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Psicologia Clínica

versão impressa ISSN 0103-5665versão On-line ISSN 1980-5438

Psicol. clin. vol.30 no.3 Rio de Janeiro set./dez. 2018

http://dx.doi.org/10.33208/PC1980-5438v0030n03A04 

SEÇÃO TEMÁTICA – QUESTÕES CONTEMPORÂNEAS: GÊNERO, FEMINISMO, MIGRAÇÃO

 

Singulares deslocamentos na experiência psíquica de migrar

 

Singular displacements in the psychic experience of migration

 

Singulares desplazamientos en la experiencia psíquica de migrar

 

 

Alexandra Garcia GrigorieffI; Mônica Medeiros Kother MacedoII

IMestra em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto Alegre, Brasil. alexandra.grigorieff@hotmail.com
IIDoutora em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e Professora Permanente do Programa de Pós-Graduação em Psicanálise: Clínica e Cultura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Brasil. Bolsista de Produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

 

 


RESUMO

Após o grave terremoto ocorrido no Haiti em 2010, um expressivo número de haitianos migrou para o Brasil, em busca de novas possibilidades de vida. Este artigo apresenta alguns elementos históricos, políticos e econômicos do Haiti, bem como aborda especificidades sobre o processo de migração haitiana para o Brasil. Tem-se como objetivo central destacar a condições do sujeito na experiência migratória, bem como a relevância da atenção direcionada àquele que migra. Tomando como eixo as proposições freudianas sobre as experiências de luto e melancolia no sentido de modalidades relativas aos investimentos e desinvestimentos psíquicos por parte do sujeito, ilustra-se, a partir da narrativa de um migrante haitiano, aspectos que permitem identificar riscos decorrentes da vulnerabilidade psíquica. A ilustração narrativa integra um corpus de dados derivado de uma pesquisa qualitativa realizada com migrantes haitianos em uma universidade do sul do país. Evidencia-se a relevância da reflexão a respeito da implicação de fatores subjetivos no processo migratório, os quais permitem desvelar um universo marcado por complexidades psíquicas e existenciais, bem como o potencial da prática de pesquisa como modalidade de escuta à singularidade presente em um fenômeno humano.

Palavras-chave: migração; sujeito migrante; psicanálise; sofrimento psíquico.


ABSTRACT

After the severe earthquake that took place in 2010 in Haiti, a significant number of Haitians has migrated to Brazil, seeking new opportunities in life. This article presents some historical, political and economic facts about Haiti, and considers specifics about the Haitian migration process to Brazil as well. Its main objective is to highlight the subjects' conditions in the migration experience, as well as the relevance of the care towards those who migrate. Having as guidelines the Freudian propositions about grief and melancholy, deemed as modalities related to the psychic investments and disinvestments by the subjects, a Haitian migrant's narrative has been used to exemplify aspects that allow the identification of risks resulting from psychic vulnerability. The sample narrative is part of a data corpus gathered in the course of a qualitative research carried out with Haitian migrants in a university in the South of the country. It makes clear the relevance of taking into consideration the import of subjective factors in the migratory process, which allows the unveiling of a context characterized by psychic and existential complexities, as well as the research practice potential as a modality of listening to the singularity present in a human phenomenon.

Keywords: migration; migrant subject; psychoanalysis; psychic suffering.


RESUMEN

Después del grave terremoto ocurrido en Haití en 2010, un expresivo número de haitianos migró a Brasil, en busca de nuevas posibilidades de vida. Este artículo presenta algunos elementos históricos, políticos y económicos de Haití, como también trata de especificidades sobre el proceso de migración haitiana a Brasil. El objetivo central es destacar las condiciones del sujeto en la experiencia migratoria, como también la relevancia de la atención dirigida a aquel que migra. Tomando como eje las proposiciones freudianas sobre las experiencias de luto y melancolía como modalidades referentes a las investiduras y desinvestiduras psíquicas de parte del sujeto, se ilustra, a partir de la narrativa de un migrante haitiano, aspectos que permiten identificar riesgos originados por la vulnerabilidad psíquica. La ilustración narrativa integra un corpus de datos derivado de una investigación cualitativa realizada con inmigrantes haitianos, en una universidad del sur del país. Se pone en evidencia la relevancia de reflexionar al respecto de la implicación de factores subjetivos en el proceso migratorio, los cuales permiten revelar un universo marcado por complejidades psíquicas y existenciales, como también el potencial de la práctica de investigación como modalidad de escucha de la singularidad presente en un fenómeno humano.

Palabras clave: migración; sujeto migrante; psicoanálisis; sufrimiento psíquico.


 

 

O imigrante é atopos, sem lugar, deslocado, inclassificável. [] Deslocado, no sentido de incongruente e de importuno, ele suscita o embaraço; e a dificuldade que se experimenta em pensá-lo - até na ciência, que muitas vezes adota, sem sabê-lo, os pressupostos ou as omissões da visão oficial - apenas reproduz o embaraço que a sua inexistência incômoda cria. (Bordieu, 1998, p. 9)

 

Introdução

Os movimentos migratórios compõem um fenômeno na história dos povos. Porém, nos tempos atuais, esses acontecimentos adquirem novos contornos e abarcam novas problemáticas. O deslocamento relativo à condição de imigrante é definido a partir de sua especificidade e convoca a demarcação de diferenças a respeito da condição de refugiados. Atualmente, destaca-se o aumento do fluxo migratório global, evidenciando uma forma de manifestação de sujeitos submetidos a riscos e a condições de vulnerabilidade, sofrendo uma precariedade de abrigo, de renda, de alimentação, de educação e de cuidados de saúde (García-Ramírez, Balcázar & De Freitas, 2014). A gravidade de tal situação é denunciada por meio da estimativa que, no mundo, 24 pessoas tornam-se refugiados por minuto, o maior número desde a Segunda Guerra Mundial1. Frente a essa situação, em que se constata o comprometimento de milhares de vidas humanas, assevera-se a urgência de reflexões e ações acerca dessa temática, assim como dos limites tênues entre a definição de refugiado e de migrante.

