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Psicologia Clínica

versão impressa ISSN 0103-5665versão On-line ISSN 1980-5438

Psicol. clin. vol.31 no.1 Rio de Janeiro jan./abr. 2019

http://dx.doi.org/10.33208/PC1980-5438v0031n01A08 

SEÇÃO LIVRE

 

Iluminismo e romantismo na formação psicanalítica

 

Enlightenment and romanticism in psychoanalytical training

 

Iluminismo y romanticismo en la formación psicoanalítica

 

 

Pedro Cattapan

Professor Adjunto do Departamento de Psicologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio das Ostras, RJ, Brasil. pedrocattapan@hotmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo versa sobre a adoção por parte da International Psychoanalytical Association (IPA) dos modelos de formação disponíveis quando surgiu a necessidade nesta instituição de formar um grande número de psicanalistas. Sustenta-se que seus modos de formação inspiradores foram a escola moderna iluminista e a concepção romântica de formação. Pretende-se demonstrar os efeitos e os problemas destes legados no modelo adotado pela IPA. Para tanto, examinar-se-á a constituição da escola moderna e as alternativas a ela idealizadas pelo Iluminismo; também se estudará de que modo o pensamento estético de Burke e Goethe orientou as bases para se esboçar uma formação romântica. Finalmente, se demonstrará como o tripé da formação psicanalítica evidencia essa herança híbrida: cursos teóricos (como continuação da escola moderna), análise pessoal (e sua herança da formação "de dentro para fora" romântica) e atendimentos supervisionados (onde os dois legados aparecem, indicando qual deles prevalece em determinada instituição de formação).

Palavras-chave: psicanálise; iluminismo; romantismo; formação.


ABSTRACT

This paper deals with the adoption by the International Psychoanalytical Association (IPA) of the models of training available when the need to qualify a large number of psychoanalists arose in this institution. One proposes that its inspiring modes of training were the modern school from Enlightenment and the Romantic conception of formation. One intends to show the effects and problems of these legacies in the model adopted by IPA by focusing on the constitution of the modern school and on the alternatives to it idealized by the Enlightenment, and also on how Burke's and Goethe's aesthetic theories guided the foundation for a Romantic formation. Finally, it will be shown how the psychoanalitical training tripod carries this hybrid legacy: theoretical courses (as an extension of the modern school), personal analysis (and its legacy of the Romantic "inside-out" formation) and supervised treatment (where both are present, indicating which legacy is stronger in a given training institution).

Keywords: psychoanalysis; enlightenment; romanticism; training.


RESUMEN

Este trabajo versa sobre la adopción por parte de la International Psychoanalytical Association (IPA) de los modelos de formación disponibles cuando surgió la necesidad en esta institución de formar un gran número de psicoanalistas. Se sostiene que los modos de formación que la inspiraron fueron la escuela moderna iluminista y la concepción romántica de formación. Se pretende demostrar los efectos y los problemas de estos legados en el modelo adoptado por la IPA. Para ello, se centrará em la constitución de la escuela moderna y en las alternativas a ella ideadas por la Ilustración; também se estudiará de qué modo el pensamento estético de Burke y Goethe orientó las bases de uma formación romántica. Finalmente, se demostrará cómo el trípode de la formación psicoanalítica evidencia esta herencia híbrida: cursos teóricos (como continuación de la escuela moderna), análisis personal (y su herencia de la formación "de dentro hacia fuera" romántica) y atendimientos supervisados (donde las dos herencias aparecen, pero donde se indica la predominante).

Palabras clave: psicoanalisis; ilustración; romanticismo; formación.


 

 

Introdução

A formação psicanalítica não foi inventada única e exclusivamente a partir de referências interiores ao campo psicanalítico. Minha intenção, com este trabalho, é de mapear as origens do modelo de formação psicanalítica tal como formalizada nos anos 1920 nas concepções e consequentes aplicações dos modos de formação iluminista e romântico que atravessaram todo o século XIX e início do XX. É certo que o modelo iluminista vigorou e foi nele que foram educados Freud e seus discípulos ao frequentarem a escola e a universidade, mas a formação romântica, mesmo permanecendo marginal, também incidiu no que se estabeleceu como formação de psicanalistas, segundo o "modelo Eitingon" (Schröter, 2011).

 

O modelo iluminista de formação

Compreenderemos o iluminismo aqui como a adesão parcial ou integral de vários pensadores oitocentistas ao projeto cartesiano (Gusdorf, 1982, 1984). A capacidade reflexiva e crítica do intelecto é exaltada como o fundamento do poder humano de alcançar a verdade, como a marca de sua independência em relação à natureza, bem como instrumento a ser utilizado para dominá-la (Descartes, 1637). Para todos os iluministas, a razão e a ciência ergueram-se como valor em si, referencial ético e político, por vezes até mesmo estético, de felicidade, justiça e beleza; e são os motores do processo que passou a ser chamado de modernização.

Ao tomar a razão como método basal de lidar com o pensamento e com o mundo, o iluminismo empreendeu uma crítica àquelas que se estabeleceram como práticas sociais e políticas fundamentadas apenas nos costumes ou na tradição (em especial a monárquico-religiosa-patriarcal). Como contrapartida, propôs a racionalização das atividades das mais simples até o governo político e a educação dos homens (Hobsbawm, 1979).

A formação dos homens necessariamente ocupará um lugar estratégico se se quer ver a transformação da sociedade inteira a partir da racionalização. Na esteira da importância adquirida pela formação, veio forçosamente a valorização das crianças e dos jovens como o futuro da nação moderna. Eles precisam, a partir de então, ser qualificados por meio da educação para que o futuro seja o progresso da razão - e não o retorno ao obscurantismo ou uma estagnação diante de um irracionalismo resistente. Emílio ou Da Educação (Rousseau, 1762), de Jean-Jacques Rousseau, foi escrito nesse contexto com fins de mostrar a potência da educação esclarecida em permitir que um indivíduo naturalmente bom possa crescer sem ser corrompido pela desigualdade e pela injustiça, vislumbrando assim um futuro melhor.

