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Psico

On-line version ISSN 1980-8623

Psico (Porto Alegre) vol.46 no.4 Porto Alegre Dec. 2015

http://dx.doi.org/10.15448/1980-8623.2015.4.18480 

ARTIGO ORIGINAL
http://dx.doi.org/10.15448/1980-8623.2015.4.18480

 

Adaptação materna ao transtorno do espectro autismo: relações entre crenças, sentimentos e fatores psicossociais

 

Maternal adaptation to autism spectrum disorder: relationships between beliefs, feelings and psychosocial factors

 

Adaptación materna al trastorno del espectro autista: las relaciones entre las creencias, los sentimientos y los factores psicosociales

 

 

Maíra Ainhoren Meimes; Helena Castro Saldanha; Cleonice Alves Bosa

Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS, Brasil

 

 


RESUMO

Crenças e sentimentos relacionados ao desenvolvimento do filho com Transtorno do Espectro Autismo (TEA) exercem importante papel na adaptação materna. Entretanto, estes fatores nem sempre são compreendidos com base nos aspectos psicossociais associados.
OBJETIVO: investigar crenças e sentimentos de mães de crianças com TEA relacionando-os a fatores psicossociais, com base no metamodelo biopsicossocial de Bradford. Delineamento: estudo de casos múltiplos, transversal e exploratório. Participantes: quatro mães (idade: 38 a 45 anos) de meninos com TEA (idades: 3 anos e 5 meses a 6 anos e 9 meses). Instrumentos: Entrevista de Percepção Materna, Entrevista de Dados Demográficos e Desenvolvimento Infantil e Questionário de Saúde Geral de Goldberg (QSG).
RESULTADOS:
crenças maternas sobre o desenvolvimento infantil, capacidade para identificar habilidades e seu senso de autoeficácia relacionam-se a diversos fatores psicossociais, como percepção dos recursos intra e extrafamiliares, qualidade dos sistemas de saúde. Discute-se que o impacto do diagnóstico pode ser mediado pelos fatores psicossociais.

Palavras-chave: Autismo; Interação mãe-criança; Fatores psicossociais; Estudo de caso.


ABSTRACT

The beliefs and feelings associated with the development of a child with Autism Spectrum Disorder (ASD) play an important part in maternal adaptation. However, these factors are not always comprehended based on associated psychosocial aspects.
OBJECTIVE:
to investigate the beliefs and feelings of mothers of ASD children, associating them to various psychosocial factors based on Bradford’s biopsychosocial metamodel. Boundaries: transversal and exploratory study of multiple cases. Participants: four mothers (aged 38 to 45 years) of ASD boys (ages between 3 years and 5 months and 6 years and 9 months). Instruments: Maternal Perception of Child Interview, Demographic Data and Child Development Interview, Goldberg General Health Questionnaire (GHQ).
RESULTS:
mothers’ beliefs about child development, ability to indentify children’s skills and their own sense of auto-efficiency are related to many psychosocial factors: perception of intra and extra-family resources and quality of health-care systems. It is discussed that the diagnosis impact may be mediated by psychosocial factors.

Keywords: Autism; Mother-child interaction; Psychosocial factors; Case study.


RESUMEN

Las creencias y los sentimientos relacionados con el desarrollo del niño con Trastorno del Espectro Autista (TEA) tienen un papel importante en la adaptación materna. Sin embargo, estos factores no son siempre entendidos en base a los aspectos psicosociales.
OBJETIVO:
investigar las creencias y sentimientos de las madres de niños con TEA y relacionarlos con factores psicosociales, basado en el metamodelo biopsicosocial del Bradford. Diseño: estudio múltiples casos, transversal y exploratoria. Participantes: cuatro madres (edad: 38-45 años) los niños con ASD (edades: 3 años y 5 meses a 6 años y 9 meses). Instrumentos: Entrevista Percepción Materna, Entrevista de Datos  Demográficos y del Desarrollo Infantil y Cuestionario de Salud General de Goldberg (QSG).
RESULTADOS: las creencias maternas sobre el desarrollo infantil, la capacidad para identificar habilidades y su sentido de autoeficacia se relacionan con varios factores psicosociales, como la percepción de los recursos intra y extrafamiliares, la calidad de los sistemas de salud. Se argumenta que el impacto del diagnóstico puede estar mediada por factores psicosociales.

Palabras clave: Autismo; Interacción madre-hijo; Factores psicosociales; Estudio de caso.


