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Jornal de Psicanálise

versão impressa ISSN 0103-5835

J. psicanal. vol.47 no.86 São Paulo jun. 2014

 

TEMA: TRANSMISSÃO DA PSICANÁLISE E REGULAMENTAÇÃO

 

I Encontro do Instituto e Jornal de Psicanálise: a transmissão da psicanálise e a prática analítica atual

 

 

Abertura do debate

Leda Herrmann

Tivemos aqui exposições sobre o tema, e a partir dos trabalhos pudemos constatar posições muito diferentes. Foi o que a diretoria do Instituto pensou para ser aberto ao debate e também aberto ao pensamento, como a Berta nos coloca. Estou muito satisfeita por tudo isso poder ter sido falado ao mesmo tempo, com a oportunidade de uns ouvirem os outros. As posições divergentes foram apresentadas por nossos colegas da mesa, portanto sugiro que comecemos por aqui e depois passaremos para vocês, público.

Permito-me ser a primeira a falar pois a Izelinda me citou, e preciso dar uma resposta.

Há duas coisas a retificar, Izelinda, nas suas observações sobre a minha participação no Encontro de Buenos Aires. Nesse encontro estava representando o Instituto, mas não fui convidada para apresentar o trabalho no painel de abertura como diretora do Instituto, fui convidada como Leda, para levar as minhas reflexões. O tema, para mim, se cunha nessa conjunção de transmissão da psicanálise e prática analítica atual. Foi essa a reflexão que eu levei. Essa reflexão não fica atada à análise didática; ela compreende todo o processo para alcançar a questão posta pela FEPAL, toda a forma que a transmissão da psicanálise exige e toma nos institutos. Isto é, considerarmos o mundo atual e a nossa prática clínica para que a transmissão possa oferecer aos nossos colegas, que estão em formação, condições para enfrentar a prática atual. A frase final do meu trabalho, conclusiva dessas considerações sobre a conjunção transmissão e prática analítica atual, com a qual a Izelinda não concorda e não citou, é assim: "Trata-se de um desafio a enfrentar com coragem, para o qual ainda, pelo me-nos em São Paulo, não temos resposta".

Pela generosidade dos debatedores, Marina, Berta, Márcio e Izelinda, passaremos diretamente ao debate com a plateia.

Julio Gheller

Estou aqui, em uma "atenção tipo flutuante", e dois pontos chamaram minha atenção, um na fala da Izelinda e outro no início da exposição do Márcio. Em relação à fala da Izelinda, eu gostaria de ouvir um pouco mais, para em seguida dizer o que me chamou a atenção nas palavras do Márcio. A questão que coloco para a Izelinda é a seguinte: fui capturado pela frase que ela citou do Winnicott: "Penso eu a respeito do analisando que, de preferência, ele possa crescer e esquecer o analista", o que ela articulou com uma diferença entre o que seria análise propriamente dita e psicoterapia analítica. Pediria para ela se estender um pouco mais sobre essa diferença, para eu poder passar para o ponto inicial da exposição do Márcio quando ele diz: "Por que estamos com tão poucos jovens entrando na Sociedade, ou tão poucos jovens até mesmo aqui, no anfiteatro?".

Izelinda Garcia de Barros

Responderei imediatamente, mas de forma resumida também. Eu havia dito em um parágrafo anterior que, esquematicamente falando, entendo que existem dois momentos em um processo de análise e que chegamos para a análise esperando, desejando, ser compreendidos e ser recebidos por alguém que esteja disposto a nos compreender. Acredito que todas as terapias dão conta desse primeiro momento. Acredito, também, que no percurso de uma análise existe a possibilidade, favorecida pelo analista, da introjeção do modelo que se constrói entre paciente e analista, e que se espera que, lentamente, possamos incorporar esse modelo e passar a se compreender, portanto, sair da análise levando consigo a aquisição dessa função de ampliar a compreensão sobre o seu próprio funcionamento, o que evidentemente gera uma capacidade de maior sintonia consigo mesmo. À medida que você não depende mais do objeto para se compreender, o objeto pode seguir a sua vida.

Julio Gheller

Esta sua resposta me ajuda no que pretendo comentar. Vou desenvolver algo que o Márcio disse no começo da sua exposição, quando trouxe o exemplo dele que, aos 40 anos, era diretor do Instituto e cita que, hoje em dia, tem gente que só entra com mais de 40 anos.

Tenho algumas ideias a respeito. Falarei da minha experiência pessoal como antigo candidato e como atual analista. Existem pessoas em análise, jovens que poderiam entrar para a formação, mas acabam não o fazendo. No ano passado uma analista que eu atendo e que tem muito potencial, sensibilidade e que imaginei que fosse prestar a seleção para o Instituto, não o fez. Preocupada com problemas econômicos e familiares, filho para cuidar, marido que estava em emprego instável, ela tinha que sustentar a casa. Concluiu que não daria conta de quatro sessões de análise por semana, além de uma de supervisão e a mensalidade de membro filiado. Claro, pode-se argumentar que são fatores meramente objetivos, relativamente discutíveis no que concerne ao investimento dela. Contudo entendo que pesaram na sua decisão. Outro ponto é que não queria mudar de analista, mas, pelas atuais regras do Instituto, seria obrigada a essa troca para procurar um didata. São questões dessa ordem que me fizeram pensar também na minha experiência. Não entrei jovenzinho, já era veterano e certamente não era ingênuo. Já tinha mais de vinte anos na estrada. Lembro-me de ter tido um ponto de inflexão, com mudança de atitude e postura, no momento de passar do primeiro para o segundo relatório, da primeira para a segunda supervisão. Mesmo já tendo bastante experiência, eu vivia ainda em um clima no qual o candidato não falava nas grandes reuniões. Só ouvia: candidato tinha que aprender, os mais velhos é que podiam falar com autoridade. Grosso modo, havia a mesa dos adultos e a mesa das crianças. Quanto a isto, poder-se-ia dizer que a timidez seria um problema para a análise pessoal. Sim, talvez fosse em parte, mas será que o meio ambiente não contribuía de modo algum? A atitude mais retraída era puramente produto da minha cabeça? Não sei, tenho a impressão de que o meio criava a "catedral" apontada pelo Márcio, funcionando de maneira a estabelecer mitos e lendas como a crença de que devíamos galgar vagarosamente as posições mais altas. O fato é que, depois do primeiro relatório, eu me vi mudando de atitude, disposto a expor o que pensava, falar um pouco mais alto e, enfim, ganhar o meu espaço, autorizando-me a sair da posição de mero observador e ouvinte.

