SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.34 número1A escuta em psicanálise: Abstinência e neutralidade em questãoA telepsicoterapia durante a Covid-19: Repercussões da capacitação e do âmbito laboral dos terapeutas índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Psicologia Clínica

versão impressa ISSN 0103-5665versão On-line ISSN 1980-5438

Psicol. clin. vol.34 no.1 Rio de Janeiro jan./abr. 2022

http://dx.doi.org/10.33208/PC1980-5438v0034n01A07 

SEÇÃO TEMÁTICA - DINÂMICAS SOCIAIS E PSICOLOGIA: COGNIÇÃO, FAMÍLIA, TRAUMA E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA EM RELACIONAMENTOS E TRATAMENTOS

 

Adesão e abandono em psicoterapia psicanalítica na perspectiva de adolescentes

 

Adhesion and dropout in psychoanalytic psychotherapy from the perspective of adolescents

 

Adhesión y abandono en psicoterapia psicoanalítica desde la perspectiva de los adolescentes

 

 

Gabryellen Fraga Des EssartsI; Sofia Koch HackII; Leonardo Copello ValentiniIII; Eduardo Brusius BrennerIV; Vera Regina Röhnelt RamiresV

IPsicóloga pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e mestre em Psicologia Clínica pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) no Núcleo de Pesquisa em Psicopatologia e Psicoterapia Psicanalítica (NuPePPP). RS, Brasil. email: gabryellen.essarts@gmail.com
IIGraduanda em Psicologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) e bolsista PRATIC de iniciação científica no Núcleo de Pesquisa em Psicopatologia e Psicoterapia Psicanalítica (NuPePPP). RS, Brasil. email: sofiakhack@gmail.com
IIIGraduando em Psicologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), bolsista de iniciação científica PRATIC no Núcleo de Pesquisa em Psicopatologia e Psicoterapia Psicanalítica (NuPePPP). RS, Brasil. email: valentini0723@gmail.com
IVGraduando em Psicologia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Bolsista de iniciação científica UNIBIC no Núcleo de Pesquisa em Psicopatologia e Psicoterapia Psicanalítica (NuPePPP). RS, Brasil. email: edub.brenner@gmail.com
VPsicóloga, doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, professora titular do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), São Leopoldo, RS, Brasil. email: vramires@unisinos.br

 

 


RESUMO

Há múltiplos fatores associados às altas taxas de abandono na psicoterapia de adolescentes, mas uma escassez de estudos que abordem o tema na visão desses jovens. Este estudo teve como objetivo analisar, com base na perspectiva de adolescentes, motivos que os fizeram abandonar ou permanecer em psicoterapia psicanalítica. Foi realizado um estudo qualitativo, exploratório, de levantamento, transversal. Participaram 23 adolescentes que receberam indicação de psicoterapia psicanalítica. Depois de sete meses, em média, 12 se mantinham em tratamento e 11 o interromperam. Foi realizada uma entrevista individual e semiestruturada com cada participante e posteriormente analisadas com base no método da análise temática. Foram identificados dois temas no grupo que se mantinha em psicoterapia: 'Relação terapêutica' e 'Mudanças resultantes da psicoterapia', e três temas nas entrevistas do grupo que abandonou o tratamento: 'Relação terapêutica', 'Defesas e resistências dos adolescentes' e 'Aliança terapêutica com os responsáveis'. Constatou-se a centralidade da relação terapêutica na experiência dos jovens, bem como a importância da manutenção de uma boa aliança com os pais para a manutenção da psicoterapia.

Palavras-chave: psicoterapia psicanalítica; adolescente; abandono; adesão.


ABSTRACT

There are several factors associated with the high dropout rates in adolescent psychotherapy, but there are only a few studies that address this topic from these patients' perspective. This study aimed to analyze, based on adolescents' view, reasons that made them dropout or remain in psychoanalytic psychotherapy. A qualitative, exploratory and cross-sectional study was conducted. In it, 23 adolescents with an indication of psychoanalytic psychotherapy took part. After seven months, on average, 12 remained on treatment and 11 interrupted. An individual and semi-structured interview was conducted with each participant and subsequently the data was analyzed based on the thematic analysis method. Two themes were identified in the group that remained in psychotherapy: 'Therapeutic Relationship' and 'Changes Resulting from Psychotherapy', and three themes in the interviews of the group that dropped out: 'Therapeutic Relationship', 'Adolescent Defenses and Resistances' and 'Therapeutic Alliance with Those in Charge'. The results point to the centrality of therapeutic relationship in young people's experience, as well as the importance of keeping a good alliance with parents in order to remain in psychotherapy.

Keywords: psychoanalytic psychotherapy; adolescent; dropout; adhesion.


RESUMEN

Son múltiples los factores asociados a las elevadas tasas de abandono en la psicoterapia de adolescentes, pero hay una escasez de estudios que aborden el tema en la visión de estos jóvenes. Este estudio tuvo como objetivo analizar, desde la perspectiva de los adolescentes, las razones que les hicieron abandonar o permanecer en la psicoterapia psicoanalítica. Se realizó un estudio cualitativo, exploratorio, de tipo encuesta, transversal. Participaron 23 adolescentes que recibieron indicación de psicoterapia psicoanalítica. Después de siete meses, en promedio, 12 permanecieron en tratamiento y 11 lo interrumpieron. Se realizó una entrevista individual y semiestructurada con cada participante y luego se analizó con base en el método de análisis temático. Se identificaron dos temas en el grupo que permaneció en psicoterapia: 'Relación terapéutica' y 'Cambios resultantes de la psicoterapia', y tres temas en las entrevistas del grupo que abandonó el tratamiento: 'Relación terapéutica', 'Defensas y resistencias del adolescente' y 'Alianza terapéutica con los responsables'. Se verificó la centralidad de la relación terapéutica en la experiencia de los jóvenes, así como la importancia de mantener una buena alianza con los padres para el mantenimiento de la psicoterapia.

Palabras clave: psicoterapia psicoanalítica; adolescente; abandono; adhesión.


 

 

Introdução

Existem evidências dos benefícios da psicoterapia psicanalítica para diferentes desordens psicológicas, embora ainda se perceba que muitos pacientes desistem do tratamento antes de finalizá-lo (Briggs et al., 2019; Midgley et al., 2017; Rabung & Leichsenring, 2012). O conceito de abandono merece atenção, pois há diversas definições para compreender esse fenômeno e, nesse sentido, diferentes entendimentos influenciam os preditores e as taxas encontradas nos estudos desenvolvidos (Haan et al., 2013). De forma geral, a definição de abandono pode ser entendida como a escolha do paciente em interromper o tratamento antes que seus objetivos sejam cumpridos (Lhullier et al., 2006). Assim, o abandono está diretamente relacionado à decisão unilateral do paciente em finalizar seu tratamento.