 

 

INTRODUÇÃO

O Transtorno do Espectro Autismo (TEA) é uma condição neurodesenvolvimental caracterizada por comprometimentos no desenvolvimento sociocomunicativo, além da presença de comportamentos repetitivos e estereotipados (Associação Psiquiátrica Americana [APA], 2013). A variabilidade das características que compõe o TEA, bem como os diversos aspectos sociais interatuantes na dinâmica familiar repercutem na adaptação familiar a esta condição (Bradford, 1997). A dificuldade na interação social recíproca especialmente os problemas de comunicação, e os comportamentos repetitivos e ritualísticos característicos desta condição representam fortes estressores (Beurkens, Hobson & Hobson., 2012; Semensato, 2013). Além destes, a agressividade, presente em alguns casos, os comportamentos desafiadores, bem como comportamentos mal adaptativos como as automutilações são também considerados geradores de estresse parental (Davis & Carter, 2008), sendo geralmente as mães as mais afetadas (Schmidt & Bosa, 2007). Estes comportamentos podem influenciar negativamente as expectativas dos pais a respeito de seus filhos com TEA e levar a uma redução no senso de competência parental. Schmidt e Bosa (2007) complementam esta noção, ao ressaltarem a importância de se considerar a natureza crônica do TEA, pois isso significa que a família é afetada de formas diferentes, ao longo do seu ciclo vital. As implicações diretas desses estressores são os riscos para o desenvolvimento infantil e para a saúde geral parental, especialmente a materna, já que as mães tendem a ser as principais responsáveis pelos cuidados diretos do filho com TEA (Schmidt & Bosa, 2007).

O metamodelo de Bradford (ver Schmidt & Bosa, 2003, para uma revisão), contempla as diversas variáveis que podem estar envolvidas no processo de adaptação da família frente a uma condição crônica, com foco para a adaptação materna. Segundo o autor, o impacto da doença é visto como um processo cujas variáveis podem conduzir a diferentes níveis de compreensão e ajustamento familiar. Assim, o foco não é a psicopatologia em si, mas as formas como a criança e sua família se comportam frente aos vários desafios, partindo de uma perspectiva sistêmica para o entendimento do fenômeno (Schmidt & Bosa, 2003).

Dentre os aspectos referenciados por Bradford (1997), atenção especial é dada à identificação de crenças, pois há evidências de que esse fator é um importante preditor da adaptação familiar e do próprio paciente e independe da gravidade ou grau de incapacitação de uma determinada enfermidade. Segundo Pinker (2004), todos têm uma "teoria" da natureza humana. Em outras palavras, os pais desenvolvem cognições acerca dos valores, convicções, atitudes acerca do desenvolvimento de seus filhos. Essas teorias influenciam as respostas emocionais e estão implícitas nas decisões que são tomadas e que direcionam, entre outras questões, a maneira de criar os filhos, a forma como os pais controlam o comportamento desses, os objetivos e os valores parentais que eles desenvolvem. Evidências empíricas desta relação são apresentadas por vários autores. Por exemplo, Aquino e Salomão (2011) afirmam que estudos atuais na área da interação social, em contexto de desenvolvimento típico, vêm ressaltando a importância do papel das crenças dos pais com relação à capacidade de comunicação de seus filhos e suas consequências no processo interativo e no desenvolvimento infantil. Estes estudos identificaram correlações entre a percepção parental acerca da intencionalidade comunicativa da criança e a aquisição da linguagem infantil subsequente. Além disso, as autoras ressaltam que tais percepções podem influenciar a) o tipo de input linguístico dirigido às crianças, b) o prazer na interação, c) o sentimento de eficácia dos pais com relação à criança e d) a avaliação que os pais fazem de seus filhos em comparação com outras crianças.

Nesta mesma linha de investigação, Hebert e Koulouglioti (2010) objetivaram revisar a literatura a respeito das crenças dos pais com filho com TEA, dos fatores etiológicos e das expectativas em relação ao desenvolvimento dos filhos. Os autores assumiram que as crenças são baseadas nos valores culturais, nas experiências pessoais, bem como em aspectos como educação, atitudes, família, amigos e comunidade. Dentre os resultados destaca-se que em relação à etiologia do autismo, a crença mais proeminente foi a sua origem genética ou hereditária. Além disso, identificou-se que a trajetória diagnóstica do filho influencia a atribuição parental às causas do transtorno: pais que observaram sintomas nos filhos desde o nascimento atribuíram as causas a fatores genéticos mais frequentemente do que pais cujos filhos apresentaram quadro de regressão das habilidades previamente adquiridas. Esses, por sua vez, associaram, com mais frequência, o TEA a fatores como vacinação e ambientes tóxicos. Fatores de risco pré-natal também foram reportados em muitos estudos, incluindo idade da mãe, uso de cigarro e drogas, medicações, vacinação e doenças maternas. As autoras ainda salientam que, embora tenha havido uma melhora nos serviços de saúde para crianças com autismo, a revisão sugere que o otimismo dos pais sobre o futuro dos seus filhos continua a ser um desafio.