A Organização Internacional para Migrações define migração como o "processo de atravessamento de uma fronteira internacional ou de um Estado. É um movimento populacional que compreende qualquer deslocação de pessoas, independentemente da extensão, da composição ou das causas" (OIM, 2009, p. 40). Considera-se, porém, que migrar não diz respeito apenas a atravessar fronteiras demarcadas geograficamente, na medida em que o percurso migratório impõe a experiência de conviver com diferentes culturas e com novas formas de estar no mundo (Becker & Borges, 2015). Tratam-se de deslocamentos que nem sempre são legais, pois muitas vezes advêm da miséria do país de origem, tornando-se a alternativa encontrada pelo sujeito para sua sobrevivência (Daure, Reyverand-Coulon & Forzan, 2014).

Cabe ressaltar as peculiaridades existentes nas diversas razões por trás dos movimentos migratórios, que geram diferentes categorias relacionadas aos seus motivos. No Glossário sobre Migração, da Organização Internacional para as Migrações (OIM), podem ser encontradas a definição de "migrante", que corresponde a uma livre escolha, e, também, a definição de "refugiado", associada à "ameaça" ou à "perseguição". Nessa perspectiva, para a concepção de migrante, considera-se que:

No plano internacional não existe uma definição universalmente aceita de migrante. O termo migrante compreende, geralmente, todos os casos em que a decisão de migrar é livremente tomada pelo indivíduo em questão, por razões de "conveniência pessoal" e sem a intervenção de factores externos que o forcem a tal. Em consequência, este termo aplica-se às pessoas e membros da família que se deslocam para outro país ou região a fim de melhorar as suas condições materiais, sociais e possibilidades de vida suas e das suas famílias. (OIM, 2009, p. 43)

No intuito de demarcar especificidades no campo de definição dos termos, por refugiado entende-se que essa condição se refere à pessoa que:

Receando com razão ser perseguida em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontre fora do país de que tem a nacionalidade e não possa ou, em virtude daquele receio, não queira pedir a protecção daquele país - Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados, art. 1º-A, nº 2, de 1951, com as alterações introduzidas pelo Protocolo de 1967. (OIM, 2009, p. 62)

Percebe-se que, mesmo frente à tentativa de distinguir os termos migrante e refugiado, a complexidade pertinente aos movimentos humanos não é superada. As temáticas envolvidas em ambas as condições extrapolam a mera distinção terminológica, na medida em que contemplam movimentos humanos cuja dinâmica não é abarcada, necessariamente, nas respectivas definições. Dessa forma, a diversidade das razões promotoras de ambos os tipos de deslocamento se faz evidente, assim como pode ser questionada a associação da decisão de migrar com condições de autonomia e conveniência por parte do sujeito. Mais especificamente, neste artigo, trata-se de explorar no fenômeno migratório aspectos relativos ao sujeito psíquico, os quais tornam evidente a singularidade das ações humanas, estejam elas sob a denominação de "refugiado" ou de "migrante". A presença do humano e de sua complexidade desfaz a possibilidade de uma leitura linear, explicativa e sustentada na limitação de um raciocínio de causa e efeito.

Nessa direção, ao ocupar-se dos aspectos subjetivos envolvidos no fenômeno migratório, Costa (2013) pontua três motivos para um sujeito deixar sua terra de origem e deslocar-se para outro lugar. O primeiro motivo, segundo a autora, está relacionado com o desejo e o ideal do sujeito, que exigem um movimento para sua realização. O segundo motivo de deslocamento associa-se à impossibilidade de o aparelho psíquico processar uma perda, de modo que o sujeito parece buscar no ato de migrar o alívio da dor psíquica (Costa, 2013). Identifica-se que, nesta segunda motivação, o movimento migratório advém da dor psíquica relativa a uma separação anterior à própria migração, passando a ser o fomento para que ela ocorra. Por fim, o terceiro motivo, de acordo com Costa (2013), resulta de uma violência que impossibilita o sujeito de permanecer em seu território, por questões de sobrevivência.

Observa-se, tanto nas definições propostas pela OIM como na literatura a respeito dos deslocamentos humanos, tentativas de demarcar especificidades nas motivações que fomentam esses movimentos. Nesse sentido, cabe enfatizar, ainda, que em cada razão de deslocamento encontra-se a singularidade da história de vida do sujeito que migra. À diversidade de motivos por trás desses deslocamentos soma-se, impreterivelmente, a complexidade de uma ação no direcionamento a novos rumos de vida, de tal forma que, muitas vezes, mesmo que possa estar contemplado na concepção de migrante, o risco à vida acaba por constituir-se numa espécie de fator que força a tomada de decisão por migrar. Conclui-se que, se por um lado a clareza terminológica é buscada, por outro as condições singulares que fomentam os deslocamentos, por vezes, impedem tal demarcação com nitidez.

O fenômeno dos deslocamentos humanos também marca presença na realidade brasileira. Reconhecidamente, não se trata do primeiro período em que o Brasil ocupa uma posição relevante no contexto migratório (Nunes & Oliveira, 2015). O histórico migratório no Brasil teve seu início com o tráfico negreiro operado na colonização portuguesa e, em seguida, com a vinda de imigrantes de outros países, além de Portugal (Becker & Borges, 2015).

Contemporaneamente, o território brasileiro voltou a ocupar lugar de destaque no campo das migrações internacionais. Após o grave terremoto ocorrido no Haiti em 2010, um expressivo número de migrantes haitianos passou a buscar o Brasil como uma terra onde pudessem encontrar novas possibilidades de vida. Ainda que a migração seja considerada um movimento coletivo, pretende-se, neste artigo, dar destaque à singularidade do sujeito migrante, por meio de suas narrativas sobre essa experiência, na medida em que, conforme afirma Kehl (2007), o narrador porta um saber coletivo sobre um dado fenômeno. A função da narrativa, portanto, é transmitir uma experiência coletiva contemplando os efeitos singulares no sujeito narrador (Kehl, 2007).

Assim, a partir de uma apresentação sobre elementos históricos, políticos e econômicos do Haiti, sobre a especificidade do processo de migração haitiana, e de narrativas de um migrante haitiano integrante de uma pesquisa sobre esse tema, procura-se retratar o que é experienciado no processo de migração para o Brasil. Este artigo visa a explorar, por meio de vinhetas narrativas do participante e aportes da Psicanálise, fatores subjetivos envolvidos na migração, os quais permitem desvelar um campo psíquico marcado por complexidades. As narrativas do migrante haitiano, que servem de ilustração para as problematizações abarcadas neste artigo, decorrem de uma investigação maior, qualitativa e exploratória, realizada com 10 imigrantes haitianos e desenvolvida em uma universidade do sul do país. Todos os dados obtidos com os 10 participantes foram trabalhados por meio do método Análise Interpretativa, proposto por Erickson (1986). Essa pesquisa explorou complexidades e demandas do fenômeno migratório e teve todos os seus trâmites éticos respaldados e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição de ensino superior.

