SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.45 número82Tornar-se um autorA autoria de Sabina Spielrein índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Jornal de Psicanálise

versão impressa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.45 no.82 São Paulo jun. 2012

 

REFLEXÕES SOBRE O TEMA

 

Autoria, elaboração e criação em análise: pensando com Sônia Azambuja

 

Authorship, working through and creation in analysis: reflecting with Sônia Azambuja

 

Autoría, elaboración y creación en análisis: pensando con Sônia Azambuja

 

 

Luís Claudio Figueiredo1

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O livro de Sônia Azambuja Presenças e ausências, parceiras na simbolização é submetido a uma leitura crítica destinada a extrair uma noção de autoria – intimamente ligada aos processos de simbolização e criação – implícita em seus escritos e em sua trajetória profissional, com seus pacientes e em sua instituição, a SBPSP.

Palavras-chave: Autoria, Elaboração, Criação, Autoria compartilhada.


ABSTRACT

This paper is a critical reading of Sônia Azambuja's Presence and abscence, partners in symbolization that envisages the extraction of an idea of authorship – intimately linked to the process of symbol formation and creativity – which is implicit in her writings and in her professional career, with her patients and in the São Paulo Psychoanalytic Society.

Keywords: Authorship, Working through, Creation, Shared authorship.


RESUMEN

El libro de Sônia Azambuja Presencias y ausencias, compañeras en la simbolización es objeto de una lectura crítica destinada a extraer la noción de autoría – íntimamente relacionada a los procesos de simbolización y creación – implícita en sus escritos y en su trayectoria profesional, con sus pacientes y en su Institución, la SBPSP.

Palabras clave: Autoría, Elaboración, Creación, Autoría colectiva.


 

 

"São quase 30 anos de escritos que amigos e admiradores de Sônia Azambuja recolheram nesta coletânea. Já não era sem tempo, mas antes tarde do que nunca, observa judiciosamente Fabio Herrmann, na apresentação. Os assuntos, os contextos e as plateias variaram, mas algumas marcas muito pessoais se mantiveram e se acentuaram ao longo do tempo. Talvez, mais importantes do que as ideias tomadas uma a uma, e que nos esclarecem e estimulam, nas áreas dos diversos temas trabalhados pela autora, o melhor e mais digno de registro seja a coerência dos escritos, dada pela reiteração de certas posições teóricas e clínicas, desde o primeiro texto de 1978. São estas posições – é este estilo – que garantem a Sônia Azambuja um lugar especial e muito valioso no campo da psicanálise que se pratica no Brasil. A este aspecto voltarei mais adiante. De início, procurei focalizar, antes de mais nada e principalmente, estas posições de base".

Assim começava uma resenha que escrevi, a pedido da Sônia, em seguida à publicação de sua coletânea (Azambuja, 2006). Uma iniciativa de um grupo de amigos e amigas, fato mais importante do que meramente circunstancial, como se verá a seguir. Na verdade, esta modalidade coletiva de produção do livro serviu como "fato selecionado" na interpretação que elaboro nas páginas que se seguem.

Embora os temas que intitulam o presente artigo já estivessem ali presentes, voltei ao livro movido pelo convite do Júlio Tanus e da Eunice Nishikawa, pelo Jornal de Psicanálise. No que segue, procurarei dar a eles um destaque maior.

De saída, uma consideração: há autorias e autorias, bem como há diversas maneiras de pensar sobre o assunto.

No sempre lembrado Qu'est-ce q'un auteur?, Foucault (1969/1994), em um período bastante peculiar de sua trajetória – sob o império da ideologia estruturalista e da condenação do sujeito como agente e ponto de partida da ação intencional, negando assim seu passado na fenomenologia – tenta nos convencer que o autor é um efeito produzido pelo conjunto de uma "obra" (conceito igualmente problemático a ser colocado sob suspeita, segundo nosso "autor"), jamais sua "causa"; tratar-se-ia de algo que se constitui na posterioridade dos textos, uma operação da crítica. Por isso, Foucault desdobra-se na análise da função autor no contexto de estruturas sóciohistóricas determinadas e como resultado de procedimentos e operações sobredeterminadas por estas estruturas.