As crenças também foram investigadas por meio do constructo de autoeficácia, na perspectiva da aprendizagem social, sendo este definido como o julgamento do sujeito sobre sua habilidade para desempenhar com sucesso um padrão específico de comportamento (Bandura, 1997). Na área do TEA, Schmidt e Bosa (2007) investigaram as crenças sobre autoeficácia parental em 30 mães de indivíduos com TEA. Para isto, foi utilizada a Escala de Autoeficácia (Sofronoff & Farbotko, 2002). Os resultados revelaram um baixo senso de autoeficácia em algumas áreas, tais como a dificuldade infantil de trocar de turnos durante conversas e fixar o olhar quando interagindo com parceiros. Em outras, como os movimentos estereotipados e os rituais comportamentais da criança, este senso mostra uma tendência a estar mais preservado. Além das crenças, a literatura tem apresentado uma grande variedade de sentimentos vivenciados por essas famílias, sugerindo que cada uma apresenta recursos diferentes para enfrentar as dificuldades com seus filhos (Poslawsky, Naber, Van Daalen, & Van Engeland, 2014; Semensato & Bosa, 2013). Por exemplo, em alguns estudos, pais de filhos com TEA reportam o impacto negativo nos seus sentimentos em relação aos filhos e sua conduta parental, quando comparados com pais de crianças com desenvolvimento típico (Donenberg & Baker, 1993). O sentimento de culpa tende a ser frequente e relaciona-se à responsabilidade que os pais atribuem a si mesmos pelo diagnóstico do filho (Dale, Jahoda & Knott, 2006).

Ainda que o enfoque da maioria das pesquisas acerca das famílias de pessoas com TEA venha demonstrando o impacto negativo desse diagnóstico na saúde mental e psíquica dos pais, sobretudo das mães, alguns estudos têm tratado desse assunto sob outro prisma. Por exemplo, alguns pesquisadores enfatizam os aspectos adaptativos das famílias, que contribuem para o seu processo de adaptação à doença crônica, como é o caso das estratégias de enfrentamento utilizadas, da qualidade das relações familiares, do suporte social recebido (Marques & Dixes, 2011; Semensato, 2013) e do nível de escolaridade materna. Sobre esse último, estudos com a população com desenvolvimento típico revelam que o risco de um atraso no desenvolvimento psicomotor infantil tem uma correlação negativa com a escolaridade da mãe (Halpern, Giugliani, Victora, Barros, Horta, 2000). Isso porque essa variável parece ser relevante no nicho de desenvolvimento infantil, pois se relaciona às cognições parentais e aos conhecimentos sobre desenvolvimento infantil (Seidl de Moura et al., 2004). De fato, Bradford (1997) salienta que o apoio conjugal e social exerce uma função importante na adaptação das famílias que possuem um membro com alguma condição crônica. Ekas, Lickenbrock e Whitman (2010) examinaram a relação entre múltiplas fontes de apoio social (e.g., apoio da família, do cônjuge e de amigos), o otimismo e o bem-estar entre as mães de crianças com TEA. O apoio social foi referenciado como um mediador e moderador do otimismo e do bem-estar materno. Os resultados revelaram que o apoio familiar foi associado ao crescimento do otimismo. Este, por sua vez, previu maiores níveis de respostas maternas positivas em relação à criança. Da mesma forma, o apoio do cônjuge e de amigos foi diretamente associado às respostas maternas positivas.

Por sua vez, Benson e Kersh (2011), em seu estudo de caráter longitudinal, analisaram o impacto da qualidade conjugal em três indicadores de ajustamento psicológico de mães de crianças com TEA: humor deprimido, eficácia parental e o bem-estar subjetivo. Os resultados indicaram que a qualidade conjugal foi um preditor significativo de ajustamento psicológico materno. Mais especificamente, essa variável não se correlacionou com a depressão materna e predisse maiores níveis de eficácia parental e de bem-estar materno.

Assim, embora o reconhecimento de dificuldades no desenvolvimento de um filho possa ser considerado um estressor em potencial, entende-se que os pais podem ou não sofrer os efeitos de um estresse real. Nessa perspectiva, Konstantareas, Homatidis e Plowright (1992) salientam que os efeitos adversos de um evento dessa natureza (no caso um filho com TEA) vão depender de uma complexa interação entre a severidade das características próprias da criança e as características de personalidade de seus pais, bem como a acessibilidade a recursos sociais e comunitários. Dessa forma, a presença de um membro com TEA na família não representa necessariamente um evento adverso para as mães, desde que o impacto deste seja mediado por uma rede de apoio social, pela percepção e identificação dos recursos intra e extrafamiliares, por estratégias efetivas de enfrentamento e pela qualidade oferecida pelos sistemas de saúde (Bradford, 1997; Schmidt & Bosa, 2007). Desta forma, é interessante investigar-se não apenas as crenças e os sentimentos por si só, mas compreendê-los por meio da identificação de suas relações com os fatores psicossociais que podem influenciar a sua expressão.

 

OBJETIVO

O objetivo deste trabalho foi investigar as crenças e sentimentos maternos referentes ao diagnóstico, ao desenvolvimento infantil e a estratégias de manejo do comportamento da criança, relacionando-os aos fatores psicossociais (nível de escolaridade materna, jornada de trabalho, saúde mental com foco no estresse psíquico, estado civil, apoio conjugal e social) presentes no contexto de vida das mães.