Lembro-me de uma frase de Lacan, no capítulo sobre a ética da psicanálise do seu Seminário 10, que dizia:

"Agiste em conformidade com o teu desejo?".

Traduzido em outros termos, seria algo como:

"Estás coerente com teu desejo?".

A questão se coloca na linha de que cada um possa, através da análise, chegar a ser o sujeito que, de verdade, é.

Levantei essa ideia porque o Márcio falou a respeito da catedral e acho que se trata de um tema superinteressante. O que é essa catedral, que impressão transmite aos jovens, será que assusta de começo?

Para mim, confesso que chegou a assustar.

Marta Úrsula Lambrecht

Bom-dia a todos. Gostaria, num primeiro momento, de destacar o inapreciável valor que envolve esta troca de experiências entre colegas em diferentes momentos do trânsito pessoal, profissional e institucional, propiciado pelo Instituto em comunhão com o Jornal de Psicanálise.

Berta, ao compartilhar conosco sua brincadeira no elevador com Leopoldo Nosek, que lhe disse: "Cuidado! Quando você vir um elefante na árvore, se ele está lá é por que alguém o colocou", levou-me à seguinte pergunta: em que premissa poderia se colocar o acento, na enormidade do elefante ou na fragilidade do galho? Então, visto deste ângulo, entramos na dicotomia entre grandes e pequenos ou entre quem colocou e quem se sentiu colocado, também entre quem está acima da árvore e quem não, e assim vai. Esta não é uma simples questão, é todo um tema a ser desenvolvido.

Ao se mencionar Bleger no que respeita à fala sobre o setting chorando que, como a criança, só se sabe que existe quando chora, ou como a simbiose que deixa de ser muda quando se rompe, incita a pensar nas tessituras da simbiose terapêutica e a esperada individuação que configurarão, entre outras tantas coisas, o setting interno do analista. Agora, é fascinante poder pensar como percorrer esse caminho nos dias de hoje para que tal processo aconteça: a análise por Skype? Seria com uma, duas, quatro sessões semanais, ou a cada 15 dias? Não sei bem ao certo como, mas a simbiose precisa ser gerada e isso entra no foro do individual e privado, não é passível de uma generalização, cada dupla é singular. Em uma entrevista publicada na Revista Brasileira de Psicanálise, Urribarri enfatiza que "O setting pode chorar". Penso que quando a simbiose se rompe, a patologia berra e nós, psicanalistas, somos convocados a entrar com as fortes e firmes ferramentas internalizadas. Estas não podem fraquejar nem muito menos ser o frágil galho da árvore, é preferível que seja como o elefante e por isso temos de continuar focando nos elefantes. Obrigada.

Alicia Lisondo

Quero agradecer ao Instituto a possibilidade de discutir essas questões quentes, com coragem e com verdade, mas tenho algumas questões para poder pensar. Primeiro, acho que para ser criativo, tomando algo da Berta, e para poder jogar, tomando algo de Márcio, e para que o jogo seja criativo, porque há jogos que são repetitivos, estereotipados, empobrecedores mas também podem ser chamados de jogo, é importante ter maturidade analítica e um respeito pelo objeto analítico. Então uma questão é a análise do futuro colega que tem sua mente como instrumento de trabalho e outra questão é a análise para o paciente contemporâneo. Fédida já dizia que a psicoterapia é uma psicanálise muito complicada e, para ser um psicoterapeuta, era preciso ter uma formação muito sólida, justamente porque o enquadre "berra".

Outro ponto, como diz Bleger, é que há questões que ficam encrustradas no enquadre, que não passam pela linguagem verbal e é muito importante levar isso em conta.

Alicia de Lustgarten, a partir de suas experiências no ILAP, que propõe análise e formação a distância, aponta que o inconsciente nem sempre se manifesta de forma verbal, pois tem o modelo verbal e o do sonho, presentes em todos e também nos analistas, devido às partes psicóticas da personalidade.

Escrevi um trabalho sobre psicanálise a distância, em que questiono a análise por Skype e proponho working parties duplamente cegos, com sessões de uma mesma análise, à distância e presencial, para que se possa observar como o analista poderá perceber questões que passam por uma linguagem pré-verbal, sendo que o Skype privilegia a linguagem verbal.