Com a influência iluminista sobre os revolucionários franceses que tomaram o Estado, a formação de pessoas tornou-se um tema político. A conquista da liberdade e da igualdade só seria estabelecida de uma vez por todas caso a educação de crianças e adolescentes já fosse praticada sob estes valores (Caron, 1994). A educação reformada pela razão, e, mais especificamente, pela ciência passa a ser o método para a chegada à felicidade coletiva, transformando os resistentes e os ignorantes.

Além do progresso moral em direção à felicidade e da manutenção da bondade humana, extraídos de Rousseau, para a cultura iluminista-revolucionária também é importante um progresso intelectual e técnico para que um indivíduo possa servir socialmente e a humanidade possa progredir em seu domínio cartesiano sobre a natureza e a desrazão. Isso fez com que a concepção iluminista de educação e de escola divergisse, ao menos em parte, daquela comum no Antigo Regime. Segundo os historiadores Phillipe Ariès (1973) e Jean-Claude Caron (1994), esta tinha bem mais a função de socialização do que de promover um aprendizado de conteúdos que capacitariam ao indivíduo para a ascensão social (econômica, intelectual e política), que é justamente o propósito basal da escola moderna democrática pós-revolucionária criada sob fundamentos racionais iluministas.

Mas o iluminismo não foi um movimento monolítico e dele emergiram diferentes ideias sobre como transmitir a razão e a ciência, quando da implementação do ideal igualitário de educação para todos. O convite à observação e à verificação da natureza - enfim, o experimento - é um método formativo, mas seria o mais apropriado como política pública para todos? Seria apropriada a relação pessoal entre preceptor esclarecido e aluno, enlaçando amor e razão? J.-C. Caron (1994) nos mostra como D'Alembert e La Chalotais, dentre outros, tomaram posição a favor deste modelo. Mesmo que o modelo tenha raízes aristocráticas, Rousseau pressupôs seu Emílio nele. Na Enciclopédia (Diderot & D'Alembert, 1751-1765) podemos encontrar a valorização de uma relação mestre-aluno nada aristocrática; a referência é à relação entre o artesão e seu aprendiz. Essa forma de aprendizagem cativou alguns iluministas, pois aqui a formação não diz respeito a um verniz erudito, mas à formação profissional, útil aos dois envolvidos e a toda a sociedade. Aprende-se praticando, sendo corrigido, especializando-se, dominando o olhar, a mão, a matéria, a natureza por meio do intelecto e dos músculos como seus apêndices. Richard Sennett acredita que "os enciclopedistas queriam que os trabalhadores comuns fossem admirados, e não lastimados" (Sennett, 2008, p. 108) em sua atividade serena, tranquila e disciplinada. Vale sinalizar que entre as práticas artesanais descritas na Enciclopédia está a criação dos filhos. Portanto, parte do iluminismo acreditava que a racionalidade das oficinas era um modelo de educação mais benéfico à sociedade do que, por exemplo, o modelo hierárquico dos colégios do Antigo Regime. Aqui aparece um primeiro elogio iluminista ao disciplinamento.

Porém, Caron (1994) destaca ainda que outra posição é tomada, por exemplo, por Roger Ducos, em 1792, diante da Convenção, quando propõe criar uma geração nova mediante uma educação uniforme. Uniformidade não combina com a relação mestre-aprendiz, em que o adulto se empenha no progresso daquela criança em particular - seria impraticável! Como seria possível haver uma quantidade tão grande de mestres? A defesa de Ducos está mais próxima da tomada de posição do Estado revolucionário: a opinião pública deveria ser controlada em nome da nova ordem e da paz nacional. Estava em pauta a compreensão de que a educação é uma forma de dominação. Por isso mesmo, seria necessário que a frequentação das instituições de educação fosse obrigatória. Sabemos que foi este modelo de educação que predominou desde então.

A escola moderna se tornou o lugar de formação do homem moderno. Uma instituição obrigatória a todos onde o coletivo prevalece sobre o individual e o saber racional e científico encontra cada vez mais espaço. Esta resultante da Revolução Francesa será exportada para toda a Europa e as Américas e, por toda parte, repetirá o paradoxo criado: reforma no sistema educacional para que a razão e a ciência convertam a educação num ensino para a felicidade, de um lado (o progresso, como o positivismo - doutrina herdeira do iluminismo - exalta); e, de outro, uma uniformização da opinião pública controladora das liberdades (a ordem, também um valor positivista, como a bandeira brasileira não nos deixa esquecer). A instrução passa a vir acompanhada de práticas que normalizam e padronizam indivíduos dentro das instituições de ensino para, em seguida, habitarem um mundo dentro dos padrões esperados de razoabilidade. Este é o modelo de educação oriundo do iluminismo que se estabeleceu como garantia de modernização.

O internato e o semi-internato como escolas a serviço do progresso da razão surgem exatamente neste contexto. A mãe de sangue, para Michelet (1869), é importante, mas a verdadeira mãe, a escola, aparece para instruir, nutrir todas as crianças. A família, mantenedora de tradições injustas e obscurantistas, de castigos retrógrados, do autoritarismo do pai, da religião da mãe é um obstáculo a ser vencido no caminho do Esclarecimento. Assim, é preciso afastar a criança desse meio nocivo ao seu desenvolvimento. Os internatos tinham o propósito de solucionar esse problema e preparar o homem do amanhã como um esforço a mais para sermos republicanos. Tanto nos colégios internos como nos colégios abertos, o distanciamento da família em relação ao espaço escolar foi intencional. As normas das escolas não eram as mesmas do lar, mas deveriam ser a base da sociedade no futuro, seja em casa, seja na ordem pública. Foi assim que o modelo disciplinar de funcionamento institucional já presente nas escolas antes da Revolução foi mantido (Foucault, 1974-1975, 1975). E, num modelo muito diferente do da formação nas oficinas, novamente encontramos a valorização iluminista da disciplina.

Esse modelo era bastante eficaz no propósito do controle sobre a opinião pública, já que previa um sistema de vigilância piramidal; era também eficaz na organização racional do espaço e do tempo, servindo como ensino prático de gestão racional; também instaurava normas de conduta avaliadas objetivamente no que diz respeito à própria serventia institucional do comportamento (e, portanto, supostamente desvinculadas de referências ético-morais tradicionais e injustas), normas estas acompanhadas de premiações e punições como método educativo eficiente em adestrar corpos, tornando-os dóceis e úteis, uma vez que adquiriam um saber-fazer.