Percebe-se que a literatura sobre abandono do público adulto já é bastante consolidada, fornecendo insights importantes acerca dos motivos que levam os pacientes a tomarem essa decisão (Block & Greeno, 2011). A metanálise de Swift e Greenberg (2012) sobre abandono de psicoterapia de adultos analisou 669 estudos de diferentes abordagens psicoterápicas, encontrando duas variáveis consistentes para explicar o término: o diagnóstico do paciente, com taxas mais altas para transtornos alimentares e de personalidade, e a idade, com pacientes mais jovens apresentando maior probabilidade de abandonar o tratamento. As variáveis sexo, estado civil e escolaridade demonstraram ser preditoras em alguns estudos, mas não de forma geral. Numa edição atualizada da mesma metanálise, os autores acrescentaram que os fatores gravidade do diagnóstico e experiência de trauma na infância também estão relacionadas com taxas mais altas de abandono (Swift & Greenberg, 2012).

A taxa média de abandono não se diferenciou conforme as abordagens terapêuticas, mas aumentou nos pacientes atendidos em clínicas universitárias (Swift & Greenberg, 2012). O fator institucional demonstra ser pertinente, pois muitas pesquisas são feitas em clínicas com profissionais ainda em formação, que não têm uma vivência consolidada na área, o que pode influenciar nos resultados bem-sucedidos, ou não, dos tratamentos (Benetti & Cunha, 2008).

Na direção dos estudos sobre abandono de psicoterapia de adolescentes, a literatura aponta uma taxa alta de interrupção, com índices entre 28,4% a 69%, (Baruch et al., 2009; Haan et al., 2013; O'Keeffe et al., 2018). Assim como no público adulto, a maior parte dos estudos pesquisou fatores sociodemográficos e clínicos. Os achados sociodemográficos sugerem que ser do gênero feminino sinaliza maior propensão para manter o tratamento, na fase inicial (Midgley & Navridi, 2007). Em contrapartida, um estudo verificou que ser do gênero feminino aumentava a probabilidade do abandono antes do encerramento do tratamento (Haan et al., 2015). Níveis baixos de inteligência intelectual, menor escolaridade, baixos níveis socioeconômicos e vulnerabilidade social também demonstraram ser preditores de abandono nessa faixa etária (Haan et al., 2015; Flisher et al., 1997; O'Keeffe et al., 2018). Quanto à idade, os resultados são díspares, com um estudo tendo encontrado que adolescentes mais novos têm mais chance de interromper prematuramente (Baruch et al., 2009) e outros indicando que pacientes com mais idade foram os que mais abandonaram (O'Keeffe et al., 2018; Rubin et al., 2016).

Sobre as variáveis clínicas, pacientes jovens com sintomatologias mais graves, funcionamento intrapsíquico mais frágil e estilos de apego do tipo evitativo ou ansioso mostraram-se como fatores de risco para a interrupção do tratamento (Benetti et al., 2017; Delgado & Strawn, 2012; Rubin et al., 2016). O comportamento antissocial e delinquente demonstrou um alto nível de predição do abandono, independentemente da idade (Baruch et al., 2009; O'Keeffe et al., 2018). Percebe-se que mais pesquisas precisam ser realizadas para preencher as lacunas e controvérsias frente aos resultados encontrados até o momento.

A opinião dos pais também demonstra contribuir significativamente na decisão da interrupção da psicoterapia. No estudo de Garcia e Weisz (2002), a percepção deles de que o psicoterapeuta não estava ajudando na melhora efetiva dos problemas do filho e a sensação de falta de investimento do profissional na família demonstraram ser motivos fortes para o abandono. Questões financeiras e decepção com o serviço prestado pela instituição escolhida também estavam associados à interrupção.

Em contraste, quando os pais conseguem acesso aos atendimentos para o adolescente, parece haver uma ambivalência sobre o desejo do início da psicoterapia: em parte, por fantasia e medo sobre o que o jovem poderia contar ao psicoterapeuta, e, por outro lado, por falta de consciência sobre os reais problemas do filho (Midgley & Navridi, 2007). Nesse sentido, os profissionais precisam estar atentos à transferência dos pais, bem como aos aspectos mais conscientes do processo, como a motivação e participação deles no tratamento (Delgado & Strawn, 2012).

O relacionamento terapêutico e os fatores que implicam maior envolvimento dos pacientes também se evidenciam como essenciais para a adesão (Bolton Oetzel & Scherer, 2003). Entre esses fatores, a Aliança Terapêutica (AT) mostra-se com papel fundamental, visto que a formação de uma AT de qualidade é um fator protetivo importante contra o abandono (Lhullier et al., 2006). Desde a etapa inicial do tratamento, a formação do vínculo entre a dupla e o estabelecimento claro dos objetivos e tarefas para o processo terapêutico podem favorecer maior adesão, pois os jovens tendem a abandonar o tratamento já nesse momento (Bordin, 1979; Roos & Werbart, 2013).

O surgimento do conceito de aliança terapêutica remonta aos escritos de Freud (1912/1996), que percebeu a necessidade do terapeuta de se tornar um colaborador do paciente e compreendeu esse achado como um fenômeno da transferência. Mais tarde, os psicanalistas do ego foram assumindo a importância da colaboração consciente entre terapeuta e paciente, tendo sido Zetzel quem cunhou o termo "aliança terapêutica" (Barber et al., 2013; Flückiger et al., 2018). Etchegoyen (1987), discutindo a teoria de Zetzel, destaca que para esta autora a AT depende de uma autonomia secundária do ego, e esta de uma boa relação de objeto com a mãe.

Entretanto, os limites entre a AT e a transferência podem ser muito tênues. Conforme Greenson (1981), que utilizava o termo "aliança de trabalho", a aliança seria um fenômeno de transferência relativamente racional, dessexualizado e desagressivizado. A transferência, por sua vez, designaria o processo pelo qual desejos inconscientes se atualizam sobre determinados objetos, no cenário de certo tipo de relação estabelecida entre eles, especialmente no quadro da relação analítica (Freud, 1916-1917/1996). Nesse sentido, a transferência implica uma repetição de protótipos infantis experimentados com um sentimento de atualidade significativa.

Algumas características por parte dos psicoterapeutas parecem influenciar positivamente o desenvolvimento da AT com os adolescentes, tais como empatia, autenticidade, disponibilidade emocional e sinceridade (Bolton Oetzel & Scherer, 2003). A literatura aponta que os jovens desejam estabelecer uma relação terapêutica mais igualitária, com abertura e franqueza no discurso dos terapeutas (Haan et al., 2014; Zack et al., 2007). Assim, o profissional que consegue equalizar a dinâmica relacional, estabelecer os limites do sigilo e desenvolver um trabalho colaborativo provavelmente promoverá uma aliança mais forte (Block & Greeno, 2011; Hawks, 2015). Uma AT de boa qualidade também favorece o desenvolvimento da transferência, primordial para as psicoterapias de orientação psicanalítica (Etchegoyen, 1987).

