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Jornal de Psicanálise

versión impresa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.1 no.1 São Paulo mayo 1966

 

A introjeção do analista como objeto bom na evolução da análise

 

 

Chaim José Hamer

 

 

O presente trabalho tem a finalidade de evidenciar a importância do mecanismo de introjeção do analista, como objeto bom, por efeito de suas interpretações, no fortalecimento do ego do paciente.

Este fortalecimento pode ser verificado no que ocorreu em duas sessões com características especiais, porquanto elas têm em comum o fato de na véspera de ambas não ter o analista podido atender o paciente. A falta de atendimento determinou um intervalo de fim de semana mais longo que o habitual. A primeira destas duas sessões (sessão nº 16) ocorreu na quarta semana de tratamento, e a outra (sessão nº 247), após um ano.

Na sessão nº 16, o paciente entra muito angustiado por não ter tido tratamento no dia anterior, lidando por isto com sentimentos de depressão persecutória, prejuízo, rejeição, apatia e desânimo, e, responsabilizando-me por eles.

Com as interpretações sente-se mais forte, porém, ainda muito amedrontado pela possibilidade de vir eu a falhar novamente em atendê-lo, ou mesmo, abandoná-lo definitivamente.

Na sessão nº 247, o paciente apresenta-se igualmente muito angustiado pela ausência do analista no dia anterior, sentindo-se perturbado, inútil, desconfiado, descrente, desanimado, deprimido, com falta de vontade de viver e sentindo a vida vazia. Com a proximidade da sessão (horas antes), enche-se de ânimo, e, com o trabalho analítico, percebe não só que está ligado a mim, mas também que depende de mim e evidencia ter para comigo albuma consideração. Pôde sentir que gosta de mim, entrando em contacto comigo como objeto bom; reatando, volta a vida, sem o que, sente morte interna. Podemos verificar, com isto, como a vida do ego depende da vida dos objetos internos (Melanie Klein). O paciente, não suportando a frustração da minha ausência no dia anterior, quando então sou sentido como objeto mau, fica perseguido, ataca a ligação comigo, projeta-me para fora de si, e, perdendo-me, sente-se vazio e morto. Reatando, re-introjeta-me e revive. Isto foi possível por haver o analista, não se confirmando como objeto perseguidor, facilitado a sua re-introjeção como objeto bom, reforçando dentro do paciente o núcleo do bom.

Na sessão seguinte, a de nº 248, o paciente sentiu-se mais tranquilo, com forças para trabalhar (o que não lhe foi possível no dia anterior, antes de ter tido a sessão) lidando com o bom que recebeu no dia anterior e que serviu para fortalecer o núcleo que ainda não é suficientemente forte e estável, teme perdê-lo, devido às fôrças do elementos persecutórios, entre estes a inveja.

Fazendo comparação entre as duas sessões, verifiquei que, de acôrdo com a obsessão de repetição descrita por Freud (um impulso reprimido trata repetidamente de encontrar sua gratificação a despeito da repressão), o paciente repete as mesmas angústias, fantasias inconscientes e mecanismos de defesa do ego, na mesma situação frustradora. Como, porém, o "insight" do paciente na sessão nº 247 é maior que na sessão nº 16, a sessão nº 247 apresenta um aspecto diferente, em concordância com a situação interna um pouco mais amadurecida do paciente.

Comparando-se o crescimento psíquico do paciente e da criança, verificamos que, em certas áreas, o paciente está revivendo um período de sua vida, compreendido entre o nascimento e os três ou quatro primeiros meses de vida, quando então, predomina a posição esquizo-paranoide (M. Klein) e quando a interação dos processos de projeção, e re-projeção e re-introjeção, determinam o desenvolvimento do ego. Penso, como muitos outros, que a vida psíquica não se inicia repentinamente com o nascimento, mas antes. Em favor deste pensamento podemos citar Freud, que, em "Inibição, Sintoma e Angústia", afirma: "Existe maior continuidade entre a vida intra-uterina e a primeira infância do que nos permite acreditar a impressionante interrupção do nascimento", e citar também Melanie Klein que em "Inveja e Gratidão" refere: "Pode muito bem ser que o fato de haver formado parte da mãe no período pré-natal contribua ao sentimento inato do lactente, de que fora dêle mesmo existe algo que lhe dará tudo o que necessita e deseja. O seio bom é admitido e chega a ser parte do ego, de modo que a criança, que antes estava dentro da mãe, passa a ter mãe dentro de si. Se bem que o estado pré-natal confere, sem dúvida, um sentimento de unidade e segurança, a não perturbação deste estado dependerá da condição psicológica e física da mãe e, possivelmente, de certos fatôres fetais ainda não explorados... Caberia, pois, supôr que a esta primeira forma de ansiedade, proveniente do nascimento se agregam as experiências desagradáveis do feto, e que, junto com o sentimento de segurança no útero, estas anunciam a dupla relação com a mãe, seio bom e seio mau".

Acredito que o equilíbrio existente dentro do feto, quando o desenvolvimento é normal, tendo de um lado os instintos de vida e as gratificações fetais, e do outro os instintos de morte e as frustrações fetais, penderá para o lado positivo do instinto de vida, e que explicará o rápido crescimento do feto. Como o trauma do nascimento dá refôrço muito grande à angústia persecutória ligada ao instinto de morte, êste equilíbrio se romperá de maneira muito intensa e o recém-nascido tentará então restabelecê-lo, à custa da introjeção do seio bom e dos cuidados maternos.