 

O migrante haitiano: reflexões acerca de singulares experiências de deslocamento

Encontram-se na história do Haiti importantes consequências decorrentes de frequentes situações relativas a explorações da terra, violação dos direitos humanos pela exportação de madeira, vivência de anos de ditadura e catástrofes naturais, sendo considerado o país mais pobre das Américas (Silva, 2015). A recente crise generalizada que se instalou em um dos países mais instáveis econômica e politicamente não pode ser compreendida desconsiderando-se sua história. Conforme Moraes, Andrade e Mattos (2013), a história do Haiti é caracterizada pela violência, desigualdade social e corrupção desde sua independência, em 1804, a partir da qual se tornou a primeira república negra do mundo, após 12 anos de conflitos contra o domínio francês.

A Revolução Haitiana provocou um movimento e um estranhamento sobre as formas de se pensar a raça, o colonialismo e a escravidão no século XIX (De Souza Junior, 2016). Por esse motivo, o reconhecimento da independência do Haiti por parte de alguns países do Caribe passou por um processo penoso e lento, trazendo dificuldades e bloqueios econômicos ao país. A queda de Jean Pierre Boyer em 1843, após 25 anos na presidência haitiana, apontou para "o encerramento de uma era na qual o país desempenhou em suas relações internacionais um papel ativo e simbólico na liberação do negro" (De Souza Junior, 2016, p. 54). A partir do fim da era Boyer, conforme De Souza Junior (2016), o Haiti passou a segunda metade do século XIX e o início do século XX na defensiva contra os desígnios das grandes potências.

Entre 1915 e 1934, tropas dos Estados Unidos da América (EUA) ocuparam o país, alegando a garantia de seus interesses durante a Primeira Guerra Mundial (Moraes et al., 2013). Posteriormente, no cenário da Guerra Fria, os EUA continuaram influenciando a política haitiana por meio do apoio à ditadura da família Duvalier. Apesar da forte repressão, o ditador deixou o Haiti em 1986 devido aos protestos populares contra seu regime. Em 1990, Jean-Bertrand Aristide foi eleito como mandatário do país, mas um ano depois, foi removido do Haiti, em razão de um golpe de estado. De acordo com Moraes et al. (2013), Aristide retornou ao poder em 1994 e, em 2000, foi eleito presidente novamente, mas devido a suspeitas de fraudes, a oposição se recusou a aceitar tal resultado, passando a protestar violentamente em importantes regiões do país. A fim de conter a crise de violência em 2004, Aristide foi obrigado a renunciar, sendo retirado do país à força por militares dos EUA, com apoio dos franceses, incomodados com a imigração generalizada de haitianos fugidos da guerra civil (Moraes et al., 2013). Após a saída de Aristide, o presidente do Supremo Tribunal haitiano, Bonifácio Alexandre, assumiu o poder e solicitou ajuda à ONU para contenção da crise. Atendendo ao pedido do presidente, ainda em 2004, foi criada a Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti - Minustah, a partir da qual foi estabelecido o vínculo entre Brasil e Haiti (Moraes et al., 2013). Agravando ainda mais o cenário instável haitiano, em 2010, o país sofreu um grande terremoto, cuja extensão trouxe consequências que resultaram em 230 mil mortos e 1,5 milhão de desabrigados, além de severos danos materiais e patrimoniais.

Atualmente, o Haiti apresenta um sistema político desorganizado, a economia destroçada e a população desnutrida, levando milhares de haitianos a deixarem o país e migrarem para o Canadá, os EUA, a França, as Antilhas Francesas, a República Dominicana e o Brasil (Moraes et al., 2013). No período de 2010 a 2013, cerca de nove mil haitianos entraram no Brasil com a finalidade de reconstruir suas vidas, visto que o terremoto exacerbou a pobreza e a baixa qualidade de vida no Haiti (Pacífico & Pinheiro, 2013).

Em razão do vínculo existente entre as nações haitiana e brasileira por meio da Minustah, a vinda dos migrantes haitianos para o Brasil foi facilitada. No entanto, destaca-se o fato de o Brasil não receber os haitianos na condição de "refugiados", na medida em que a Lei brasileira nº 9.474/1997 e a Convenção de Genebra não consideram os desastres naturais e os problemas econômicos e sociais como causa de refúgio, uma vez que tais fenômenos não são abarcados nas categorias de perseguição, guerras ou ameaças à vida.

Dessa forma, o Conselho Nacional de Imigração optou por conceder aos migrantes haitianos vistos humanitários, expedidos em número limitado, com fins de autorizar o trabalho e o estudo no Brasil (Moraes et al., 2013; Coentro, 2011). Em 2013, depois de sofrer críticas e ações jurídicas a respeito da forma de acolhida dos migrantes, o Brasil revogou a Resolução Normativa nº 97/2012, passando, então, a não haver mais limites para a emissão desses vistos (Moraes et al., 2013). A partir dessa mudança, constatou-se o aumento do fluxo migratório de haitianos para o país, colocando em cena também as diferentes formas de recepção deles, que contemplam desde um acolhimento mais genuíno até atitudes racistas e xenófobas. Percebe-se, portanto, que a expressiva vinda de haitianos para o Brasil está dada, sem que haja dúvidas que este fenômeno suscita amplas, necessárias e complexas reflexões.

As vicissitudes relativas à migração haitiana têm perpassado discussões e estão cada vez mais presentes em pesquisas que se desenvolvem no Brasil (Cogo, 2014; Cogo & Silva, 2016; Costa & Reusch, 2016; Moraes et al., 2013; Pacífico & Pinheiro, 2013; Rosa, 2015; Silva, 2015; Silva & Lima, 2016). As pesquisas acerca desse fenômeno questionam a política migratória brasileira, na medida em que os migrantes haitianos não são bem-vindos em alguns estados e, portanto, encontram diversos impedimentos e dificuldades no acolhimento no Brasil (Cogo & Silva, 2016; Rosa, 2015). Além disso, os estudos expressam a necessidade de ampliar o regime de refúgio e garantir a dignidade dos migrantes haitianos por meio de programas de proteção e ações voltadas para os processos de cidadania de haitianos no Brasil (Pacífico & Pinheiro, 2013; Silva & Lima, 2016).