Verdade é que, neste mesmo trabalho, a certa altura ele admite que certos autores são bem mais que isso e se encontram numa posição "transdiscursiva": são os fundadores de uma discursividade; Marx e Freud, por exemplo, seriam autores não só de seus textos como, de certa forma, "autores", de todos os textos que foram gerados no campo desta discursividade, gerados por ela, que funcionaria como horizonte e matriz de possibilidades lógicas e interdições. Uma discursividade estabeleceria "a possibilidade e a regra de formação de outros textos" (Foucault, 1969/1994, p. 804). Freud e Marx, de certa maneira, teriam provocado efeitos (irreversíveis?) de estruturação ou reestruturação a partir dos quais as autorias possíveis – as nossas, por exemplo – voltariam a ser meros efeitos retrospectivos dos textos que tentamos ou conseguimos escrever, vistos a uma certa distância crítica.

A partir desta concepção, Freud, como "instaurador da discursividade" psicanalítica, tornou possíveis não só nossas semelhanças, facilmente atribuíveis à nossa filiação comum, como também "certo número de diferenças" (p. 805). Vale dizer, até mesmo nossas singularidades diferentes fariam parte do que Freud nos legou como possibilidade. Eis aí um excelente antídoto contra o "narcisismo das pequenas diferenças" que tantas vezes assola e perturba nossas frágeis comunidades.

Mas há, certamente, formas bem diferentes de lidar com autores, mesmo os maiores como Freud, avaliando seus recursos retóricos, seu estilo, seus meios e modos de produção de ideias e de argumentação e convencimento dos leitores; é o que praticou Patrick Mahony em diversas oportunidades focalizando textos particulares desta obra gigantesca (cf. Mahony, 1981). Um empreendimento como o de Mahony não invalida a perspectiva foucaultiana, ao contrário, a corrobora, pois o que Mahony faz corresponderia justamente à construção de uma função autor em torno do nome de Freud e a partir dos textos assinados por ele, com o que adquirimos noções mais claras acerca do tipo de escritor que Freud era, melhor dizendo, do escritor que nós leitores psicanalistas construímos sob esta rubrica.

E há autores de outra estatura, importantes sem dúvida, mas que não chegam a ser fundadores ou instauradores de uma "nova discursividade". Ao contrário, pertencem ao campo das semelhanças e diferenças por Freud estabelecidas e reestabelecidas – com suas diferenças – pelos maiores de seus herdeiros, tais como Klein, Lacan e alguns outros.

O trabalho de Liana Pinto Chaves (2011), por exemplo, apresentado originalmente em Londres em 2011, focaliza a produção de Ronald Britton, um pensador psicanalista freudo-kleiniano, produtor de uma obra original, vale dizer, responsável por uma série de textos que podem ser reunidos sob seu nome e que exploram a discursividade freudo-kleiniana de maneira inovadora. Coube à amiga Liana não só identificar nos textos publicados de Britton o que faz dele um "autor", mas também interpretar o processo através do qual isso pode ocorrer, tendo chegado a conclusões bem interessantes. Ela mostra como tal processo acaba sendo um dos temas, nem sempre explícito, de seus principais trabalhos: a travessia do Édipo na posição depressiva, o confronto com a tradição, o confronto com o patrimônio criado pelos fundadores e sustentado pelos pares de Ronald Britton na British Society of Psychoanalysis, às vezes de forma um tanto persecutória diante de inovadores.

Outro trabalho está sendo realizado sobre este tema do "vir a ser autor" (Franco, 2012), focalizando agora a produção de Donald Winnicott. Para nossa surpresa, conforme se pode interpretar a partir de referências esparsas contidas em seus textos, Winnicott, ao que parece, tornou-se "autor" lidando com questões que estão no centro de algumas de suas principais contribuições para a psicanálise … No caso, há uma questão de "autenticidade" implicada: trata-se da necessidade de criar uma via própria, singular de pensar e expressar-se, mantendo-se rente à própria experiência, sem romper com a tradição, mas a incorporando criativamente, o que promove mudanças e continuidade, singularização e inserção comunitária. É toda a questão do self verdadeiro, sua proteção e expressividade espontânea que comparece nesta forma de autorização: Winnicott procurava um reconhecimento incompatível com o que seria a produção de um self puramente adaptativo, interessado em conformar-se às normas e padrões estabelecidos, ainda que muito capaz e inteligente.