 

MÉTODO

Delineamento

Trata-se de um estudo de casos múltiplos (Yin, 2004) de cunho transversal, do tipo exploratório. Dessa forma, buscou-se investigar semelhanças e particularidades entre os casos analisados.

Participantes

Participaram desse estudo quatro mães (entre 38 a 45 anos de idade) de meninos com autismo (com idades entre 3 anos e 5 meses a 6 anos e 9 meses).

Instrumentos

1. Entrevista de Dados Demográficos e Desenvolvimento da Criança (adaptado de Bosa, 1998). Entrevista semiestruturada com informações sobre dados clínicos da criança e informações demográficas e psicossociais da família, tais como nível de escolaridade materna, estado civil e jornada de trabalho.

2. Entrevista de Percepção Materna: Entrevista semiestruturada, desenvolvida especialmente para este estudo e utilizada para investigar as crenças maternas acerca dos problemas de desenvolvimento da criança, nível de informação sobre a patologia, dificuldades enfrentadas no convívio com a criança, apoio social e conjugal.

3. Questionário de Saúde Geral de Goldberg (QSG) – adaptação Brasileira (Pasquali, Gouveia, Andriola, Miranda, & Ramos, 1994).1: Trata-se de um instrumento que avalia a saúde mental a partir de 5 fatores (Estresse Psíquico; Desejo de Morte;

Desconfiança no Próprio Desempenho; Distúrbios do Sono; Distúrbios Psicossomáticos) e também produz um escore geral de distúrbios mentais. Utilizado para avaliar o fator psicossocial saúde mental materna, com foco nos níveis de estresse psíquico.

Procedimentos e análise dos dados

As quatro entrevistas maternas foram analisadas a partir do método de análise de conteúdo proposto por Bardin (1979) e complementado por Laville e Dionne (1999). Utilizou-se o modelo misto de categorias, com a utilização de categorias a priori e a posteriori. Considerações éticas: O presente estudo foi aprovado pelo comitê de ética do Instituto de Psicologia sob o nº 17805813.1.0000.5334. Os dados analisados provêm do banco de dados do Núcleo Integrado de Estudos e Pesquisa em Transtornos do Desenvolvimento (NIEPED), UFRGS, com acesso restrito aos pesquisadores envolvidos no projeto. Os participantes, na ocasião da coleta, preencheram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente, apresentam-se as principais informações familiares na Tabela 1 e, posteriormente, os resultados da análise de conteúdo. O Anexo 1 apresenta a matriz com as categorias e subcategorias de análise. O tema e as categorias provenientes da análise de conteúdo serão apresentados em negrito, e as subcategorias sublinhadas.

CASO 1

Tema: Crenças e sentimentos

Na categoria Impacto do diagnóstico da criança verificou-se que esta mãe refere esperança de cura do filho, com base na crença de que o autismo não é algo constitutivo, mas sim "adquirido" após o nascimento: "(...) por eu achar que o I. não tenha nascido

 

 

assim, eu acredito na cura (...)". Esta crença, por sua vez, reveste-se de tristeza, aflição e certo inconformismo com a realidade: "eu fico muito triste de me lembrar assim, poxa vida eu tive um filho tão sadio, nunca tive problemas de saúde, né. Por que será teve que ser com o I., né?" E também frustração/decepção: "o I. pra mim é como se fosse uma criança normal. Só que como eu sei que não é, eu fico nervosa". A mãe relata também suas crenças sobre as características da criança, cujas subcategorias revelam o foco tanto em suas potencialidades (aspectos positivos), "eu acho assim que ele tá até indo bem, sabe, eu tô sentindo que ele tá desenvolvendo, sabe?", quanto em seus comprometimentos (aspectos negativos): "Ele não progrediu muito (...) praticamente dizendo quase nada" algo que desperta frustração "(…) e uma das coisas que eu mais sinto é ele não me chamar, sabe". A frustração materna torna-se mais evidente ao comparar seu filho a uma criança mais jovem: "Ontem mesmo no médico, uma baixinha lá, que tinha feito 2 anos (...) e escrevendo: ‘Olha, papai, olha aqui, mamãe, olha o que eu fiz, olha, isso aqui é tu, isso aqui é tu. Essa aqui é a caneta, aqui é o papel.’ Tudo a criança dizia, sabe, fiquei parada olhando, sabe. Mas não é que eu fique assim sentida por isso, não, mas eu queria muito ouvir, sabe?". Em relação às crenças sobre o Autismo, emergem novamente relatos que refletem os comprometimentos na comunicação. Esta mãe também desenvolveu suas próprias crenças sobre as "causas"(etiologia) do autismo, pois, por vezes, parece acreditar em fatores genéticos e/ou hereditários que teriam sido transmitidos pelo pai e, outras vezes, atribui as causas a fatores emocionais, deixando clara a incerteza e o desconhecimento gerados pelo impacto do diagnóstico. Quanto as crenças sobre a rede de apoio, essa percebe rede de apoio social restrita pelos familiares, afirmando que nenhum deles soube lhe alertar a respeito do estado de seu filho, bem como não a ajudam na compreensão do diagnóstico. Revela, entretanto, sentimento de amparo quanto ao apoio dos profissionais, identificado pela equipe profissional que acompanha seu filho: "eu tô vendo que ele tá sendo bem tratado, tá com uma equipe boa da clínica que eu consegui". Não foram identificados relatos referentes ao papel do pai nos cuidados com o filho, sugerindo falta de apoio percebido por parte do ex-cônjuge.