Sofri um acidente, fiquei internada na UTI, claro que eu estava em um trauma em carne viva, e na ocasião fazia análise com uma pessoa de Buenos Aires, Dario Schor, e tentamos a análise por Skype. Apesar da tentativa de se preservar um ambiente de privacidade, um tempo específico para a análise, isto não foi possível pois, às vezes, a imagem congelava, havia ruído na voz, ele não sabia se eu estava muda, chorando ou se era problema de conexão. Essa análise não foi possível, meu analista teve a coragem de me dizer que teríamos mais um encontro para nos despedir, que essa análise não poderia continuar e eu deveria ir em busca de outro analista. Durante os quatro meses de internação não podia clinicar, mas pude trabalhar para a ilap, escrevendo, em entrevistas a distância.

Trabalho para a ILAP, sou a favor de videoconferências, mas questiono a análise a distância na formação de futuros analistas.

Como diz Izelinda, o paciente da contemporaneidade está mais para o modelo do ato que do sonho, e o futuro analista deverá estar preparado para interagir com esse tipo de paciente.

O futuro analista deverá trabalhar os aspectos primitivos de sua mente, com a linguagem não verbal, justamente para poder brincar e ser criativo.

Wagner Francisco Vidille

Gostaria de parabenizar o Instituto e o Jornal. Esta reunião é muito importante porque vemos que a Sociedade está polarizada em termos de alguns temas, mas estamos tendo oportunidade de conversar. Isso é o mais importante, grupos diferentes conversando, congregados, algo diverso de um engessamento percebido em outros momentos. Por exemplo, em 2000, um grupo do interior me pediu um curso a distância, para ser feito via internet, hoje em dia mais comum, mas não houve nenhuma credibilidade. Há dois anos escrevi um trabalho para pensar o atendimento por Skype mas, naquele momento, a apresentação não despertou interesse nas pessoas daqui. O gratificante foi a grande quantidade de e-mails que recebi de pessoas de fora que trabalhavam dessa maneira.

A possibilidade dos grupos conversarem harmoniosamente, como estamos fazendo, é importante para o desenvolvimento da organização para que ela não definhe e fique em uma situação de engessamento.

Leda Herrmann

Depois da Ana, os debatedores irão falar, antes de continuarmos.

Ana Vannucchi

Gostaria de agradecer à Marina, pois tenho a impressão de que toda a interlocução que tivemos transformou meu trabalho em um trabalho melhor, mais claro, talvez mais eu mesma.

A respeito de seus comentários sobre a questão da transmissão, penso, como a Izelinda, ser esta uma palavra que talvez dê mais conta do que todas as outras que tentamos achar, porque é algo que não cabe em palavra nenhuma. Formação implica algo que lembra forma, apreender, aprendizagem. Talvez transmissão dê conta de todo esse oceano que implica o psiquismo do analista, buscando tornar-se analista. Esta é uma missão até o fim da vida, nenhum analista se sente um analista já pronto.

Quero também agradecer ao Márcio, que leu meu trabalho com muito cuidado, tendo inclusive tomado um termo de minha vinheta clínica como fato selecionado para pensar outro contexto.

Márcio se utiliza do termo catedral como metáfora para seu raciocínio sobre a sacralização das instituições, trazendo a questão do rito e do jogo e das nossas relações com o inconsciente de nossos antepassados. Isto me fez pensar que também aqui há uma dialética entre jogo e rito, pois esta conversa é também um rito, porque os encontros que realizamos são também ritos que acontecem entre os institutos, como os congressos e as reuniões científicas. E o que permite o jogo é a possibilidade de lidarmos com as diferenças, o que se torna bastante enriquecedor.

Berta, você traz a questão, sempre bastante discutida, sobre qual seria o melhor setting para a análise de formação e que essa questão atrapalha as análises. Eu diria que ajuda, pois nos faz refletir sobre a impossibilidade de dizer o que é o melhor para o outro, pois só podemos dizer algo a partir da própria experiência. Você também se refere a isto quando diz que não poder falar pelos membros filiados, de quem é representante, pois só pode falar por si mesma.

Você falou da matriz ativa que Green chama de estojo, o setting formal. Ele diz que precisamos cuidar para que esse estojo proteja a joia, matriz ativa, que está dentro, e que consiste nas associações livres do analista e do analisando. Como diz Moguillansky, a maneira como cada um trabalha e se sente trabalhando é uma questão ética pessoal. Eu percebo que trabalho melhor com o maior número possível de sessões, pois isto me permite lidar com níveis psíquicos mais profundos e entrar em contato com o novo, o desconhecido, as reverberações do inconsciente, surgidas ou criadas naquele instante pela dupla analítica.

Voltando à questão das diferenças; gostaria de lembrar que aquilo que está na base de qualquer identificação é sempre o processo de observar e lidar com as semelhanças e diferenças. A discriminação e o respeito pelas diferenças é fundamental entre grupos, entre uma pessoa e outra ou dentro da própria pessoa. Isso permite o estabelecimento da identidade em geral e da identidade analítica em particular.

Penso que, durante uma sessão de análise, momentos profundamente psicanalíticos são raros. Então procuro discriminar em que nível estou trabalhando, o que é possível naquele momento, naquela sessão, para que a dinâmica entre semelhanças e diferenças possa estar trabalhando a favor de um trabalho ético, no sentido de eu poder ser eu mesma e colaborar com o outro para que ele seja ele mesmo.

Esta não é a única, mas é a minha maneira de pensar o processo psicanalítico e a análise pessoal do analista.

Acredito que me fazer conhecer é a melhor maneira de conversar e estar disponível para entender as premissas e escolhas que sustentam outras maneiras de pensar.

Gostaria de contar também que já atendi por telefone, quando eu ainda não tinha Skype, e que isso não me pareceu algo transgressor, mas, sim, algo que, naquelas circunstâncias específicas, apenas contribuía para a continuidade dos encontros, num nível de profundidade bem diferente do que se alcançava na mesma relação presencial. Esse trabalho foi interrompido pela própria paciente, que me disse que não tinha "nada a ver, nem graça nenhuma" conversar comigo por telefone.