No campo da psicoterapia psicanalítica, estudos têm sido desenvolvidos comprovando a eficácia dessa abordagem e seus resultados no tratamento de adolescentes (Goodyer et al., 2017; Milrod et al., 2013; Seiffge-Krenke, 2020). Entretanto, ainda se observa uma escassez de estudos brasileiros nessa área, que contemplem apenas adolescentes e com foco na abordagem psicanalítica. Tendo em vista as peculiaridades próprias da adolescência, os aspectos que envolvem o desenvolvimento e manutenção do processo terapêutico com esses jovens e a alta taxa de abandono nessa faixa etária, esta pesquisa teve por objetivo compreender, a partir da perspectiva dos adolescentes, os fatores que os fazem abandonar ou permanecer em tratamento.

 

Método

Foi realizado um estudo de abordagem qualitativa, de levantamento, exploratório, transversal.

Participantes

Participaram deste estudo 23 adolescentes com idade entre 12 a 17 anos, que buscaram psicoterapia numa clínica privada, localizada na cidade de Porto Alegre. Durante um período de dez meses, 45 pacientes dessa faixa etária iniciaram psicoterapia na referida clínica e foram convidados a participar do estudo. Desses, 23 pacientes aceitaram participar, dos quais 12 permaneciam em tratamento e 11 haviam deixado de comparecer à psicoterapia antes da terceira sessão. Os pacientes que permaneciam em tratamento estavam, em média, há 7,25 meses em psicoterapia, com desvio-padrão de 2,26 meses. A definição de abandono utilizada foi que o tratamento tivesse sido interrompido por decisão unilateral do paciente e/ou dos responsáveis, sem que os objetivos e metas estabelecidos com o terapeuta tivessem sido cumpridos em sua totalidade.

A instituição onde a coleta de dados foi realizada tem por finalidade oferecer diversos tipos de atendimento psicológico e psiquiátrico à comunidade de classe média e média-baixa, além de oferecer especialização em psicoterapia psicanalítica. Nesse sentido, é importante destacar que os psicoterapeutas que realizaram os atendimentos são profissionais graduados e em formação na instituição.

Instrumentos

Além da ficha de dados sociodemográficos da instituição e dos dados de prontuário dos adolescentes, no período que o estudo abrangeu, foi utilizada uma entrevista individual, semiestruturada, por telefone. Questões norteadoras foram utilizadas com os dois grupos. Com o grupo que se mantinha em psicoterapia, as questões foram:

1. Como está sendo a experiência de fazer a psicoterapia?

2. O que acha bom (o que gosta) da psicoterapia? (caso não mencione: no que te ajuda?)

3. Tem alguma coisa que tu não gostas ou não achas bom? Se sim, o quê?

4. O que da psicoterapia mais gosta? (o que mais ajuda, na tua opinião?)

Com o grupo que interrompeu a psicoterapia, as questões foram:

1. Podes me contar da experiência dos primeiros atendimentos? Como foi para ti?

2. O que achou bom? O que não foi bom? O que não gostou?

3. Por que tu desististe de ir (de continuar o tratamento)?

Procedimentos de coleta de dados e procedimentos éticos

Foi feito um contato telefônico inicial com os pais/responsáveis para explicar o objetivo da pesquisa e o procedimento da entrevista com os adolescentes, solicitando sua permissão para conversar com o paciente. Com a autorização, um novo contato era realizado com o jovem, explicando o motivo do estudo e, mediante sua concordância, a entrevista era realizada. Os adolescentes também foram consultados sobre a permissão para a gravação das entrevistas, que tiveram a duração de 10 a 20 minutos. Os pesquisadores não tinham vínculo com a instituição onde a coleta de dados foi realizada, seja como psicoterapeutas, seja como docentes.

Este estudo foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição dos pesquisadores. Assim, tanto os pais/responsáveis como os adolescentes já haviam assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o Termo de Assentimento (TA), respectivamente. Além disso, haviam assinado o TCLE da instituição onde a psicoterapia aconteceu, que se caracteriza também como instituição de pesquisa e segue diretrizes de um Comitê de Ética em Pesquisa. Foi assegurado aos participantes que a realização da entrevista era voluntária, sem prejuízo ao tratamento que realizavam ou a futuros atendimentos na clínica. Questões de sigilo foram reforçadas, de forma a deixar os jovens confortáveis com a entrevista.

Análise de dados

Todas as entrevistas foram transcritas e submetidas à análise temática (Braun & Clarke, 2006; Braun et al., 2019). A análise foi realizada separadamente para os dois grupos. Foi efetuada por dois juízes, de maneira independente, e posteriormente discutida. As categorias temáticas finais foram estabelecidas por consenso.

 

Resultados e discussão

Os dados sociodemográficos do grupo que abandonou a psicoterapia e daqueles que se mantinham em tratamento são apresentados na Tabela 1.

Na Tabela 2 são apresentadas informações clínicas dos dois grupos.

A análise temática das entrevistas gerou dois temas no grupo de adolescentes que se manteve em psicoterapia e três temas no grupo que abandonou o tratamento. O tema "Relação Terapêutica" foi comum aos dois grupos e incluiu dois subtemas, como sintetiza o Quadro 1.

Adolescentes que permaneciam em psicoterapia

A análise das entrevistas desses jovens permitiu identificar que sua permanência em psicoterapia podia ser explicada por dois fatores: a relação terapêutica e uma percepção de mudanças resultantes da psicoterapia. Entre os aspectos descritos pelos adolescentes como positivos acerca do tratamento, a maior parte dizia respeito ao relacionamento terapeuta-paciente. Muitos desses aspectos se referiam ao que tem sido descrito na literatura como AT.

"Foi boa e tá sendo boa Eu achei bom, por causa que ela me explicou o que acontecia, o que que ela achava. E ela tava me ajudando nisso Eu gosto do tipo, como é que eu posso te explicar, eu gosto do jeito que ela me explica as coisas. Tipo, eu consigo entender muito." E10

"Eu gosto do jeito que é mostrado pra mim, do jeito que me ajuda, que não é algo forçado e também não é algo que É o que me dá ânimo pra ir aí e poder me ajudar. Eu gosto do jeito que me ajuda Acho que são os jogos que jogo com ela." E12

Uma AT de qualidade possibilita que o terapeuta se alie à parte sadia do paciente, que passa a ser capaz de tolerar suas resistências e defesas, inevitáveis na psicoterapia, possibilitando assim que os conflitos sejam experimentados (Zimerman, 2007). As falas seguintes ilustram a compreensão dos pacientes acerca do processo:

" é algo mais voltado pra perguntar o que tá acontecendo, seja bom ou ruim, e aí ver o que te incomoda e, a partir disso, tu tentar entender o porquê acontece. Não tentar resolver, mas sim tentar entender o porquê acontece e, então, tentar procurar soluções, talvez, que eu acabo dando ou acho acessível ou aceitável." E4

" eu posso desabafar e meus problemas eu divido, compartilho o que tá acontecendo e eu acho que é o principal: a ajuda pra resolver alguns problemas que eu tinha antes de consultar com um psicólogo." E1

Observou-se que as alianças foram bem avaliadas em todas as suas dimensões por esses pacientes, demonstrando que havia um entendimento sobre os objetivos do tratamento, como alcançá-los e um bom vínculo estabelecido entre a dupla. Tais achados corroboram a literatura, que destaca a importância dos profissionais investirem na relação terapêutica. Uma vez que ela é assimétrica, ao terapeuta cabe a responsabilidade de trabalhar intencionalmente em sua formação e manutenção (Roos & Werbart, 2013).

