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Psicologia Clínica

Print version ISSN 0103-5665On-line version ISSN 1980-5438

Psicol. clin. vol.31 no.3 Rio de Janeiro Sept./Dec. 2019

http://dx.doi.org/10.33208/PC1980-5438v0031n03Edt 

EDITORIAL

 

 

O número 31.3 da revista Psicologia Clínica apresenta duas seções, uma temática e outra livre. A seção temática versa sobre "Questões contemporâneas da mulher" e reúne quatro artigos.

O primeiro, Mulheres privadas de liberdade e seus filhos: o sistema de justiça criminal em perspectiva, das autoras Ilka Franco Ferrari (da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais) e Vanessa Fusco Nogueira Simões (da Universidade Federal de Minas Gerais), investiga o trabalho de juízes em processos que envolvem mulheres privadas de liberdade e seus filhos, com elas reclusos por algum tempo. A pesquisa percorreu o sistema de justiça criminal do Brasil e de Minas Gerais, e apresenta reflexões psicanalíticas dentro da perspectiva da sociologia jurídico-penal, baseadas na observação de uma realidade social que prima pela complexa judicialização da relação entre mãe e filho. Os atores do sistema de justiça circulam pela administração ordinária da justiça penal, regida pelo princípio da eficiência, que é ainda distante das particularidades que supõem a diferença entre os sexos e a garantia dos direitos fundamentais da criança.

O artigo seguinte, Representações maternas de gestantes sobre o bebê concebido por ovodoação, das autoras Ivana Elia Schneider e Tagma Marina Schneider Donelli (ambas da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, RS), busca compreender as representações maternas de gestantes sobre o bebê concebido por ovodoação. A partir dos dados resultantes de uma pesquisa qualitativo-exploratória, com três gestantes entre 44 e 45 anos, considerados os aspectos objetivos e subjetivos, destacaram-se as expectativas em torno das características físicas e da saúde do bebê vinculadas à doadora, bem como a preferência por não revelar à criança sua origem genética.

O terceiro artigo da seção temática, "Mulher objeto": feminismo e psicanálise, de Lúcia Alves Mees e Maria Cristina Poli (ambas da Universidade Federal do Rio de Janeiro), tem por finalidade retomar as elaborações lacanianas quanto às fórmulas da sexuação, ressituando o lugar de objeto que comporia o gozo feminino, numa releitura voltada para a contemporaneidade do feminino, notadamente no cinema, na política e na moda, esta como expressão da posição objetal feminina, repensando sobretudo a questão do "objeto a" na posição feminina e sugerindo que ele segue a nova lógica ali escrita, sendo "não-todo" efeito do desejo masculino no fantasma.

A seção temática se completa com o artigo Repercussões de desencontros e ambiente familiar na relação mãe-bebê, das autoras Luiza Guazzelli da Costa Rodrigues (da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, RS) e Márcia Pinheiro Schaefer (da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, RS), que tem como objetivo discutir as dificuldades iniciais na relação mãe-bebê decorrentes dos desencontros ocorridos e a importância do ambiente familiar, a partir de um relato de experiência de uma observação da relação mãe-bebê e das formulações teóricas de Winnicott, realizada por meio de uma adaptação do método Bick. Concluiu-se que o ambiente familiar e, especialmente, o auxílio da avó materna foram importantes enquanto fontes de afeto e empatia para o desenvolvimento da criança.

A seção livre se inicia com o artigo Tempo de espera: narrativas de casais que aguardam pelo primeiro filho adotivo, das autoras Vivian Mazzini Pekny e Tania Mara Marques Granato (ambas da Pontifícia Universidade Católica de Campinas), um estudo qualitativo de orientação psicanalítica visando a compreender os sentidos afetivo-emocionais da adoção e da família adotiva para casais no primeiro processo de adoção. As entrevistas foram realizadas na residência de cada um dos cinco casais participantes, inicialmente com a apresentação de uma narrativa interativa como instrumento de acesso à experiência emocional. Os dados coligidos revelaram conflitos, fantasias, expectativas parentais e o sofrimento parental engendrado pelo próprio processo de adoção.

O segundo artigo, Emotional development of children with attention deficit hyperactivity disorder, das autoras Fernanda Kimie Tavares Mishima-Gomes e Valeria Barbieri (ambas da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP), é um estudo clínico-qualitativo, empregando a psicanálise winnicottiana como referencial teórico, visando a compreender o desenvolvimento emocional de crianças diagnosticadas com TDAH. Por meio das "narrativas transferenciais" e do teste de apercepção temática infantil, quatro crianças diagnosticadas com TDAH revelaram que os comportamentos desatentos e hiperativos surgem como uma deficiência no recebimento do "holding", o que resulta em enfraquecimento e desconsideração do gesto criativo que promove e sustenta o vínculo emocional com o mundo, o que faz com que a capacidade para vivenciar a transicionalidade, para o brincar e para a simbolização não possam se desenvolver. Este estudo abre possibilidades de intervenção e auxílio terapêutico às crianças e suas famílias.

O terceiro artigo da seção, O dinheiro como promotor de satisfação? Da economia política à economia psíquica, dos autores Lillian Nathalie Oliveira da Silva e Rogério da Silva Paes Henriques (ambos da Universidade Federal de Sergipe) é um ensaio teórico que analisa o dinheiro como elemento conflitivo de satisfação e condensador de opostos no psiquismo humano, contrapondo a economia psíquica, de uma perspectiva psicanalítica, à economia política capaz de satisfazer necessidades humanas, enfocando o dinheiro como atributo fálico em suas relações com a demanda e com o desejo do sujeito pulsional e denunciando assim o engodo da tentativa de contrabalançar a falta estrutural do sujeito com o dinheiro.

O penúltimo artigo, Repensando o caso Lefebvre com Jean Laplanche, dos autores Sarug Dagir Ribeiro e Fábio Roberto Rodrigues Belo (ambos da Universidade Federal de Minas Gerais), propõe uma releitura do caso Lefebvre, de Bonaparte, cujo resgate histórico-epistemológico interessa à psicanálise contemporânea por apontar justamente para o descentramento radical. Do referencial da teoria da sedução generalizada e com base na teoria tradutiva do recalcamento, o texto é trabalhado no sentido de desentranhar seus elementos concernentes à sedução originária e seus possíveis destinos e fracassos, tendo como princípio a primazia da sedução do outro nas origens da vida psíquica inconsciente e o ganho de realidade na psicose.

O artigo que fecha a seção e este número da revista, O conceito de imaginário coletivo em sua acepção psicanalítica: uma revisão integrativa, dos autores Débora Cristina Joaquina Rosa, Daiane Marcia de Lima, Rodrigo Sanches Peres (os três da Universidade Federal de Uberlândia, MG) e Manoel Antônio dos Santos (da Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP), expõe uma revisão integrativa empreendida mediante consultas às bases de dados PEPsic e SciELO-Brasil, sem limite de tempo, visando a mapear, analisar e avaliar criticamente a produção científica brasileira em forma de artigos sobre o imaginário coletivo em sua acepção psicanalítica. Um estudo que realça a plasticidade do conceito de imaginário coletivo e revela uma gama de produções imaginativas não conscientes que ensejam atuações no mundo externo ou delas representam um momento inicial, captando assim uma diversidade de processos psicológicos que são, ao mesmo tempo, individuais e sociais.

 

Isabel Fortes

Esther Arantes

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