Márcio Giovanetti

Izelinda questionou a Leda e ela respondeu dizendo que não foi convocada como diretora do Instituto. Acho que foi sim, como diretora do Instituto. Izelinda disse que São Paulo não tem ainda uma resposta para essa questão das frequências às sessões. São Paulo não deu ainda uma resposta: apenas fez uma votação sobre essa questão.

Por isso estou achando muito interessante nossa discussão aqui, pois está se podendo trabalhar o que não foi possível ser trabalhado há dois ou três anos, quando predominou um clima de assembleia, de votação. Hoje predomina um clima de reflexão, e isso precisa continuar.

A ideia da catedral ficou bastante forte, porque de fato ela é forte, e basicamente temos que pensar a transmissão numa perspectiva religiosa ou numa perspectiva de profanação. Isso é o mais básico do que eu quis ressaltar, claro, a partir das vinhetas clínicas dos trabalhos. Minha ideia foi que eu pegasse algumas frases que de fato fossem a alma daquele trabalho, o ponto central. A oposição que se apresentou entre uma casa que não pode ser comprada, uma casa perdida e uma catedral que está sempre no mesmo lugar serviu muito para eu estabelecer esse jogo entre o pensar enrijecido, engessado, entronizado, sacralizado em última instância e um pensar da ordem da profanação, que faz diferença.

Pensar em psicanálise ou psicoterapia tem como base pensar o que é ser um psicanalista. O que surge do encontro da escuta do psicanalista com a pessoa torna irrelevante se vamos chamar de psicanálise ou chamar de psicoterapia.

A questão da transmissão é para formar psicanalistas e a discussão sobre a frequência das sessões não me agrada, estamos atrasados aqui em São Paulo discutindo número de sessões. Talvez seja essa a referência que Wagner faz sobre o espírito, quando a sociedade definha. Jovens que não possam chegar aqui?

Precisamos pensar muito sobre isso e trabalhar, não apenas ficar pensando, voltar sempre às mesmas discussões, num tempo que parece o tempo do eterno retorno. Aí fica um tempo mítico, a fala não caminha nas ideias, a instituição não caminha, engessa.

Alicia faz distinção entre análise didática e análise a distância. Não sei, preocupo-me muito mais com o sombreamento que as análises didáticas causam nas análises não didáticas, em todas as análises, do que no contrário. Acho que a análise, à medida que ela só pode se dar no contemporâneo, com a fala nova, não tem que ficar se ocupando muito dessa diferença. Alicia disse ter uma experiência própria, em que a análise por Skype não funcionou. Essa é a experiência pessoal dela. É importante ouvirmos outras experiências. Há muita gente que diz que análise em divã quatro ou cinco vezes por semana também não funcionou nada na vida. Cansamos de escutar gente que diz que fez 20 anos de análise e não adiantou nada.

Experiências são sempre pessoais, testemunhos próprios. Temos aqui outra função, que é a de transformar aquilo que é pessoal em algo que seja mais conceitual e genérico, e que isso sim seja a base da transmissão: a da função significante e não do significado em si, conforme a citação que fiz do Agamben em minha fala.

Nilde Jacob Parada Franch

Queria fazer uma pergunta ao Márcio: você falou que aos 40 anos era diretor do Instituto, você já devia ter feito toda a formação, no mínimo cinco anos de análise e tal. Como você pagava isso? Você tinha pai rico ou tinha um consultório superlotado?

Márcio Giovanetti

Não tive pai rico, pagava trabalhando, era caro pagar, sempre foi difícil. Mas tinha uma diferença do mundo de hoje, eu não fui buscar nenhum emprego quando me formei, os empregos buscavam a gente na faculdade. Essa é uma diferença do mundo de hoje, ganhávamos um pouco mais. Mas essa não é uma questão puramente econômica, tem esse fator econômico, mas deve ter outros.

Marion Minerbo

Primeiro gostaria de dizer que estou absolutamente feliz com a qualidade desta mesa, de todas as apresentações e queria ressaltar especificamente a qualidade e a consistência da apresentação da Berta, que tem um pensamento muito decantado e ideias que são apresentadas de uma maneira absolutamente metabolizadas. Eu tinha preparado uma coisa que não servirá porque a discussão tomou outro rumo, mas eu gostaria de ler um trechinho de um trabalho do Freud de 1918. Naquela época ele já trabalhava há 20 anos e trabalharia mais 20, e já estava preocupado com o futuro da psicanálise. No v Congresso da IPA ele apresentou um texto chamado "Linhas de desenvolvimento da terapia psicanalítica". O texto começa dizendo o seguinte:

Como vocês sabem, nós nunca nos arrogamos um saber completo e definitivo sobre nossas capacidades, estamos tão prontos agora como estivemos antes a admitir as imperfeições do nosso conhecimento, apreender coisas novas e a modificar nossos métodos em qualquer direção que possa aperfeiçoá-lo, agora que estamos novamente reunidos depois de longos e difíceis anos de separação, era a I Guerra Mundial, sinto-me levado a rever a posição do nosso procedimento terapêutico e a considerar as novas direções em que ele pode se desenvolver.