No tema "Relação Terapêutica", muitas falas referiram-se a elementos da dinâmica psíquica dos jovens, que extrapolavam a experiência que eles estavam tendo no aqui e agora. A transferência se refere aos sentimentos do paciente em direção ao terapeuta. A análise das entrevistas evidenciou que transferências positivas predominavam nesses casos. Esse tipo de transferência diz respeito aos sentimentos afetuosos e amistosos que o paciente direciona ao terapeuta (Zimerman, 2007).

" Humm, não sei, acho que é interessante o jeito que a psicóloga consegue transformar um assunto qualquer entrar na minha cabeça, eu acho bem legal isso." E3

"Eu acho bom, quando eu tô sozinha, assim, dentro de casa, eu não tenho ninguém pra conversar, entendeu? E quando eu tô com ela eu posso conversar, eu posso desabafar, eu posso falar, eu posso conversar com ela." E10

O estabelecimento da transferência positiva desses adolescentes se mostrou como um fator que auxiliou na adesão. Esses aspectos podem ter sido essenciais para a manutenção da psicoterapia e para o enfrentamento dos momentos de resistência no processo.

Um segundo tema com esse grupo se destacou e foi formulado como "Mudanças resultantes da psicoterapia". Esse tema revelou-se como um fator capaz de fortalecer a AT e também contribuir para a adesão. As seguintes falas ilustram esse tema:

"Com certeza, os problemas que eu tenho na escola, porque no ano passado, quando eu comecei, tava tudo muito horrível, tava com uma vontade imensa de mudar de escola e agora eu consegui me encaixar, tô conseguindo resolver as coisas sozinha Porque antes eu tinha muito medo de fazer algumas coisas, então eu acho que me ajudou principalmente nisso." E1

"Essa experiência está sendo maravilhosa, por causa que eu tô me sentindo bem melhor do que eu era, entendeu? Por causa que tipo, eu não me sentia muito confortável, então, eu conversando com a terapeuta eu tô muito melhor do que eu tava Tipo, eu era muito fechada, agora eu tô mais aberta, eu converso mais com as pessoas." E10

Na psicoterapia psicanalítica, a mudança psíquica está relacionada à possibilidade de ampliação do conhecimento da realidade psíquica e da realidade externa, ao aumento da organização das funções mentais, maior tolerância à frustração, capacidade de pensar antes de agir e uso de mecanismos de defesa mais maduros (Romanowski et al., 2015; Zimerman, 2007). As falas dos pacientes refletem mudanças esperadas nessa abordagem terapêutica e dão sustentação aos seus relatos acerca de como vivenciavam seus tratamentos.

Entre os critérios de mudança de uma psicoterapia estão a melhora dos sintomas e o progresso de relações interpessoais mais estáveis (Delgado & Strawn, 2012). Nas falas destacadas, tais mudanças ficaram evidenciadas. Quando os afetos negativos começam a ser melhor assimilados e o jovem se torna mais capaz de tolerá-los, há o desenvolvimento da capacidade de lidar com seus conflitos internos (Delgado & Strawn, 2012). Outro fator importante é a capacidade de insight do adolescente, ou seja, de compreender e atribuir significado sobre aspectos da sua vida psíquica de que antes não tinha consciência (Zimerman, 2007). As entrevistas dos pacientes que continuavam em tratamento revelaram os avanços que a psicoterapia estava proporcionando nesse sentido.

Adolescentes que abandonaram a psicoterapia

No grupo de adolescentes que abandonaram a psicoterapia, também foi possível identificar uma categoria temática relacionada à "Relação Terapêutica", que envolveu as dimensões da AT e da transferência, mas com nuances diferentes em relação ao grupo que permanecia em tratamento. No que diz respeito à AT, as seguintes falas ilustram isso:

"Ahm não sei, eu acho que a gente podia ter procurado outra forma de eu conseguir me expressar." E13

"Eu não me senti muito à vontade depois de um tempo." E15

"Então eu acho que eu meio que nunca sabia como começar a contar assim. Se eu começava contando, se eu não sei o que eu faria direito. Então, eu acho que pra melhorar o atendimento seria legal se tipo o psicólogo chegasse e tipo perguntasse se tá tudo bem, como foi a semana, se teve algum conflito, porque isso meio que ajuda a gente tipo a falar assim." E18

Considerando que esses adolescentes abandonaram o tratamento em suas sessões iniciais, deve-se considerar também que, em realidade, parece não ter havido uma adesão à psicoterapia. A AT pode não ter se estabelecido como seria esperado, já que a literatura aponta que até a terceira sessão já é possível identificar uma boa aliança (Bickman et al., 2004; Murphy & Hutton, 2018; Shirk et al., 2011; Zorzella et al., 2015).

Além dos aspectos relacionados à dinâmica psíquica própria desses jovens, e ao fator de que a maioria deles foi encaminhada para psicoterapia, deve-se considerar também questões relativas à técnica psicoterápica e à abordagem dos terapeutas em direção a esses jovens. As falas acima remetem a aspectos relacionados a uma falta de confiança no vínculo com os terapeutas (Bordin, 1979).

Bordin (1994) conceitualizou a AT como um constructo multidimensional. Esse autor descreveu a aliança como envolvendo três aspectos fundamentais: os objetivos, estabelecidos por consenso entre paciente e terapeuta; a tarefa, relativa às atividades para alcançar tais objetivos; e o vínculo, referente aos aspectos afetivos e relacionais da dupla terapeuta-paciente (Bordin, 1979). Analisando-se as falas dos adolescentes, uma hipótese para explicar a fragilidade da AT observada nesse grupo de participantes é que as dimensões "objetivo" e "tarefa" podem não ter sido abordadas de modo suficiente no período inicial do tratamento. É importante comunicar ao adolescente como a psicoterapia vai funcionar, e isso pode ser ainda mais relevante quando ele veio encaminhado por um terceiro. A dimensão "objetivo" tem especial complexidade, pois pode haver expectativas diferentes sob a perspectiva de quem encaminhou, do jovem e da família. Soma-se a isso que os jovens têm uma tendência a atribuir às situações externas os motivos de suas dificuldades; logo, o paciente pode não demonstrar motivação para a mudança ou, de acordo com essa hipótese, não assumir sua responsabilidade por sua melhora no tratamento (Block & Greeno, 2011). De acordo com Zack et al. (2007), isso pode ocorrer porque os adolescentes ainda estão desenvolvendo os recursos psicológicos mais elaborados.