Relação com os aspectos psicossociais

A análise da entrevista revelou que o impacto do diagnóstico nesta mãe parece ter sido intenso e demarcado por dúvidas, incertezas e tristeza, as quais se intensificaram em decorrência de uma rede de apoio restrita, entre outros. O senso de desamparo conjugal contribui para esse panorama, tendo em vista ser essa mãe separada do marido e não relatar nenhum tipo de auxílio por parte do ex-cônjuge. Benson e Kersh (2011) indicaram que a qualidade conjugal foi um preditor significativo de ajustamento psicológico materno em termos de humor deprimido, eficácia parental e o bem-estar subjetivo. Soma-se a isso os comprometimentos característicos do autismo, com destaque para as dificuldades de comunicação, que parecem explicar, em parte, as dificuldades maternas. A literatura, de fato, refere que a vulnerabilidade da saúde materna é explicada não apenas pelo impacto do diagnóstico, mas também pelas condições do desenvolvimento individual da criança (Aquino  & Salomão, 2011; Davis & Carter, 2008). Discute-se ainda o fato dessa mãe ter abdicado de sua vida profissional para se ater integralmente aos cuidados do filho. O impacto do TEA na vida profissional materna é discutido na literatura (Tunali & Power, 2002), que aponta para o fato de serem as mães as que mais sofrem ajustes de planos e expectativas em sua vida pessoal, além da intensa dedicação e prestação de cuidados ao filho (Fávero & Santos, 2005). O nível de escolaridade materna também pode ser um fator que influencia negativamente o impacto do diagnóstico e, portanto, na adaptação materna à condição de saúde do filho. (Halpern et al., 2000; Seidl de Moura et al., 2004). Ainda, há presença de níveis elevados de estresse (de acordo com o QSG materno). Sobre isso, as mães tendem a apresentar altos níveis de estresse (Baker, Messinger, Lyons, & Grantz 2010; Blacher, Baker & Kaladjian, 2012; Dolev, Oppenheim, Koren-Karie, & Yirmiya, 2009), sendo que esse sintoma é um dos aspectos mais frequentemente pesquisados entre as famílias de crianças com TEA (Davis & Carter, 2008).

CASO 2

Tema: Crenças e sentimentos

Na categoria impacto do diagnóstico da criança foram identificadas as seguintes subcategorias: culpa, angústia, esperança e determinação. Observa-se que o sentimento de culpa materno relaciona-se àquilo que a mãe atribui às causas do autismo no filho: "Às vezes eu penso que, de repente, ele ficou assim por isso, por ele não ter alguém que tentasse fazer ele desenvolver, né?" e se questiona "Será que foi porque eu larguei ele na mão de pessoas diferentes...". Nesse ínterim expõe seu possível sentimento de culpa "se eu tivesse percebido, né, antes" e insegurança: Será que eu fui assim tão desleixada como mãe, que não dei importância, né, pra isso, né...". Dessa forma, expõe a angústia que sente ao ter de lidar com essa situação: "bah, entrei até em estado de depressão, tomei, fiz tratamento e tudo". Apesar disso, refere esperança quanto ao desenvolvimento do filho e afirma sua determinação em seguir em frente e ajudá-lo da melhor forma possível: "Não pode é ficar parado, esperando que as coisas aconteçam, tem que fazer acontecer".

A mãe também relata suas crenças frente as práticas parentais, cuja subcategoria Autorresponsabilização materna revelou-se proeminente: "Porque eu acho que não adianta só eu saber alguma coisa, eles também querem saber e eu tenho que passar isso aí pra eles, né?". Dessa forma, coloca para si a responsabilidade de informar o restante da família (marido e filha) a respeito da saúde do filho. A autorresponsabilização recai também sob a crença de que a sintomatologia do filho é explicada pelo seu mau desempenho enquanto mãe. Isso permite que essa mãe atribua a si todo e qualquer compromisso com o filho, inclusive o manejo com o resto da família. Essa angústia relatada pela mãe também gera dúvidas sobre o futuro: "Como que eu vou agir com ele em casa (...)".

Esta mãe também expõe suas crenças sobre as características da criança, cuja percepção dos aspectos positivos da criança predominaram sobre os aspectos negativos. "Na hora que ele ta brabo pra mim é a maior dificuldade" (...) "porque no mais ele é uma criança muito querida e carinhosa". Com relação ao Autismo esta mãe também desenvolveu suas próprias crenças sobre as "causas" (etiologia) do autismo, caracterizadas pela crença de que alguma situação traumática seja o motivo do diagnóstico "eu penso assim que ele sofreu (...) algum trauma". Também, aparentemente, parece atribuir ao período gestacional, embora revele não terem ocorrido quaisquer intercorrências: "Eu fiz dois pré-natal, pensa bem, me cuidei e tudo e de repente ele ficou assim".