Aí ele discute a propriedade das contribuições de Ferenczi em relação à técnica ativa, que naquele momento ele apoiava totalmente. Mais tarde Ferenczi passou do ponto e eles acabaram brigando. Além de estar falando, apoiando as modificações e a técnica ativa de Ferenczi em certo contexto, ele prevê que no futuro a psicanálise será praticada em situações muito diferentes da clínica padrão. Então é interessante ver que Freud não se sente ameaçado em sua identidade psicanalítica, nem pelas inovações técnicas propostas por Ferenczi, nem pelas mudanças de enquadre que ele prevê para o futuro. Ele já tinha dito, não lembro mais em qual artigo sobre técnica, que ele considera a psicanálise qualquer prática que mantenha como referência o método psicanalítico e os conceitos fundamentais: inconsciente e transferência. Não trago isso como argumento de autoridade, é apenas para mostrar a diferença entre os momentos instituintes e os instituídos.

Na época, a psicanálise ainda era um instituinte - falo isso porque surgiram aqui várias referências a Bleger. Não só o enquadre das análises serve para que as partes mais primitivas e mais psicóticas se depositem e fiquem mudas ali, mas certamente as nossas instituições funcionam como um enquadre para nós, e servem de apoio para as nossas identidades psicanalíticas. Nós todos depositamos sobre o enquadre institucional as partes mais primitivas das nossas mentes; o nosso funcionamento psicótico fica tamponado porque ele está acolhido pelo enquadre institucional, e é por isso que qualquer modificação nesse enquadre tende a "deixar soltas" as nossas partes psicóticas que estão tamponadas pela instituição.

Acho que os debates em que não falamos propriamente de diferenças, mas onde vemos posições polarizadas, onde vemos impasses, são posições que estão polarizadas defensivamente, pois temos medo de que mudanças possam trazer à tona e deixar soltas as nossas partes mais primitivas.

Neste momento, se estamos num momento de polarização, é porque nossas angústias paranoides estão emergindo. Nestes dois grupos que estão polarizados, cada grupo vê o outro como ameaçando uma coisa absolutamente preciosa que é a sua psicanálise; cada um vê o outro como um perigo. Falo isso porque também pertenço a um dos grupos e percebo uma dinâmica polarizada sim, há uma dinâmica paranoica. Talvez, para sair desse impasse, precisássemos recorrer, então, a um terceiro. Nosso terceiro poderia ser o estudo sobre o funcionamento nas instituições como um todo. Qual é o movimento, quais são os mecanismos do funcionamento psíquico das instituições, quais são os contratos inconscientes que todos nós fazemos com as instituições? De que maneira as mudanças nas instituições nos afetam em nossas identidades singulares, individuais? Penso que isso talvez nos ajudasse a pensar este momento para além de "eu acho isso", "você acha aquilo". Além do "você está pondo em risco a psicanálise"; "não, é você que está pondo em risco a psicanálise". Então eu pensaria que precisamos de um terceiro, e talvez um estudo do funcionamento psíquico das instituições, porque elas têm um psiquismo próprio que independe do psiquismo de cada um de nós, isso poderia nos ajudar.

Em relação à ideia das análises por Skype, discordo dessa prática para a formação psicanalítica pelo seguinte: acho que o corpo fala, o corpo se comunica, é a comunicação não verbal, as identificações projetivas se dão pelo corpo, o corpo é a parte mais primitiva da mente, digamos assim, acho muito difícil que uma comunicação entre corpos possa acontecer no espaço virtual. Acho que seríamos levados a restringir a análise aos aspectos verbais da comunicação, àquilo que pode ser dito, perderíamos talvez a dimensão mais importante das análises - claro que isto não se aplica a condições excepcionais, alguém viaja ou está doente etc.

E só voltando, então, para algo que a Berta falou sobre os não ditos e das zonas não pensáveis, que todas as instituições abrigam zonas de não ditos e não pensáveis, me faz pensar se o nosso não dito e não pensável não teria a ver com a nossa falta de clareza, afinal de contas, sobre aquilo que para Freud era tão claro, que o que define a psicanálise é por um lado um método e por outro a referência a dois conceitos fundantes, inconsciente-transferência. Então talvez o não dito e não pensável seja que não temos essa clareza, então, acabamos hiperinvestindo outros elementos, aspectos formais do enquadre. Mas, obviamente, cada vez que trazemos à tona um não dito e não pensado isso só pode produzir uma enorme turbulência.