Curiosamente, também foi possível identificar a experiência de uma boa AT nesse grupo, especialmente no que diz respeito ao vínculo:

"Eu gostei bastante, eu achei uma experiência boa e eu desabafei bastante com ela." E15

"Ela conseguia tipo dizer o que eu tava sentindo, e isso me ajudava e entender o que eu tava sentindo." E18

"Bem amigável. O jeito que a conversa funcionava, ela falava como se ela tivesse no mesmo nível que eu. Era como se fosse um diálogo entre pessoas iguais. Não era uma pessoa em cima e a outra embaixo, eram as duas no mesmo nível." E22

Embora possa haver um elemento subjacente a essas falas, decorrentes de desejabilidade social (eram adolescentes sendo entrevistados por uma pessoa adulta, perguntando sobre o tratamento que eles interromperam), deve-se considerar a hipótese de que a AT também continha elementos positivos, especialmente no que diz respeito ao vínculo que parecia estar se estabelecendo nessas duplas. Isso sugere que a qualidade da AT, por si só, não explica a continuidade ou a interrupção da psicoterapia, pelo menos no grupo de adolescentes entrevistados neste estudo.

Na psicoterapia psicanalítica, a AT e a transferência são fenômenos interligados, já que a AT, nessa perspectiva, tem aspectos inconscientes. Os aspectos transferenciais identificados nos relatos desses adolescentes evidenciaram que o fenômeno da transferência negativa teve impacto e influenciou na decisão pela interrupção. Nessa direção, Samardžić e Nikolić (2014) examinaram a relação entre a AT e a transferência, e sugeriram que a qualidade da AT pode estar diretamente relacionada aos padrões de relacionamento interpessoal dos pacientes e, consequentemente, à relação transferencial que o paciente estabelece com o terapeuta.

Na psicoterapia psicanalítica, a AT é parte da transferência e, mesmo que tenha uma parte consciente, faz parte da dinâmica transferencial, com aspectos racionais e irracionais (Etchegoyen, 1987). A análise das entrevistas do grupo que abandonou sugere um predomínio da transferência negativa. Entende-se, então, que não ficou favorecido o desenvolvimento de uma AT suficientemente robusta nos encontros iniciais, para que os jovens seguissem em tratamento.

A transferência se constitui como central na técnica psicanalítica e pode ser entendida como uma forma de relação que vai além de uma relação interpessoal dita comum, que se desenvolve no percurso da psicoterapia, remontando, inconscientemente, às experiências relacionais primárias (Tyson & Eizirik, 2015). Na clínica com adolescentes, a transferência demostra ser um desafio para os profissionais, tendo em vista a complexidade de conflitos intersubjetivos dessa fase:

"Achei um pouco fraca [a terapeuta]. Eu achei que ela podia ter explorado um pouco mais." E15

"Ah, sei lá, é que ela era muito repetitiva. Era sempre a mesma." E16

"Eu não sabia como é que era aquilo, mas no início eu achei meio estranho, porque eu falava, falava e falava com a pessoa, assim, e a pessoa só me escutava, sabe? Claro, me ajudava, mas eu achava estranho." E17

Os exemplos sugerem vivências de frustração, atribuída às terapeutas, que não supriram os pacientes da forma como eles esperavam. A transferência negativa pode ser entendida como um tipo de relação inconsciente, que remonta às vivências passadas do paciente e que se atualizam com o terapeuta, por meio de sentimentos de hostilidade e agressão (Zimerman, 2007). Mesmo com supostas boas alianças, a transferência negativa se impôs com mais intensidade e demonstra ter contribuído para a interrupção do atendimento.

Bornholdt (2009) aponta que, com adolescentes, o terapeuta precisa observar os conteúdos enigmáticos, as identificações projetivas envolvidas e os sentimentos contratransferenciais como material de escuta e compreensão dos conflitos. O papel do terapeuta passa a ser, ao mesmo tempo, de objeto transferencial e real. Essa capacidade de discriminação entre a dupla é possível para o terapeuta, que precisa ser capaz de suportar os mecanismos mais primitivos para transformar a ação comunicativa mais concreta em palavra e simbolismo (Lewkowicz & Brodacz, 2015). Para tanto, características específicas do profissional demonstram ser importantes, como paciência, firmeza e tolerância.

O segundo tema identificado nesse grupo foi o das "Defesas e resistências do paciente", que são aspectos fundamentais e que integram o processo terapêutico. É esperado que o paciente utilize as defesas do ego, e elas não podem ser entendidas apenas como resistências, mas como fonte de informação sobre o funcionamento do paciente (Zimerman, 2007). O paciente adolescente se depara com conflitos internos opositores. Esse jogo ambivalente o acompanha durante a adolescência e isso também aparece na psicoterapia. Uma das formas de a resistência aparecer é o jovem se defender por medo da mudança, mesmo quando ele a deseja:

"Eu acho por talvez não ter sentido muita diferença, daí eu achei que Eu tinha um pouco [de expectativa]. Na verdade, quem escolheu ir fui eu. Eu pedi pros meus pais, mas daí depois eu cansei eu acho um pouco difícil de falar, de conversar humm, não sei, eu acho que essa questão de ter dificuldade de falar. Então eu não senti que fez tanta diferença assim." E13

"No caso não é que não foi bom, é que no caso, sei lá, eu resolvi parar, é que tava sendo um "dinheirão". Ah, sei lá, às vezes atrapalhava e eu tinha que fazer algumas coisas na hora da psicóloga e sei lá. Eu tava, é que começou a ficar chato, sabe. No começo era legal, mas daí começou a ficar chato e eu enjoei, eu só enjoei." E16

"Quando eu desabafei tinha várias coisas que eu não queria mais falar, mas eu achei que precisava e eu fiquei bem triste com algumas coisas." E15

Os relatos ilustram processos defensivos como uma noção de estagnação do tratamento e de racionalizações acerca do impedimento que a psicoterapia está ocasionando, que podem representar dificuldades dos jovens para entrar em contato com seus conflitos. O conflito entre desejar que o adulto possa fazer algo por ele e, ao mesmo tempo, resistir a esse movimento marca a fantasia de ameaça de que, ao ceder, estaria abrindo mão de sua própria autonomia (Delgado & Strawn, 2012).

O uso de mecanismos de defesas mais primitivos no início da psicoterapia psicanalítica foi identificado em um estudo brasileiro realizado com pacientes adultos. O estudo de Hauck et al. (2007) teve como objetivo analisar fatores associados ao abandono precoce, isto é, tratamentos interrompidos antes dos três meses. Entre os diferentes fatores analisados, o estilo defensivo dos pacientes foi examinado. Os resultados mostraram que os pacientes que abandonaram apresentaram maior uso de mecanismos de defesas imaturos, o que pode indicar maior dificuldade de lidar com a realidade e enfrentar problemas externos e internos.

Bronstein (2000) sinalizou que, na adolescência, a capacidade de lidar com as ansiedades próprias da fase depende dos recursos internos do jovem e a função do setting, e do terapeuta, é tolerar as tensões e angústias geradas na contratransferência. Embora não tenha sido examinada neste estudo, a contratransferência também pode ter impactado nas psicoterapias analisadas, e constitui uma ferramenta valiosa dos profissionais para lidar com as vicissitudes da psicoterapia de adolescentes.