Na análise, à introjeção do seio bom e dos cuidados maternos, corresponderão as boas interpretações e os cuidados na manutenção da situação analítica. A ausência de interpretação no momento necessário, ou a interpretação inadequada em conteúdo ou em forma aparecem quando o analista não é suficientemente preparado em sua análise pessoal, ou quando faltam-lhe conhecimentos teóricos, o que provoca no paciente revivências da introjeção de um seio mau, percebido como: sêco, estragado, ou como tendo leite bom, porém em volume insuficiente, ou então tendo tanto leite que "afoga" a criança. Podemos portanto concluir que as interpretações não devem pecar por serem "sêcas" no momento de "fome" do paciente, erradas, insuficientes ou serem longas a ponto de "afogarem" o paciente. A quebra da situação analítica que igualmente aparece quando o analista é insuficientemente preparado, provoca no paciente a revivência dos sentimentos de frustração do bebê, que ainda existe no paciente feito adulto, acarretados por uma mãe, que, embora possa ter um seio cheio de leite bom, não cria para o bebê condição de ambiente, de aconchêgo, de amôr enfim, que dê condições plenas para o bom aproveitamento da mamada. Analogamente, podemos concluir que o analista deverá ser capaz de dar, além de boas interpretações, condições ao paciente para que elas sejam bem aproveitadas, e isto conseguirá tendo o cuidado de preservar a situação analítica, e na qual é importante respeitar o contrato estabelecido com o paciente na primeira entrevista.

Podemos verificar nas duas sessões citadas, como o paciente se comporta diante da frustração intensa de não ter tido sessão na segunda-feira, depois da pausa habitual do fim de semana. Para o paciente, teve o sentido que tem para uma criança não receber a mamada esperada, após um intervalo muito longo, ou então, pode mesmo representar a vivência da separação da mãe ao nascimento. O paciente (como a criança) passa a viver angústias persecutórias muito acentuadas porque tem de lidar com o analista introjetado como objeto mau, ficando o ego quase que à mercê do instinto de morte reforçado por este mau objeto introjetado, decorrente da frustração experimentada.

No material do paciente encontramos também elementos depressivos, embora não esteja o paciente propriamente no período depressivo descrito por Melanie Klein. Podemos entender que seja assim, porque achamos que há, desde as primeiras introjeções de algum objeto bom, a necessidade de o ego incipiente cuidar dêste bom objeto introjetado, que vai fortalecer o núcleo do bom objeto introjetado, que vai fortalecer o núcleo do bem, a fim de não perdê-lo e com isto não se enfraquecer. Para isto usa mecanismos de defesa como: "split", omnipotência, negação, idealização, contrôle dos objetos internos e externos, projeção e introjeção. É pois à custa de boas interpretações (seio bom para a criança) que o paciente consegue amortecer a angústia persecutória e se equilibrar, porque são estas interpretações que vão reforçar o núcleo do bom, formado pelos bons objetos introjetados e o instinto de vida. Desta maneira consegue tranquilizar-se, adquirir mais confiança no objeto bom, revelando maior integração do ego e síntese do objeto.

 

BIBLIOGRAFIA

1 - Freud S. - Inibicion, Sintoma y Angustia. Sigmund Freud - Obras Completas. Editorial Biblioteca Nueva. Madrid, 1948 Volumen 1, pg. 1235        [ Links ]

2 - Freud S. - Mas Alla del Principio del Placer. Sigmund Freud. Obras Completas. Editorial Biblioteca Nueva. Madrid, 1948. Volumen 1, pg. 1111        [ Links ]

3 - Klein M. - Envidia Y Gratitud. Las Emociones Basicas del Hombre. Editorial Nova Buenos Aires.         [ Links ]

4 - Klein M. - Algunas Conclusiones Teóricas Relativas a la Vida Emocional del Lactente. Revista Uruguaya de Psicoanalisis. Tomo II. Número 3. Año 1958.         [ Links ]

 

 

- NOTICIÁRIO -

- A Comissão Organizadora do VI Congresso Psicanalítico Latino-Americano, noticiando o temário e programa convida Membros da Sociedade Brasileira de Psicanálise a participar dos trabalhos, colaboração indispensável para êxito desse acontecimento Internacional.

- Programa -

Domingo 24 de julho - Ato inaugural.

Segunda-feita 25 de julho

- Tema oficial: Mania

- 4 Relatórios oficiais (duração 30 minutos).

- 4 Correlatórios oficiais (duração 15 minutos).

- Sessão plenária.

Terça-feira 26 de julho

a) Parte da manhã: Trabalhos livres de 10 minutos de duração apresentados em mesas simultâneas.

b) Parte da tarde: Sessão Administrativa.

Quarta-feira 27 e Quinta-feira 28 de julho

- Tema oficial: Teoria da técnica: discussão baseada em dois materiais clínicos.

- 4 Relatórios oficiais (duração 30 minutos)

- Mesas redondas simultâneas sob a direção de um coordenador. Cada uma terá um sintetizador.

- Exposição dos analistas que apresentaram o material clínico.

- Síntese de todos os relatórios com discussão sobre os diferentes esquemas conceituais.

- Sessões plenárias.

- Sessão de avaliação do Congresso e Encerramento.

Os casos clínicos "Cacilda e Perla", material de estudo do Congresso foram distribuídos entre os Membros da Sociedade e Candidatos do Instituto. Contribuições aos estudos desses casos podem ser dirigidas à Secretaria do Instituto.

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