Berta Hoffmann Azevedo

Vou tentar acompanhar as falas que me citaram. Começarei pela Martha que destacou o Bleger e a história do elefante. Tem algo de muito interessante nesse texto do Bleger, que ele justamente trata de quando o enquadre não chora, acho isso muito interessante porque estamos acostumados a pensar quando o enquadre chora, e ele nesse texto fala: vou, justamente, estudar o que acontece quando não chora, o que está ali guardado no setting e aí ele chega à simbiose. A sua pergunta, Martha, é como estimular isso? Que é mais ou menos próxima à minha pergunta de como tentar propiciar que uma análise se dê. Esta é uma pergunta que temos que nos fazer. Não acho que tudo vale, mas entendo que precisamos ter espaço para conversar, não penso que a resposta seja universal. Quando Green diz do enquadre interno, e você lembra que esse não poderia chorar, acho que é um aspecto que passa, sim, por uma análise. Vou juntar, então, com a questão da Alicia, que fala que seria importante diferenciar entre a análise do analista e a do paciente contemporâneo, e isso, eu lembro na época em que começou a discussão aqui, há três anos, falavam muito da análise do analista. Para mim este foi um termo que sempre me causou estranhamento, porque acho que a análise é sempre do paciente. Então quando falamos de análise do analista, só faz sentido se ele estiver ali numa condição de paciente, numa condição de sofrimento. E em relação a essa análise temos que pensar de que maneira favorecer que seja mais análise do que didática, digamos, que o fato de ser didática não implique em deixar de ser análise. Eu acho que esse é um problema, problema como algo que nos movimenta, uma questão-problema para pensarmos. Como podemos pensar condições para que uma análise de fato se dê também numa condição de análise de um analista em formação? E eu penso que, quanto mais liberdade esse par tiver, mais chance dela ser genuína, para que essas pessoas, então, ali, naquele momento, possam falar em nome próprio sobre o que pensam que seja bom para aquela análise. Quando a instituição entra de um jeito muito firme, colocando muitos parâmetros do que é e do que não é, da maneira que tem que ser, acho que isso cria entraves, é algo para pensar. Outro ponto que gostaria de comentar é sobre quando a Ana fala que não é a primeira oportunidade em que esse assunto é debatido. Sim, eu estava aqui, lembro desse momento delicado em que se falou de transmissão, deve ter tido outros, mas estou aqui só há cinco anos e outro momento que pude acompanhar foi aquele das assembleias, dos ânimos muito à flor da pele, e a Marion usou essa expressão das angústias paranoides, eu acho que sim, dava para sentir isso naquele momento. Eu diria que este hoje é um momento privilegiado, e por isso destaquei a forma como o convite é feito na carta da FEPAL, porque é um convite de suspender o fazer em nome do pensar. Não estamos decidindo nada, não tem nada a ser votado em breve, este é um momento muito propício para pensarmos de fato, para que as angústias persecutórias fiquem menos à flor da pele. É o que temos pensado para a Associação dos Membros Filiados, que possamos oferecer espaços privilegiados de debates, de se colocar questões para discutir, para que no momento em que passarmos para a Sociedade possamos não apenas reproduzir coisas, já tenhamos decantado ideias, como a Marion falou, cada um à sua moda. Outro aspecto que a Ana levantou, a respeito do impasse político que talvez atrapalhe a formação, acho que aqui eu talvez não tenha me feito entender. Não acho que são os pontos de vista divergentes, polarizados, que atrapalhem. O que atrapalha é o não dito. Atrapalha que essa polarização da forma que está, e a forma que esteve a Sociedade há algum tempo, muito em carne viva, foi criando assuntos que causam um certo desconforto. A minha experiência em seminários clínicos e teóricos é que quando alguém levanta uma questão ligada à frequência, por exemplo, dá aquele momento em que todos se acomodam mal na cadeira, porque ali parece que ao invés de podermos de fato pensar no caso, entramos num terreno de tomar posições ideológicas. É isso que atrapalha nossa formação. Por isso momentos como este, em que tentamos pensar juntos, debater, não para chegar a um consenso, mas para colocar as coisas em jogo, são muito importantes.

Marina Massi

Queria retomar algumas coisas e pinçar o que mais me chamou atenção a partir daquilo que ouvi.

Um dos desafios que temos no momento é acolher o desenvolvimento que a psicanálise alcançou no mundo. Um desenvolvimento que ocorreu ao longo de muitos anos e que vem sendo produzido seriamente.

O acolhimento significa para mim a possibilidade de uma instituição ser pensante, reconhecer o processo histórico da própria psicanálise, reconhecer seus pares, o trabalho e o próprio desenvolvimento. Percebo que um dos problemas é faltar esse espaço pensante como identidade da psicanálise - uma atitude analítica. É importante que nós, juntos, possamos metabolizar questões da psicanálise sem se ater ao vértice de determinada escola ou grupo. É necessário construir um outro patamar de discussão.

Se para conversar sobre análise didática, formação, análise pessoal mantivermos a ideia de que a análise didática é o paradigma da melhor análise, é o modelo de análise, a discussão será qual a análise, de qual grupo, será tida como a verdadeira, a melhor? A kleiniana, bioniana, winnicottiana, enfim, escola inglesa ou a francesa, com três ou quatro vezes por semana? A discussão será muito mais de poder e de grupos do que realmente analítica.

É importante também dar possibilidade aos membros filiados de conhecer e escolher diferentes possibilidades de e da psicanálise. É permitir que um mf possa ter a experiência de começar uma análise, por exemplo, e dizer que "não me encontro nisso, mas me encontro noutro", que pode ser a visão da escola inglesa, francesa e outras.

Outro ponto, é que devemos ter cuidado ao falarmos de atendimento de casal e família, como se ele não pertencesse ao campo psicanalítico, pois isto é algo novo. Se é algo novo, do campo da pesquisa psicanalítica atual, ainda não dá para ser a favor ou contra. É preciso pesquisar mais. Tempos atrás não imaginaríamos trabalhar com grupos/casal/família aqui e hoje já fazemos.

Em relação ao atendimento por Skype, não sabemos o que as diferentes experiências de diversos psicanalistas, que enfrentam o desafio de atender o paciente que viajou, não fala a língua, e está desesperado no exterior, poderão trazer. Não respondemos ainda `as variadas questões, importantes e significativas em uma pesquisa - que tipo de interferências trás o Skype? Com imagem ou sem imagem, ele ajuda, atrapalha? Que tipo de paciente poderia, ou não, ser atendido?

Poderemos ter muitos trabalhos que indicarão prós e contras, pode ser que daqui a dez anos estejamos ou não trabalhando muito mais com o Skype, e aí poderemos chegar a uma conclusão, não só no Brasil mas no mundo, em relação a esse recurso para atendimento de pacientes.

Também em relação formação devemos pensar que há mudanças. Não posso usar os mesmos parâmetros de antes para avaliar a formação que acontece agora. A formação é outra, o membro atual não é mais um jovenzinho, em geral são jovens e também mais velhos, são pessoas pensantes com as quais podemos ter interlocução; quando chegam, em geral, eles já têm experiência clínica.