Por fim, identificou-se que outro aspecto presente nas decisões pelas interrupções do tratamento foi a "Aliança terapêutica com os responsáveis". De acordo com as entrevistas, evidenciou-se nas falas dos pacientes a influência dos pais na decisão da interrupção. Em alguns casos, a opinião deles parece ter contribuído para o abandono, embora o discurso dos jovens também deixasse entrever suas dúvidas em relação à psicoterapia. Assim, o movimento dos pais parece chancelar a decisão, com base na atribuição de motivos externos, como dificuldades financeiras.

"A gente começou a ter dificuldades financeiras e achamos melhor cortar algumas coisas. A gente falou com ela que a gente tava com dificuldade com dinheiro e a gente teve que parar naquele momento." E14

"Era tipo um algo a mais assim que ela não tava esperando assim. Então acho que ela não tava muito preparada pra pagar por muitos meses a psicóloga." E18

"Na verdade, não foi bem eu. Foi a minha mãe, ela achou que assim, acho que a minha família em si sempre achou que saúde emocional não é tããão importante quanto saúde física enfim, eu acho que ela pensou que já tava bom, que eu não precisava mais e que a gente já conseguiria resolver sozinhas. Porque, tipo, na visão dela, isso era muito das brigas que a gente sempre teve assim, eu e ela. E aí ela achou que a gente conseguiria resolver isso sozinha, mas acho que a psicóloga ajudava bastante assim." E18

Mesmo com a possibilidade da presença de dificuldades financeiras reais, é importante também considerar os aspectos inconscientes e resistenciais familiares, além da possibilidade de uma AT frágil com esses pais, pois a adolescência dos filhos mobiliza sentimentos importantes neles. Esse momento pode trazer dificuldades para os pais, que precisam abdicar do filho infantil e fornecer a passagem para que o jovem adquira suas próprias conquistas (Aberastury, 1981). Eles podem ser dominados por sentimentos de culpa e inveja ao perceberem as melhoras que a psicoterapia está proporcionando ao filho, posto que eles se deparam com suas próprias falhas narcísicas. Pode também acontecer uma rivalidade edípica com o psicoterapeuta, que passa a ocupar o lugar transferencial adulto para o jovem e desempenhar o papel de reparação das dificuldades.

Adicionalmente, a participação dos pais na psicoterapia dos adolescentes poderá ser imprescindível, pois são eles que garantem a manutenção do tratamento. Midgley e Navridi (2007) apontaram que a motivação e expectativa deles em relação ao tratamento, aliada à capacidade de pensar sobre os próprios sentimentos e os do filho, tiveram impacto na não continuidade da psicoterapia dos jovens em seu estudo.

O estudo de Garcia e Weisz (2002) chegou à conclusão de que os problemas associados ao relacionamento terapêutico foram o que mais influenciou o abandono do tratamento, isto é, a percepção dos responsáveis de que o terapeuta não estava ajudando adequadamente na resolução dos problemas. O julgamento que os pais podem formular também parece influenciar na continuidade da psicoterapia. Assim, os estudos concluíram que estabelecer uma AT sólida e de boa qualidade com os pais pode ser crucial para a adesão (Delgado & Strawn, 2012; Garcia & Weisz, 2002; Midgley & Navridi, 2007).

O terapeuta precisa formar um vínculo com esses pais por meio de uma escuta atenta, acolhendo possíveis angústias e fantasias. Os objetivos do tratamento e a forma de trabalho precisam ser informados, assim como entender suas expectativas em relação à psicoterapia. É possível que, em alguma medida, uma aliança frágil com os pais dos adolescentes entrevistados constitua uma hipótese para a não adesão desses jovens à psicoterapia, com base no que foi identificado nas entrevistas.

 

Considerações finais

Este estudo teve o objetivo de compreender os motivos que levam os adolescentes a permanecer ou abandonar a psicoterapia psicanalítica, de acordo com a perspectiva desses jovens. Foi possível constatar o papel central da relação terapêutica nos dois grupos entrevistados. Duas dimensões da relação terapeuta-paciente foram evidenciadas. A qualidade da AT e o tipo de transferência predominante. Para os adolescentes que continuavam em tratamento, observou-se uma AT caracterizada por uma boa qualidade, em geral, enquanto no grupo que interrompeu o tratamento essa aliança era mais ambivalente, abrangendo elementos menos favoráveis e indicativos de fragilidades.

Quanto à transferência, no grupo que permanecia em tratamento a transferência positiva parece ter predominado, enquanto uma transferência negativa foi identificada no grupo que abandonou. Ficou evidenciado que o uso de defesas mais rígidas e a resistência foram fenômenos mais presentes no grupo de jovens que não se manteve na psicoterapia. Além disso, ATs mais frágeis com os pais também apareceram entre os motivos para a interrupção. Já no grupo de adolescentes que se mantinha na psicoterapia foi observada uma percepção de mudanças positivas promovidas pelo tratamento. Esses jovens revelaram se sentir ajudados pela psicoterapia, o que fortalecia sua AT e a motivação para a continuidade do atendimento.

O estudo deixou em evidência a centralidade da relação terapêutica para os adolescentes entrevistados. Esse achado pode servir como alerta para os clínicos que trabalham com adolescentes, apontando para um elemento do processo terapêutico que pareceu suplantar, pelo menos nesse grupo, as questões da técnica e das intervenções utilizadas. Além disso, o estudo mostra a importância dos pais na psicoterapia psicanalítica de adolescentes, indicando que uma boa aliança terapêutica com eles, ou sua ausência, pode ser decisiva para a manutenção ou descontinuidade do tratamento.

Fica evidente a atenção especial que os psicoterapeutas devem dar à transferência do adolescente. Especialmente aos indicadores de transferência negativa que, neste estudo, mostraram-se como importantes fatores de risco para a interrupção da psicoterapia, e que podem comprometer, inclusive, uma boa aliança terapêutica.

É importante destacar que a psicoterapia psicanalítica de adolescentes é desafiadora para os terapeutas, assim como a adolescência é complexa e desafiadora para os jovens e para seus pais. Nesse sentido, há elementos do processo terapêutico não examinados neste estudo, como a contratransferência, por exemplo, além de outros fatores do terapeuta, como características de personalidade, estilo de apego e estilo defensivo, que podem ter um impacto no processo e no desfecho da psicoterapia com jovens.

As limitações deste estudo devem ser destacadas. O tema da continuidade ou abandono da psicoterapia foi examinado apenas da perspectiva dos adolescentes, por meio de entrevistas realizadas via telefone, com pacientes atendidos numa única instituição. Examinar a perspectiva dos familiares e dos terapeutas, com base em instrumentos diversificados e abrangendo uma diversidade maior de participantes, pode contribuir para a elucidação do fenômeno.