As crenças sobre a rede de apoio revelaram que esta mãe percebe rede de apoio social e conjugal ampla: "eu e meu marido e minha mãe, a gente que cuida dele". Quanto à relação com profissionais, o desamparo mostrou-se evidente, tanto com o cuidador da criança: "Descobri que ela deixava ele muito sozinho e ficava tomando chimarrão com outras pessoas", quanto com profissionais da saúde: "(...) porque o primeiro médico que diagnosticou o R., (...) além do diagnóstico do autismo, ele me disse que o R. ia ser vegetal (...) que ele não ia ter uma vida própria (...) ele me deixou assim apavorada".

Relação com os aspectos psicossociais

A análise da entrevista revelou que o impacto do diagnóstico nesta mãe parece ter sido demarcado por muita culpa, levando-a a atribuir para a si a responsabilidade pelos cuidados com o filho e o manejo da situação familiar. Nesse sentido, dados empíricos revelam que as atribuições às causas e o curso do diagnóstico no filho têm impacto no bem-estar materno (Dale et al., 2006). Há percepção de ampla rede de apoio conjugal e social, sendo que muitos estudos na área vêm indicando a rede de apoio como possíveis fatores protetivos na saúde geral materna e, consequentemente, na interação mãe-criança (Cappe, Wolff, Bobet, & Adrien 2011; Ekas et al., 2010; Lickenbrock, Ekas, & Whitman, 2011). Contudo, há percepção de falta de apoio por parte dos profissionais, bem como o relato de experiências traumáticas. Nesse sentido, o metamodelo de Bradford (1997) revela a importância dos acessos aos serviços de saúde e a rede de apoio dos profissionais como fundamentais para a compreensão e auxílio nas dificuldades do diagnóstico de TEA. O preconceito e os comportamentos agressivos do filho também são causa de preocupação e frustração materna. Apesar disso, essa mãe consegue perceber e valorizar as potencialidades do filho, revelando esperança e ímpeto em buscar fontes de auxílio. De fato, a literatura revela que o impacto do diagnóstico de autismo nas mães pode variar dependendo se elas enfatizam mais os atributos negativos e deficiências da criança, por exemplo, problemas de comportamento e a gravidade dos sintomas (Ekas & Whitman, 2010; Phelps, McCammon, Wuensch, & Golden, 2009; Pottie, Cohen, & Ingram, 2009) ou os seus atributos positivos e realizações (Hastings & Taunt, 2002).

CASO 3

Tema: Crenças e sentimentos

No que tange aos sentimentos, na categoria impacto do diagnóstico da criança revela-se a culpa acerca do diagnóstico do filho, com base na crença de que a situação de saúde da criança seja devida a gravidez tardia: "O que que eu tinha que deixar vir mais essa criança depois de mulher velha, né". Soma-se a isso o sentimento de injustiça imbricado na situação familiar: "o que que aconteceu comigo pra eu ter uma criança assim!". Todavia, foi identificada a determinação desta mãe em lidar com a situação: "eu quero ficar cuidando do meu filho até o dia que ele puder se defender sozinho, né". Dentre os sentimentos referentes às práticas parentais, há os relacionados à impotência: "ele fica brabo porque a gente não entende e eu fico naquela tristeza de não poder entender" e à autorresponsabilização materna, com foco no papel paterno: "Eu não sei, a gente que é mãe, a gente sempre quer, né, ficar mais com filho. Não é todo pai hoje em dia que quer ficar com o filho".

Quanto às crenças acerca das características da criança foi possível observar que, apesar de ter sido identificada a subcategoria dificuldade da criança (aspectos negativos), mais especificamente sobre o deficit comunicativo infantil ("tem hora que a gente até entende bem a criança, mas tem dia que não se entende nada"), esta mãe elencou diversas potencialidades (aspectos positivos): "Ele é muito carinhoso..." e afirma "Agora ele tá ficando esperto". Esta mãe desenvolveu suas próprias crenças sobre as "causas" do autismo (etiologia), cujo conteúdo atrela-se a algo ocorrido durante a gravidez, apesar de relatar que o período gestacional ocorreu sem maiores intercorrências. Atribui-se a isso as poucas informações que essa detém a respeito do transtorno: "(...) autista pra mim eram essas crianças que têm a Síndrome de Down, pra mim era tudo a mesma coisa". Quanto às características do TEA (Autismo) refere "eu acho uma coisa muito chata, uma coisa que deprime muito uma família inteira (...)". Além disso, parece associar ao TEA aquilo que observa em seu filho: "Isso eu já sei que é coisa do autista mesmo, né, que o autista chora quando dá vontade e daqui a pouco já ri".