Enfim, é quase como se cada um criasse uma psicanálise tanto à altura das necessidades de sua experiência clínica com seus pacientes, como também na medida de seu próprio percurso de "autorizar-se", de sua própria história de "vir a ser autor". A hipótese mereceria ser testada com outros autores. Mas cremos que algo assim se passa efetivamente no autorizar-se de Sônia Azambuja, que inclui como elemento essencial promover a nossa própria autorização, o "vir a ser autor" do outro, seja seu paciente, seja seu leitor, fazendo com que sua autoria se converta em uma espécie de compartilhamento autorizante.

Sem pretender – nem precisar – situar Sônia Azambuja nos patamares de Freud, Winnicott, ou mesmo de um psicanalista prolífico como Britton, interessa-nos seu pensamento e sua escrita como testemunho de um processo de autorização que, a rigor, é bem mais universal do que poderia parecer: para além das peculiaridades da autora, há algo que diz respeito ao "tornar-se autor" de cada um de nós, como psicanalistas e como pacientes, ou seja, como ser humano em sociedade, entre outros seres humanos, os que nos precederam, os que nos cercam e os que nos hão de suceder. Uma autoria que se manifesta a cada vez, por exemplo, que interpretamos, o que fazemos o tempo todo, recortando e produzindo sentido a partir da complexidade "insensata" da existência: refirome a todos os aspectos da vida que residem fora do campo do sentido, resistindo a ele e tanto exigindo um processo de simbolização como a ele se opondo.

É claro que mesmo no contexto aparentemente minúsculo – o de uma situação analítica bem instalada e em andamento – ainda nos podem ser de alguma valia as perspectivas abertas no texto de Foucault: o quanto, em uma interpretação em análise, se trata da iniciativa intencional do sujeito intérprete, o quanto se trata do efeito de uma estrutura e de sua dinâmica peculiar, ainda quando esta dinâmica gera, por sua vez, efeitos de ruptura e transformação da própria situação analítica? De onde e de quem provêm as ideias transformadoras em uma análise? Indo mais longe: quem é o sonhador que sonha um sonho em análise, como se pergunta Grotstein? (e a noção de "terceiro analítico" criada por Ogden para designar o campo intersubjetivo criado no encontro analítico nos ajuda a encontrar uma resposta).

Mas mesmo que reduzíssemos a autoria a esta condição – efeito da estrutura e da dinâmica estrutural –, sempre que se produz uma transformação – um acontecimento, inesperado e catastrófico, na ordem estrutural – uma interpretação analítica é, como os seis personagens na peça de Pirandello, uma demanda e uma ocasião do autorizar-se, para o analista e, esperemos, para seu paciente. Ou seja, mesmo quando atribuímos uma interpretação verdadeiramente analítica e transformadora à dinâmica estrutural, seria necessário conceber esta dinâmica como efetivamente capaz de constituir subjetividades que a transcendem, subjetividades capazes de introduzir elementos de ruptura e transformação na situação analítica, fazendo-a transitar, termo, aliás, caro a nossa autora.

Mas vamos ao livro de 2006 e ao que ele nos sugere sobre autoria, elaboração e criação em análise.

O que se pode apreender em todos os doze capítulos da coletânea de Sônia Azambuja é, em primeiro lugar, a liberdade com que ela evolui pelos meandros da teoria e da clínica e pelas veredas, nem sempre fáceis de transitar, da vida institucional. Seja quando um referencial kleiniano e bioniano pareciam predominar, seja quando o estudo dos textos de Freud veio a ser privilegiado, seja quando psicanalistas "franceses" emergiram no seu horizonte, o que Sônia Azambuja jamais foi é escolástica e sectária, marcando sua singularidade de forma firme, mas sem alarde e oposições. Ou seja, muito mais um trabalho de assumir diferenças, no âmbito das semelhanças e colaborações, do que uma exibição arrogante de incompatibilidades; vale dizer, o narcisismo das pequenas diferenças passa longe deste autorizar-se.