Michel Foucault mostra brilhantemente, em Vigiar e punir (1975), como as instituições disciplinares se assemelhavam umas às outras em seu funcionamento, mas ainda assim vale salientar como as reformas no campo da educação e do tratamento dos loucos tornaram os procedimentos nessas áreas, até então bastante heterogêneos, muito parecidos. Na educação e na psiquiatria, a criança e o louco serão tomados, nessa operação, como os sem razão. Quanto aos loucos, Pinel apostou que eles poderiam adquirir o maior dos bens, a razão, e assim serem curados e reintegrados à sociedade (Foucault, 1961). A psiquiatria moderna se fundava ali, naquela prática bem próxima da pedagógica, uma vez que era preciso ensinar ao louco a desenvolver um discurso e uma conduta racionais. No entanto, se os loucos, encarcerados desde o século XVII, encontravam a possibilidade de saírem às ruas, para isso, seria preciso que deixassem de ser loucos e se tornassem úteis, dóceis e razoáveis. O mesmo se esperava das crianças ao terminarem seus anos de escola; aliás, as crianças que não frequentavam a escola eram consideradas mal educadas, vagabundas, indisciplinadas e um perigo em potencial para o bom funcionamento social. É contemporâneo ao nascimento da escola moderna o desprezo e a desconfiança com a formação extra-escolar; haveria algo de louco nela.

É importante lembrar também que tal mescla de instituição disciplinar com projeto iluminista também se viu presente nas universidades europeias. Ali, a autoridade do professor era mantida e defendida pelo respeito, mas sendo difícil distinguir se tal respeito vinha do seu uso da razão, do conhecimento acadêmico-científico ou do lugar hierárquico e dos títulos possuídos. Provavelmente um pouco de cada. Enfim, a manutenção do modelo disciplinar já estabelecido deu continuidade à manutenção do poder do professor sobre o aluno, todavia não mais apenas como o poder de quem sabe sobre quem não sabe, de quem dita sobre quem copia ou de quem pode castigar sobre quem deve se submeter, próprios da escola do Antigo Regime. Agora, a esse poder soberano do professor do Antigo Regime soma-se o poder de moldar a conduta do aluno por meio da vigilância, da exigência de observância das normas, do adestramento. O professor agora é o exímio executor de uma pedagogia, de um método de ensino - como se só ele fosse capaz de transmitir certos saberes a seus alunos. Isto difere bastante, seja do professor do Antigo Regime, seja do aprendizado pelo experimento. O segundo, sugerido por alguns iluministas e que está na base do próprio método cartesiano, reconhece em qualquer intelecto que raciocine a capacidade de conhecer; o sujeito pode aprender em sua investigação da natureza sem um tutor. Já o primeiro, o professor do Antigo Regime, não tinha preocupações pedagógicas, era tão somente um comerciante de aulas e palestras (Ariès, 1973).

Percebe-se então que a ideia de que o Esclarecimento promovido pelo professor iluminista poderia ser efetuado num diálogo entre partes igualmente interessadas em fazer a razão prevalecer e ditar o final e glória da cena de descoberta da verdade é e foi algo absolutamente idealizado e quase nunca vivido. O lugar hierárquico concedido ao professor devido ao seu saber já comprovado, conjugado à concepção da criança ou do aprendiz como incipiente em termos de razão, quase nunca permitiu o diálogo entre as partes, mas, ao contrário, o emprego do poder instituído do primeiro sobre o segundo. O aluno passa, assim, a ser concebido apenas como recipiente de intelecto passivo, ou que deve ser tornado passivo, para receber o conteúdo do ensino.

Segundo Caron (1994), desde sua reformulação após a Revolução Francesa, o ensino primário teria como objetivo principal o aprendizado do que seria considerado basicamente necessário para a vida social, já o ensino secundário, que coincidiria com a adolescência, seria marcado pelo ensino moral também, como se vê no Grande Dicionário Universal do Século XIX, de Pierre Larousse (Larousse, 1866-1876), para o qual nos anos da adolescência, a higiene e a educação devem preparar e fundar, de alguma maneira, a saúde física e moral do homem. Foi exatamente entre 1780 e 1880 que se instaurou o ensino secundário em toda a Europa. A partir dessa época, a escola passa a representar na Europa o caminho regular pelo qual, por meio da instrução e da educação, o jovem ascende à ou na burguesia. Mas o que se chama saúde moral a ser transmitida no ensino secundário não é a mesma coisa que o ensino moral no Antigo Regime. O ensino secundário portaria o signo da tentativa da burguesia de criar uma elite em seu próprio âmbito e em relação às classes populares. Uma elite que se distinguiria do resto da burguesia e do proletariado por cultivar valores diferentes do ideal pequeno-burguês de estabilidade no amor, na família, na saúde e no trabalho. Essa elite cultivaria o amor pelo belo, pela ciência, pelos clássicos, pela filosofia; valores que supostamente a elevariam acima das preocupações mundanas rasteiras e a fariam experimentar o que resta de ascensão espiritual num mundo sem Deus. Tratar-se-ia da tentativa de conjugar a ascensão da razão como método universal e legítimo de busca da felicidade com valores clássicos não contaminados pelas derrotadas religião e aristocracia; algo semelhante ao projeto estético oitocentista neoclássico, derivado do iluminismo e da Revolução, e que buscou reunir o culto ao belo e o culto à razão, porém tornando-se no século XIX não apenas um referencial estético, mas também ético (Argan, 1992). A ciência transforma a escola para adorar a ciência: eis algo que se aprende na escola.