As crenças sobre a Rede de Apoio revelaram que esta mãe a percebe de maneira ampla por parte da família e dos amigos. Quanto à relação com profissionais, observou-se a percepção de amparo: "A psiquiatra me disse ‘Tá no começo do autismo, tu fez muito bem em me trazer aqui que eu já vou encaminhar pra clínica’ ".

Relação com os aspectos psicossociais

A análise da entrevista mostrou que o impacto do diagnóstico nesta mãe parece ter sido marcado por dúvidas e incertezas, as quais se intensificaram em decorrência da pouca informação materna sobre o transtorno. Apesar disso, a mãe revela determinação nos cuidados do filho, como buscas por fontes de informação para a melhor compreensão do TEA. Embora ela revele culpa e tristeza, percebe uma ampla rede de apoio social e conjugal (esse último reportado pela mãe, na entrevista de anamnese), cujo sentimento de amparo parece auxiliá-la. Isso parece incidir no bem-estar materno, além de auxiliá-la a lidar com as adversidades de seu contexto familiar (Benson & Kersh, 2011; Ekas et al., 2010; Semensato et al., 2010). As dificuldades do filho, com foco no comprometimento na comunicação, a levam ao sentimento de impotência; apesar disso, essa mãe revelou que é capaz de elencar diversas potencialidades do filho, possivelmente minimizando o impacto do diagnóstico e auxiliando-a no manejo da situação, sendo isso um fator protetivo para a adaptação materna em contexto de TEA (Hastings & Taunt, 2002; Hutman, Siller, & Sigman, 2009).

CASO 4

Tema: Crenças e Sentimentos

Na categoria sobre o impacto do diagnóstico da criança, foram identificadas as seguintes subcategorias: desejo e esperança. Pode-se verificar que esta mãe refere esperança de cura, com base na crença de que o quadro atual do filho possa ser apenas uma fase transitória: "eu acho também que, que essa fase aí pode ser transitória, né? Que, (...) de repente ele possa corresponder de alguma forma, algum objetivo mais claro que a gente espera, né?" e afirma "Então a gente não vai esperar milagre, né, a gente vai esperar alguma coisa boa, que alguma coisa boa seja construída com ele". O desejo materno refere-se à melhora da linguagem e da comunicação do filho e expõe: "Toda mãe que tem um filho com um problema (...) ela tem vontade que ele se pareça o mais natural possível, né, o mais normal possível. (...)". Apesar disso, quanto às práticas parentais, predominaram os sentimentos de impotência:"eu tô virando uma escrava dele, né?" e insegurança "Se eu tivesse ainda condições assim de tê-lo num local, uma escola especializada (...). E que se ele ficar comigo, quanto mais o tempo for passando, mais difícil vai se tornando isso aí pra ele, pro mundo dele, né".

A mãe relata também suas crenças sobre as características da criança, cujas subcategorias revelam o foco tanto em seus aspectos positivos: "Me agrada que ele é uma criança extremamente carinhosa, ele procura a gente e abraça e beija (...), quanto em seus comprometimentos (aspectos negativos): "ele deve se sentir incomodado de não poder se comunicar, de falar correto com a gente, né". Sobre o Autismo esta mãe também desenvolveu suas próprias crenças sobre as "causas" do autismo (etiologia), as quais tende a associar aos problemas decorrentes no parto: "eu acho que pode ser orgânico, mas tem muito a ver com o problema do parto (...) com o sofrimento do parto pelo qual ele passou (...)". Sobre as características do autismo, as crenças focam-se naquilo que ela observa e interpreta no filho: "(...) é um problema onde a criança se fecha no mundo dela, não participa do mundo da gente (...)". Sobre a categoria relativa às crenças sobre a Rede de Apoio, foi possível identificar a percepção de apoio conjugal restrito, no referente à divisão dos cuidados com o filho: "(...) e aí eu me pergunto, nessas horas ele precisava do pai, né? Como é que eu vou fazer, né?".

Relação com os aspectos psicossociais

A análise da entrevista revelou que o impacto do diagnóstico nesta mãe parece ter sido intenso e demarcado pelas dúvidas e inseguranças sobre a própria capacidade em lidar com o filho. De acordo com o modelo psicossocial de Bradford (1997) o baixo senso de autoeficácia materna pode ser visto como o resultado do uso reiterado de estratégias de enfrentamento dos problemas relacionadas ao comportamento do filho pouco adaptativas (no caso com destaque para a agressão). Revela esperança na cura do filho, calcada na crença de que o TEA pode ser um quadro transitório, evidenciando sua dificuldade em aceitar o diagnóstico. Atribui-se às dificuldades maternas, principalmente à insegurança em lidar com as demandas do filho de forma satisfatória e à dificuldade a aceitação do diagnóstico, a falta de apoio social e conjugal percebida e a possível restrita rede de saúde. Conforme descrito na literatura, esses fatores revelam-se prejudiciais ao bem-estar materno (Bromley, Hare, Davison, & Emerson, 2004; Lickenbrock et al., 2011).