Ao ler seus trabalhos, não saímos com a impressão de termos lido uma kleiniana, uma freudiana ou o que quer que seja, mas a de havermos convivido com uma psicanalista dotada de um leque de referências suficientemente amplo – e em contínua expansão – para dar conta de sua clínica, ou ao menos, honestamente, tentar … Clínica, aliás, entendida no sentido amplo da palavra, o que inclui as produções sociais, culturais e artísticas do nosso tempo. As referências "teóricas", por sua parte, incluem autores contemporâneos da filosofia, da literatura e … da psicanálise. O que se abre e descortina é uma rede sutil e delicada de referências conceituais, posta a serviço de elaborações muito pessoais e singulares, totalmente voltadas para os fenômenos examinados, na medida de seus "objetos", em proveito do cultivo paciente das relações emocionais e cognitivas com seus "objetos". Assinalo na afirmação acima a noção de rede, pois a concepção de autoria que Sônia Azambuja implicitamente "expõe" e, mais que tudo, encarna deve muito às redes.

Convivência e diálogo, na verdade, são as palavras-chave, tanto no conteúdo, quanto na forma destes trabalhos: o que assistimos são os encontros e intercâmbios entre autores, entre fenômenos e processos psicológicos, entre a autora e seus ouvintes e leitores etc. À página 189, lemos: "muitos dos escritos que produzi foram feitos dialogando com outros escritos de colegas e mesmo com interlocutores ausentes". Acrescentaria: todos os escritos trazem a marca de sua origem dialógica e colocam em diálogo autores, colegas, filmes, obras da cultura e … pacientes. Como se afirma no título, todos estes elementos são parceiros ora bem presentes, ora mais ausentes, e são parcerias o que se constitui e mobiliza nestes trabalhos que muitas vezes têm a cadência de uma conversação sossegada, sinuosa, paciente.

Um pensamento e um estilo "femininos" na melhor acepção do termo – o de uma disposição à receptividade e ao acolhimento –, sendo também, e por causa disso, um continuado elogio da amizade, que começa na nota de agradecimentos, percorre todas as páginas e finaliza na última linha do livro. É nesta medida que o fato da coletânea haver surgido de uma ação coletiva de amigos da autora não pode ser tomado como acidente e ter-se tornado o "fato selecionado" nesta interpretação: a autoria segundo Sônia Azambuja é um processo de elaboração que reúne, entrelaça, diferencia, transforma e cria nas coletividades patrocinadas por Freud, Klein, Bion e muitos outros. Isto é: a efetiva autoria é atribuída a um campo dinâmico por cuja constituição a "autora" individual é responsável e no qual se define ("Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és"), mas cuja evolução ela não controla nem domina, nem prevê. A esta coletividade, aliás, se junta agora a minha própria leitura.

O caráter feminino deste pensamento – um atributo que, queira Deus, não precise estar vedado aos homens – também se revela nos grandes temas e motivos de Sônia Azambuja. A tessitura de conceitos associados cria uma espécie de nebulosa em que nossa autora reside e a partir da qual projeta com sutileza suas questões, seus procedimentos analíticos e os objetivos de sua atividade terapêutica: transformação, expressão, simbolização, expansão, imaginação criativa, tolerância à perda, à separação e à frustração, aceitação da finitude e do conflito etc.

Enfim, uma psicanálise que não desconhece ou renega a dor – e como poderia, mantendo-se psicanalista? –, mas que conserva uma aposta de base nas possibilidades do crescimento psíquico, na esperança de uma vida mais rica, mais vigorosa, mais alegre. O processo do vir a ser autor – autor de textos, autor de interpretações, autor de si mesmo, finalmente – conjuga todos estes elementos, inclusive os tanáticos, sob a égide de Eros.

Tanto na psicanálise (por exemplo, a da melhor tradição kleiniana, como a de Hanna Segal e a Marion Milner nos estudos sobre simbolismo e ilusão), como no campo da antropologia e da filosofia (como os livros de G. Durand e de Suzanne Langer), Sônia Azambuja procura e encontra colaborações importantes para o fortalecimento desta vertente de seu pensamento. A ênfase na fecundação, na gestação e no crescimento são uma tônica da autora em processo de autorizar-se e autorizar: inclusão e separação, presença e ausência como parceiras da simbolização transformadora que promove autonomia para os dois polos de uma situação analítica. O primeiro e mais longo dos textos publicados, e que dá titulo à coletânea, um texto de 1978, é exemplar desta maneira de pensar e praticar a psicanálise, o que vai se desdobrando nas décadas seguintes.