Como já apontado, as universidades modernas também se desenvolveram reunindo o modelo escolar do Antigo Regime com a exigência de que o ensino e as pesquisas ali realizados fossem científicos. Foucault (1975-1976) nos lembra que desde o século XVIII as universidades vêm desempenhando importante papel na seleção de quais saberes serão os universitários e quais serão dali excluídos, quais saberes constituirão a comunidade científica e quais não serão reconhecidos como ciência; além do mais, toda pesquisa científica será realizada e padronizada na universidade. Desde então foi decretado o desaparecimento do cientista-amador e a concentração de toda a ciência reconhecida como tal no interior da universidade. A razão e a verdade científica passam a ser bens possuídos pelo sistema escolar-universitário, que serão oferecidos àqueles que se disciplinarem ao seu modus operandi. Além dessa função, como a universidade está inserida no sistema educacional, ela também serve à formação e padronização profissional, submetendo cada profissão ao crivo da racionalidade prática. Isso quer dizer que ela passa a significar a caixa-forte das Luzes e o destino necessário para se alcançar o Esclarecimento e, ao mesmo tempo, um lugar de aprimoramento técnico disciplinar; centro de pesquisa, teoria e aprendizagem de uma profissão.

Peter Sloterdijk, em sua Crítica da razão cínica (1983), ataca a crença burguesa de que o aprimoramento por meio da formação seria de fato um herdeiro e o destino desejado para o Esclarecimento. Ao contrário, o autor viu emergir ao longo dos séculos XIX e XX, e em torno desta crença, uma postura indesejada, mas disseminada por toda parte, inclusive entre os profissionais da educação: o cinismo. O cínico, como "um tipo das massas" (Sloterdijk, 1983, p. 32), não acredita em nenhum progresso rumo à felicidade, mas aceita sustentar o sistema educacional nos moldes construídos a partir do iluminismo e das instituições disciplinares porque ele serve ao status quo ou, ao menos, às garantias mínimas de conquista de um trabalho; trata-se de uma espécie de conformista melancólico, de associal integrado.

Os planos de aula das escolas modernas são paródias da ideia de desenvolvimento (...). No sistema cultural moderno, a ideia do conhecimento corporificado decai nos docentes, assim como nos estudantes. Os professores (...) são (...) chefes de treinamento em cursos de aquisição de um saber distante da vida. (Sloterdijk, 1983, p. 130)

A formação nos moldes iluministas-escolares não seria uma formação para a vida em sua integralidade, mas estaria voltada para a adequação à razoabilidade social e profissional, como se se acreditasse cinicamente que um fragmento da vida pudesse ser desligado de todo o resto.

Ao contrário do que parece com sua crítica ácida, Sloterdijk é um defensor do Esclarecimento, mas tenta incentivar seus leitores a levar o Esclarecimento além de onde chegou e parou - e, para isso, seria preciso fazer, entre outras coisas, uma crítica à formação. Em certo sentido, ele busca manter a radicalidade da posição kantiana sobre o assunto. Quando Kant foi convidado a definir o que é o Esclarecimento (Kant, 1784), descreveu-o como uma saída de uma posição de imaturidade da humanidade - o que mais uma vez ratifica o lugar central da formação das crianças e jovens para os iluministas. A imaturidade em questão seria aquela dos que suspendem o uso de sua própria razão ao aceitarem a autoridade de alguém. Para Kant, obediência e uso da razão deveriam ser claramente distinguidos um do outro. Parece ser nesse mesmo sentido que Sloterdijk continua sua crítica à escola moderna:

Se não houvesse professores que se empenhassem desesperadamente pelo Esclarecimento apesar da aula e que investissem sua energia vital, apesar das condições, nos processos pedagógicos, não haveria mais quase nenhum estudante que conseguiria experimentar o que afinal estaria efetivamente em questão em uma escola. Quanto mais sistematicamente a educação é planejada, tanto mais ela depende do acaso ou da sorte, se é que a educação ainda pode acontecer efetivamente como iniciação da vida consciente. (Sloterdijk, 1983, p. 131-132)

O ponto central da crítica de Sloterdijk ao modelo escolar iluminista-moderno pode ser resumido, assim, nesta afirmação em forma de aforismo: "É constitutivo do Esclarecimento preferir o princípio da liberdade ao princípio da igualdade" (Sloterdijk, 1983, p. 149). E não parece ser isso o que as instituições disciplinares oferecem.

 

Concepções românticas de formação

O pensamento, os valores e o estilo de vida românticos desenvolveram-se como crítica à visão de mundo iluminista. A Revolução Francesa, com sua promessa de transformar o mundo em racional e belo, um mundo melhor, mais justo e mais harmônico, ao menos de imediato não alcançou propriamente seus objetivos. Viu-se, do lado dos revolucionários, personagens que poderiam, eles também, serem chamados de injustos, inimigos da liberdade e da igualdade e nem um pouco fraternos. Além do mais, a guerra civil, as traições, o Terror, a guilhotina, a retomada do poder eclesiástico e o estabelecimento do despotismo napoleônico apresentaram aos franceses uma realidade bem distante das promessas iluministas (Hobsbawm, 1979). Tal "espetáculo" não foi assistido somente pela população francesa, mas também pelo resto da Europa e do Ocidente, o que foi determinante para a força obtida pelas críticas românticas à utopia iluminista. Ainda assim, se um certo estilo de vida romântico se desenvolveu ao longo do século XIX, o romantismo não criou um modelo de educação com força para derrubar a escola moderna iluminista.

Como Georges Gusdorf (1982) observa, compreender o romantismo como uma unidade é um esforço meramente teórico; afinal, é justamente nesse momento histórico que as particularidades e diferenças serão reconhecidas como riquezas irredutíveis a uma unidade. Ainda assim, há uma constante valorização do que foge à disciplina; por exemplo, os caprichos e manias dos indivíduos, seus estilos e gostos próprios, passam a ser considerados adoráveis na cultura romântica. A criatividade e o gênio tornam-se virtude e ideal de vida. Tomaremos as ideias de duas grandes referências românticas, Edmund Burke e F. W. Goethe, a respeito da formação como parâmetro do que poder-se-ia esboçar como concepção romântica de educação.