Sobre as dificuldades de comportamento da criança, o estudo de Schmidt et al. (2007) mostrou que o comportamento agressivo de pessoas com autismo é identificado por suas mães como estando entre as maiores dificuldades para lidarem com o filho. Schmidt (2004) relata ainda que os altos níveis de estresse encontrados nas mães de pessoas com autismo encontram-se relacionados a fatores como o excesso de demanda de cuidados diretos do filho, isolamento social e escassez de apoio social. Muitos estudos ainda apontam para a necessidade de um ajuste de planos e expectativas, bem como uma intensa dedicação e prestação de cuidados ao filho (Fávero & Santos, 2005; Tunali & Power, 2002). De fato, essa mãe abdicou de sua vida profissional para cuidar do filho.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise de conteúdo empregada permitiu observar tanto fatores psicossociais que facilitam, quanto que dificultam a adaptação materna em contexto de TEA, sendo esses relacionados às crenças e aos sentimentos investigados. Verificou-se fatores protetivos para a saúde mental materna e, consequentemente, para o impacto do diagnóstico de TEA nas mães: o apoio social e conjugal, a capacidade de observar aspectos positivos nas habilidades infantis, impacto do diagnóstico na vida social materna, possivelmente minimizado pela vida profissional ativa de algumas das mães do estudo. Com base no modelo proposto por Bradford (1997), isso tem um impacto direto nas estratégias de enfrentamento em relação ao TEA, sendo que tais evidências foram identificadas nesse estudo.

Foi possível observar que, de alguma forma, as quatro mães participantes do estudo relataram o sentimento de culpa quanto ao diagnóstico do filho, os quais refletem as crenças sobre o TEA. Os quatro casos evidenciaram que uma das maiores dificuldades para lidar com o filho é o comprometimento na comunicação. A falta de compreensão da criança é geradora de intensa frustração e sofrimento materno.  Esse ínterim revela o quanto essa característica impacta os pais e repercute em sofrimento parental. 

Foi possível observar que alguns fatores psicossociais podem influenciar negativamente a adaptação materna em contexto de TEA, quais sejam: a falta de apoio social (suporte social) e conjugal (padrão de interação familiar), pouco acesso aos serviços de saúde (sistemas de saúde), sobrecarga materna devido às características infantis (características individuais), desafios impostos pela doença (desafios específicos relacionados à doença), dificuldades em observar aspectos positivos nas habilidades infantis (crenças sobre saúde). Somam-se a isso, as dificuldades em reaver estratégias de enfrentamento da doença, além da abdicação à vida profissional que incide negativamente no impacto do diagnóstico na vida social da mãe. Sabe-se que a capacidade parental de identificar habilidades nas crianças, sejam estas com desenvolvimento típico ou com autismo, gera ganhos à adaptação familiar. Contudo, para que isso ocorra é necessário que o impacto do diagnóstico seja mediado por uma rede de apoio social, pela percepção e identificação dos recursos intra e extrafamiliares, por estratégias efetivas de enfrentamento e pela qualidade oferecida pelos sistemas de saúde.

Esse estudo verificou que as crenças e sentimentos maternos em relação ao diagnóstico, desenvolvimento infantil e estratégias de enfrentamento não podem ser compreendidas de maneira linear, isto é, a partir de uma lógica de causa e efeito da patologia. A relação com os fatores psicossociais interatuantes em contexto de TEA revela a importância de se compreender o fenômeno de forma global e dinâmica. Nesse sentido, o metamodelo psicossocial sistêmico proposto por Bradford (1997), ainda que desenvolvido para a compreensão psicossocial das doenças orgânicas,  mostrou-se uma ferramenta adequada na área de TEA. Este modelo permitiu a identificação dos fatores interatuantes no contexto de vida dessas mães, ao extrapolar a análise de variáveis isoladas para a compreensão global do fenômeno.

As discussões a respeito do impacto do diagnóstico do autismo nas mães apontam para a importância da intervenção familiar o mais cedo possível. Assim, intervenções que levem em consideração os desafios específicos de crianças com TEA e os fatores psicossociais interatuantes em contexto de adaptação familiar, conforme propõe Bradford (1997), podem ser particularmente úteis na melhoria da disponibilidade emocional materna a respeito de seus filhos no contexto de TEA.

 

 

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Autores:
Maíra Ainhoren Meimes – Mestre, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Helena Castro Saldanha – Iniciação Científica, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Cleonice Alves Bosa – Doutor, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Endereço para correspondência:
Maíra Ainhoren Meimes
Rua Ramiro Barcelos, 2600, sala 110 – Santana
CEP 90035-003  Porto Alegre, RS, Brasil

Recebido em: 08.09.2014
Aceito em: 06.10.2015

[1] Atualmente este teste encontra-se em situação desfavorável em termos de utilização clínica, segundo site do SATEPSI, pois não foram reapresentados estudos de revisão. Contudo, na época em que foi realizada a coleta de dados do projeto maior, cuja amostra desse estudo provém, a situação era inversa.

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