália metaforizada como solução chave-fechadura para todos os conflitos da humanidade. O caminho para dentro do fenômeno da sexualidade implica valorizarmos a possibilidade do par complementar como um estado dinâmico que não se manterá por muito tempo, seja dentro ou fora de nós. Desta forma, o desejo pelo sexo oposto pode se constituir como um evento ou uma ocasionalidade, formando-se como identidade naqueles que assim se construírem, enfim destituído de compulsoriedade. Ninguém deveria ter como obrigação existencial ser dois ou complementar um outro. Permanecer muito tempo no dois, inscrito sob a psicologia de homem-mulher, é interromper a expressão da sexualidade em suas múltiplas possibilidades. É a interdição moderna do desejo e das múltiplas configurações de relação. Em risco, claro, ficam a monogamia, as relações de pessoas que se complementam e o encaixe perfeito, porque já não há mais o que encaixar. Precisamos enfrentar estes medos.

Freud avançou como pôde ao nomear a homossexualidade como perversão. Para sua época, perversão era uma alternativa menos patologizante ou passível de punição que sodomia, possessão demoníaca ou desvio de caráter, outras atribuições das sexualidades dissidentes anteriores à formulação freudiana. Jung explicitou o complexo heteropatriarcal justamente ao propor uma psicologia profundamente heterossexualizada, estruturada a partir de anima e animus, imaginada a partir de uma pretensa dualidade que jamais deixou emergir um terceiro na própria teoria de gênero que formulou. Em certo sentido, avançou e possibilitou que entrássemos na fantasia do par complementar para que pudéssemos sair dela sem que precisássemos matá-la. Para escutarmos quem nos procura no atendimento psicológico, é necessário que superemos o dois como verdade última. Lutemos pelo 3 e o 4. Lutemos pela morte e renascimento da sexualidade, pois é de Eros que mais precisamos, ilustrado por todas as cores que tivermos para vivenciá-lo.

 

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Recebido em: 12/06/2021
Revisão: 01/11/2021

 

 

1 Para os autores, o complexo cultural se refere à área da memória histórica coletiva mobilizada por um afeto, comumente marcada por uma experiência traumática e que possui um fundo arquetípico. Desta forma, complexos culturais atravessam a todos nós em certo grau de coletividade. Podemos, no Brasil, trabalhar com os exemplos da invasão portuguesa e genocídio indígena subsequente, da escravidão e da ditadura civil-militar iniciada em 1964 como possibilidades de pensarmos complexos culturais que permeiam o inconsciente dos brasileiros.
2 A palavra identidade surge aqui para diferenciar as modalidades de dissidência da norma heteropatriarcal. A visibilidade dada às sexualidades dissidentes, quais sejam, a identificação dos corpos com o desejo orientado para outros corpos, no caso das homossexualidades e bissexualidades, expandiu-se para enxergarmos as identidades dissidentes atreladas à sexualidade, como é o caso de pessoas que se identificam como travestis. Neste caso, não se tratam apenas de sexualidades orientadas pelo desejo em direção ao outro, mas inclui a relação da psique consigo própria, o que nos leva a usar o termo identidade ou identidade de gênero juntamente ao termo sexualidade.
3 A perspectiva construcionista trazida por Katz (1996) é corroborada na obra do autor por diversos outros autores e pesquisadores. No campo feminista radical, temos desde Betty Friedman em 1963, Kate Millett em 1970 e Gayle Rubin em 1975 até o feminismo lésbico de Margaret Small em 1970 e Monique Wittig em 1975, como veremos adiante. Nos estudos feministas negros, temos de Angela Davis desde os anos 1960 a Kimberlé Crenshaw que emerge no fim dos anos 1980 com o conceito de interseccionalidade. Na filosofia, vemos a obra de Foucault e a partir da filosofia emerge o campo de estudos de gênero, cujo expoente maior é Judith Butler e sua obra seminal Problemas de Gênero, publicada em 1990.

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