Conforme afirma Gondar (2012), a grande dificuldade política contemporânea refere-se ao fato que alguns sujeitos têm sua vulnerabilidade protegida e outros não. Na crítica proposta pela autora, a própria definição de vulnerabilidade passa a ser questionada. Na medida em que a condição vulnerável é reconhecida como passível de atribuição a todos os sujeitos, também as formas de proteção precisam passar por uma reflexão. Não se trata, assim, de mera atribuição da condição de vítima àquele percebido como vulnerável. Como assinala Gondar (2012) "reconhecer a precariedade de alguém não é reconhecer a sua identidade, mas proteger a sua possibilidade de tornar-se algo que ainda não sabemos, e que nem ele mesmo sabe" (p. 207). Logo, a questão relativa à migração não se restringe apenas ao fato de o imigrante ter um visto concedido, o qual viabiliza sua entrada em um país estrangeiro. Trata-se muito mais de ampliar a reflexão sobre a complexidade inerente aos deslocamentos humanos, a fim de contemplar o reconhecimento da condição de vulnerabilidade do sujeito, mas também de efetivas e necessárias possibilidades de construção de relações alteritárias. É evidente que a inserção do sujeito migrante em uma nova modalidade de laço social não se estabelece sem conflitos e impasses. Rosa vai ao encontro dessa proposição ao afirmar que:

A dificuldade política do governo brasileiro em pensar uma política migratória de qualidade revela que esse debate, se tratado com a relevância que o tema merece, pode revelar matizes de uma sociedade xenófoba, reprodutora de desigualdades e cultivadora da crença de que as nacionalidades possuem pesos diferentes e devem ser tratadas de maneira desigual, inclusive com desrespeito aos direitos dispostos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário desde 1948. (Rosa, 2015, p. 62)

O estabelecimento de laços sociais mostra-se indispensável ao processo de constituição de um sujeito, uma vez que inauguram e possibilitam sua entrada na cultura, bem como dão os fundamentos para sua identidade. Ao enunciar um território de pertencimento, os laços sociais passam a ser elementos indispensáveis na vida de um sujeito. Assim, defrontar-se com diferenças culturais e com um universo político, econômico e social desconhecido pode gerar sofrimento. As condições de enfrentamento de tais adversidades referem-se tanto à extensão dos impasses encontrados no acolhimento ofertado, como também aos recursos psíquicos do próprio sujeito migrante. É fato que um processo de desenraizamento provoca rupturas na identidade, de modo que o migrante, na medida em que muda de contexto social, poderá ter a forma de se perceber e ser percebido também transformada (Mallard, Cremasco & Metraux, 2015).

Dessa forma, a experiência migratória pode exigir grandes esforços por parte do migrante, tanto no sentido do estabelecimento de novos laços sociais como para ter sua subjetividade reconhecida. Para além da atribuição de um documento identitário ou de um visto humanitário, é necessário efetuar uma reflexão sobre a condição subjetiva do migrante, reconhecendo-o em suas especificidades e diferenças. Conforme aponta Gondar (2012), "reconhecer a precariedade de alguém não é reconhecer a sua identidade, mas proteger a sua possibilidade de tornar-se algo que ainda não sabemos, e que nem ele mesmo sabe" (p. 207). Percebe-se, portanto, a importância de reconhecer a necessidade de um acolhimento e de considerar os aspectos psíquicos como condição para fomentar um devir e uma perspectiva de transformação, que teve seu início na decisão do sujeito pelo seu deslocamento para outro território. Torna-se necessário identificar as perdas intrínsecas a um processo de desenraizamento na medida em que o sujeito deixa um país de origem e busca outra cultura para viver, bem como reconhecer a diversidade de motivos que estão contemplados nesse movimento e que terão inegáveis efeitos no tempo a ser vivido na condição de migrante.

Assim, a migração exigirá do sujeito não apenas um trabalho corporal de movimento migratório, mas também o confrontará com suas próprias condições e recursos de elaboração de perdas e de atribuição de valor às novas experiências. Nesse sentido, ao sujeito é imposta a necessidade de administrar suas (im)possibilidades de (des)investimentos a partir dessa importante mudança em sua vida. Ao migrante cabe o desafio de dar sentido à sua experiência com vistas à elaboração, sob pena de ocorrer produção de intenso sofrimento diante de situações frente às quais não encontre recursos de compreensão e/ou enfrentamento. O processo migratório poderá "desencadear um estado de vulnerabilidade psíquica no migrante, cujos efeitos podem ser sentidos a partir do modo como este percebe e lida com a realidade, tendo em vista o rompimento dos laços afetivos e as referências socioculturais de origem" (Becker & Borges, 2015, p. 164). Nesse sentido, os elementos psíquicos marcam presença, visto que se apresentam ao sujeito tanto no que diz respeito ao que deixou para trás, como também na percepção e na condição de investimento no novo lugar que o acolhe.

Considerando-se, portanto, a complexidade envolvida nas migrações, a Psicanálise apresenta-se como uma ferramenta imprescindível para a investigação e a compreensão das facetas que compõem esse fenômeno humano. Ao considerar "os efeitos da história do sujeito em sua realidade psíquica" (Dockhorn, 2015, p. 70), a Psicanálise tem muito a contribuir no estudo aprofundado sobre o processo psíquico demandado ao sujeito frente a uma experiência migratória. Os aportes psicanalíticos dão condições para que se efetive uma reflexão a respeito do sujeito migrante, evidenciando a demanda de trabalho psíquico que lhe é imposta e permitindo, também, explicitar o aspecto de vulnerabilidade que se faz presente como sinalizador de maior risco de padecimento ao psiquismo. Para além das discussões políticas e jurídicas, é também fundamental considerar que o fenômeno migratório envolve aspectos subjetivos, os quais interferem diretamente na vida de um sujeito que deixa muito para trás e que precisa criar novas possibilidades de inserção. Nesse sentido, a tênue fronteira entre a definição de refugiado e migrante evidencia o fato de que as experiências ocorridas nos deslocamentos humanos colocam o sujeito psíquico frente a condições que, por vezes, podem incrementar o padecimento inerente ao desafio de buscar um novo devir.