Edmund Burke (1757) tem em seu projeto estético-educativo o objetivo de minorar o valor do belo identificado ao racional e, ao contrário, elevar o do sublime à mais engrandecedora experiência. Ao contrário do domínio, da estabilidade e da harmonia, o autor nos propõe que o sublime provocaria descompasso, angústia, terror e medo, mas também reflexão e uma espécie de prazer com o que supostamente seria desprazeroso, o deleite (delight). A experiência sublime viria lembrar ao homem sua pequenez e desamparo frente às forças da natureza, sejam as do mundo externo, sejam as de sua profunda natureza interna. Seja a razão, seja a harmonia com pretensões estabilizantes, não há poder humano que possa fazer frente àquelas forças descomunais. A razão e o belo como domínio do pensamento sobre a natureza jamais nos permitem apercebermo-nos daquela verdade. Ao contrário, seriam uma ilusão de segurança, engodo com o qual a civilização racionalista se comprometeu. Para Burke, o sublime provocaria um transbordamento, uma afetação tão intensa que causaria uma desindividuação radical, uma quebra de fronteiras entre o eu e os mundos externo e interno. Esse pensador acredita que será a experiência de desindividuação provocada pelo sublime que tornará os homens criativos e poéticos. O indivíduo genial será aquele inspirado por uma experiência sublime. Portanto, seria educativo lançar-se em experiências dessa qualidade, pois só assim é possível emergir tal ideal de homem - o gênio.

Goethe, quando jovem, o pré-romântico do Sturm und Drang, também traçou diretrizes importantes para o que seria educar do ponto de vista romântico. O Sturm und Drang foi um movimento artístico-intelectual concebido em torno de um trabalho de crítica mordaz à hegemonia do iluminismo e à centralização do núcleo da cultura ocidental na França (Goethe, 1772). Os membros desse movimento se dedicaram à tarefa de retirar o mundo alemão, com todas as suas particularidades culturais e naturais, da desvalia à qual o relegavam outros intelectuais alemães, deslumbrados com os ideais do outro lado do Reno. Ao valorizar o que havia de particular na cultura alemã, fizeram, no entanto, mais que isso: rebelaram-se contra o culto à razão e exaltaram as multiplicidades, as paixões e a vida.

Em Goethe (1772, 1774), as diversas formas de vida, em toda sua multiplicidade e poder metamórfico, harmonizam-se na natureza e numa cultura mais vasta, as quais aglomerariam todas as possibilidades de ser. O projeto iluminista é, desse modo, apenas uma entre múltiplas possibilidades de a humanidade se organizar e, se tomado em sua radicalidade, é limitador da vida. O jovem Goethe será, desse modo, um grande defensor das forças imanentes em oposição à transcendência de qualquer ideia ou modelo de cultura. É nesse sentido que a vida será uma noção importante para o poeta. Ela seria o maior valor a que os homens deveriam se voltar. Os conceitos, a razão, as ideias nos afastam da vida, que é pura energia transformadora. A vida não sai ilesa das generalizações; ao contrário, ela está na particularidade única de uma experiência, de uma realidade, de um ser humano. Na vida está o imediatismo do ser, a espontaneidade. Não obstante, a vida se refere sempre à própria natureza, mas natureza aqui corresponde à grande unidade que comporta todas as multiplicidades, todas as diferenças, todas as singularidades de cada vida. A natureza não é mais a natureza racional da ciência iluminista, um objeto a ser estudado e manipulado; ela, ao contrário, nos remete às singularidades irredutíveis que coabitam o mundo, sendo, em última análise, irredutível a um objeto. A desarmonia entre o homem e a natureza acontece toda vez que uma determinada forma de experiência cultural se impõe como a única tolerável e, dessa maneira, proíbe as multiplicidades de existirem.

Nesse sentido, se a vida - e não a razão - é o valor maior, a educação do homem será concebida de modo diferente. Uma vez que a vida é singular e irredutível às generalizações, cabe a cada um de nós tomar posse de nossa vida em oposição às forças contrárias a ela. A vida deve ser vivida em sua singularidade - o homem deve construir sua própria vida, tomar sua própria história nas mãos e conduzi-la; deve se automodelar. Por isso, em Goethe a arte ocupa um lugar destacado na educação. A arte é a tradução em ação da liberdade, da vida desconectada de uma cultura específica, para fazer parte de uma espécie de cultura mundial que inclui todas as subculturas em suas diferenças e possibilidades, confundindo-se com a própria natureza.

O romance de formação, invenção goethiana, é, juntamente com a autobiografia, a expressão na literatura do que se entendia como educação romântica, como se lê em Os sofrimentos do jovem Werther (Goethe, 1774) e até mesmo no título de Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister (Goethe, 1777-1786). Trata-se da narrativa de uma vida como aventura, como um lançar-se na experiência e transformar-se a partir dela. Trata-se da demonstração da construção de uma singularidade subjetiva e a valorização estética da realização da conquista da própria verdade.

Além das balizas traçadas por Goethe e Burke para uma educação romântica, Gusdorf (1982) salienta que a formação tal como concebida pelos românticos é sempre de dentro para fora e, portanto, muito diferente do modelo escolar. O conhecimento nunca se daria única e exclusivamente como a captura racional que um sujeito faz de seu objeto, mesmo que ensinado a fazê-lo; ao contrário, a troca afetiva parece condição sine qua non para o que os românticos considerariam o verdadeiro conhecimento. É claro que se perde muito da objetividade, mas a verdadeira transformação subjetiva se daria assim. A obediência disciplinada e a exposição de um conteúdo teórico ou prático transmissível por meio de exercícios racionais seriam uma transformação superficial do sujeito; apenas a experiência afetiva com um outro poderia levar a transformações profundas. O romantismo chama o sujeito à iniciação em um mistério: seja na descoberta de si, seja no amor a um outro, seja na experiência sublime da natureza ou na conversão religiosa. Não há programa estabelecido para essa aventura, ela é um contínuo desafiar-se e conhecer-se no processo e, ao mesmo tempo, porta, devido à exclusividade da experiência, uma incomunicabilidade. Daí a desconfiança romântica quanto à possibilidade de se ensinar a verdade pela comunicação inteligível.