A clínica contemporânea também nos chama para algo novo, e o que se espera é que a instituição tenha uma postura analítica, que permita enfrentar os desafios da atualidade, pensar a psicanálise de uma maneira mais ampla e não ter a análise didática como o único objetivo a ser alcançado, pois é através dela que se formata o que é a "boa" psicanálise.

O que se precisa e espera frente a essa situação é que tenhamos, enquanto membros da SBPSP, uma postura de conversa sobre o tema da análise didática, que a instituição tenha uma postura de acolhimento e que não se preocupe tanto com a possibilidade de deixar de existir a análise didática, pois lá está o top, o local onde se formata a "boa" psicanálise. Não cabe mais uma regulamentação sem um aprofundamento psicanalítico como resultado de uma longa conversa entre pares.

Heloisa Ditolvo

Quero parabenizar a ideia, qualidade e a importância deste encontro. Na mesa existem pessoas com tempos bem diferentes de Sociedade, com uma qualidade, consistência de apresentação muito semelhante. E quero dizer, Berta, que eu sou do Jornal, sou membro associado, mas você me representa.

Cecilia Orsini

Fiquei com as palavras transferência e objeto transicional, que têm como destino a solução ou transformação em outra coisa. Se a transferência leva para outro lugar, a colocação da Marina é muito pertinente, o Instituto tem que ser um lugar de linhas de pesquisa e não de reprodução de xis modelos. É um lugar de produção de conhecimento porque a transferência vai levar para um outro lugar. Levando para outro lugar, frisa o Márcio. E a Berta trouxe a anedota do elefante.

O mineiro também tem uma anedota do elefante: dois mineirinhos estão pitando quando passa um elefante voando e eles olham. Passa o segundo elefante, eles olham. Quando passa o terceiro elefante voando, um deles fala: - Poxa! O ninho deles deve ser por aqui.

Então eles acolhem o estrangeiro.

Eu queria voltar à tradição e à ruptura, com nosso maior escritor, Guimarães Rosa, que pega a linguagem das profundezas do sertão, absolutamente regional, e leva para outro lugar. O mote de Riobaldo é: "Viver é muito perigoso, é muito arriscado".

A psicanálise é um contrato de risco, assim como a vida. Se psicanálise é vida, vivemos uma aposta de riscos.

Luciana Saddi

Como vocês pensam, diferenciam, a análise e a análise do analista? Para mim a análise é sempre análise pessoal.

Falando um pouco de mim, entrei no Instituto aos 28 anos, fazia análise há 10 anos, não era análise didática, mas não mudei de analista pois o meu analista tornou-se didata. Não consigo pensar que uma análise didática deveria ser diferente da pessoal. Para que serve uma análise? Lembro-me que há dez ou 15 anos, eu e Marina estávamos no Jornal e fizemos um número sobre a análise regulamentada. Naquela época Meneses e Liana eram os editores e a IPA os aterrorizou, pois não se podia questionar a análise regulamentada.

Quinze anos depois questionamos a regulamentação das análises.

Karin Sapocznik Szapiro

Tenho 42 anos, estou há dois anos em análise didática, um ano na instituição, em aula com cursos. Achei muito interessante todo esse tema. Escutei o Julio comentar e fiquei tentada a ficar escondida, mas não consegui ficar quietinha, escondida embaixo da cadeira. A ideia da catedral me parece muito pertinente, porque é assim que as pessoas de fora da Sociedade a veem. Isto é uma pena, porque eu, particularmente, tenho grandes amigos que poderiam estar aqui, mas estão longe dessa possibilidade, o que é uma perda muito grande, pois são pessoas que poderiam contribuir e agregar muito na instituição. Muitas vezes elas me veem como uma pessoa privilegiada. Penso, onde estamos errando? Colocando-me dentro da instituição: por que somos uma catedral e não uma casa de portas abertas? O Sedes Sapientiae e o Centro de Estudos Psicanalíticos (CEP) têm um número muito maior de pessoas que ingressam e frequentam. Sinto que precisamos fazer as pessoas se aproximarem do nosso Instituto, seja via cursos rápidos, introdução à psicanálise, como no Sedes Sapientiae, por exemplo, que tem curso de um ano. Eu vim de um curso de um ano do Sedes Sapientiae. As pessoas precisam sentir o cheiro da instituição, precisam ver que é uma casa, que podem ser bem recebidas. Enfim, desmistificar essa ideia de catedral.

Miriam Altman

Parabéns a todos, Berta representou muito bem os membros filiados. Estive nesse encontro de institutos e lembro-me que fiz a supervisão cruzada e uma das coisas que falei lá é que a discussão a respeito da frequência das sessões, de três ou quatro vezes semanais, da forma como vinha sendo conduzida, me parecia meio "esquizofrenizante" para quem estava chegando à Instituição como eu. Hoje, ao contrário, sinto que é algo rico o que está acontecendo aqui, entre pessoas de gerações diferentes, e sinceramente não sinto que a discussão está engessada. É uma riqueza poder, como a Marina disse, conviver com essas diferenças. Os pacientes que nos chegam têm necessidades diferentes, e cabe ao analista, se tiver maturidade, integrar isso dentro dele e usar de acordo com o que pede o paciente.

Marina fala a respeito do trabalho do Jornal sobre a questão do desenvolvimento científico e conceitual.