 

Desinvestir e investir: impasses ao sujeito migrante

A constituição do sujeito psíquico se dá a partir do encontro com um outro, que o investe amorosamente, no momento em que o toma como objeto a ser cuidado. O desamparo inerente à condição humana pressupõe a necessária ajuda externa daquele que cuida, denominada por Freud (1885/2006) como "fremde Hilfe" - ajuda estrangeira. Não se trata apenas de atentar às necessidades relativas à sobrevivência biológica, mas fundamentalmente da inauguração de condições que darão origem a complexos recursos psíquicos e que passam, inevitavelmente, pelo reconhecimento da função do outro nesse exercício primordial de cuidado. Nessa direção, o reconhecimento da vulnerabilidade que promove a potência e não a vitimização ancora-se, conforme afirma Gondar (2012), no reconhecimento e na compreensão de "como um sujeito se constitui, em que aspectos ele se apresenta desamparado e necessitado de um outro" (p. 207).

A Psicanálise desenvolveu importante teorização sobre o processo de construção da noção de si mesmo (Freud, 1905/2006). Na medida em que a criança pode encontrar no outro primordial as condições que permitem a criação de seus próprios recursos psíquicos, a identidade passa a ser o legado das experiências nesse campo intersubjetivo. O processo de construção da identidade pressupõe uma experiência alteritária inicial, cuja qualidade permite, a posteriori, a constituição de si mesmo. O legado identitário, conforme afirma Bleichmar (2009), corresponde a uma estrutura composta por invariantes que se repetem e cuja estabilidade interfere nas modalidades de funcionamento psíquico. Trata-se, portanto, de um conceito que, em Psicanálise, alude à permanência, continuidade e estrutura, de maneira que modificações nas referências identificatórias são sentidas com estranheza pelo sujeito (Rother-Hornstein, 2006).

Além da imprescindível presença do outro primordial no processo de constituição identitária, também os laços sociais respaldam posteriormente a condição de pertencimento a uma cultura. Constata-se, assim, que a noção de alteridade ocupa sempre lugar central no que tange à manutenção e à consolidação da identidade do sujeito, bem como em suas possibilidades de investimento. Se, por um lado, o processo de constituição identitária implicou um permanente trabalho psíquico de apropriação do que foi enunciado pelo outro, por outro lado, os laços sociais confrontam o sujeito com sua capacidade de administrar demandas de desinvestimento e investimento ao longo da vida. Nesse sentido, pode-se aludir aos processos vitais de perda e de transformações que serão demandados ao sujeito, independentemente de maiores adversidades. A capacidade elaborativa frente a perdas, decepções e frustrações terá importante repercussão no trabalho de ressignificação e construção de representações identitárias de um sujeito. Traduzem-se, portanto, nessas singulares vicissitudes elementos próprios à história de vida e à qualidade das relações experimentadas nos vínculos inter-humanos. Nesse sentido, faz-se importante refletir acerca do que ocorre quando, na condição de estrangeiridade devido à migração, elementos relativos à identidade são colocados em xeque.

Existem inegáveis diferenças entre processos psíquicos nos quais, frente à vivência de perda, o sujeito passa a empreender um trabalho necessário de luto que viabiliza uma posterior elaboração daquele processo no qual predomina a impossibilidade de elaborar o perdido, denominado melancolia. Neste segundo caso, o sujeito corre sério risco de ficar à mercê de contar com parcas condições para investimentos de vida.

A temática da perda foi abordada magistralmente por Freud (1917[1915]/2006) em seu texto Luto e Melancolia. No cenário marcado pela eclosão da Primeira Grande Guerra, o tema do enfrentamento com a morte, com constantes perdas e seus dramáticos efeitos no psiquismo, convocou a Psicanálise à reflexão. Freud (1917[1915]/2006) afirma que o luto comporta uma dor psíquica, que se manifesta por meio da falta de interesse pelo mundo externo e da incapacidade de escolher novos objetos de amor. Assim, observa-se, em um primeiro momento, a escassez de destinos da libido, de forma que o sujeito parece encontrar-se aprisionado ao objeto perdido. Por luto, compreende-se o predomínio de um estado afetivo diante de uma perda, não apenas da morte, que implica um trabalho psíquico e decorrentes modificações subjetivas. Na medida em que a perda provoca efeitos no registro identitário do sujeito (Hornstein, 2008), é-lhe exigido que efetive um trabalho psíquico de elaboração.

Nem sempre, porém, o sujeito disporá de recursos psíquicos suficientes para efetuar um trabalho de luto. Freud (1917[1915]/2006) explora a complexidade dos efeitos da perda e da experiência de ruptura nos investimentos psíquicos. São evidentes, para o autor, as diferenças entre o trabalho de luto e o quadro melancólico. Na condição melancólica, apresenta-se uma impossibilidade de elaboração diante da perda do objeto. O autor aponta que ambas as condições, luto e melancolia, apresentam as mesmas características, com exceção da perturbação de autoestima devido ao empobrecimento do Eu presente e típico da melancolia.

Nessa direção, as diferenças fundamentais, considerando-se a capacidade de enfrentamento de perdas e a administração de seus efeitos no psiquismo, não podem ser abordadas sem a devida consideração da história de constituição do sujeito. Na situação relativa ao quadro melancólico, o tema da autoestima, a saber, os recursos amorosos de investimento no Eu, mostra-se fragilizado, resultando em importante prejuízo para a atribuição de valor próprio. Assim, frente à impossibilidade de um trabalho elaborativo de perdas, característico da condição de luto, manifesta-se um comprometimento no que diz respeito aos investimentos psíquicos no campo alteritário. O trabalho de luto implica a condição do sujeito recolher, temporariamente, sobre si mesmo os investimentos antes destinados ao mundo exterior (projetos, relações, trabalho, lazer, dentre outras atividades). Após esse necessário tempo de desinvestimento como decorrência do trabalho elaborativo ocorrido em relação à perda ocorrida, o sujeito volta, posteriormente, a ter a disponibilidade de (re)investir no mundo exterior.