As concepções românticas de formação não tiveram força suficiente para se transformarem em modelo de formação para as massas, ou mesmo para a burguesia. A escola moderna iluminista ergueu-se como modelo imbatível para todas as sociedades ocidentais. A desconfiança romântica quanto à capacidade de se transmitir a verdade, o entendimento da formação como um trabalho do indivíduo de dentro para fora, o reconhecimento de que cada indivíduo deveria ter uma formação singular para poder expressar a potência de sua vida e a tomada do gênio - figura excepcional - como resultante da experiência sublime certamente não ajudaram na implementação e disseminação de uma alternativa ao sistema educacional vigente que se dedicava à padronização de corpos úteis, dóceis e reprodutíveis. Ainda assim, foram fundamentais na formação dos artistas e literatos modernos que, por sua vez, destilaram o veneno romântico nos apreciadores de suas obras.

Após percorrer as vias principais dos mapas da formação segundo o iluminismo e o romantismo, localizarei alguns efeitos dessas duas tradições intelectuais-formativas na construção do modo de formação psicanalítica tornado referencial - o da clínica de Berlim sob a administração dos psicanalistas Karl Abraham e Max Eitingon, sob o aval de Freud.

 

Formação psicanalítica - na tensão entre iluminismo e romantismo

Bem antes da crise com Alfred Adler que conduziu à primeira grande ruptura no campo psicanalítico e o levou a cada vez mais buscar formalizar o que seria e o que não seria psicanálise e, com isso, a se preocupar com a formação dos analistas (como no artigo "A história do movimento psicanalítico" de 1914), no ano de 1907, nas famosas reuniões de quarta-feira, Freud já expressava algumas ideias que vigorariam depois (Checchia, Torres & Hoffmann, 2015). Por exemplo, na reunião de 27 de novembro de 1907, Freud censura a técnica adotada por Wilhelm Stekel e inspirada por Jung, da utilização das palavras indutoras, já considerando que ela se afasta da técnica clássica. Ali, portanto, já aparece um zelo com a técnica clássica e uma censura à adoção de outras vias. Sua intervenção no debate parece ter fins esclarecedores e instrutivos; foi o mesmo motivo que o levou, um pouco depois, a escrever o artigo "Psicanálise 'silvestre'" (Freud, 1910). Ali já se praticava um tipo de formação, mas muito diferente do que veio a se realizar depois.

Nessa época, a formação dos psicanalistas se conduzia assim: em torno de Freud havia algo semelhante a uma iniciação em um mistério; encontros com poucos discípulos, permeados de afetos, debates, discussões, alternâncias de palestras, interpretações psicanalíticas mútuas, conselhos e recomendações técnicas (Nunberg, 1959). A formação era, nos termos de Nathan G. Hale Jr. (1995), centrada num sistema patriarcal, onde o patriarca era Freud - ele era o educador de todos; nos termos de David M. Sachs (2011), o modelo era de um guru e seus discípulos. Respirava-se um ar um tanto romântico, talvez devido ao ineditismo daquela aventura ou talvez aos próprios fundamentos da psicanálise, como se verá mais adiante. Talvez seja possível também reconhecer aí vestígios da relação mestre-aprendiz tal como interpretada pelos iluministas, onde o laço afetivo e o ensino da psicanálise na sua própria prática pareciam pilares importantes. De qualquer modo, não havia ainda uma formalização da formação, mas Freud já a desejava. Isso fica claro na ata da reunião de 20 de outubro de 1907. Ali, Adler coloca em dúvida a possibilidade de a psicanálise poder ser ensinada ou aprendida. O secretário Otto Rank registra assim a resposta de Freud: "Em resposta a Adler, Freud afirma que não resta dúvida de que o método psicanalítico possa ser aprendido. Ele poderá ser aprendido uma vez que regras seguras estabeleçam limites à arbitrariedade dos psicanalistas individuais." (Rank, citado por Checchia, Torres & Hoffmann, p. 352-353).

Portanto, Freud tinha como objetivo instituir regras para o ofício da psicanálise e entendia que isso estava intimamente ligado à possibilidade de sua transmissão. Aparentemente, as regras aqui aludidas seriam de regras sobre a prática da psicanálise, sem que ficasse claro se haveria necessidade de regras sobre a forma de ensiná-la.

Durante e após as crises e rupturas com Adler, Jung e Stekel, ou seja, durante as publicações dos "Artigos sobre a técnica", e se julgarmos a posição de Freud a partir deles, temos de reconhecer que, ao mesmo tempo em que tenta definir claramente o que é e o que não é psicanálise (Freud, 1914), ele concede grande liberdade no uso da técnica por meio de suas recomendações aos analistas contidas naqueles artigos. E nada surge a respeito de regras quanto à formação dos psicanalistas.

É após a Primeira Guerra Mundial que as coisas mudam. Em 1919 Freud publica o artigo "Sobre o ensino da psicanálise nas universidades" (Freud, 1919b [1918]). Como o nome indica, Freud tenta adequar o ensino da psicanálise ao modelo universitário. Esse momento precisa ser contextualizado. Tanto Peter Gay (1988) quanto, mais esmiuçadamente, Hale Jr. (1995), Michael Schröter (2011) e Sachs (2011) mostram como a psicanálise muda de patamar, no que diz respeito ao seu reconhecimento internacional, após a Grande Guerra. Hale Jr. (1995) insiste que o reconhecimento do sucesso no tratamento psicanalítico dos neuróticos de guerra tornou a psicanálise mais aceitável, seja para os Estados, seja para o público em geral, seja no campo médico (surgiu uma psiquiatria de orientação psicanalítica). Claramente cresceu o interesse e o número de atendimentos nos Estados Unidos, na Inglaterra e na Alemanha.

Num contexto de rápida expansão da psicanálise, o tema da formação de psicanalistas entrou na ordem do dia. Assim surgiu o artigo de Freud acima mencionado. Freud sempre quis que a psicanálise fosse reconhecida como uma ciência - e, como a escola e a universidade modernas lhe ensinaram, é o modelo escolar que, supostamente, na modernidade garantiria a formação científica. Outro indício de que o movimento psicanalítico tomava o modelo escolar-universitário moderno como adequado à formação de psicanalistas surge no Sexto Congresso da IPA em 1920, cuja ata se encontra no The International Journal of Psychoanalysis (IPA, 1920): o pastor Oskar Pfister, apoiado por Hans Sachs, Freud, Abraham e Ferenczi, propõe que a Executiva da IPA investigue se seria possível emitir diplomas em psicanálise.