Justamente porque não se torna escolástica, Sônia Azambuja não fez discípulos fiéis e disciplinados. Justamente porque não faz da linguagem que adota em seus textos um emblema a estampar sua filiação, mas um instrumento para pensar e comunicar-se livremente, Sônia não criou seitas e grupos. Isso lhe deu, no campo da vida institucional, um lugar diferente do que estamos acostumados a reconhecer em pensadores-guias. Sônia Azambuja não posou de chefe de escola ou "maître à penser". Via com desconfiança e preocupação todos os processos que geram tais personagens na formação de um psicanalista e na vida das Sociedades de Psicanálise. Contrapôs-se a tudo que faz com que "nos curemos no divã e adoeçamos na vida institucional". Sublinhou o caráter criativo e poético – nada burocrático e repetitivo – da atividade analítica bem constituída e continuamente em trânsito, o que requer um analista que seja ele mesmo de natureza transicional. O que muda, o que move, o que conduz a desenlaces, abre horizontes e propicia transformações, isto sim diz respeito à psicanálise, seja como atividade clínica, seja como atividade formadora. Isso é o que está implicado nos processo do autorizar-se e autorizar. Estudar Freud, mas também, estudar Melanie Klein, Wilfred Bion, Donald Winnicott, Joyce McDougall, Piera Aulagnier, Armando Ferrari e tantos outros, sim, mas em proveito do que nos trazem de potencial germinativo. Assim, Sônia Azambuja, representando uma maneira de pensar e fazer psicanálise, abrindo mão de certas posições institucionais e grupais a que poderia ter tido acesso, mas que contrariavam suas convicções mais profundas e sua sensibilidade, pôde vir a ocupar este espaço diferente, o lugar de uma inspiradora da criação em análise. Não seria um exemplo a ser imitado, mas um chamado a ser ouvido: "venham! A psicanálise é uma força da vida, da sensibilidade e da razão", é o que nos dizem todos estes textos. Um chamado, em outras palavras, a um contínuo "vir a ser autor" endereçado, finalmente, a todos que com ela conviveram. Na resposta a este chamado eu também me incluo.

E quando a morte comparece – e como poderia ser evitado, pela psicanálise, o reconhecimento dos poderes de Thanatos? – o faz de um modo muito peculiar. A citação por Armando Ferrari de um texto de Hanna Arendt, e que Sônia Azambuja reproduz e encampa, resume e encerra, no último capítulo, o tom predominante em todos os textos: "Os homens, ainda que tenham de morrer, não nasceram para morrer, mas para recomeçar". Assim foi a psicanálise de Sônia Azambuja: uma via árdua e trabalhosa, mas carregada de esperança, para um contínuo recomeço, uma aposta radical na capacidade de transformação e criação do psiquismo, mesmo o mais comprometido em virtude das vicissitudes de sua história e de suas condições. Enfim, é uma aposta no "vir a ser autor" do animal simbolizante com seu destino de transformação e criação.

 

Referências

Azambuja, S. C. de (2006). Presenças e ausências, parceiras na simbolização. São Paulo: HePsykhe.         [ Links ]

Chaves, L. P. (2011). On becoming an author. Texto apresentado em Londres por ocasião da homenagem aos 80 anos de Ronald Britton.         [ Links ]

Franco, W. (2012). Autorização e angústia de influência em Winnicott. Dissertação de Mestrado apresentada no IPUSP.         [ Links ]

Foucault, M. (1994). Qu'est-ce q'un auteur? Dits et écrits (1954-1988). (Vol. I, pp. 789-821). Paris: Gallimard. (Trabalho original publicado em 1969)        [ Links ]

Mahony, P. J. (1981). Freud as a writer. New York: International Universities Press.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Luís Claudio Figueiredo
Rua Alcides Pertiga 65, Cerqueira César
05413-100, São Paulo, SP
Tel: 11 3871-5458
E-mail: lclaudio@netpoint.com.br

Recebido em: 10/06/2012
Aceito em: 27/6/2012

 

 

1 Psicanalista, professor da PUC-SP e da USP, autor de diversos artigos e livros, entre os quais Bion em nove lições (2011) e Balint em sete lições (2012) (ambos pela Editora Escuta).