A experiência migratória traz, inevitavelmente, uma demanda de importantes desinvestimentos e reinvestimentos por parte do sujeito psíquico. Considerando-se perdas, rupturas e abandonos, e também as expectativas e projetos frente ao novo, que integram essa situação, as contribuições freudianas a respeito dos fenômenos de luto e melancolia permitem pôr em evidência a complexidade humana que neles residem. Koltai (2007) afirma que a migração não se refere apenas a uma mera passagem de um país para outro, mas a uma experiência radical e dolorosa. Segundo a autora, a chegada a um novo destino convoca o sujeito a recolocar a questão sobre quem se é e o que foi deixado para trás (Koltai, 2000, p. 101). O movimento migratório implica, assim, a saída de um lugar no qual os códigos sociais e linguísticos eram acessíveis e a chegada a um mundo onde tudo é desconhecido (Daure et al., 2014). Nessa alternância entre necessários desinvestimentos que lhe possibilitam sair e reinvestimentos que viabilizam a inserção no novo contexto, são colocadas em xeque as condições psíquicas que lhe permitem, no presente, construir um futuro.

Dessa forma, para tornar possível o (re)investimento no devir, seguindo a construção de sua vida, o sujeito migrante é confrontado com sua história até então. O ato de migrar pode levar ao incremento de condições próprias a uma experiência de desamparo, e constituir, na experiência migratória, um cenário de excessos, uma vez que o sujeito não tenha como reconhecer como familiar o novo contexto. Mallard et al. (2015) assinalam o risco que se faz presente nessa vivência de desamparo. Nessa direção, conforme Borges e Pocreau (2009), o movimento de identificação é posto em questão, visto que tudo está por ser reconstruído. A constatação de que novos encontros exigem uma reorganização no campo dos investimentos psíquicos, impondo a escolha de novos objetos e o luto por outros, conforme assinala Hornstein (2009), também pode ser aproximada ao contexto da migração.

Destaca-se que a experiência migratória, ao passo que reproduz uma situação de desamparo já experimentada pelo sujeito, faz com que dois novos elementos precisem ser considerados. O primeiro deles diz respeito ao fato de que, frente à migração, será demandado ao sujeito um trabalho psíquico de reordenamento de seu patrimônio afetivo. O segundo elemento remete, como descreve Freud (1885/2006), à implicação da qualidade da "ajuda estrangeira" que lhe é ofertada. Este artigo busca, portanto, explorar esses dois elementos - o trabalho relativo a aspectos subjetivos, pondo em destaque a escuta ao migrante - por meio da narrativa de um haitiano sobre seu singular desafio de ser sujeito em espaços alteritários. Trata-se de evidenciar o risco de incremento à vulnerabilidade quando não se consideram os aspectos subjetivos e demandantes de atenção a quem estuda e intervém junto a essa população. Além disso, ilustra-se a forma como o espaço de escuta gerado na prática da pesquisa pode ser relevante na atenção à dor psíquica.

 

Fernand - a narrativa de um sujeito migrante

Acreditar na heterogeneidade de fatores relativos ao fenômeno da migração sustenta a relevância de promover a narrativa do sujeito migrante sobre sua experiência. Opta-se, portanto, por apresentar as narrativas de Fernand2, jovem haitiano, a respeito de sua experiência migratória. Não se tem a pretensão de tomar tal ilustração como uma categoria analítica em relação ao fenômeno, mas sim evidenciar o quanto o espaço de palavra ofertado ao sujeito reafirma a importância de contemplar a singularidade do vivido, no intuito de abarcar complexidades presentes nos fenômenos humanos.

Busca-se problematizar e evidenciar o quanto, no afã de instrumentalizar o migrante com alguns recursos que facilitem a inserção na nova cultura, corre-se o risco de deixar à margem aspectos que tornam singular essa experiência. Assim, a narrativa de Fernand permite lançar luz sobre os elementos subjetivos que implicam o acolhimento da narrativa do sujeito sobre sua história, além de dar condições para que se identifique a impossibilidade de atender, mediante um "protocolo" de acolhida, à complexidade da subjetividade. A narrativa do jovem haitiano revela o importante prejuízo quando não é possível, frente às exigências do luto, destinar um tempo para a elaboração. Assim, na busca pela urgência da sobrevivência, um necessário processo elaborativo acaba, por vezes, suplantado por demandas financeiras, de trabalho, de aquisição de um novo idioma e de moradia.

Fernand, 25 anos, migrou para o Brasil em função de importante necessidade familiar. A partir das muitas dificuldades financeiras enfrentadas por sua família, seu pai havia migrado para os Estados Unidos da América (EUA) na tentativa de obter trabalho e, assim, ajudar no sustento da família. A migração paterna provocou significativa crise familiar, uma vez que o pai se envolveu com outra mulher no novo país e decidiu não efetuar mais as contribuições financeiras à família. Somou-se ainda à situação já difícil a doença cardíaca da mãe, que a incapacitou para trabalhar. Foram as condições já precárias de sobrevivência familiar, incrementadas pelas novas dificuldades, que resultaram em um pedido materno endereçado a Fernand para que este deixasse o Haiti e fosse em busca de uma vida melhor. Dessa forma, a migração de Fernand motivou-se a partir da grave situação familiar e da expectativa materna de que ele pudesse viabilizar um futuro diferente para todos. Apareceu em sua narrativa a compreensão sobre sua condição de migração para o Brasil:

A minha mãe me mandou pra cá. Pra conseguir ajudar ela e meus dois irmãos, pra eu conseguir ajudar eles.

Durante a entrevista, Fernand oscilava entre a compreensão de que o pedido da mãe para que ele migrasse estivesse relacionado a uma autorização de empreender esforços que incluíam seu próprio bem-estar e a constatação de que o desenrolar dos fatos levaram-no a uma exigência de enviar seus ganhos para garantir o futuro da mãe e dos irmãos. Antes de sua chegada como migrante ao Brasil, Fernand migrou para o Equador, onde viveu por quase um ano, trabalhando na construção civil. Após esse período, devido à sua insatisfação com a situação no Equador e a relatos de outros migrantes haitianos sobre maior oportunidade de trabalho em solo brasileiro, o jovem decidiu migrar para o Brasil.