Aliás, o editorial desse primeiro volume do The International Journal of Psychoanalysis, assinado pelo então presidente da associação, Sándor Ferenczi (1920), indica um movimento de centralização de poder da IPA com a renovada discussão sobre o que é e o que não é psicanálise; ali é categoricamente afirmado que a IPA é uma instituição de sustentação de verdades duramente conquistadas até serem contraditadas por novas evidências, e também uma instituição de contraposição e crítica às tendências disruptivas e reacionárias que acompanham a psicanálise.

Também no contexto mencionado surge a policlínica de Berlim, administrada por Karl Abraham e Max Eitingon. O próprio Eitingon (1922) é explícito quanto à razão da criação dessa policlínica: atender à convocação realizada por Freud em sua comunicação no Congresso de Budapeste (Freud, 1919a [1918]), na qual se explicita tanto a vontade de oferecer psicanálise a um público mais amplo quanto de formar mais psicanalistas em instituições voltadas para isso.

Se reunirmos essa comunicação de Freud, seu artigo sobre a psicanálise nas universidades, o aumento pós-Guerra da demanda de psicanálise - até mesmo por parte do Estado - e o que se tornou a policlínica de Berlim, é possível afirmar que o movimento psicanalítico se empenhou deliberadamente em construir uma instituição nos moldes da escola moderna iluminista para a formação de psicanalistas e atender às exigências de padronização da prática exigidas pela universidade (bastião da ciência) e pelo Estado moderno (o maior aplicador e disseminador da ciência como prática - ao menos nos anos 1920). Passava pelo projeto de poder do movimento psicanalítico tentar conquistar o respeito científico e técnico da universidade e do Estado.

Com os esforços de Eitingon, em três anos de existência a policlínica se transformou num instituto de formação com um caráter acadêmico e um programa de estudos fixo, seguindo um modelo tripartite: análise pessoal, aulas e atendimento sob supervisão. Ali, "graduava-se" em psicanálise, surgia uma identidade, uma uniformidade profissional antes apenas esboçada. Esse ficou sendo conhecido como o "modelo Eitingon", que foi importado pelas demais sociedades componentes da IPA, sob o aval silencioso de Freud. Sabemos que, se Freud se opusesse a alguma posição política ou teórica no campo psicanalítico, ele se manifestaria publicamente, mesmo que envelhecido e adoentado, como se demonstra em sua defesa da análise leiga (Freud, 1926b) e na crítica aos desenvolvimentos teóricos e técnicos de Rank (Freud, 1926a [1925]).

A importação gradual do modelo da policlínica pelas demais sociedades de psicanálise parece fazer parte do esforço da IPA de controlar o desenvolvimento da psicanálise num universo de membros tornado muito maior após a Grande Guerra. Segundo Hale Jr. (1995), o que estava em pauta era a emergência de um sistema de monopólio e controle sobre a profissionalização que codificou teoria e terapia. Quem estivesse fora da instituição e se dissesse praticante da psicanálise encontraria um opositor que, com desconfiança, poderia chamá-lo de farsante ou louco.

A adoção pela IPA de um modelo escolar padronizado e burocratizado para se transmitir a psicanálise ocorreu nesse contexto. Uma história análoga à criação da escola moderna iluminista, que precisou ser implementada quando foi considerado necessário educar todos. Na IPA, foi o grande aumento da demanda de psicanalistas e de candidatos a psicanalista o que alavancou a escolarização da formação. O único modelo de formação de grandes grupos que se conhecia era a escola moderna. Mas os problemas da escola foram também herdados. Agora havia menos liberdade e mais igualdade. Perguntamo-nos se esse efeito era acidental ou intencional na apropriação do modelo escolar pela IPA, uma vez que continuava seu movimento centralizador e de combate aos divergentes.

Sloterdijk é preciso na crítica à adoção pelas instituições de formação psi do modelo escolar, no qual os professores detêm voz, saber e poder e cabe aos alunos a passividade, instaurando uma relação perversa: "Ao invés de oferecer uma psicologia da autoridade e uma radioscopia do masoquismo político, os diretores de escola dos movimentos psicológicos tendem a degustar até mesmo as benesses da autoridade e a utilizar mecanismos masoquistas a seu próprio favor." (Sloterdijk, 1983, p. 134).

Além disso, o modelo escolar também traz o inconveniente de ser um esforço "de fora para dentro", uma transformação superficial do aluno. Talvez por esse motivo, e tendo em vista que a psicanálise, como investigação do inconsciente, provoca tanto no paciente como no analista profundas resistências, seria preciso um trabalho a mais além do modelo escolar.

O próprio objeto da psicanálise, o inconsciente, bem como outro conceito fundamental, a pulsão, foram construídos por Freud no interior de sua prática, mas a partir de premissas distantes do racionalismo que vigorava em seu meio médico inicial. Parecem bem mais próximos de uma tradição romântica: o primeiro problematiza a supremacia do eu fundado no pensamento racional como idêntico ao sujeito e capaz de dominar o corpo e a natureza igualmente racionalizáveis (Mosé, 2004). A afirmação da existência do inconsciente traz consigo outra afirmação: a de que um campo de desejos e fantasias não dominado pelo eu se impõe a ele e determina a vida do indivíduo, apesar de sua suposta deliberação consciente (Freud, 1900a, 1900b, 1915b). Do mesmo modo, o conceito de pulsão nega o corpo como objeto natural sobre o qual incide a razão; a pulsão sexual é o efeito da erogenidade do corpo, ela é excitação que exige trabalho de descarga e prazer - e, para que esse trabalho seja realizado, o corpo é cartografado por meio das fantasias de realização de desejo que permitiriam a descarga pulsional (Freud, 1905, 1915a; Birman, 2000). Desse modo, o conceito de pulsão anula a separação entre corpo e pensamento, entre soma e psiquismo; ao contrário, o psiquismo se engendra em seu fundamento como um mapeamento corporal-afetivo das fantasias sexuais.