É significativo o número de jovens que interrompem suas psicoterapias, como mostra a literatura. Da mesma forma, são significativos os problemas de saúde mental apresentados por essa população e que requerem tratamento. É importante que esforços sejam canalizados no sentido de identificar as melhores estratégias e abordagens para o atendimento psicoterápico desse grupo. De acordo com este estudo, especial atenção deve ser dedicada à relação terapêutica, ao estabelecimento de um enquadre claro e definido com o jovem e à formação de uma AT sólida com seus pais.

 

Referências

Aberastury, A. (1981). O adolescente e o mundo atual. In: A. Aberastury; M. Knobel, Adolescência normal, p. 88-90. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Barber, J. P.; Muran, J. C.; McCarthy, K. S.; Keefe, J. R. (2013). Research on dynamic therapies. In: M. J. Lambert (Ed.), Bergin and Garfield's handbook of psychotherapy and behavior change, p. 443-494. New York: Wiley.         [ Links ]

Baruch, G.; Vrouva, I.; Fearon, P. (2009). A follow-up study of characteristics of young people that dropout and continue psychotherapy: Service implications for a clinic in the community. Child and Adolescent Mental Health, 14(2), 69-75. https://doi.org/10.1111/j.1475-3588.2008.00492.x        [ Links ]

Benetti, S. P.; Cunha, T. R. (2008). Abandono de tratamento psicoterápico: Implicações para a prática clínica. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 60(2), 48-59. https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=2290/229017549006        [ Links ]

Benetti, S. P.; Mattos, M. C. V.; Silva, N. B.; Bittencourt, A. A. (2017). Avaliação de processo em psicoterapia psicanalítica na adolescência. Psico, 48(2), 130-139. http://doi.org/10.15448/1980-8623.2017.2.24820        [ Links ]

Bickman, L.; Vides de Andrade, A. R.; Warren Lambert, E.; Doucette, A.; Sapyta, J.; Boyd, A. S.; Rumberger, D. T.; Moore-Kurnot, J.; McDonough, L. C.; Rauktis, M. B. (2004). Youth therapeutic alliance in intensive treatment settings. The Journal of Behavioral Health Services & Research, 31(2), 134-148. https://doi.org/10.1007/BF02287377        [ Links ]

Block, A. M.; Greeno, C. G. (2011). Examining outpatient treatment dropout in adolescents: A literature review. Child and Adolescent Social Work Journal, 28(5), 393-420. https://doi.org/10.1007/s10560-011-0237-x        [ Links ]

Bolton Oetzel, K.; Scherer, D. G. (2003). Therapeutic engagement with adolescents in psychotherapy. Psychotherapy: Theory, Research, Practice, Training, 40(3), 215-225. https://doi.org/10.1037/0033-3204.40.3.215        [ Links ]

Bordin, E. S. (1979). The generalizability of the psychoanalytic concept of the working alliance. Psychotherapy: Theory, Research & Practice, 16(3), 252-260. http://doi.org/10.1037/h0085885        [ Links ]

Bordin, E. S. (1994). Theory and research on the therapeutic working alliance: New directions. In: A. O. Horvath; L. S. Greenberg (Eds.), The working alliance: Theory, research, and practice, p. 13-37. Oxford: Wiley & Sons.         [ Links ]

Bornholdt, I. M. (2009). Adolescência: Fôlego. Revista de Psicanálise da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre, 16(2), 247-260. https://revista.sppa.org.br/RPdaSPPA/article/view/728        [ Links ]

Braun, V.; Clarke, V. (2006). Using thematic analysis in psychology. Qualitative Research in Psychology, 3(2), 77-101. https://doi.org/10.1191/1478088706qp063oa        [ Links ]

Braun, V.; Clarke, V.; Hayfield, N.; Terry, G. (2019). Thematic analysis. In: P. Liamputtong (Ed.), Handbook of research methods in health social sciences, p. 843-860. Penrith, Australia: Springer. https://doi.org/10.1007/978-981-10-5251-4        [ Links ]

Briggs, S.; Netuveli, G.; Gould, N.; Gkaravella, A.; Gluckman, N.; Kangogyere, P.; Lindner, R. (2019). The effectiveness of psychoanalytic/psychodynamic psychotherapy for reducing suicide attempts and self-harm: Systematic review and meta-analysis. British Journal of Psychiatry, 214(6), 320-328. https://doi.org/10.1192/bjp.2019.33        [ Links ]

Bronstein, C. (2000). Working with suicidal adolescents. In: I. Wise (Ed.), Adolescence, p. 21-39. London: Karnac.         [ Links ]

Delgado, S. V.; Strawn, J. R. (2012). Termination of psychodynamic psychotherapy with adolescents: A review and contemporary perspective. Bulletin of the Menninger Clinic, 76(1), 21-52. https://doi.org/10.1521/bumc.2012.76.1.21        [ Links ]

Etchegoyen, R. H. (1987). Fundamentos da técnica psicanalítica. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Flisher, A. J.; Kramer, R. A.; Grosser, R. C.; Alegria, M.; Bird, H. R.; Bourdon, K. H.; Narrow, W. E. (1997). Correlates of unmet need for mental health services by children and adolescents. Psychological Medicine, 27(5), 1145-1154.         [ Links ]

Flückiger, C.; Del Re, A. C.; Wampold, B. E.; Horvath, A. O. (2018). The alliance in adult psychotherapy: A meta-analytic synthesis. Psychotherapy, 55(4), 316-340. https://doi.org/10.1037/pst0000172        [ Links ]

Freud, S. (1912/1996). A dinâmica da transferência. In: Obras completas, vol. XII, p. 109-122. Rio de Janeiro: Imago.         [ Links ]

Freud, S. (1916-1917/1996). Conferências introdutórias sobre psicanálise - Conferência XXVII: Transferência. In: Obras completas, vol. XVI, p. 287-539. Rio de Janeiro: Imago.         [ Links ]

Garcia, J. A.; Weisz, J. R. (2002). When youth mental health care stops: Therapeutic relationship problems and other reasons for ending youth outpatient treatment. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 70(2), 439-443. https://doi.org/10.1037/0022-006X.70.2.439        [ Links ]

Goodyer, I. M.; Reynolds, S.; Barrett, B.; Byford, S.; Dubicka, B.; Hill, J.; Holland, F.; Kelvin, R.; Midgley, N.; Roberts, C.; Senior, R.; Target, M.; Widmer, B.; Wilkinson, P.; Fonagy, P. (2017). Cognitive behavioural therapy and short-term psychoanalytical psychotherapy versus a brief psychosocial intervention in adolescents with unipolar major depressive disorder (IMPACT): A multicentre, pragmatic, observer-blind, randomised controlled superiority trial. The Lancet Psychiatry, 4(2), 109-119. https://doi.org/10.1016/S2215-0366(16)30378-9        [ Links ]

Greenson, R. R. (1981). A técnica e a prática da psicanálise. Rio de Janeiro: Imago.         [ Links ]

Haan, A. M.; Boon, A. E.; Jong, J. T. V. M. de; Geluk, C. A.; Vermeiren, R. R. (2014). Therapeutic relationship and dropout in youth mental health care with ethnic minority children and adolescents. Clinical Psychologist, 18(1), 1-9. https://doi.org/10.1111/cp.12030        [ Links ]