Pode-se considerar que esses singulares dois tempos no processo migratório de Fernand revelam, inicialmente, um movimento de obediência ao apelo materno e, posteriormente, a tentativa de efetivar uma escolha própria. Porém, a fala de Fernand ("a minha mãe me mandou para cá") durante a entrevista anula a diferença entre os tempos, denunciando o quanto ainda prevalece em sua narrativa uma condição de quem obedece a uma ordem. Nessa direção, a impossibilidade de nomear um desejo próprio relativo à migração mostra-se na singularidade da história de Fernand como mais um obstáculo a ser ultrapassado.

No ano de 2015, Fernand chegou ao Rio Grande do Sul. Morou por um ano e meio em uma cidade do interior do estado e, depois, veio para a capital. Em ambas as cidades, Fernand trabalhou em supermercados, exercendo atividades de descarga de mercadorias e de controle no abastecimento de produtos nas prateleiras. Na ocasião da entrevista, o jovem estava trabalhando há três meses em um supermercado, mostrando-se bastante queixoso e insatisfeito com a vida que levava. Narrou muitas queixas em relação aos relacionamentos pessoais, às experiências que identificava como preconceituosas em relação à sua condição de migrante e de negro, à impossibilidade de preencher determinados requisitos para a obtenção de habitação, e também à modalidade de trabalho que exercia, considerada por ele como aquém de suas possibilidades. Porém, na medida em que discorria sobre sua experiência migratória, evidenciava-se forte desagrado com o destino que precisava dar a seu salário, considerando a solicitação materna.

Só tô vivendo pra ajudar minha família, pra mim não. Não tô vivendo pra mim, só pra minha família. Daí eu quero começar a viver minha vida, porque eu tô trabalhando aqui só pra ajudar minha família, só pra minha família. Cada mês eu recebo eu tenho que mandar dinheiro lá direto pro Haiti. O dinheiro não vai ficar pra mim. O que que vai ficar pra mim, só o dinheiro do aluguel e comida. Só isso.

Na experiência singular de Fernand, a condição migratória está atravessada por uma incapacidade de manter uma "reserva" de investimento do que recebe para seus projetos. Mostra-se, portanto, extremamente frustrado, uma vez que os ganhos obtidos em seu trabalho estão a priori comprometidos. Comprometimento esse evidente nas falas "a minha mãe me mandou para cá" e "cada vez eu recebo eu tenho que mandar dinheiro lá direto pro Haiti". Na condição de passividade em relação ao que é delegado por outro, fica-lhe impossibilitado desenvolver um trabalho elaborativo, que implica autonomia para desinvestir e reinvestir. Constata-se, assim, a sensação de desesperança, na medida em que ele não se vê com condições de investir em algo para si, associando a falta de dinheiro à impossibilidade de viver sua própria vida.

No decorrer da entrevista, surgem elementos que permitem identificar a intensidade da tristeza e da solidão permanentemente presentes no cotidiano de Fernand:

Eu tô sozinho aqui no Brasil. Tô sozinho, sozinho. (). Daí ficou um pouco difícil pra mim e fiquei muito triste. Todo dia triste. Muito triste.

A tristeza aparece no relato do jovem muito associada àquilo que os "brasileiros" não lhe proporcionam: um emprego melhor, o reconhecimento de suas competências, relações de confiança, dentre outras queixas. Na medida em que se acolhe a narrativa sobre sua história de vida e o que experiencia ao migrar, pode-se enxergar o sujeito Fernand, não apenas um migrante haitiano. Na tristeza que compromete sua autoestima se faz ainda mais difícil administrar os impasses de sua migração. Tais sentimentos não são demonstrados à família, e a própria ambivalência em enviar todo seu ganho para sustento da mãe e dos irmãos é disfarçada por meio de justificativas tais como:

Eu tenho que ajudar. Porque eles vão ficar mal, vão passar fome, então eu tenho que ajudar. Pra mim a vida deles lá no Haiti é mais importante que minha vida, porque eu tava no Haiti e vi como que é a situação, eu vi como que é, por isso a vida deles é mais importante que a minha vida. Porque eu tô vivendo agora, agora eu tô vivendo por eles, porque o meu pai não tá ajudando mais.

É a escuta do sujeito que permite identificar suas necessidades e seus conflitos. No reconhecimento da precariedade real e evidente de sobrevivência de sua família no Haiti, torna-se ainda mais custoso para Fernand constatar que também sua sobrevivência está em questão. Investir em projetos próprios, ou seja, reconhecer-se como sujeito independente da demanda do outro, deixa-o culpado e preso à ambivalência decorrente da contradição entre "ter que obedecer" e "dizer não". O conflito de Fernand, a partir da singularidade de sua história, assinala um importante trabalho psíquico a ser empreendido a fim de constatar que não é ceder tudo que ganha a única possibilidade de ajudar o outro. Para constituir condições que lhe permitam transformar a submissão em uma experiência de generosidade, mediante a qual repartir já não é mais dar tudo que tem, é necessário ofertar a Fernand um espaço de atenção e cuidado a seus aspectos subjetivos.

Diferente de se submeter a uma vida na qual trabalha para enviar todos os seus ganhos para outros, Fernand precisará empreender um trabalho de investimento sobre si mesmo, a fim de recuperar a condição de equilíbrio entre o que dá e o que recebe. O risco do fracasso desse empreendimento poderá gerar novas modalidades de submissão. A fala de Fernand sobre a vida no Brasil alerta para esse risco:

Muito, muito difícil. Mas também lá no Haiti é pior, daí… A gente dá um jeito pra aguentar, porque no Haiti é pior. Aí, é isso.

Quando estava na cidade do interior do estado, Fernand fez uma tentativa de iniciar um curso de contabilidade, porém precisou interrompê-lo a fim de enviar, também, esse valor à família. Vislumbra-se em sua narrativa a possibilidade de um projeto, de investimento no devir que foi cerceado na imposição que faz a si mesmo como sujeito da servidão ao desejo do outro:

Eu gosto muito da contabilidade, que eu falei que eu tava fazendo, eu gosto muito, mas não dá porque eu tenho que ajudar minha mãe e por isso que eu parei, daí eu fiquei lá no serviço trabalhando, trabalhando.