Lembro que o Marucco frisa muito a necessidade, que a Cecilia Orsini traz, de desenvolver conceitualmente essa questão para não ficarmos somente na questão da prática. Fiquei muito feliz quando peguei o Jornal e pude ler o artigo da Ana Clara Gavião e artigos com tendências diferentes, o que significa que vocês, do Jornal, estão podendo fazer o trabalho de manter as diversidades muito bem. Manter a diversidade é uma das riquezas da nossa sociedade, o contrário de ficar achando que a diferença é um problema. Eu acredito que trabalhar para produzir e estimular a teorização e discussões como estas é o grande desafio que uma publicação como o da nossa Sociedade pode ter.

Nilde Franch

Marina, há no mínimo 15 anos houve um evento interessantíssimo em Ribeirão Preto sobre a transmissão e expansão da psicanálise, em que Odilon de Mello Franco e Virginia Bicudo foram convidados a representar São Paulo, apresentando suas ideias. Talvez possamos recuperar algo desse material.

Falou-se muito sobre a "catedral". Há muitos anos, quando eu pensava em fazer formação, ouvia falar sobre a Sociedade - "Você quer entrar naquela igrejinha?". Não era nem catedral. Era considerada uma instituição extremamente fechada. Tínhamos oito analistas didatas e não era muito fácil encontrar um analista didata cujos honorários fossem razoáveis para quem estava começando a vida profissional. Tive a sorte, não só pela questão financeira, mas principalmente pela personalidade, de conhecer Lygia Amaral e de poder fazer uma análise extensa, que começou quando ela me recebeu para a entrevista e deixou claro que trabalhava cinco vezes por semana. Aceitei o desafio. Minha experiência foi muita rica; foi a minha experiência! É o que eu precisava como pessoa; era relativamente jovem, filhos pequenos, tinha acabado de perder uma pessoa muito importante da minha vida, meu pai. Foi uma análise de cinco sessões semanais, riquíssima. Quando ela parou de trabalhar às sextas-feiras e diminuiu para quatro sessões, senti como uma perda. Acredito que a instituição tem que acolher diferentes pontos de vista, ainda que eu continue no meu consultório trabalhando com quatro sessões semanais para análises de formação. Acho que a Sociedade, como instituição, tem que acolher pontos de vista diferentes, caso contrário, parece-me que ficamos bastante vulneráveis ao surgimento de transgressões, o que acredito ser pior em termos de formação de atitude e postura psicanalíticas.

Sobre a questão que Marina levantou, existem hoje aqui na Sociedade 27 grupos de estudos: grupo de estudo sobre a obra de Bion, de Winnicott, sobre homossexualidade, sobre corpo e mente, sobre filosofia e psicanálise, entre outros. Fui durante sete anos coordenadora do Comitê de Educação da FEPAL, viajei pela América Latina, participei de todos os encontros de Institutos da época, organizando muitos deles, e posso dizer que a diferença entre o nosso Instituto e de grande parte de outros Institutos é enorme. Aqui, o analista em formação pode escolher professor, horário, curso, e ir fazendo sua formação levando em conta suas necessidades e predileções. Para cursos eletivos, o que se oferece é um cardápio imenso. Isto não quer dizer que atingimos o ponto mais alto de organização da formação e não temos mais nada a fazer; temos sim, temos que continuar pensando a formação como um todo, porque inclusive essa questão da frequência é apenas um sintoma de que precisamos continuar conversando. Não esqueçamos a ideia de Freud de que nenhum analisando irá mais além do que foi seu analista, e como formadores fica clara a grande importância da análise do analista.

Sobre a questão do Skype, tenho pouca experiência, no momento atendo uma analisanda de outro estado da federação que alterna sessões presenciais, em maior quantidade, com sessões por Skype, e essa experiência está sendo pensada por mim no momento.

Julio Gheller

O que a colega Karen disse, lamentando a ausência aqui de colegas que foram para outras formações, me lembrou de uma sensação igual. Eu também lamento por alguns contemporâneos valorosos que optaram por outros percursos. Eles poderiam estar aqui, enriquecendo nosso ambiente. Sou um dos que fizeram outra trajetória, mas acabei vindo para cá. Outros seguiram caminhos diferentes e nunca mais concretizaram seu interesse pela Sociedade. De certa maneira, ainda temo por isto, porque acho que temos uma formação melhor. Conheço colegas a quem respeito muito, que pensam que os mais jovens podem iniciar seus estudos no Sedes Sapientiae, por exemplo, porque futuramente virão para cá. Eu, de minha parte, creio que devemos criar condições para que esses pretendentes jovens venham logo para a Sociedade.

Maria Aparecida Nicoletti

Gostaria de dar uma notícia boa, que já foi publicada. No processo seletivo de 2011/2012, a faixa etária mais baixa variava entre 50 e 55 anos, e a mais alta era em torno de 70 anos. Em 2013 tivemos a satisfação de ver que a faixa etária foi de 28 a 60 anos, o que é uma boa notícia. Esperamos que neste próximo processo seletivo, de 2014, que já está aberto, possamos ter pessoas jovens. Convido a todos a colaborarem indicando seus amigos.

Leda Herrmann

Quero agradecer a vocês que aceitaram o convite para participar deste encontro. Volto a dizer que foi uma oportunidade excelente do Instituto para abrir uma discussão sobre transmissão e formação em psicanálise e escutar pontos de vista diferentes, escutar as diferenças. Se não nos escutarmos ficaremos presos em qualquer lugar do não dito, e isso é horrível. Para ir para frente temos que nos escutar, mesmo que seja preciso nos estapear, mas nos escutarmos. De tanto falarmos de diferenças, lembrei-me de uma expressão do final dos anos 1960 que dizia "É proibido proibir".

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