Haan, A. M.; Boon, A. E.; Jong, J. T. V. M. de; Hoeve, M.; Vermeiren, R. R. (2013). A meta-analytic review on treatment dropout in child and adolescent outpatient mental health care. Clinical Psychology Review, 33(5), 698-711. https://doi.org/10.1016/j.cpr.2013.04.005        [ Links ]

Haan, A. M.; Boon, A. E.; Vermeiren, R. R. J. M.; Hoeve, M.; Jong, J. T. V. M. de (2015). Ethnic background, socioeconomic status, and problem severity as dropout risk factors in psychotherapy with youth. Child & Youth Care Forum, 44(1), 1-16. https://doi.org/10.1007/s10566-014-9266-x        [ Links ]

Hauck, S.; Kruel, L. R. P.; Sordi, A. O.; Sbardellotto, G.; Cervieri, A.; Moschetti, L.; Schestatsky, S.; Freitas Ceitlin, L. H. M. (2007). Fatores associados a abandono precoce do tratamento em psicoterapia de orientação analítica. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 29(3), 265-273. https://doi.org/10.1590/S0101-81082007000300005        [ Links ]

Hawks, J. M. (2015). Exploring the therapeutic alliance with adolescents and their caregivers: A qualitative approach (dissertação de mestrado). University of Kentucky, USA.         [ Links ]

Lewkowicz, A. B.; Brodacz, G. (2015). Abordagem psicanalítica na adolescência. In: C. L. Eizirik; R. W. de Aguiar; S. S. Schestatsky (Orgs.), Psicoterapia de orientação analítica: Fundamentos teóricos e clínicos, p. 755-771. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Lhullier, A.; Nunes, M. L.; Horta, B. (2006). Preditores de abandono de psicoterapia em pacientes de clínica-escola. In: E. Silvares (Org.), Atendimento psicológico em clínicas-escola, p. 229-246. Campinas: Alínea.         [ Links ]

Midgley, N.; Navridi, E. (2007). An exploratory study of premature termination in child analysis. Journal of Infant, Child, and Adolescent Psychotherapy, 5(4), 437-458. https://doi.org/10.1080/15289160701382360        [ Links ]

Midgley, N.; O'Keeffe, S.; French, L.; Kennedy, E. (2017). Psychodynamic psychotherapy for children and adolescents: An updated narrative review of the evidence base. Journal of Child Psychotherapy, 43(3), 307-329. https://doi.org/10.1080/0075417X.2017.132945        [ Links ]

Milrod, B.; Shapiro, T.; Gross, C.; Silver, G.; Preter, S.; Libow, A.; Leon, A. C. (2013). Does manualized psychodynamic psychotherapy have an impact on youth anxiety disorders?. American Journal of Psychotherapy, 67(4), 359-366. https://doi.org/10.1176/appi.psychotherapy.2013.67.4.359        [ Links ]

Murphy, R.; Hutton, P. (2018). Practitioner Review: Therapist variability, patient-reported therapeutic alliance, and clinical outcomes in adolescents undergoing mental health treatment: A systematic review and meta-analysis. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 59(1), 5-19. https://doi.org/10.1111/jcpp.12767        [ Links ]

O'Keeffe, S.; Martin, P.; Goodyer, I. M.; Wilkinson, P.; IMPACT Consortium; Midgley, N. (2018). Predicting dropout in adolescents receiving therapy for depression. Psychotherapy Research, 28(5), 708-721. https://doi.org/10.1080/10503307.2017.1393576        [ Links ]

Rabung, S.; Leichsenring, F. (2012). Effectiveness of long-term psychodynamic psychotherapy: First meta-analytic evidence and its discussion. In: R. Levy, J. Ablon, H. Kächele (Eds.), Psychodynamic psychotherapy research: Evidence-based practice and practice-based evidence, p. 27-49. Totowa, NJ: Humana. https://doi.org/10.1007/978-1-60761-792-1_3        [ Links ]

Romanowski, R.; Escobar, J. R.; Sordi, R. E.; Campos, M. S. (2015). Níveis de mudança e critérios de melhora. In: C. L. Eizirik; R. W. de Aguiar; S. S. Schestatsky (Orgs.), Psicoterapia de orientação analítica: Fundamentos teóricos e clínicos, p. 376-397. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Roos, J.; Werbart, A. (2013). Therapist and relationship factors influencing dropout from individual psychotherapy: A literature review. Psychotherapy Research, 23(4), 394-418. https://doi.org/10.1080/10503307.2013.775528        [ Links ]

Rubin, A.; Dolev, T.; Zilcha-Mano, S. (2016). Patient demographics and psychological functioning as predictors of unilateral termination of psychodynamic therapy. Psychotherapy Research, 28(5), 672-684. https://doi.org/10.1080/10503307.2016.1241910        [ Links ]

Samardžić, L.; Nikolić, G. (2014). Transference patterns and working alliance during the early phase of psychodynamic psychotherapy. Vojnosanitetski Pregled, 71(2), 175-182. https://doi.org/10.2298/VSP1402175S        [ Links ]

Seiffge-Krenke, I. (2020). Depressive and anxious adolescents: Do they profit from psychodynamic therapy?. Psychology, 11(4), 563-571. https://doi.org/10.4236/psych.2020.114037        [ Links ]

Shirk, S. R.; Karver, M. S.; Brown, R. (2011). The alliance in child and adolescent psychotherapy. Psychotherapy, 48(1), 17-24. http://doi.org/10.1037/a0022181        [ Links ]

Swift, J. K.; Greenberg, R. P. (2012). Premature discontinuation in adult psychotherapy: A meta-analysis. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 80(4), 547-559. https://doi.org/10.1037/a0028226        [ Links ]

Tyson, R.; Eizirik, C. L. (2015). Transferência. In: C. L. Eizirik; R. W. de Aguiar; S. S. Schestatsky (Orgs.), Psicoterapia de orientação analítica: Fundamentos teóricos e clínicos, p. 287-299. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Zack, S. E.; Castonguay, L. G.; Boswell, J. F. (2007). Youth working alliance: A core clinical construct in need of empirical maturity. Harvard Review of Psychiatry, 15(6), 278-288. https://doi.org/10.1080/10673220701803867        [ Links ]

Zimerman, D. E. (2007). Fundamentos psicanalíticos: Teoria, técnica, clínica - Uma abordagem didática. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Zorzella, K. P. M.; Muller, R. T.; Cribbie, R. A. (2015). The relationships between therapeutic alliance and internalizing and externalizing symptoms in Trauma-Focused Cognitive Behavioral Therapy. Child Abuse & Neglect, 50, 171-181. https://doi.org/10.1016/j.chiabu.2015.08.002        [ Links ]

 

 

Recebido em 22 de outubro de 2020
Aceito para publicação em 04 de fevereiro de 2022

 

 

Não se declararam fontes de financiamento.

Creative Commons License