A condição de pertencimento a um lugar novo exige, inevitavelmente, atribuir novos sentidos às fronteiras identitárias em relação ao seu lugar de origem, à família. Nessa singular experiência de migração, há o deslocamento geográfico, o qual não garante as condições necessárias de investimento e construção de um devir. Se, por um lado, há o deslocamento físico de Fernand do Haiti ao Brasil, impera, ainda, um aprisionamento psíquico, no qual se vê submetido a cumprir o que toma como ordem do outro.

As tênues diferenças entre as definições de migrante e refugiado se fazem evidentes no caso de Fernand. Como sua decisão de migrar não pode ser tomada como exemplo de exercício de autonomia e liberdade, no qual não teria havido intervenção de fatores externos, segundo a definição de migração pela OIM (2009), Fernand põe em xeque o que é efetivamente ser um sujeito migrante. Na medida em que prevalece um aprisionamento psíquico, percebe-se a impossibilidade de pedir e usufruir da proteção de um novo lugar, aproximando-o mais do que se entende por refugiado. Aqui, o refúgio a ser buscado parece ser a possibilidade de construir-se como sujeito, autorizar-se a ter um lugar próprio, independentemente do país que habita. Para além de uma definição, as narrativas de Fernand permitem constatar a relevância da subjetividade do migrante, ou seja, os singulares elementos com os quais precisa se deparar em sua experiência de deslocamento de um país a outro. A história de Fernand demonstra como as questões psíquicas são decisivas na forma de enfrentamento do novo que a migração contempla.

A partir do processo de escuta de Fernand, percebeu-se o intenso sofrimento no qual o jovem se via aprisionado, bem como o custoso trabalho psíquico de tornar-se um "novo e mesmo" sujeito em sua experiência migratória. Cabe ressaltar o valor da escuta em um processo de pesquisa, uma vez que a intensidade do sofrimento do participante não deixou dúvidas sobre a necessidade de que lhe fossem destinados cuidado e atenção. Assim, Fernand foi encaminhado ao Serviço de Psicologia da universidade na qual a pesquisa foi desenvolvida, a fim de iniciar um processo psicoterapêutico. A entrevista, mesmo em um contexto de pesquisa, possibilitou a Fernand experienciar os efeitos benéficos de um convite a narrar-se como sujeito em primeira pessoa. Assim, acredita-se que o interesse demonstrado e a pronta aceitação frente ao encaminhamento recebido possam contribuir no árduo processo de atribuir significado às suas vivências e empreender um trabalho psíquico que lhe permita efetivamente migrar para ser.

 

Considerações Finais

A partir de uma apresentação sobre a temática da migração haitiana e o trabalho com os elementos singulares da experiência migratória de Fernand, foi possível ilustrar a complexidade e o desafio envolvidos nos deslocamentos humanos. A entrada de migrantes em outra cultura implica o confronto com o desconhecido, a administração de necessários desinvestimentos relativos ao que se deixa, bem como o trabalho exigido de investimentos em novos projetos e novas relações. Nesse sutil e delicado equilíbrio entre desinvestir e investir, o sofrimento psíquico pode aparecer como força produtora de patologias. A distinção freudiana entre as possibilidades criativas que decorrem de um trabalho de luto e a rigidez e empobrecimento do quadro melancólico apresenta-se como eixo norteador da reflexão sobre o movimento migratório. Assim, o trabalho de elaboração do luto liberta o sujeito de uma condição de vítima e abre as perspectivas da construção da autonomia e de investimentos no devir. Por outro lado, no predomínio da fragilidade dos recursos intrapsíquicos e também da violência própria ao exercício de poder advindo dos laços sociais, ficam favorecidas as condições melancólicas. É evidente o valor do reconhecimento do sujeito como tal, possibilidade essa que dá espaço, no laço social, para que o migrante seja, efetivamente, visto, ouvido e reconhecido em sua subjetividade.

A história de Fernand desvela intenso sofrimento psíquico na experiência migratória, não apenas pelas adversidades encontradas no novo país, mas, sobretudo, pela necessidade de enfrentamento com as condições que impulsionaram o deslocamento migratório. Entende-se que a história do participante ilustra a relevância da subjetividade na definição da experiência migratória. O cuidado com a identidade do sujeito torna-se fator essencial, ou seja, trata-se de reconhecer a dimensão conflitiva que se apresenta no desafio de ser o mesmo e o novo simultaneamente, tarefa essa que exige a impreterível atenção à subjetividade desses sujeitos. A vulnerabilidade psíquica e o risco de padecimento ficam ampliados, portanto, quando os aspectos subjetivos são deixados à margem de uma reflexão sobre a experiência migratória.

A prática da pesquisa sobre os fenômenos humanos também pode fomentar um contexto de atenção e cuidado àquilo que, por vezes, tende a ser excluído da produção de conhecimento no âmbito cientifico. Frente à exigência de padronização das formas de coletar dados, pode-se correr o risco de desconsiderar o sujeito presente no fenômeno. Proporcionar que o participante de uma investigação construa uma narrativa sobre sua experiência retira-o da condição de ser uma mera "fonte" de dados, convidando-o a ser autor de uma narrativa cujo endereçamento ao pesquisador viabiliza o acesso ao âmago de temáticas sobre o humano.

Nesse interjogo entre o elemento singular da narrativa de um sujeito e a possibilidade de fazer com que seus desdobramentos encontrem eco e levem à construção de conhecimento sobre um dado fenômeno, a prática da pesquisa não se distancia da realidade sobre a qual incide sua interrogação. O conhecimento obtido, na medida que efetivamente dialoga com a realidade pesquisada, reverte-se em um conhecimento que pode modificar e contribuir para com o fenômeno investigado. As proposições da Psicanálise sobre o sujeito psíquico, sua complexidade, seus recursos e sua vulnerabilidade contribuem de forma qualificada nas leituras e investigações sobre o fenômeno migratório, asseverando a importância de considerar o migrante em sua subjetividade, a qual interfere diretamente na forma como poderá ou não o sujeito dispor de recursos diante dessa radical mudança em sua vida.

 

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Recebido em 03 de outubro de 2017
Aceito para publicação em 23 de dezembro de 2017

 

 

1 Disponível em http://www.acnur.org/t3/portugues/noticias/noticia/deslocamento-forcado-atinge-recorde-global-e-afeta-uma-em-cada-113-pessoas-no-mundo/.
2 Pseudônimo utilizado com fins de preservar a identidade do participante da pesquisa.

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