Podemos afirmar, portanto, que os conceitos de inconsciente e pulsão, tão caros a Freud e à psicanálise de um modo geral, mostram que o funcionamento racional do pensamento consciente domina apenas parcialmente a conduta; por trás dele há o corpo pulsional e o inconsciente. Essa posição político-teórica, conjugada ao problema da contratransferência, manteve no interior das discussões psicanalíticas o problema da formação não só como uma apropriação de um conhecimento racional transmitido por um mestre, mas também como o manejo do problema da experiência sublime do inconsciente e do corpo pulsional que adentram a experiência analítica dos lados do paciente e do analista (Birman, 2000; Saint Girons, 2005).

A exigência de análise pessoal por parte do candidato a psicanalista é, portanto, mais antiga do que a policlínica de Berlim, mas foi mantida. Essa exigência parece, assim, ter extraído suas raízes não do modelo escolar iluminista, mas das concepções românticas de educação, nas quais o sujeito só seria capaz de alcançar a verdade não por meio de aulas, mas por uma aventura subjetiva, uma busca de um conhecimento mais profundo de si, incluídos aí os percalços e dificuldades do processo. A transformação subjetiva da experiência psicanalítica seria condição necessária para se tornar psicanalista. Essa posição foi sempre defendida por Freud, sendo explicitada em um de seus últimos trabalhos (Freud, 1937), o que prova a manutenção de sua posição. Apesar da emergência do modelo escolar, a exigência de que o psicanalista tenha feito análise aparece, portanto, como uma resistência das raízes românticas das primeiras experiências de transmissão da psicanálise presentes nas reuniões de quarta-feira. Nem todos aqueles psicanalistas fizeram análise, mas as atas daquelas reuniões claramente demonstram que a transformação "de dentro para fora" era fundamental, que o posicionamento do sujeito e a investigação do próprio inconsciente e da própria experiência como analista eram muito valorizadas (Checchia, Torres & Hoffmann, 2015).

Vem também da herança romântica a sustentação da dúvida se a psicanálise é passível de ser transmitida, uma vez que é uma transformação de dentro para fora - e, portanto, difícil de se verificar. Também a herança romântica traz o cultivo da adoração e idealização dos psicanalistas de destaque como seres geniais e criativos, expressões em vida de uma verdade. A formação psicanalítica, devido ao modo escolar, tenderia a produzir uma massa de psicanalistas normais, sensatos e burocráticos (talvez um tanto cínicos, no sentido dado por Sloterdijk); mas a exigência de análise pessoal faz surgir desta massa, vez por outra, psicanalistas geniais, adorados, que rapidamente se tornam líderes locais. A exigência romântica de transformação de si diante do sublime inconsciente (Saint Girons, 2005), por não ser programática, não permite que todos sejam geniais, mas cria condições para que alguns destes "artistas" despontem.

O pensamento de Freud, seja na formulação de conceitos psicanalíticos, seja na construção de estratégias de formação de analistas, é o tempo todo marcado pela tensão entre essas duas heranças: a romântica e a iluminista. No que diz respeito ao exercício do tratamento sob supervisão, invenção da policlínica de Berlim, terceiro componente do tripé constitutivo da formação psicanalítica segundo o "modelo Eitingon", ele parece compor-se como um amálgama das tradições iluminista-escolar e romântica-experiencial. Afinal, a supervisão parece ocupar um lugar entre a aula e a análise, uma espécie de campo turvo entre aquelas duas práticas. E, por isso, talvez seja um ponto sensível para se avaliar a instituição de formação em questão. Na prática da supervisão se poderá afirmar a presença maior ou menor das influências iluministas ou românticas no modo de formar psicanalistas. Supervisores que tendem a controlar seus supervisionados, dizendo-lhes o que fazer e o que não fazer, ensinando-os a diagnosticar ou interpretar corretamente o que se passa naquela análise específica, disciplinando-os e instruindo-os, seriam verdadeiros herdeiros da escola iluminista. É esse estilo que aparece no "Report of the Berlin psycho-analytical polyclinic" (1922), assinado por Max Eitingon, no qual se lê que lá os supervisores acompanhavam de perto as análises dos aprendizes mediante anotações feitas por estes; conseguir-se-ia assim - segundo o relatório - detectar facilmente seus equívocos e gradualmente eliminar a maioria dos erros que os inexperientes cometem. Por outro lado, supervisores que estimulam o supervisionado a ele mesmo se haver com suas questões e pressões inconscientes, a explorar a experiência afetiva presente naquela análise, a ele próprio construir seu modo de ser psicanalista, a se lançar no mistério de cada encontro analítico, seriam herdeiros legítimos do romantismo; cada um pagando o preço da tradição em que está inserido.

 

Conclusão

Encerro aqui minha apreciação sobre o tema proposto. É verdade que investigações futuras podem ainda destrinçar mais delicadamente as heranças romântica e iluminista no "modelo Eitingon". E seria desejável que tal trabalho fosse feito, pois se complementaria com este em sua intenção de conduzir o leitor a perceber a insuficiência das tentativas de fundamentação de um modelo de formação psicanalítico a partir dos constructos teóricos internos à produção de conhecimento psicanalítico naturalizados ou mesmo tomados como a expressão de uma verdade intelectual irrefutável. As verdades forjadas pelo saber psicanalítico são em parte herdeiras de uma história ao mesmo tempo maior e menor do que a da psicanálise. Referi-me, neste artigo, seja a uma história maior anterior à psicanálise, a dos conflitos entre os projetos de formação iluministas e românticos que repercutiram na história da psicanálise, seja a uma história menor interior à psicanálise, mas interior não no sentido do desenvolvimento dos conceitos como autônomos da prática; ao contrário, me refiro aos efeitos que a prática, as experimentações, as circunstâncias políticas internas e externas à psicanálise têm na produção de ideias que se tornaram canônicas na história da psicanálise. Assim, abre-se o convite para a reflexão dos psicanalistas atuais sobre o que querem herdar e o que devem deixar morrer.

 

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Recebido em 10 de novembro de 2017
Aceito para publicação em 23 de dezembro de 2017

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